quarta-feira, 9 de julho de 2014

Sony x Betamax: guerra de padrões

Charles Ginsburg e Ray Dolby[1]  da empresa norte-americana Ampex desenvolveram os primeiros protótipos de videocassetes com gravação em fita magnética em 1956 tendo recebido patente (US2956114).[2] A proposta era a de permitir que as televisões pudessem exibir seus programas gerados em Nova York por toda a costa oeste sem a necessidade de retransmissões ao vivo. O preço elevado (equivalente a US$ 400 mil em valores atualizados) somente podia ser arcado pelas emissoras de televisão. Em 1956 a CBS foi a primeira emissora a transmitir, de Los Angeles[3], o programa “Douglas Edwards with the news” gravado três horas antes em Nova Iorque. A empresa poderia ter implementado recursos para minimizar as oportunidades de violação de direitos autorais, mas não o fez[4]. Em 1959 a Toshiba desenvolveu a técnica helicoidal de gravação, que se tornaria padrão na indústria.

A Totsuko, precursora da Sony negociou junto ao MITI a aquisição da tecnologia de videocassetes, colocando no mercado um modelo para consumidor residencial em 1965 para gravação de programas enquanto estavam fora de casa. Em 1972 a Philips lançaria no mercado o VCR que permitia a gravação de 45 minutos de vídeo, com grande sucesso. Um modelo mais prático da Sony foi lançado como U-matic seguido do Betamax em 1975, , com capacidade para duas horas de gravação. A JVC lançaria o VHS no ano seguinte, com três horas de gravação. [5]. Diante da qualidade do vídeo Betamax, Universal e Disney processaram a Sony por possibilitarem violação de copyright de seus filmes pelos usuários domésticos. Os representantes das indústria de distribuição de conteúdo defendiam o banimento de gravadores e videocassetes pela mesma razão que se deveria banir armas brancas[6]. A Suprema Corte[7] em 1984 decidiu que o usuário doméstico exercia um uso lícito (fair use) e, portanto, o fato de gravar vídeos em seu videocassete não configurava infração dos titulares do copyright.[8] A vitória da japonesa Sony, contudo, foi transitória pois o padrão Betamax seria superado pelo padrão VHS.

Embora o padrão Sony/Betamax fosse considerado superior, a empresa se recusou a licenciar sua patente a muitas empresas [9] e o padrão que se estabeleceu foi o VHS/JVC por ser mais aberto e, portanto, de maior difusão [10]. Enquanto o padrão VHS foi licenciado para 38 empresas, o padrão Beta ficou restrito a 12 empresas [11]. Acordos com lojas de aluguel de fitas de vídeo, interessadas em um produto mais barato, contribuíram para o estabelecimento do VHS como padrão de mercado [12]. A Sony por outro lado, ao restringir a difusão de seu padrão como um modelo proprietário subestimou o mercado de aluguel de fitas. [13] Ainda no início da década de 1980 os aparelhos de videocassetes custavam mais de US$ 1 mil e as fitas mais de US$ 90. As videolocadoras tiveram um papel central na difusão da tecnologia ao possibilitar que os clientes alugassem tento o aparelho quanto a fita. Pressionada pela concorrência da locadoras a Disney começou a ofertar filmes a custo reduzido. O filme “A dama e o vagabundo” foi lançado no mercado por US$ 30 , tendo vendido mais de 3 milhões de cópias, desencadeando novas quedas de preço entre os concorrentes.[14] Para o uso doméstico, o Betamax perdeu para o VHS apesar de uma grande campanha de marketing da Sony. Na autobiografia do fundador da Sony, Akio Morita, atribui isso ao fato de que a Sony dificilmente licenciava o Betamax para outras empresas fabricarem, alegando que o VHS ficava com a "massa crítica". Outros acreditam que o tempo menor de gravação da fita fez com que os consumidores optassem pelo VHS em primeira instância. Este problema levou a Sony a uma corrida na década de 1980 para aumentar a capacidade do formato, mas nunca estiveram à frente por muito tempo.[15]

Fita Betamax [15]




[1] JOHNS, Adrian. Piracy: the intellectual property wars from Gutenberg to Gates. The University Chicago Press, 2009.p.448
[2] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 741
[3] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 740
[4] Direitos autorais na internet e o uso de obras alheias, Sérgio Vieira Branco Júnior, Lúmen Júris, 2007, p. 105
[5] História Viva, Invenções Geniais, Especial Grandes Temas nº 48, São Paulo: Ed. Duetto, p.9
[6] Direito Autoral: paradoxos e contribuições para a revisão da tecnologia jurídica no século XXI, Alessandra Tridente, Rio de Janeiro:Elsevier, 2009, p. 50
[7] US Supreme Court Sony Corp. v. Universal Ciy Studios Inc. 464 US 417 (1984) cf. WIPO Magazine, Genebra, dezembro 2006, p. 9
[8] JOHNS, Adrian,op.cit.p.453
[9] PETROSKI, Henry. Invention by design: how engineers get from thought to thing. Cambridge: Harvard University Press, 1996, p. 112.
[10] TIGRE, Paulo Bastos. Gestão da Inovação: a economia da inovação no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Elsevier, 2006, p. 233.
[11] CHANDLER, Alfred. O século eletrônico: a história da evolução da indústria eletrônica e de informática. Rio de Janeiro: Campus, 2002. p. 304, 327.
[12] CASTONGUAY, Sylvie. 50 years of the vídeo cassette recorder, Geneva: WIPO Magazine, dez. 2006, n.6 p. 10. http: //www.wipo.int/wipo_magazine/en/2006/06/article_0003.html.
[13] HOVENKAMP, Herbert. Antitrust enterprise: principle and execution, Cambridge:Harvard University Press, 2005, p.3597/4769
[14] SHAPIRO,Carl; VARIAN, Hal R. A economia da informação. Rio de Janeiro:Campus, 1999, p.117
[15] http://pt.wikipedia.org/wiki/Betamax

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