A pessoa ou empresa que solicitar uma
licença compulsória deverá ter, além de legítimo interesse, comprovada
capacidade técnica e econômica para explorar eficientemente o objeto da patente
licenciada compulsoriamente. Neste sentido, o instrumento de licença compulsória
não se constitui um instrumento de transferência de tecnologia, uma vez que a
licenciante já detém capacitação tecnológica para fabricação do objeto da
patente.
Segundo Maria Tereza Mello [1]: “é ilusório pensar que o
titular de uma patente fornecerá por imposição legal ou judicial todo o know
how necessário a um concorrente que requeira licença compulsória. Assim
o licenciamento compulsório pode até ser relativamente eficaz como mecanismo de
controle do poder de monopólio em mercados onde concorrem empresas de grau
semelhante de capacitação tecnológica, mas não como instrumento de acesso à
tecnologia por parte de empresas menos capacitadas”. Segundo Jorge Àvila,
licenças compulsórias são mecanismos de exceção e como tais não podem ser
utilizados com intuito de se desenvolver uma política de industrialização e
capacitação tecnológica. [2]
Segundo Antonio Figueira Barbosa: “deve
estar claro que obter licença compulsória é obter o direito a uso da invenção.
O licenciado, dessa maneira, recebe o direito de usar a invenção descrita no
documento de patente. Nenhuma outra obrigação é requerida do licenciante, isto
é, este não está obrigado a fornecer quaisquer outras informações sobre a
invenção. Ora, principalmente no tocante a patentes de processo (por exemplo processos
químicos) é uma característica internacional a inexistência de disclosure. Na medida
em que a obtenção de uma patente está transformada mais em um processo legal do
que tecnológico, o sistema de patentes
passa claramente a não cumprira finalidade suposta por seus defensores, ou seja,
de difundir o conhecimento tecnológico. Assim, o requerimento da licença
compulsória é uma medida que só tem finalidade se o requerente possui o
conhecimento tecnológico e, para aplica-lo industrialmente, necessita obter o
direito de uso de invenção”.[3]
Nuno Carvalho lembra que face a tal
dificuldade de transferência tecnológica, há previsões legais que exigem a
transferência de know how no caso das licenças compulsórias [4]: “Este
tema decorre do texto do Art. 5o(ii)§1o do Decreto 3.201 (tal como alterado
pelo Decreto 4.830), o qual dispõe: “O ato de concessão da licença compulsória
poderá também estabelecer a obrigação de o titular transmitir as informações
necessárias e suficientes à efetiva reprodução do objeto protegido e os demais
aspectos técnicos aplicáveis ao caso em espécie, observando-se, na negativa, o
disposto no art. 24 e no Título I, Capítulo VI, da Lei nº 9.279, de 1996”. Este
dispositivo tenta resolver um problema muito comum: muitas vezes, sobretudo
quando se trata de tecnologia mais sofisticada ou sujeita a padrões muito
elevados de qualidade na fabricação (caso dos produtos farmacêuticos), não
basta conhecer o invento, tal como descrito na patente, para reproduzi-lo. Há
que se ter acesso aos manuais de produção e outras informações que constituem o
know-how, a parte submersa do icebergue. É precisamente a falta de acesso a
esse know-how que na prática explica a ausência de licenças obrigatórias em
países em desenvolvimento: as empresas nacionais, na maioria dos casos,
simplesmente não dispõem da tecnologia para explorar os inventos patenteados,
ainda que disponham de instalações e de recursos financeiros para isso.”
Denis Barbosa [5]também alega que cabe ao titular fornecer o know how ao licenciado compulsório, se isto for necessário, para que a exploração da patente se inicie: “o aparente bom senso, mas não a lei em vigor, dá amparo ao disposto no Decreto 3201/96, segundo o qual existiria a obrigação de o titular, se preciso, transmitir as informações necessárias e suficientes à efetiva reprodução do objeto protegido, a supervisão da montagem e os demais aspectos técnicos e comerciais aplicáveis ao caso em espécie”.
[1] MELLO.op. cit. p. 6
[2] ÁVILA, Jorge. Painel: O impacto econômico da propriedade intelectual: a Agenda do
Desenvolvimento. Repict,Rio de Janeiro, setembro de 2011
[3]
BARBOSA, Antonio Figueira. Propriedade e quase-propriedade no comércio de
tecnologia, v.2, Brasília:CNPq, 1981, p.
71
[4] CARVALHO, Nuno. Questões pendentes na
implementação das normas internacionais de direito de patentes relativas ao
acesso a medicamentos. XXIV Seminário Nacional da Propriedade Intelectual
Propriedade Intelectual: Crescimento Econômico com Responsabilidade Social.
ago. 2004 Brasília – DF.
[5] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à
propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 546.
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