Patentes concedidas sob o Lei nº 5.772/71 que previa 15 anos de vigência para a patente, que ainda estivessem em vigor em 14/05/97 com a entrada em vigor da LPI, podem contar com a vigência de 20 anos, estendendo assim a vigência original por mais 5 anos?
Não. A LPI estabelece vigência de 20 anos para patentes de invenção. O Código de Propriedade Industrial de 1971 estabelecia prazo de 15 anos. A LPI afirma no artigo 229 que aos pedidos em andamento serão aplicadas as disposições desta Lei. Portanto, o entendimento, considerando-se apenas a LPI é o de que não poderia haver retroatividade neste caso, pois não se trata de pedidos em andamento, mas patentes já concedidas.
Segundo Lucas Rocha Furtado para que possam se beneficiar dos novos prazos de 20 anos seria necessário que as patentes tenham sido ou venham a ser concedidas já sob a vigência da nova legislação[1] “sendo totalmente descabida ampliação dos atuais prazos das patentes ainda existentes ou o ressuscitamento das que já tenham sido extintas por expiração do prazo”.
Gustavo Leonardos tem entendimento contrário e alega que a extensão de prazo não prejudicaria qualquer direito adquirido ou ato jurídico perfeito e, portanto: “todas as patentes em vigor em 15/05/1997 teriam, se isto já não tivesse se dado por força do artigo 33 do TRIPs, seus prazos estendidos por força do artigo 40 da Lei 9.279/96 não havendo qualquer necessidade de se invocar as disposições do Acordo TRIPs para se exigir esta extensão de prazo”.[2]
Considerando a aplicação de TRIPs no Brasil a partir de 01/01/1995, então, para toda a patente em vigor nesta data, caberia a prorrogação por mais cinco anos, pois TRIPs prevê 20 anos de vigência, de modo que, esta patente tem o benefício das disposições de TRIPs, pois trata de “matéria existente, que esteja protegida naquele Membro na citada data “ conforme estabelece o artigo 70.2 de TRIPs. Ou seja, se por um lado a LPI não prevê retroatividade de forma clara, TRIPs aparentemente prevê. Como resolver esta aparente incompatibilidade entre os dois diplomas legais, ambos válidos no Brasil?
A própria OMC tem jurisprudência que prova que TRIPs prevê a extensão da vigência as patentes. Um painel na OMC dos EUA contra o Canadá (WT/DS170/AB/R, 18/09/2000) sobre esse assunto, com base em TRIPs (artigo 33 e 70.2), obrigou o Canadá a estender por cinco anos a vigência das patentes concedidas sob a Lei antiga do país,[3] mas para tanto o Canadá teve de modificar sua lei, o que mostra que a aplicação de TRIPs não é direta.[4] A Lei canadense anterior a 1989 concedia vigência de 17 anos às patentes contados da data de concessão, ao passo que após 1989 a vigência passou a ser de vinte anos da data de depósito. A Lei de 1989, contudo, não previa extensão de vigência para as patentes já concedidas sob a Lei antiga e este foi o alvo do painel na OMC: as patentes canadenses ainda em vigor em 1995 teriam de ser beneficiadas com o novo prazo de vigência de 20 anos previsto em TRIPs.[5]
Denis Barbosa (figura) discorda que o caso do Canadá se aplique ao Brasil. A retroatividade de TRIPs às patentes vigentes antes da entrada em vigor do acordo se fundamenta no artigo 70.2 de TRIPs que afirma que o Acordo gera obrigações com respeito a toda a matéria existente, que esteja protegida no país na citada data. Para Denis Barbosa tais obrigações não inclui o prazo de vigência da patente: “o sistema contencioso da OMC, que declarou que TRIPs aplica-se à matéria pré-existente, só pode ser entendido no sentido de que, no sistema jurídico canadense, o prazo das patentes não integra o ato jurídico perfectado com a concessão”. Como no Brasil o prazo das patentes integra o ato jurídico perfeito, então o entendimento do contencioso do Canadá, de se estender a vigência das patentes não se aplicaria ao Brasil.[6]
No caso da maioria dos países europeus a sua adesão à Convenção Europeia de Patentes (EPC) criada em 1973, fez com que tivessem tempo para ajustar suas legislações internas à vigência de 20 anos (Artigo 63 da EPC), de modo que não necessitaram de qualquer regra de transição quanto à vigência das patentes quando de sua adesão ao TRIPs. Na Coreia, a adoção de TRIPs se tornou efetiva em 1 de julho de 1996, assim algumas patentes coreanas expiraram o prazo legal da lei anterior no primeiro semestre de 1996 indevidamente, uma vez que nesta época o prazo de vigência de 20 anos exigido em TRIPs já deveria estar em vigor. Mas estas patentes expiradas não foram reativadas, pois o Artigo 70.3 de TRIPS não obriga aos Estado Membros a restaurarem patentes já expiradas pela lei anterior. [7]
Denis Barbosa argumenta que TRIPs não se aplica automaticamente, aumentando o prazo das patentes em vigor ou extintas por uma série de razões: 1) porque TRIPs adiou sua aplicação para os países em desenvolvimento para 1/1/2000, 2) porque TRIPs não cria direitos e obrigações para partes privadas mas para os Estados Membros, 3) mesmo se aplicável neste caso, TRIPs tem vigência para o futuro, ele não se aplica a patentes já concedidas, 4) mesmo de aplicável, TRIPs teria sido revogado pela LPI que não determinou a prorrogação das patentes, 5) ainda que TRIPs e LPI determinassem a prorrogação haveria o confronto com o direito adquirido dos concorrentes ao entrar no mercado, ao fim do prazo concedido inicialmente para a patente.[8]
Segundo o princípio do ato jurídico perfeito tudo o que foi decidido na vigência da lei anterior deve ser mantido em benefício da estabilidade social, de forma que apenas os atos em tramitação entram no domínio da lei nova. Nesse sentido Limongi França fala da “impossibilidade (cujas razões são do mais alto imperativo de ordem pública) de se mudar por lei posterior aquilo que a coisa julgada já estabeleceu”, ou seja, a coisa julgada, o ato jurídico perfeito é inatingível pela lei nova.[9] Por sua vez a Lei de Introdução do Código Civil em seu artigo 6° parágrafo 3° estabelece que “chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso”,[10] ou seja, transpondo este princípio para esfera administrativa uma carta patente expedida, já decorridos os prazos recursais (no caso o período de seis meses para entrada de um nulidade administrativa) encerra a instância administrativa, ou seja, o INPI tem a decisão como encerrada na esfera administrativa.
A lei norte americana (35 USC § 154)[11] previa 17 anos de vigência contados da data de concessão da patente, e teve de se ajustar em 8 de outubro de 1995 para a vigência de 20 anos contados da data de depósito prevista por TRIPs (Uruguay Round Agreements Act of 1994 URAA),[12] porém, segundo Denis Barbosa[13] “esta lei, embora estendendo a todos o novo prazo, deixou de fazê-lo no tocante aos concorrentes efetivos do titular da patente prorrogada. Tal lei garantiu o status especial dos concorrentes, cujo interesse jurídico não poderia deixar de ser respeitado”. Desta forma, conforme legislação específica, patentes em vigor em 8 de junho de 1995 ou pedido de patente em andamento tem um prazo de dezessete anos contados da concessão ou vinte anos contados do depósito, o prazo que for maior. [14]
Denis Barbosa discorda que o Acordo contemple a retroatividade e segue raciocínio de Carlos Correa de que o Artigo 70.1 de TRIPs “não gera obrigações relativas a atos ocorridos antes de sua entrada de aplicação para o respectivo Membro” logo, não contempla retroatividade aos atos jurídicos perfeitos como o caso de patentes concedidas antes de TRIPs[15]. No entanto, na reunião do Council for Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights, realizada em 10 de abril de 1996 (documento IP/C/M/6 da OMC) foi discutida tal possibilidade de extensão da vigência de tais patentes em vigor quando da aprovação de TRIPs em 01/01/95, concluindo-se de forma positiva[16].
Esta ampliação do prazo de vigência de patentes não despertou um maior interesse da indústria farmacêutica, principal lobby nos debates sobre Lei de patentes, porque não havia patentes de produtos farmacêuticos pela Lei antiga, cuja lei anterior vetava proteção, e as poucos existentes puderam se aproveitar do mecanismo de pipeline (Artigos 230 e 231 da LPI).
Mesmo titulares de patentes já extintas quando da entrada em vigor de TRIPs, pleitearam a extensão da vigência de suas patentes[17]. O INPI, entretanto, por diversas vezes defendeu a não retroatividade da extensão da vigência das patentes concedidas sob a Lei nº 5.772/71. O parecer PROC DICONS 01/2001 de 15/01/2001 trata da questão da extensão da vigência da patente PI8203942, depositada em 07/07/82, concedida sob a Lei nº 5.772/71, negando provimento ao pedido, concluindo “patente extinta por decurso de prazo não é passível de extensão de prazo, pois não se pode prorrogar o que já perdeu a validade [...] não há como se estender prazo de validade de patente por ter caído em domínio público”. O requerente solicitou a extensão de prazo através de petição protocolada em 12/08/1997, ou seja, uma vez já expirado o prazo original de 15 anos de vigência.
Este entendimento se coaduna com o parecer PROC DICONS 57/99 de 15/10/99 que conclui: “não há como prorrogar o que já perdeu a validade, posto que do contrário, teríamos que, em primeiro lugar ressuscitar o ato e depois prorrogá-lo”. O parecer PROC DICONS 298/05 de 18/09/2003 trata da questão da extensão da vigência da patente PI8204011 e conclui que o pleito não encontra amparo, sendo irrelevante que a parte tenha efetuado recolhimento de anuidades após o fim da vigência legal da patente. O fato do INPI ter aceitado tais pagamentos e não tenha efetuado qualquer reembolso não significa que a extensão tenha sido tacitamente aceita ou que exista qualquer “direito adquirido” e conclui: “é destituído de fundamento, pois, qualquer maior questionamento a respeito, em sede administrativa, restando à interessada, se julgar conveniente, valer-se da esfera judicial, para apresentar seus infundados argumentos”.
O parecer PROC DICONS 92/02 de 11/06/2002 trata caso similar e conclui no mesmo sentido negando a extensão de prazo e recomendando ao INPI que devolva as anuidades pagas indevidamente “por caracterizar locupletamento ilícito, é de ser devolvida anuidade recolhida indevidamente, após a extinção da patente, por decurso de prazo, portanto, já em domínio público”.
O parecer DIRPA de 04/08/99 da então Diretora de Patentes do INPI Maria Margarida Mittelbach, com base no parecer MICT/CONJUR n°24/97 publicado no D.O de 28/11/97, exarado no âmbito da Consultoria Jurídica do MICT reafirma: “tal entendimento, aliás, só vem a realçar, a conclusão, inafastável, da impossibilidade de fazer retroagir a Lei nova para estender a validade de patente já concedida anteriormente, a nova disposição quanto ao prazo de vigência, eis que se estaria a afetar dois daqueles princípios que, expressamente, como visto, excluem a incidência da Lei nova: o do ato jurídico perfeito, no caso a concessão da patente de acordo com a legislação então vigente, e o do respeito ao direito adquirido, no caso o daquele titular subjetivo do direito, a quem seria este oponível, investido no direito de uma vez expirado o prazo de proteção legal, que se sabia certo, por definido no tempo, se utilizar livremente do conhecimento. A concessão de uma patente constitui outorga de um título temporário visando o equilíbrio entre o titular temporário do conhecimento e o titular, a posteriori, do uso livre daquele mesmo conhecimento, razão de ser do instituto das patentes”.
Um outro ponto de discórdia sobre este assunto diz respeito a data de aplicação de TRIPs, pois de fundamental importância será determinar afinal a partir de que data TRIPs entrou em vigor no país. A jurisprudência do STF[18] mostra que o sistema constitucional brasileiro não consagra o princípio de efeito direto e nem o postulado da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais. Neste sentido, TRIPs foi internalizado em lei interna no Brasil pelo Decreto Lei 1.355 de 30/12/1994, no entanto, resta a dúvida de se saber se o Brasil utilizou ou não do prazo de transição de cinco anos previsto em TRIPs, o que gera a dúvida se TRIPs é aplicado a partir de 01/01/1995 (defendido por aqueles que pleiteiam a extensão da vigência de patentes) ou 01/01/2000 (daqueles contrários a tal extensão e conforme defende o INPI). A determinação da data de aplicação de TRIPs é igualmente essencial para se estabelecer o momento em que as proibições da Lei nº 5.772/71 aos produtos farmacêuticos deixaram de ser aplicáveis.[19]
O parecer DIRPA 01/97 conclui em relação as solicitações para aplicação das disposições constantes no artigo 70.2 de TRIPs que “qualquer solicitação neste sentido até 31/12/1999 é extemporânea, não devendo ser acatada, após o que, se fixada a interpretação quanto à extensão do termo de vigência, será a mesma cabível”, ou seja, segundo este entendimento do INPI, TRIPs aplica-se apenas a partir de 01/01/2000. No entendimento do INPI (parecer DIRPA 01/1997), como o Brasil é um país em desenvolvimento (artigo 65.1 TRIPs), só estaria obrigado a aplicar tais disposições transitórias a partir de 01/01/2000 (parecer DIRPA 02/1999 de 28/05/99). Segundo a ABPI a data de vigência plena de TRIPs no Brasil seria 01/01/1995. A Procuradoria do INPI, no entanto, sempre defendeu a tese de que a obrigação da aplicação do Acordo no país se daria apenas em 01/01/2000, conforme parecer DIRPA n.01/97 e parecer[20] MICT/CONJUR n.24/97, pois o Brasil, por ser um país em desenvolvimento, teria um prazo de cinco anos para se adequar às novas normas, sendo tal disposição transitória automática sua aplicação, só perdido caso houvesse uma renúncia formal a este direito, o que não ocorreu no caso do Brasil.
O Itamarati formalizou de forma discreta[21] que faria uso do prazo de cinco anos,[22] como observado pelo presidente da Reunião do Council for Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights de 17 de novembro de 1997. O Chile em comunicado feito a OMC de 23 de janeiro de 1996 (IP/C/W/19) notificou à OMC sua intenção em fazer uso dos cinco anos de atraso para aplicação de TRIPs. Tal notificação foi discutida na reunião seguinte da OMC (IP/C/M/6), em 10 de abril de 1996 em que EUA e Comunidade Europeia afirmaram que não havia qualquer necessidade dos países em desenvolvimento[23] em formalizar sua intenção em fazer uso de tal período de transição do artigo 65.2, embora tais iniciativas fossem úteis para maior transparência.
Três decisões do STJ[24]-[25]-[26] mostraram-se favoráveis à aplicação de TRIPs a partir de 01/01/1995: “O que sustenta o período de transição é a vontade do país-membro, não sendo, portanto, obrigatório postergar a data de aplicação do disposto no Acordo TRIPs. Esta Corte já se pronunciou nessa direção assentando que se o Brasil não manifestou, “em momento oportuno, qualquer opção em postergar a vigência do TRIPs no plano do direito interno, entende-se haver renunciado à faculdade oferecida pelo art. 65 daquele acordo””. Em decisão de fevereiro de 2008 o STJ, tendo como relatora a Min. Nancy Andrighi faz referência aos três recursos citados Resp. 661.536/RJ, 667.025/RJ e 423.240/RJ e conclui que estas decisões configuram “jurisprudência pacífica deste Tribunal”. Denis Barbosa contesta que a questão esteja pacificada, uma vez que no TRF2, onde há Varas especializadas de propriedade industrial, a questão foi decidida majoritariamente no sentido inverso do citado pela Min. Nancy Andrighi e conclui: “O que, no plano das duas únicas turmas federais especializadas em PI do país, está quase que pacificado, é o entendimento diverso ao recentemente expresso. O elemento a se considerar, numa avaliação desses dados, é a especialização dos julgados no TRF2, e o número de casos sob intensa discussão. Há 12 vezes mais decisões no TRF2 do que no STJ, e, naquele, a matéria tem o benefício da reflexão constante e fogosa”.[27]
Em decisão do TRF2 de 2002: “carece de fundamento o pedido de ampliação do prazo de vigência de patente, deferida com validade de quinze anos, para estendê-la por mais cinco anos, sob o argumento que a lei atual confere privilégios maiores, com duração de vinte anos. Nada existe no Acordo ADPICS, vulgarmente conhecido como TRIPs, que autorize a ampliação. Pedido que abala as expectativas empresariais legítimas, de explorar invento ou modelo que cairá em domínio público. Impossível ampliar a exclusividade, que apenas pode ser concedida com base em lei. O artigo 70.2 do TRIPs não tem o alcance que se lhe quer conferir”[28]. Segundo o Desembargador André Fontes: “Aliás, ampliar o prazo de proteção de fato, por iniciativas judiciais, constitui um dos mais típicos exemplos de uso abusivo de uma patente”.[29] Em setembro de 2007 o TRF2 unificou a jurisprudência das duas Turmas especializadas em propriedade intelectual e decidiu que não pode ser dada a extensão das patentes de 15 para 20 anos daquelas concedidas sob o regime da lei anterior ao Acordo TRIPs. A decisão da Seção que reúne as duas Turmas do TRF2 é vinculante e vem exatamente no momento em que o STJ começa a tomar decisões justamente em sentido contrário. Segundo o STJ em decisão de 2007 “não tendo o Brasil optado pela reserva a que tinha direito nos termos do Acordo, o TRIPs está em plena vigência desde 1o de janeiro de 1995, e não a partir de 1o de janeiro de 2000, como entenderam as instâncias ordinárias”[30].
A DuPont, titular da patente PI8303322 de um produto agroquímico utilizado para combater pragas nas lavouras de soja e milho entrou na Justiça em 1998 (findo o prazo de 15 anos de sua patente) contra o INPI para prorrogar o direito até 2003. A empresa perdeu nas primeiras instâncias, mas, em fevereiro de 2008, obteve uma decisão favorável da ministra Nancy Andrighi no STJ. O INPI e a Nortox, que comercializa o produto, entraram com um agravo regimental que fez a ministra reconsiderar a decisão e encaminhar o recurso para novo julgamento. Dos cinco recursos até então existentes que citaram o Acordo TRIPs, no âmbito do STJ, três deles analisaram o mérito da extensão das patentes concedidas sob a vigência da Lei nº 5.772/71. O primeiro é o Resp n° 423.240/RJ, da 4° Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 15/03/2004, onde estabelecido que seria possível a prorrogação das patentes então pendentes por mais cinco anos. Na 3° Turma, há dois precedentes: o Resp n° 661.536/RJ, Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 30/05/2005 e o Resp n°667.025/RJ, de relatoria do Min. Castro Filho, DJ de 12/02/2007, com a mesma conclusão.
Reconsiderando a questão em maio de 2008, a ministra Nancy Andrighi no STJ a ministra conclui pela não aplicabilidade imediata de TRIPs tendo em vista que todas estas decisões da Corte tomaram como premissa que TRIPs passou a produzir efeitos no Brasil no momento de sua recepção pelo Estado brasileiro, ou seja, 01/01/1995, o que “está longe de ser pacífico”. A ministra Nancy Andrighi reconheceu que, no voto-vista proferido no Resp nº 661.536/RJ, chegou a comungar do entendimento que o Brasil renunciara aos períodos de transição previsto em TRIPs; porém, melhor examinando a questão, modificou sua opinião, pois a transcrição da sessão do Senado Federal de 13/12/1994, em que se discutiu a aprovação do citado Decreto Legislativo 1355/94 revela a intenção de utilização dos períodos de carência no que diz respeito a setores tecnológicos que não recebem proteção patentária na data geral de aplicação do Acordo. A Ministra conclui: “Aquele que tem um direito reconhecido em seu favor não precisa se manifestar de forma expressa no sentido de que deseja dele fazer uso”.
Ademais uma cópia de ofício assinado pela própria OMC, em resposta a provocação da Missão Permanente do Brasil datada de 10/11/1997, manifestou a posição da OMC, por via do seu Conselho para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relativos ao Comércio, que no tocante ao art. 65.2, “o supracitado período de transição foi automaticamente concedido a todos os países em desenvolvimento membros do WTO, independentemente de qualquer comunicação formal nesse sentido”[31].
Em março de 2009 um nova decisão do STJ sobre a questão, em julgamento do Recurso Especial 960.728, interposto pela E.I. Du Pont, confirmou entendimento desfavorável a extensão por mais cinco anos da patente da empresa Du Pont do herbicida Clorimuron, de largo emprego em lavouras de soja e milho. Neste parecer o Ministro Revisor Pargendler votou acompanhando a Relatora, ministra Nancy Andrighi, que considerou que, apesar de o tratado TRIPs ter data para seu início em janeiro de 1995, efetivamente seus efeitos só começariam em janeiro de 2000. Para o Ministro Revisor, uma vez concedida, a patente gera ato jurídico perfeito, não podendo ser alterado.
O STJ apontou que a Lei nº 9.279/96 veio ajustar a legislação nacional aos termos do acordo, pois o objetivo deste, na esteira das negociações para criação da OMC, era o de provocar a uniformização da legislação sobre patentes em todo o mundo, cabendo a cada país signatário a adaptação de sua legislação interna. Assim, o TRIPs não teria como superar a legislação então vigente no país para alterar relações jurídicas já constituídas, sendo, portanto, impossível estender o prazo de patentes concedidas antes da vigência da Lei nº 9.279/96. A decisão da 3a Turma do STJ, assim, consolida uma mudança de entendimento do Tribunal, a qual por sua vez fica em consonância com a jurisprudência do TRF2 quanto à questão[32].
O STJ em abril de 2010 decidiu que as patentes com duração de 20 anos só valem para quem obteve o direito após o ano 2000. A decisão foi baseada no processo da empresa Du Pont, que solicitou ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região a prorrogação de cinco anos de uma patente concedida antes de 2000. Segundo o relator do processo, ministro João Otávio de Noronha, a extensão dos prazos das patentes concedidas antes de 2000 não pode ser aceita porque abala as expectativas empresariais. O STJ entendeu que a prorrogação do prazo de validade viola a Lei das Patentes e TRIPs.[33] Em maio de 2010 a Terceira Turma do STJ anunciou nova reviravolta no caso, deu provimento ao recurso da DuPont cassando assim a decisão do TJ-SP que tinha julgado extinto o processo movido pela empresa contra a Nortox.[34] Em agosto de 2010 o agravante Nortox formulou pedido de desistência do presente recurso.
Para Denis Barbosa “Ao conceder, sob o CPI/71 uma patente por quinze anos, a União ao mesmo tempo constituiu um direito a tal prazo no patrimônio do dono da patente e garantiu à sociedade em geral e aos competidores do dono da patente, que em quinze anos, a tecnologia estaria em domínio público. Os competidores das titulares de patente tinham um direito adquirido a exercer sua liberdade de iniciativa, em face da patente, ao fim dos quinze anos de seu prazo. Se a lei aumentasse o prazo da patente estaria invadindo o patrimônio do competidor, agredindo uma situação jurídica constituída que tinha de vir a investir livremente no mercado”[35], ou seja, Denis Barbosa é contra a extensão da vigência das patentes face a impossibilidade constitucional de se retirar algo que já estava no domínio público.
[1] FURTADO, Lucas Rocha, Sistema de Propriedade Industrial no Direito brasileiro, Brasília: Ed. Brasília Jurídica, 1996. p. 52.
[2] apud BARBOSA, Denis. Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 113.
[3] http: //www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds170_e.htm.
[4] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 229.
[5] BARBOSA, Denis. op. cit., p. 241.
[6] BARBOSA.op. cit.p. 61.
[7] GRUBB, Philip, W. Patents for Chemicals, Pharmaceuticals, and Biotechnology: Fundamentals of Global Law, Practice, and Strategy; Oxford University Press, 2004, p.42, 156
[8] BARBOSA, Denis. Propriedade Intelectual: a aplicação do Acordo TRIPs. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 110.
[9] CABRAL, Plínio. Direito Autoral: dúvidas & controvérsias. São Paulo: Harbra, 2000, p. 22.
[10] CABRAL.op. cit.p. 21.
[11] http://www.law.cornell.edu/uscode/text/35/154
[12] GRUBB, Philip W.; THOMSEN, Peter. R. Patents for chemicals, pharmaceuticals, and biotechnology: fundamentals of global law, practice, and strategy. Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 7.
[13] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 477, BARBOSA, Denis. Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 119.
[14] BOUCHOUX, Deborah. Intellectual Property for Paralegals: the Law of trademark, copyrights, patents and trade secrets. Canada: Thomson, West Law Studies, 2005. p. 343. “The term of a patent that is in force on or that results from an application filed before the date that is 6 months after the date of the enactment of the Uruguay Round Agreements Act shall be the greater of the 20-year term as provided in subsection (a), or 17 years from grant, subject to any terminal disclaimers” 35 USC 154 c(1) http://www.uspto.gov/web/offices/pac/mpep/documents/appxl_35_U_S_C_154.htm.
[15] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 239, BARBOSA, Denis. Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 59.
[16] If a patent had been granted before the application of TRIPs implementing legislation under a law that provided for a patent term of ten years, and that patent would still be under protection at the time that TRIPs obligations became effective, the patent should, under Article 70.2, benefit from the patent term stipulated in Article 33 of the TRIPs Agreement, i.e. 20 years from the filing date of the patent application on which the patent in question had been granted. Council for Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights – Minutes of Meeting – Held in the Centre William Rappard on 22 February 1996 http: //www.wtocenter.org.tw/SmartKMS/do/www/readDoc?document_id=12296.
[17] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 232.
[18] Ag.Reg em carta Rogatória AGRCR 8279/AT Relator: Min. Celso de Mello DJ 10/08/2000, p. 6, Ement. Vol.1999-1, p. 42, Julgamento: 17/06/1998, Tribunal Pleno, apud BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 173.
[19] DANNEMANN, SIEMSEN, BIGLER & IPANEMA MOREIRA, Comentários à Lei de Propriedade Industrial e correlatos, 2001, Rio de Janeiro: Renovar, p. 64.
[20] Diário Oficial da União, 28/11/1997, Seção I, N.231, Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo, p. 28076 apud BARBOSA, Denis. BARBOSA, Denis. Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.p. 31.
[21] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 230.
[22] The Chairperson said that Brazil had submitted a communication stating that it was exercising its right under Article 65.2 of the Agreement to delay the application of the provisions of the TRIPs Agreement other than Articles 3, 4 and 5 (IP/C/11). Council for Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights MINUTES OF MEETING Held in the Centre William Rappard from 17 to 21 November 1997 Chairperson: Ambassador Carmen Luz Guarda (Chile). http: // www.wtocenter.org.tw/SmartKMS/fileviewer?id=13002.
[23] there was no requirement in the TRIPs Agreement on developing country Members to provide any formal notification of their invocation of the transitional period for which they were eligible under Article 65.2. Council for Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights – Minutes of Meeting – Held in the Centre William Rappard on 22 February 1996. http: //www.wtocenter.org.tw/SmartKMS/do/www/readDoc?document_id=12296.
[24] STJ RESP 200400681555 TERCEIRA TURMA Data da decisão: 07/04/2005 Relator(a) CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO.
[25] STJ - REsp 2002/0032733-9 Relator(a) Ministro FERNANDO GONÇALVES QUARTA TURMA Data do Julgamento 02/03/2004
[26]STJ - REsp 2004/0086618-6 Relator(a) Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 14/12/2006
[27] Yajhoo Groups mensagem de 29/02/2008.
[28] 2a Turma do TRF2, Apelação em Mandado de Segurança n.24516, processo n.9902027032/RJ decisão de 13/03/2002 documento TRF200084185 relator Guilherme Couto. apud BARBOSA.op. cit. p. 97.
[29] FONTES, André. Patente, Invenção e Inovação. Revista da EMARF, Especial de Propriedade Intelectual, Rio de Janeiro, p.273, mar. 2011
[30] GOULART, Josete. Decisão do TRF veda a extensão de patentes, Valor Econômico, 10/09/2007.
[31] STJ Recurso Especial Nº 960.728 – RJ (2007/0134388-8) Rel: Min. NANCY ANDRIGHI, Recorrente: E I DU PONT DE NEMOURS
[32] Du Pont não consegue estender validade de patente. mar.2009
http: //www.olhardireto.com.br/noticias/exibir.asp?noticia=Du_Pont_nao_consegue_estender_validade_de_patente&id=2557
[33] STJ ratifica: prazo de 20 anos só vale para patentes registradas depois de 2000
https://jornaldebrasilia.com.br/noticias/brasil/stj-ratifica-prazo-de-20-anos-so-vale-para-patentes-registradas-antes-de-2000/
[34] Briga entre DuPont e Nortox volta ao TJ-SP https://www.abras.com.br/clipping/geral/13348/briga-entre-dupont-e-nortox-volta-ao-tj-sp
[35] apud BARBOSA, Denis. As bases constitucionais do sistema de proteção das criações industriais, in. SANTOS, Manoel Joaquim Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. Criações Industriais, Segredos de Negócio e Concorrência Desleal. São Paulo: Saraiva, 2007, série GVLaw, p. 88 apud BARBOSA, Denis. Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 99.
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