A Constituição de 1988 refere-se a
questão ao tratar dos direitos individuais no Artigo 5º inciso XXIX “a lei
assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua
utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das
marcas, aos nomes de empresas e outros signos distintivos, tendo em vista o
interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País”. No
Título VII que trata da Ordem Econômica e Financeira o artigo 170 estabelece
que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social, observados os princípios da propriedade privada e da função
social da propriedade. Segundo o TRF3 “A
Constituição Federal protege a propriedade na medida em que atenda à sua função
social, ou seja, a propriedade não pode obstar à realização dos objetivos
públicos e do interesse social.”[1] Tais
garantias constitucionais existem desde a primeira Constituição[2] de 1824
com exceção da Constituição de 1937 do Estado Novo de Getúlio Vargas, de
caráter anti-individualista em função de um Estado forte. Ainda assim, Pontes
de Miranda e Gama Cerqueira ressaltam que mesmo diante
desta omissão a garantia constitucional não desapareceu, face ao Artigo 122 da
mesma Constituição que garantia o direito à propriedade [3].
O sistema de patentes deve,
portanto, encontrar um equilíbrio entre o interesse privado do titular da
patente o interesse público da sociedade, sendo estes dois interesses legítimos
e constitucionais. O mesmo capítulo dos direitos e deveres individuais e
coletivos estabelece no inciso xxii que é garantido o direito de propriedade e
no inciso xxiii que a propriedade atenderá a sua função social. Ao observar que
o direito à propriedade intelectual é um direito constitucional Gabriel Di
Blasi conclui: “isso
significa dizer que o seu exercício não é um fim em si mesmo, mas antes um meio
de promover os valores sociais, cujo vértice central encontra-se na própria
pessoa humana” [4].
Segundo Cláudio Barbosa: “A função social
é alcançada com a manutenção de um fluxo de criação e circulação de informação,
criando-se um valor econômico e social. Quando a proteção é excessiva, perde-se
a função de incentivo, estanca-se a criação e a circulação da informação, e,
consequentemente, constata-se que a proteção gera externalidades negativas,
acarretando um custo social”.[5] Para
Pontes de Miranda toda a propriedade só se justifica por sua função social.[6] Segundo
o Ministro Celso Bandeira de Mello: “O
interesse social, quando em conflito com o indivíduo deve prevalecer, porque a
sociedade é o meio, em que o homem vive; não há homem fora da sociedade [...] O
princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é
princípio geral do Direito inerente a qualquer sociedade”.[7]
Para Hely Lopes Meirelles: “enquanto o direito privado repousa sobre a
igualdade das partes na relação jurídica, o Direito Público assenta em
princípio inverso, qual seja, o da supremacia do Poder Público sobre os
cidadãos dada a prevalência dos interesses coletivos sobre os individuais [...]
Sempre que entrarem em conflito o direito do indivíduo e o interesse da
comunidade, há de prevalecer este, um vez que o objetivo prpimacial da
Administração é o bem comum. As leis administrativas visam, geralmente, a
assegurar essa supremacia do Poder Público sobre os indivíduos, enquanto
necessária á consecução dos fins d Administração. Ao aplicador da lei compete
interpretá-la de modo a estabelecer o equilíbrio entre os privilégios estatais
e os direitos individuais, sem perder de vista aquela supremacia [...] os fins
da administração pública resumem-se num único objetivo: o bem comum da
coletividade administrada. Toda atividade do administrador públici deve ser
orientada para esse objetivo [...] Todo ato
que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de
finalidade [...] Desde que a Administração Pública só se justifica como fator
de realização do interesse coletivo, seus atos hão de se dirigir sempre e
sempre para um fim público, sendo nulos quando satisfizerem pretensões
descoincidentes do interesse coletivo”. [8] Segundo
o TJSP: “o controle jurisdicional se
restringe ao exame da legalidade do ato administrativo, mas por legalidade ou
legitimidade se entende não so a conformação do ato com a lei, como também com
a moral administrativa e com o interesse coletivo”. Segundo o TJSP “ninguém adquire direito contra o interesse
público”.[9]
Hely Lopes Meireles
Segundo Lucas Rocha Furtado [10]
“a propriedade privada, como posta na Constituição,
vincula-se a um fim – a função social – não sendo garantida em termos
absolutos, mas apenas na medida em que atenda este fim”, ou
seja, os direitos do inventor “não poderão sobrepor-se aos interesses
sociais e nem frustrar a realização da função social do direito de propriedade
industrial, sendo certo ainda que visarão sempre ao desenvolvimento tecnológico
e econômico do País”. Este mesmo princípio está expresso no artigo 2º da LPI:
“A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o
seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País,
efetua-se mediante concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade“.
[1] TRF3
Processo: AMS 10245 SP 2003.61.00.010245-5 Relator(a): DESEMBARGADOR FEDERAL
MAIRAN MAIA Julgamento: 06/05/2010 Órgão Julgador: SEXTA TURMA
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/9222998/apelacao-em-mandado-de-seguranca-ams-10245-sp-20036100010245-5-trf3
[2]
MALAVOTA,Leandro Miranda. A construção do
sistema de patentes no Brasil: um olhar histórico, Rio de Janeiro:Lumen
Juris, 2011, p. 114
[3] CERQUEIRA.
op. cit., v. I, p. 107
[4] Di
BLASI, Gabriel. A propriedade Industrial: os sistemas de marcas, patentes,
desenhos industriais e transferência de tecnologia.Rio de Janeiro: Forense,
2010. p. 46.
[5]
BARBOSA, Cláudio. Propriedade
Intelectual: introdução à propriedade intelectual como informação. Rio de
Janeiro:Elsevier, 2009, p.53
[7] MELLO,
Celso Bandeira . Curso de direito administrativo, São Paulo: Malheiros, 2011,
p. 96 cf. BARBOSA, Pedro Marcos Nunes. Direito Civil da propriedade intelectual:
o caso da usucapião de patentes. Rio de Janeiro, Lumen Juris,2012, p.8
[8]
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo:Malheiros
editores, 1990, p.44, 84, 88, 133
[9] MEIRELLES,
Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo:Malheiros editores,
1990, p.117
[10]
FURTADO, Lucas Rocha. Sistema de Propriedade Industrial no Direito
brasileiro. Brasília: Brasília Jurídica, 1996. p. 22
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