Edith Penrose[1] em 1951 chegou a afirmar que “países não industrializados e aqueles em estágios iniciais de industrialização não ganham nada com a concessão de patentes a estrangeiros porque tais países patenteiam muito pouco ou nada no exterior”. Fritz Machlup em estudo realizado para o Comitê do Senado norte-americano em 1958 que discutiu o papel do sistema de patentes na economia segue a mesma linha crítica:[2] “se não tivéssemos um sistema de patentes, seria irresponsável, com base no conhecimento atual de suas consequências econômicas, recomendar criar um. Mas uma vez que temos um sistema de patentes desde há muito tempo, seria irresponsável, com base no nosso conhecimento atual, recomendar a sua abolição”.[3] Para Machlup[4] quanto maior a taxa de compensação conferida ao inventor menor a qualidade do trabalho produzido, ou seja, uma pessoa que prefere fazer outra coisa que inventar algo, e que opta pela invenção em função de alguma compensação econômica imediata é provável que seja menos talentosa que outra que invente sem esta compensação em vista. Diante desta perpsctiva, embora não tenha sido este o objeto do inquérito de Fritz Machlup, podemos concluir que a concessão de patentes aos inventores em países sem tradiçao em propriedade industrial, sem muita inovação, o sistema de patentes poderia ser abolido.
O mesmo argumento é retomado por críticos recentes como Ha Joon Chang: “Diferentemente do comércio de bens e serviços, em que todos têm algo para vender, essa é uma área [propriedade intelectual] em que os países desenvolvidos quase sempre são vendedores e os países em desenvolvimento compradores. Portanto, aumentar a proteção dos direitos de propriedade intelectual [TRIPs] significa que o custo é principalmente arcado pelas nações em desenvolvimento [...] os países em desenvolvimento não terão nada em troca pelo pagamento maior das taxas de licenciamento e por assumirem gastos adicionais com a implementação do novo sistema de IPR”.[5] Na mesma linha crítica Pedro Paranaguá afirma “A maioria dos países em desenvolvimento não dispõe de capacidade significativa de pesquisa, sobretudo de pesquisa de inovação. Com essa realidade, esses países tem pouco a ganhar com a ampla proteção de patentes como forma de otimizar suas pesquisas, porém tem muito a perder com o impacto das patentes nos preços e envio de royalties ao exterior”.[6]
Maria Tereza Leopardi assume uma postura menos radical e argumenta que os estudos sobre os efeitos da propriedade intelectual tanto na concorrência como na inovação não são conclusivos. A autora relata que diversos autores como Arrow (1962), Teece (1988) e Dosi (2006) concordam que a apropriabilidade de ativos intelectuais é uma motivação forte para o incremento de atividades de P&D no país, porém há divergência quanto ao grau de proteção adequado, uma vez que uma proteção excessiva traria como trade off um efeito restritivo não justificável da disseminação do conhecimento: “a afirmação de que algum nível de apropriabilidade é fundamental para propiciar o gasto privado em P&D, entretanto, é uma postulação genérica, e nada diz a respeito do nível de apropriabilidade, tampouco é suficiente para fundamentar teoricamente a relação entre apropriabilidade e taxas de inovação. Nesse novel de análise, não há fundamento teórico para a relação entre o grau de proteção à propriedade intelectual e de restrição à difusão do conhecimento e do progresso técnico”.[7]
Penrose e Machlup também argumentam que as invenções são o resultado do progresso natural tecnológico e portanto o sistema de patentes seria desnecessário para promover algo que invariavelmente as empresas iriam inventar. William Cornish contesta este argumento e alega que embora isso possa fazer sentido para invenções simples na área de mecânica, na perspectiva de invenções obtidas com grandes investimentos em laboratórios de pesquisas que reúnem diversos pesquisadores, seria muito pouco provável se chegar nestas invenções sem uma garantia de proteção que impedisse a sua utilização pela concorrência sem que houvesse a contrapartida de pagamento pelos investimentos feitos em P&D.[8]
[1] in. TACHINARDI. Maria Helena. Guerra das patentes: o conflito Brasil x EUA sobre propriedade intelectual. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1993, p. 78.
[2] Study of the subcommittee on patents, trademarks, and copyrights of the Committee on the judiciary United States Senate. 1958 http: //mises.org/etexts/patentsystem.pdf.
[3] apud.CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 371. http://library.mises.org/books/Fritz%20Machlup/An%20Economic%20Review%20of%20the%20Patent%20System_Vol_3.pdf
[4] MACHLUP, Fritz. The supply of inventors and inventions. In KUZNETS, rate and Direction of Inventive Activity. Cf. ROSEN, William. The most powerful idea in the world: a story of steam, industry and invention. Randon House, 2010, p. 2342/6539 (kindle edition)
[5] CHANG, Ha Joon. O mito do livre-comércio e o maus samaritanos: a história secreta do capitalismo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 73, 138.
[6] PARANAGUÁ, Pedro; REIS, Renata. Patentes e Criações Industriais. Rio de Janeiro: FGV Jurídica, 2009. p. 93.
[7] MELLO, Maria Tereza Leopardi. Propriedade Intelectual e Concorrência. Revista Brasileira de Inovação, Rio de Janeiro, v.8, n.2, p.377, julho/dezembro de 2009
[8] CORNISH, William, LLEWELYN, David. Intellectual property: patents, copyright, trademarks and allied rights. London: Sweet&Maxwell, 2007. p. 135
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