quarta-feira, 28 de maio de 2014

Direito de Autor de Pareceres do INPI e Documentos de Patentes

A Lei de Direitos Autorais Lei nº 9610/98 estabelece no artigo 8º inciso IX que não são objeto de proteção como direitos autorais os textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais[1]. O parecer do INPI é um ato previsto no artigo 35 da Lei nº 9279/96[2], trata-se, portanto de um ato oficial emitido por órgão do governo e como tal isento de direitos autoriais como regula a LDA. Da mesma forma os pedidos de patente publicados pelo INPI na RPI atendem a uma provisão legal conferida pelo artigo 30 da LPI. Plínio Cabral observa que os atos administrativos, e os atos praticados pelo INPI se enquadram neste conceito, são excluídos da proteção autoral: “Não são evidentemente atos criativos. E mesmo que fossem, a lei não os protege, pois a sua finalidade é instruir porcedimentos, cuja publicidade é absolutamente necessária, e, em certos casos imperativo legal”. Plínio Cabral cita como exemplo um parecer expedido por Graciliano Ramos enquanto prefeito de Palmeira dos Índios, ao governador de Alagoas e que por ser ato oficial está fora do âmbito de proteção autoral ainda que o documento em questão seja esteticamente elaborado[3]Os relatórios da prefeitura que escreveu nesse período chamaram a atenção de Augusto Frederico Schmidt, editor carioca que o animou a publicar Caetés (1933)
Disposição idêntica estava prevista no artigo 11 da Lei de Direitos Autorais anterior Lei nº 5988/73[4]. José Ascenção admite um entendimento extensivo a tal dispositivo pois “falando-se em textos, entende-se que não se abrangem apenas as obras literárias, mas qualquer categoria de obras que possam merecer a designação de obras oficiais [...] A exclusão de tutela é radical. Sobre aquelas obras não recai nenhum direito de autor, quer no plano pessoal quer no plano patrimonial”.[5] Denis Barbosa[6] em parecer sobre caso que tratou da aplicação de direitos de autor sobre fotografias documentais realizadas por funcionário municipal conclui que não há qualquer direito autoral a se considerar, entre outros motivos porque tratando de documentos oficiais a estes não incidiria a proteção autoral por força do artigo 661  inciso II do Código Civil de 1916 que lançava em domínio público imediatamente os documentos oficiais uma vez produzidos.[7] Segundo o artigo 661 do Código Civil de 1916 pertencem à União, aos Estados, ou aos Municípios: (Revogado pela Lei nº 9.610, de 1998). I - Os manuscritos de seus arquivos, bibliotecas e repartições. II - As obras encomendadas pelos respectivos governos, e publicadas à custa dos cofres públicos.[8]
Mesmo entes privados, como universidades privadas que emitam uma portaria regulando exames vestibbulares, por exemplo, podem se enquadrar no contexto de ato oficial, pois entende-se um pronunciamento que interessa a milhares de pessoas e portanto seria um contra-senso impedir ou restringir sua circulação.[9] Neste sentido, os documentos de patentes cumprem uma função fundamentalmente orientada no sentido de promover a disseminação tecnológica e da mesma forma seria um contrassenso estabelecer restrições a divulgação deste material. O INPI dispõe de programa específico a mais de 30 anos que divulga cópias de documentos de patentes a usuários no intuito de disseminar a informação tecnológica. O PROFINT criado em 1985 tem como objetivos divulgar e facilitar o acesso à Informação Tecnológica contida nos documentos de patente para que os usuários – sejam eles Associações, Empresas, Instituições de Pesquisa, Universidades, entre outros – possam usufruir as vantagens das informações disponíveis no sistema de patentes.[10] A distribuição de cópias dos documentos de patentes pode ser feita porque tais documentos não dispõe de proteção autoral.
Uma obra com caráter didático, de estudo e pesquisa que utilize trechos de pareceres técnicos do INPI ou trechos de documentos de patentes ou de seus desenhos, ainda que distribuída comercialmente, se enquadraria nas exceções da LDA que prevê no artigo 46 inciso III que não constitui ofensa aos direitos autorais a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra.
Outro aspecto a ser considerado é que em um documento de patente submetido a exame técnico pelo INPI são levados em conta aspectos essencialmente técnicos da invenção. Toda a matéria de aspectivo subjetivo, o aspecto criativo e original com que o texto de um pedido de patente é escrito que expressa traços e sentimentos do autor, deve ser desconsiderado no exame, que deve se voltar apenas para os aspectos técnicos da patente. Podemos, portanto, afirmar que o documento de patente, documento este que assume uma tecnicidade própria, busca evitar exatamente aqueles aspectos para o qual o direito de autor busca proteger. A doutrina é unânime em afirmar que o direito autoral não protege qualquer ideia ou conceito existente por detrás da obra criada, que é exatamente aquilo que o documento de patente deseja transmitir quando a LPI exige no artigo 24 exige que a patente deva descrever o pedido de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto.Também neste sentido a porteção por direito de autor do documento de patente parece inadequada.
O artigo 46 inciso VIII da LDA prevê que não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores. Este texto faz sentido se estamos tratando da reprodução de uma obra comercial, ou seja, em que a reprodução não autorizada de trechos significativos pode representar um ônus ao titular dos titular dos direitos. No entanto a reprodução de documentos de patentes, onde não há qualquer interesse comercial do titular em distribuir tal documento, não faz sentido em se falar em “prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores” quando da reprodução deste documento de patente. Pelo contrário o que se observa é que os escritórios de patentes disponibilizam tal documentação a bases de dados comerciais tais como Dialog, STN, Questel-Orbit, entre outras, sem que para isso seja necessária a autorização do inventor, ainda que estas mesmas empresas tenham interesses comerciais na redistribuição deste material.
Este entendimento de garantir livre acesso aos documentos de patentes como fair use[11] é compatível com o ordenamento jurídico internacional que prevê no artigo 9º da Revisão de 1971 que as legislações dos países da União reservam-se a faculdade de permitir a reprodução das referidas obras em certos casos especiais, contanto que tal reprodução não afete a exploração normal da obra nem cause prejuízo injustificado aos interesses legítimos do autor.[12]


Graciliano Ramos [13]





[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm
[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9279.htm
[3] CABRAL, Plínio. Direito Autoral: dúvidas & controvérsias, São Paulo, Harbra, 2000, p. 74
[4] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5988.htm
[5] ASCENÇÃO, José de Oliveira. Direito Autoral, São Paulo:Renovar, 2007, p.81
[6] BARBOSA, Denis. Propriedade Intelectual: direitos autorais, direitos conexos e software, Lumen Juris:Rio de Janeiro, 2003, p.51
[7] http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/apostilas/inpi/inpidappt.pdf
[8] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071impressao.htm
[9] CABRAL, Plínio. Direito Autoral: dúvidas & controvérsias, São Paulo, Harbra, 2000, p. 74
[10] http://www.inpi.gov.br/portal/artigo/profint
[11] ABRÃO, Eliane. Direitos de autor e direitos conexos, São Paulo:Ed. do Brasil, 2002, p.151
[12] http://www2.cultura.gov.br/site/wp-content/uploads/2008/02/cv_berna.pdf
[13] http://pt.wikipedia.org/wiki/Graciliano_Ramos

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