quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

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sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

A crítica francesa ao exame de patentes

O exame na França do século XVIII era realizado pelo Bureau Du Commerce que requisitava auxílio da Academia de Ciências para análise das questões técnicas. [1]. Mario Biagioli destaca que a patente aprovada pela Academia de Ciências francesa gozava de certa respeitabilidade e era importante elemento de propaganda para as invenções do que propriamente a eficácia do título como proteção à propriedade intelectual. [2]Os artesãos inventores julgavam que deveriam ser julgados por seus pares e não por cientistas. Em 1783 um modelo de barco a vapor inventado por Jouffroy d’Abbans em 1783, apesar de bem sucedido, teve sua patente negada pela Academia de Ciências. [3]Os cientistas por sua vez queixavam-se da grande quantidade de invenções inúteis e quiméricas, a ponto de Laplace em 1789 propor um teste de álgebra aos depositantes de patentes como critério para o depósito. Em 1790 o deputado Stanislas de Boufflers apresentou à Assembleia Nacional um projeto em defesa da lei de patentes, criticando contudo o exame da invenção [4]:quantos embaraços, quantos obstáculos, quantas mágoas, quantos desgostos estiveram sempre reservados àqueles que ousavam apresentar-se à nossa administração como inventores de descobertas úteis ao gênero humano ! [...] O infeliz cliente [...] mal tem coragem para lhe apresentar a sua petição, objeto de tantas esperanças e fruto de tantas vigílias; recebem-no com um ar de impaciência, olham-no com um ar distraído, tratam-no com desdém”.[5] Renouard também destaca que se por um lado o exame evitaria a concessão de patentes frívolas e poupar os inventores de decepções, por outro lado, submete a destino da patente a erros, incertezas e subjetividades por parte da administração e ademais “expõe os inventores a um indeferimento desmerecido e que irá lhes arruinar suas justas esperanças, ele [o exame] converte um direito que é do inventor em uma solicitação de favores administrativos”.[6] Muitas patentes eram concedidas com base nas relações do inventor com a Corte como a patente de um cosmético concedida a Chevalier de Gruyère em 1781. Nas “jornadas de agosto” de 1789 foram abolidos monopólios de toda a sorte como contrário ao princípio de igualdade natural. Em setembro de 1789 foi aprovado pela Assembleia a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão[7].
 
Em 16 de outubro de 1791 um júri técnico composto por 30 artesãos e cientistas, o Bureau de consultation des arts et métiers substitui a Academia no exame das patentes [8]. Com a legislação de 1791 o exame prévio foi eliminado. Em relatório dirigido à Assembleia Nacional em 1792 a Societé du Point Central des Arts et Métiers acusou os “sábios pensionistas” da Academia de Ciências de ceder ao favoristismo e inveja ao emitir seus relatórios.[9] Em 1797 este comitê é substituído pelo Conservatoire des Arts et Métiers estabelecido na abadia de Saint Martin.[10] O escritório de patentes frances com o propósito de registro apenas seria criado apenas em 1901.[11] Na Bélgica Edmond Picard aponta a separação dos poderes Judiciário e Executivo como argumento para não se realizar exame de fundo nas patentes: "as contestações que tenham como objeto dos direitos civis são matéria exclusiva dos tribunais. Como as patentes são uma matéria de direito civil, elas não podem depender, para sua concessão, do poder executivo." Cabe contudo ao governo examinar a forma do pedido de patente assim como sua licitude, nos casos em que a matéria pleiteada atenta contra à ordem pública, à moral e às leis[12] Christine MacLeod aponta que na França predominou o entendimento de um direito natural à propriedade intelectual ao passo que na Inglaterra o common Law militou contra este entendimento.[13] A ausência de exame em 1791 fez com que as patentes francesas fossem acompanhadas da menção a “sans garantie du governement” S.G.D.G.[14] Na primeira metade do século XIX somente Bélgica, Holanda, Prússia Sardenha mantinham a prática do exame de patentes, os demais países seguiam o modelo francês.[15] Jean Pierre Stenger afirma que a declaração S.G.D.G é mais nefasta do que útil uma vez que como a indicação não permite identificar o número da patente, não se sabe se o porduto marcado está de fato portegido ou se a marcação se refere a um detalhes insignificante do porduto, ou mesmo, se patente é nula por falta de novaide uma vez que não há exame. Na prática ainda que o pordduto tenha sido marcado com S.G.D.G isto será ignorado pelos concorrentes que lançarão seus produtos sem saber afinal qual o objeto de fato está protegido pela patente.[16] Henri Allart destaca que autores como Bédarride, Renouard, Nouguier e Pouillet manifestaram-se favoravelmente a ausência de exame. No Congresso de 1878 em Paris foi discutida a questão do exame com oposição da delegação francesa. [17]

 
Academia de Ciências Francesa (1666) encarregada do exame de patentes [18]


[1] GUELLEC, Dominique; POTTERIE, Bruno van Pottelsberghe de la. The economics of the european patent system. Great Britain:Oxford University Press, 2007, p.36
[2] BIAGIOLI, Mario. From print to patents: living on instruments in early modern Europe. Hist. Sci., xliv, 2006, p. 144 http://innovation.ucdavis.edu/people/publications/Biagioli%202006%20From%20Print%20to%20Patents.pdf
[3] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 213
[4] PRAGER, Frank. History of Intellectual property from 1545 to 1787. Journal of the Patent Office Society, v.26, n.11, nov. 1944, p. 711-760 http: //www.compilerpress.ca/Library/Prager%20History%20of%20IP%201545-1787%20JPOS%201944.htm. Stanislas de Boufflers : Rapport à l'Assemblée Nationale de Mr de Boufflers sur la propriété des auteurs de découvertes et d'inventions en tout genre d'industrie - 30 décembre 1790 http://www.mshparisnord.fr/controverses-PI-XIX/notices/not_de_boufflers_1790.html
[5] CARVALHO.op. cit.p. 295; BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 35
[6] POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la Contrefaçon. Marchal et Bilard:Paris, 1899, p.153
[7] BURNS, Edward McNall. História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo, v.2, 1979, p.608
[8] GILLISPIE, Charles. The encyclopédie and the jacobin philosophy of science: a study in ideas and consequences In: CLAGETT. Marshall.Critical problems in the history of science. Madison: Univ Wisconsin Press, 1959, p. 273; CROSLAND, Maurice Science under control: the renchacademy of Sciences 1795-1914, Cambridge Univerty Press, 2002, p.82
[9] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 296
[10] KHAN, Zorina; SOKOLOFF, Kenneth. Historical prspectives on patent systems in economic development. In: NETANEL, Neil Weinstock. The development agenda: global intellectual property and developing countries. Oxford University Press, 2009,p.223
[11] VOJÁCEK, Jan. A survey of the principal national patent systems. New York:Prentice Hall, 1936, p.138
[12] PICARD, Edmond; OLIN, Xavier, Traité des brevets d'invention et de la contrefaçon industrielle, précédé d'une théorie sur les inventions industrielles, 1869, p. 321, 323
[13] MacLEOD, Christine. Inventing the industrial revolution: the english patent system, 1660-1800, Cambridge:Cambridge University Press, 1988 p.199
[14] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.96; POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la Contrefaçon. Marchal et Bilard:Paris, 1899, p.152; NOUGUIER, Louis. Des brevets d'invention et de la contrefaçon. Paris:Librairie de la Cour de Cassation, 1856, p.265; ALLART, Henri. Traité théorique et pratique des brevets d'invention. 1911, Paris:Arthur Rousseau, p.3
[15] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 35
[16] STENGER, Jean Pierre. La contrefaçon de brevet en droit français et en droit américain. Collection Hermes, Ed. Cujas: Paris, 1965, p.255
[17] ALLART, Henri. Traité théorique et pratique des brevets d'invention. 1911, Paris:Arthur Rousseau, p.115

Backlog e desistência

Um levantamento dos pedidos que efetivamente recebem o primeiro exame no INPI mostra que nos anos 1980 esse número era de 70% e em hoje em dia está em torno de 40%, ou seja, um grande número de depósitos desistem diante do atraso no exame. No período de 1976 a 1978 o INPI adotou “exames técnicos sucintos” para reduzir o atraso no exame. Com a mudança de administração em 1979 esta nova sistemática foi provisoriamente abandonada, sendo retomada a partir de 1980, atendendo agora pela denominação de “exame sumário”. Os pedidos depositados em 1981 no gráfico foram examinados aproximadamente 5 anos mais tarde ou seja em 1986. Nesta época o INPI já não tinha exames sumários, no entanto, seu estoque havia reduzido consideravelmente por conta desta política. Observa-se que a média de 70% se manteve de 1981 a 1985, o que sugere que este valor seja um valor razoável, aceitável para desistências, ou seja, por ocorrerem em grande parte por questões mercadológicas do que propriamente por uma ineficiência do INPI no exame, uma vez que nessa época o tempo de concessão médio de uma patente era de 5 anos medidos entre o intervalo entre depósito e concessão.
 

Essa hipótese de que o maior atraso do INPI tem relação direta com as desistências se confirma quando vemos o gráfico seguinte. Podemos dividir o gráfico abaixo em três segmentos: o primeiro entre 1981 a 1991 quando o tempo de exame aumenta gradativamente. Nesse primeiro intervalo nota-se que o percentual de pedidos com primeiro exame diminui na mesma proporção, o que mostra que quanto mais aumenta o atraso mais o depositante reage aumentando as desistências. Em uma segunda etapa de 1991 a 1993 o tempo de exame se estabiliza em 7 anos (devido a contratação de servidores terceirizados que faziam um exame acelerado baseado no exame PCT o que permitia ganhos significativos de produtividade). Neste segundo momento o percentual de pedidos como primeiro exame começa a se recompor para o patamar de 70%, ou seja, bastou o INPI acelerar sua produtividade para o depositante reagir mantendo seus pedidos na esperança de tê-los examinados. O padrão anterior se repete após 1994. Nesta terceira etapa, quando o tempo de exame volta a aumentar (as metas de produção são inclusive rebaixadas no período e a produtividade reduz) novamente o que se observa é que o percentual de pedidos que tem primeiro exame volta a cair, chegando a 40%, ou seja, de cada dez pedidos depositados em 2003 apenas 4 chegaram a ser examinados, os outros 6 foram arquivados por desistência do depositante. Os pedidos de 2004 não foram mostrados nos gráficos, porque ainda restam pedidos desta data para serem examinados. Dos pedidos de 2003 e anteriores, mais de 90% já foi decidido, de modo que os dados mostrados não devem variar muito quando este estoque tiver sido completamente zerado.
 
 

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Método terapêutico na EPO


Em T2420/13 OJ 2016 o pedido tinha por objeto a utilização de um vidro progressivo particularmente empregado para corrigir defeitos de visão por um portador de óculos. A EPO inicialmente rejeitou o pedido por ser um método terapêutico (artigo 53c da EPC) em analogia à decisão T24/91 que trata de um método de ajuste do perfil da curvatura de uma lente sintética ligada à córnea por ablação à laser de parte da lente. A Câmara de Recursos não concordou que o pedido tratasse de método terapêutico. O método tem como objetivo atuar sobre a convergência ou divergência dos raios luminosos de modo a compensar os problemas de visão do usuário. Os sintomas do usuário são desta forma minimizados, mas isto não significa que o método se enquadre como de tratamento do corpo humano. Um tal método supõe um efeito terapêutico que seja causado devido a uma ação sobre partes do corpo tratado e, no caso, a ação é sobre os raios luminosos sem que o corpo do usuário sofra qualuer tipo de tratamento. Em T24/91, por sua vez, o método atuava no sentido de mudar as características de refringência do olho humano, ou seja, o corpo de fato estava sendo tratado. A Câmara rejeitou qualquer analogia entre o óptico especialista em lentes e um médico uma vez que suas atividades são totalmente distintas. A Câmara de Recurso, contudo, destacou que o fabricante de lentes que execute o método patenteado de modo privado, sem fins lucrativos, não será incomodado com esta patente.[1]
 

sábado, 17 de dezembro de 2016

STF e as patentes


Decisão do STF de 20 de abril 1932 tendo como relator E. Lins analisou a novidade da patente referente a um produto para combater a transpiração excessiva. Um produto similar estava disponível nos Estados Unidos denominado Odorono. Para a Corte a mera diferença de dosagem de uma mesma matéria prima não justifica a novidade da patente e conclui: “considerando que, como parece aos peritos, os dois preparados são uma contrafação um do outro, por ser a mesma a matéria prima empregada na composição de ambos – cloreto de alumínio com pequena diferença na dosagem, devido ao modo de preparação, proposital para disfarçar o fabrico um do outro ou acidental pelo estado de impureza das matérias primas utilizadas na preparação [..] faltava ao ser privilegiado, o requisito essencial da novidade”.

Segundo[1] o STF “as diferenças acidentais de forma não devem ser levadas em consideração para se considerar o novo modelo, nem excluem a contrafação”. Em outra decisão do STF[2]para ocorrer o crime de contrafação de patentes da invenção não é necessário que haja absoluta identidade entre os dois produtos. Basta que a semelhança seja tal que torne possível o engano [...] A diferença é nos detalhes, mas isso, evidentemente, não será bastante para se concluir pela inexistência da violação”.

O STF[3] em decisão de 1966 sobre a nulidade da patente n.45718 referente a um processo de preparação de um produto empregado em composições para acabamento de artefato ou outros artigos de metais ferrosos e não ferrosos, suas ligas e as composições assim obtidas, o juiz Evandor Lins e Silva reproduz o lacônico parecer de deferimento do DNPI: “O pedido está, a meu ver, bem definido e delimitado em suas reivindicações. Como não tenha encontrado qualquer anterioridade que possa afetar a sua novidade, opino pelo deferimento do presente pedido[4] concorda com o parecer do Ministro Oscar Saraiva de que o parecer é “um mero nada consta, não tendo afirmado positivamente que havia novidade no processo para o qual era pedida a patente. Na verdade, o perito afirmou, apenas, que nada conhecia em matéria de anterioridade. Assim, a patente, ao ser expedida, apoiou-se apenas numa ficção legal de um ato formal, e não na seriedade de um exame técnnico fundado [...] No caso, não houve exame técnico feito pelo próprio DNPI, que se limitou a um suscinto e inconveniente parecer, que não se fundou em quaisquer elementos, por ocasião da patente”. [5]

Decisão[6] de 1967 do STF mostra que a falta de novidade pode fundamentar a nulidade da patente: “Patente de invenção não pode ser concedida sem o requisito da novidade do invento. Nulidade da patente porque, ao tempo do registro, já era do domínio público ou comum, e, portanto, insuscetível de constituir privilégio”.

Sob o CPI 5772/71 que proibia a patenteabilidade dos produtos farmacêuticos o STF concluiu pela constitucionalidade das restrições patenteáveis[7]. Para o Ministro Cunha Peixoto: “a Lei que define os requisitos para a concessão do privilégio” poderá ou não “estabelecer a privilegiabilidade ou não do produto e a duração da concessão, e sendo a Lei de ordem pública, pode alargar ou diminuir, até a concessão do privilégio, as listas de produtos suscetíveis de patenteação. A matéria é de interesse público”. Segundo ementa do STF o legislador ordinário pode definir o que não é patenteável, seguindo critérios técnicos[8].

O STF decidiu pela constitucionalidade do artigo 125 do CPI 5772/71 que impôs aos titulares de patentes no INPI, domiciliados no exterior a obrigação de constituir procurador[9]. Esta condição está prevista no Artigo 2(3) da CUP: “Ressalvam-se expressamente as disposições da legislação de cada um dos países da União relativas ao processo judicial e administrativo e à competência, bem como à escolha de Domicílio ou à designação de mandatário, eventualmente exigidas pelas leis de propriedade industrial.”

Segundo o STF[10] citando Pontes de Miranda: “No sistema jurídico brasileiro o direito preexiste à patente, sem ser ainda, direito real: a realidade só lhe surge à patenteação” .

Segundo decisão[11] do STF de 1987 “o depósito de pedido de patente feito à luz de legislação permissiva não gera direito adquirido à obtenção da patente, se a legislação superveniente à época de sua concessão for proibitiva, pois a regra que deve ser imposta é a Lei vigente (subsequente) podendo ela, por ser de ordem pública, modificar, aumentar ou diminuir a relação dos inventos suscetíveis de patenteação até o momento de sua concessão”.

O STF em Ind. Térmica Brasileira S/A Termolar v. Ind. Com. Sobral Ltda[12] analisou a novidade da patente MU5305749 referente a uma construção para recipientes térmicos. A titular alegou como suposta prova da novidade de seu modelo de utilidade que havia depositado junto ao INPI, antes do depósito do modelo de utilidade, ainda em sua fase de sigilo, um depósito de patente de invenção para semelhante tampa. O juiz conclui: “O fato de que a paternidade inventiva de semelhante tampa é de titularidade exclusiva da Ré, conforme clareado no final do memorial descritivo da patente anulanda (MU5305749), isto só não é bastante e suficiente para ensejar ao modelo de utilidade objeto desta causa o requisito de novidade. Ao contrário, se anteriormente ao depósito do modelo de utilidade aqui discutido, foi depositado a patente de invenção de semelhante tampa, isto só é suficiente para descaracterizar a novidade que se quer afirmar existente, no caso, não importando, evidentemente, se o depósito anterior é da própria autora, que acabou titular da patente requerida”.

 



[1] AG 19621, relator: Ministro Lafayette de Andrada J.1958.06.10 Segunda Turma, ementário do STF vol 8.01 p.25 RTJ vol. 6.01 p.01 apud Uma introdução à Propriedade Intelectual, Denis Barbosa, Rio de Janeiro:Lumen Juris, p. 481 apud Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial, Denis Barbosa. Rio de Janeiro:Ed. Lumen Juris, 2006, p.136
[2] STF Recurso Extraordinário n.22017 de 28/05/1953 João Ramos Machado e outro e In. Brasileiras de Materiais Plásticos AS, relator Ministro Mário Guimarães. apud Patentes de invenção: extensão da proteção e hipóteses de violação, Fernando Eid Philipp, São Paulo:Ed. Juarez de Oliveira, 2006, p.155
[3] Recurso Extarodinário n.58535 Primeira Turma São Paulo, Recorrentes: Abrasivos e Polidores Seracchi S/A e outros, Recorrido: Gioiffe Borelli, Data: 31/12/1966, Publicação: DJ 12-04-1967 Presidente: Cândido Motta Filho, Relator: Evandro Lins e Silva http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/670221/recurso-extraordinario-re-58535-sp-stf
[4] BARBOSA, Denis Borges; KUNTZ, Karin Grau; BARBOSA, Ana Beatriz Nunes. A propriedade intelectual na construção dos tribunais constitucionais. Rio de Janeiro: Lumen, 2009, p. 116
[5] BARBOSA, Denis. Nulidade de modelos de utilidade: peculiaridades. In: BARBOSA, Denis. A propriedade intelectual no século XXI: Estudos de Direito, Rio de Janeiro:Lumen, 2009, p.588
[6] STF, Recurso extraordinário 58535-SP. Relator: Ministro Evandro Lins. J.: 1966.12.05. Primeira turma. DJ 12.04.67, BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual, Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2003, p. 367; FURTADO, Lucas, Sistema de Propriedade Industrial no Direito brasileiro, Brasília:Ed. Brasília Jurídica, 1996, p. 54
[7] R.E. 93679, RTJ 109/188. apud Lucas Rocha Furtado, Sistema de Propriedade Industrial no Direito brasileiro, Brasília:Ed. Brasília Jurídica, 1996, p. 20
[8] 1a Turma do STF de 13.04.1982, no R.E.94468-1-RJ, relator Min. Néri da Silveira RDM 56/130 apud As bases constitucionais do sistema de proteção das criações industriais, Denis Barbosa, in. Criações Industriais, Segredos de Negócio e Concorrência Desleal, Manoel Joaquim Pereira dos Santos e Wilson Pinheiro Jabur (coord.), São Paulo: Saraiva, 2007, série GVLaw, p.63
[9] Lucas Rocha Furtado, Sistema de Propriedade Industrial no Direito brasileiro, Brasília:Ed. Brasília Jurídica, 1996, p. 78
[10] STF, Re n.94468 RJ de 13.04.84 in RTJ 115/748
[11] STF, AR nº 1182-RJ de 02.09.87, in RTJ 123/4-10, BASTOS, Aurélio. Propriedade Industrial: política, jurisprudência, doutrina, Rio de Janeiro: Liber Juris, 1991, p. 60
[12] RE 108817 / SP - SÃO PAULO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. OCTAVIO GALLOTTI Julgamento: 07/11/1986 Órgão Julgador: Primeira Turma Publicação DJ 05-12-1986 PP-24082 EMENT VOL-01444-02 PP-00369

Propriedade Intelectual e o Código de Hamurabi

Encontramos presentes em legislações antigas dispositivos de proteção à propriedade intelectual. O Código de Hamurabi, (1792 a 1750 a.c.)[1] foi descoberto em 1902 e reflete regras e costumes dos sumérios (código Ur-Namu) e estabelecendo pela primeira vez direitos dos artesãos, como um salário mínimo fixado por lei[2], possui na Lei 188 a seguinte provisão “Se o membro de uma corporação operária, (operário) toma para criar um menino e lhe ensina o seu ofício, este não pode mais ser reclamado” e na Lei 188: “Se um artesão tiver adotado uma criança e lhe tiver ensinado o seu ofício, ele não pode ser tomado de volta” e Lei 189: “Se ele não lhe ensinou o seu ofício, o adotado pode voltar à sua casa paterna”, como forma de se proteger a técnica dos artesãos [3]. Para Nuno Carvalho o código de Hamurabi  se estas disposições não foram elaboradas para proteção de segredos e técnicas não faria sentido reter o aprendiz, de modo que não procede o argumento de Pamela Long de que não há provas da existência de segredos na Antiguidade[4]. Uma placa cuneiforme descrevendo um método para fabricar uma liga semelhante a prata mostra instruções para não se revelar a técnica[5]. O Código de Hamurabi tornou-se a base das leis dos povos semitas tais como os babilônios, assírios, caldeus e hebreus[6]. Embora os sumérios tenham escrito um código de leis três séculos antes de Hamurabi, a concisão do estilo o torno o texto legislativo mais famoso da antiguidade pré romana[7]. Moisés viveu por volta de 1500 a.c., portanto, alguns séculos depois de Hammurabi. Os dez mandamentos guardam muitas semelhanças com o código de Hammurabi, encontrado na cidade babilônica de Susa, na Pérsia, em 1902 e que se encontra no Museu do Louvre.[8] Na Mesopotâmia embora os artesãos se reunissem em bairros, como a rua dos ourives em Sippar, e adotassem um deus protetor comum, não há provas de que se reunissem em corporações.[9] Jeremias 37:21 se refere a rua dos padeiros no reinado de Zedequias em 597 a.C.

Nuno Carvalho observa que o exemplo do Código de Hamurabi reconhece o valor do conhecimento que era transferido do artesão ao aprendiz. Segundo Nuno Carvalho o exemplo mostra que “os princípios da propriedade industrial estão profundamente enraizados no tecido social – tão enraizados quanto todos os outros princípios relativos à apropriação privada de riqueza” [10]. Em 1952 foi encontrada em uma tabuinha de Istambul um código bem mais antigo, o Código de Ur-Namu[11], também da Mesopotâmia de  2050 a.C. cerca de 300 anos anterior ao código de Hamurabi.[12] Em 1945 e 1947 foram encontrados o Código de Lipit-Ischtar[13] de 1900 a.C. da Suméria e o Código de  Bilalama (imperador de Eschnunna)[14] de 1970 a.C. da Babilônia.[15] O Código de Hamurabi destaca-se como um código de ordena leis e preceitos locas em certa de trezentos parágrafos e continuaria a exercer influência muito tempo depois de desaparecido o império da Babilônia.[16] Diversos textos mesopotâmicos, como textos médicos e de fabricação de vidro do século VIII a.c preservam a recomendação para preservação dos segredos de ofícios: “aquele que sabe pode mostrar ao que sabe, mas aquele que sabe não deve mostrar ao que não sabe”. [17] Mircea Eliade destaca receitas de técnicas mesopotâmicas do século XVIII a.c. que eram escritas na “linguagem secreta” eram lidas apenas pelos iniciados.[18]



[1] CERAM, Walter. O segredo dos hititas, Belo Horizonte:Itatiaia, 1961, p. 149; Grande História Universal: o princípio da civilização, Barcelona:Folio, 2001, p.86
[2] RACHET, Guy. Ur. Readers's Digest. As grandes civilizações desaparecidas, Lisboa:1981, p.58
[3] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 43; Código de Hamurábi http: //www.culturabrasil.pro.br/hamurabi.htm.
[4] LONG, Pamela. Openess, secrecy, authorship – technical arts and the culture of knowledge from antiquity to the Renaisssance, John Hopkins, 2004, p. 71-73 cf. CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 44
[5] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 48
[6] BURNS, Edward McNall. História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1959, p.80
[7] AMIET, Pierre. Babilônia. Readers's Digest. As grandes civilizações desaparecidas, Lisboa:1981, p.122
[8] MARSTON, Charles. A Bíblia disse a verdade, Belo Horizonte:Itatiaia, 1958, p. 117, https://pt.wikipedia.org/wiki/Hamurabi
[9] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 45
[10] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 47.
[11] https://en.wikipedia.org/wiki/Code_of_Ur-Nammu
[12] GOWLETT, John. Arqueologia das primeiras culturas. Barcelona:Folio, 2008, p.9
[13] https://en.wikipedia.org/wiki/Lipit-Ishtar
[14] https://en.wikipedia.org/wiki/Laws_of_Eshnunna
[15] NEUBERT, Otto. O vale dos reis, Belo Horizonte:Itatiaia, 1962, p.298
[16] CERAM, Walter. Deuses, túmulos e sábios, Rio de Janeiro:Bib. Exército, 1971, p.266
[17] ELIADE, Mircea. Ferreiros e alquimistas. Rio de Janeiro:Zahar, 1979, p.111
[18] ELIADE, Mircea. Ferreiros e alquimistas. Rio de Janeiro:Zahar, 1979, p.127