PL 5810/2025
Projeto de Lei
Capitão Alberto Neto - PL/AM , Dr. Zacharias Calil - UNIÃO/GO , Mersinho Lucena - PP/PB
12/11/2025
Altera a Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996 (Lei de Propriedade Industrial), para instituir mecanismo de ajuste do prazo de vigência de patentes em casos de atraso na tramitação não imputável ao titular, e dá outras providências.
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2584295
O Congresso Nacional decreta:
Art 1º A Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo de 15 (quinze) anos contados da data de depósito.
§ 1º Sempre que houver comprovado atraso não atribuível, direta ou indiretamente, a ações ou omissões motivadas pelo titular da patente, o INPI, a pedido da parte interessada, instaurará processo administrativo de ajuste do prazo da sua vigência.
§ 2º O ajuste de prazo nunca ultrapassará o prazo de 5 (cinco) anos e será sempre estabelecido proporcionalmente ao atraso da tramitação da aprovação da patente.
§ 3º O prazo estabelecido para requerimento da abertura do processo administrativo de ajuste do prazo de vigência da patente será de 60 (sessenta) dias, contado da concessão da patente.
§ 4º O INPI regulamentará os critérios, os prazos e a tramitação do processo administrativo de ajustamento do prazo de vigência de patente.
§ 5º Excepcionalmente, os titulares de patentes já concedidas e não expiradas, cuja mora administrativa tenha sido objeto de pré-questionamento judicial até a data de promulgação desta Lei, poderão requerer, no prazo de 60 (sessenta) dias, a abertura do processo de ajuste do prazo de vigência de patente nos termos estabelecidos neste artigo.”
Art 2º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
A proposta visa suprir o vácuo regulatório decorrente da decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.529/DF, que declarou inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/1996, eliminando o mecanismo de garantia de tempo mínimo de fruição das patentes e gerando impacto econômico relevante. Desde então, a ausência de instrumento legal para compensar atrasos injustificados do INPI compromete a segurança jurídica, a previsibilidade e o ambiente de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), reduzindo de forma abrupta o período efetivo de exclusividade abaixo do padrão de 20 anos internacionalmente adotado. A medida alinha o Brasil às melhores práticas internacionais, nas quais existem instrumentos de ajuste de prazo de patentes para compensar atrasos administrativos, como nos Estados Unidos (35 U.S.C. 154), na China (art. 42.2 da Lei de Patentes) e na União Europeia (Regulamento (CE) nº 469/2009). O texto propõe:
i. ajuste proporcional ao atraso não imputável ao titular, limitado a 5 anos;
ii. prazo de 60 dias, contado da concessão, para requerer o ajuste;
iii. regra transitória que permite o pedido por titulares de patentes já concedidas e não expiradas, em até 60 dias a partir da vigência da lei; e
iv. competência ao INPI para regulamentar critérios e procedimentos.
Com isso, restabelece-se previsibilidade, sem extrapolar limites razoáveis, fomentando inovação e assegurando ambiente regulatório compatível com o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Esperamos que os Pares compartilhem de nossa visão de um Brasil moderno, inovador e comprometido com o progresso, apto a acompanhar as transformações científicas e tecnológicas que caracterizam o mundo contemporâneo. Ressaltamos a importância deste aperfeiçoamento legal para garantir maior segurança jurídica, promovendo clareza, previsibilidade e confiança para todos os envolvidos.
Comentário:
A justificativa para a extensão de prazo (PTA) em países como EUA, China e Europa é simples: Durante o exame, não há qualquer proteção — nem legal, nem de fato. No Brasil, o sistema é diferente: existe monopólio de fato. O art. 44 da LPI garante indenização retroativa Ou seja, mesmo antes da concessão, o titular pode exigir: “indenização correspondente à exploração indevida ocorrida entre a publicação do pedido e a concessão da patente.” art. 44, LPI Isso transforma todo o período de exame em um período potencialmente indenizável. Se não há prejuízo real ao titular, não há razão jurídica para PTA O titular já é protegido economicamente durante todo o exame. O art. 44 já compensa o período pré-concessão. A exclusividade de fato já existe. O atraso do INPI não reduz o retorno econômico do titular.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI nº 5529/DF. Relator: Ministro Dias Toffoli. Brasília, DF, 2021b. https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1273342619/acao-direta-de-inconstitucionalidade-adi-5529-df
Gesner Oliveira et. al., Os impactos econômicos e concorrenciais decorrentes do parágrafo único do art. 40 da Lei 9.279/96, p. 68: “O art. 44 é meio efetivo de garantir a compensação dos inventores sob a presença de backlog. Faz isso sem gerar distorções na duração de patentes na economia e não criando proteção adicional a pedidos eminentementes fracos”. https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/propriedade-intelectual-protecao-patentaria
Walter Gaspar: "Sem fazer qualquer distinção entre a violação ocorrida antes ou depois da expedição da carta-patente, a legislação brasileira estabeleceu uma das formas mais rigorosas para se apurar o valor dessa indenização, sendo extremamente favorável ao titular da patente. Chaves, Vieira, Dorneles e Vianna, em estudo que se debruçou sobre o tema do monopólio de fato, afirmam que a legislação brasileira "supera em muito a indenização adequada, prevê em realidade uma compensação total de todos os danos, além de perdas e danos e lucros cessantes fixados no critério mais benéfico em prol do titular da patente". https://www.migalhas.com.br/depeso/341418/sistema-de-patentes-e-monopolio-de-fato
Gabriela Chaves escreve "Segundo a LPI, o direito de obter indenização tem início na data de publicação do pedido de patente (art. 44, caput, LPI) ou do início da exploração, caso o infrator tenha tido conhecimento do conteúdo do pedido anteriormente a publicação (art. 44, §1º, LPI). Cabe frisar que a indenização só será devida após a concessão da patente, pois previamente a isto, há tão somente expectativa de direito. Caso a expectativa de direito venha a se concretizar, haverá possibilidade de obter indenização retroativamente ao período de pendência do pedido; caso a expectativa de direito não se concretize, não há que se falar em indenização. Importante lembrar ainda que a indenização só se aplica à exploração indevida, ou seja, não inclui os atos previstos no artigo 43 da LPIQ. E ainda que a indenização está limitada ao conteúdo da patente na forma em que for concedida (art. 44, §3º, LPI). Esse último ponto se faz especialmente importante devido à possibilidade do quadro reivindicatório inicialmente depositado ser substancialmente diferente daquele efetivamente protegido pela carta-patente. Mas no que consiste essa compensação? É aqui que a legislação brasileira se diferencia mais substancialmente da legislação de outros países. Em relação à maior parte das legislações nacionais analisadas, a LPI contém uma das provisões mais extremas em matéria de compensação, prevendo um quantum indenizatório de alta monta que se aplica inclusive ao período anterior à concessão da patente, não havendo diferença explícita na indenização cabível por ato ocorrido antes ou depois da concessão como ocorre em outros países". https://naf.ensp.fiocruz.br/sites/default/files/relatorio_projeto_monopolio_v_final_divulgacao_18_12_2018.pdf
Denis Barbosa afirma "a retroação garantida ao depositante é substantiva, e compreende uma forma eficiente de impedir, pelo risco econômico da indenizabilidade plena, qualquer competição honesta e consequente". BARBOSA, Denis Borges. A inexplicável política pública por trás do parágrafo único do art. 40 da Lei de Propriedade Industrial. 2013. p. 23. https://www.dbba.com.br/wp-content/uploads/ensaios_estudos_pi_patentes.pdf
O §154(d) cria direitos provisórios (“provisional rights”): O titular pode exigir reasonable royalty por atos de terceiros entre a publicação do pedido e a concessão da patente, desde que: i) A invenção publicada coincida substancialmente com a invenção concedida (similaridade entre as reivindicações); ii) O infrator tenha notice, isto é, notificação prévia e comprovada da existência do pedido publicado; iii) A infração (making, using, selling, offering for sale, importação) tenha ocorrido durante esse período; Nos EUA, a partir da publicação, o potencial infrator já sabe que qualquer exploração acarretará royalties obrigatórios, desde que o pedido seja concedido depois. Isso tem forte efeito inibitório (“deterrent effect”).
O art. 44 também garante indenização pelos atos de exploração: Entre a data da publicação e a concessão; Se houver equivalência entre reivindicações publicadas e concedidas.
Diferenças importantes (e aí surgem as críticas)
i) O Brasil não exige “notice” (notificação prévia) Isso parece bom para o titular, mas tem efeito contrário: Como não existe aviso formal, muitos operadores econômicos nem sabem da existência do pedido. Sem esse aviso, o efeito inibitório é menor, e grande parte das empresas “toma o risco” de usar. Nos EUA, o aviso é claro e jurídico; no Brasil, é difuso. ii) O valor da indenização não segue o padrão “reasonable royalty” obrigatório A indenização brasileira depende de prova robusta de danos, lucros cessantes, prejuízo efetivo etc. Nos EUA, basta provar infracção pois royalty razoável é matematicamente devido. No Brasil o titular pode “ganhar” mas receber menos ou ter de lutar por anos em litígio. Judicialização complexa e longa Nos EUA, cálculo de royalty provisório é relativamente consolidado. No Brasil, cálculo de indenização gera litígios periciais, contábeis e demora mais de uma década. iii) Incerteza quanto ao deferimento e alcance real das reivindicações O art. 44 só vale se as reivindicações concedidas forem substancialmente iguais às publicadas. Isso é altamente debatido em juízo. Nos EUA, a jurisprudência é mais estável e previsível. A interpretação doutrinária e jurisprudencial de que: Não é justo responsabilizar alguém por explorar algo que não estava claramente reivindicado ou descrito na publicação original. Por isso, a jurisprudência construiu o seguinte princípio: A indenização retroativa só abrange atos que envolvem matéria já coberta pela publicação. Se a versão final da patente mudar substancialmente, não há retroatividade.Se a matéria concedida estava descrita, ainda que de forma não idêntica, na publicação → há indenização retroativa. Se a matéria concedida NÃO estava presente (ampliação posterior) → não há responsabilidade retroativa.
STJ REsp 2001226 / RS RECURSO ESPECIAL 2022/0134389-7 Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 21/03/2023 Data da Publicação/Fonte DJe 23/03/2023 Antes da concessão do direito de propriedade industrial, o requerente possui mera expectativa em relação a ele, circunstância que, por si, não gera dever de indenizar. https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202201343897&dt_publicacao=23/03/2023
STJ "Ao titular da patente é assegurado, pelo art. 44 da LPI, o direito de obter indenização por exploração indevida de seu objeto a partir da data da publicação do pedido (e não apenas a partir do momento em que a patente é concedida). Dessa forma, apesar da expedição tardia das cartas-patente pelo INPI, as invenções não estiveram desprovidas de amparo jurídico durante esse lapso temporal" https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ITA?CodOrgaoJgdr=&SeqCgrmaSessao=&dt=20220511&formato=PDF&nreg=202000806777&salvar=false&seq=2132577&tipo=0
STJ (RESP nº 1.721.711/RJ, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/4/2018, DJe de 7/11/19) Por isso, não se sustenta o argumento trazido pela defesa do ato questionado - como nos pareceres da Ministra Ellen Gracie (doc. 137) e do professor Daniel Sarmento (doc. 132), não obstante a excelência de tais manifestações - de que o art. 44 proporcionaria uma proteção fraca ao requerente da patente. Primeiramente, destaca-se que em todos os países signatários do acordo TRIPS, o prazo de vigência é contado da data do depósito, não se tratando de exclusividade do direito brasileiro. Pelo contrário, apenas no Brasil garante-se um prazo mínimo de monopólio contado da data de concessão da patente. Em segundo lugar, a Lei de Propriedade Industrial prevê a mesma consequência para a exploração indevida tanto de patentes já concedidas quanto daquelas pendentes de decisão final, qual seja, a indenização. Trata-se de mecanismo utilizado em toda a esfera cível para recompor direitos eventualmente lesados e que tem como fundamento não apenas a reparação àquele que sofreu algum prejuízo, mas também a dissuasão daqueles que se prontificarem a cometer um ilícito, diante de seu potencial decréscimo patrimonial. [...] Ademais, o § 1º do art. 44 reforça proteção fixada no caput, estabelecendo que ela deve ser contabilizada a partir da data em que se iniciou a exploração, caso o infrator tenha obtido conhecimento do conteúdo do pedido depositado antes de sua publicação".https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ITA?CodOrgaoJgdr=&SeqCgrmaSessao=&dt=20220511&formato=PDF&nreg=202000806777&salvar=false&seq=2132577&tipo=0
Denis Barbosa mostra em artigo que discute como deve ser calculado o valor indenizável quando ocorre violação de patente, analisando criticamente os métodos previstos na Lei de Propriedade Industrial (LPI) e mostrando por que, na prática, a quantificação dos danos é um dos pontos mais problemáticos do sistema de patentes brasileiro. O texto afirma que a LPI prevê três caminhos para cálculo da indenização: Perdas e danos efetivos do titular (danos emergentes + lucros cessantes); Lucro que o infrator obteve com a exploração indevida; Valor que o infrator teria pago se tivesse celebrado uma licença legítima (royalty). No entanto, o artigo argumenta que esses critérios não funcionam bem na prática, especialmente porque: é muito difícil provar lucro cessante, já que a patente muitas vezes ainda não gerou faturamento significativo para o titular; estimar o lucro do infrator exige perícias complexas, longas e frequentemente contestadas; determinar o valor hipotético de royalties é igualmente complicado, pois o Brasil não possui parâmetros consolidados, tabelas setoriais ou jurisprudência estável como nos Estados Unidos. Um ponto central do texto é que, embora a lei ofereça caminhos teóricos para se chegar à indenização, na prática a compensação costuma ser baixa, demorada e incerta, o que reduz o efeito dissuasório das normas e falha em proteger adequadamente o sistema de inovação. A ausência de critérios objetivos, somada à morosidade processual e à dificuldade probatória, torna o art. 44 e os mecanismos de indenização “menos efetivos do que parecem no papel”. https://www.dbba.com.br/wp-content/uploads/valor_indenizavel.pdf
Segundo Adélia Valladares "Importante ressaltar que ainda que o art. 44 da LPI assegure ao titular da patente o direito obter indenização pela exploração indevida de seu objeto entre a data da publicação do pedido de patente e da concessão da patente, esse dispositivo não seria o suficiente para concretizar a garantia constitucional de exploração exclusiva do invento patenteado por um prazo razoável. Isso ocorre na medida em que ao ver a sua invenção sendo explorada indevidamente durante o depósito do pedido de patente até a concessão da patente, o titular não poderá fazer nada para coibir a infração antes de concedida a patente, uma vez que o direito de exclusividade se constitui com a concessão da patente e antes disso, inexiste direito constituído. Além disso, a pretensão indenizatória alcança tão somente a infração praticada nos cinco anos que antecedem a data da concessão da patente conforme disposto no art. 225 da LPI ao indicar que “Prescreve em 5 (cinco) anos a ação para reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial.” Em termos práticos, o prazo prescricional de 5 anos, contado a partir concessão da patente, para o ajuizamento da ação de reparação por danos causados pela infração patentária previsto no art. 225 da LPI significa que o titular da patente não possui proteção para infrações que ocorreram ao longo do processo administrativo perante o INPI, mas tão somente nos últimos cinco anos que antecedem a concessão da patente. Nesse sentido, o Ministro Luiz Fux na ADI nº 5529 indica que o artigo 44 da LPI oferece um verdadeiro “prêmio de consolação” ao titular da patente que viu seu objeto ser explorado indevidamente durante o depósito do pedido até a concessão da patente sem poder fazer absolutamente nada, naquele período, para impedir o infrator por conta da mora do trâmite administrativo de seu pedido de patente e ausência de direito constituído": https://pantheon.ufrj.br/bitstream/11422/19872/1/ACValladares-min.pdf
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