O TRF2 inicialmente já se manifestou pela não patenteabilidade de segundos usos médicos.
Segundo decisão de 2009 do TRF2 em INPI v. Eli Lilly Co. ao discutir a
patenteabilidade de PI9606903: “Das
matérias referentes à propriedade industrial a patente de medicamentos é das
mais controversas, por permitir uma série de estratégias muito mais
conceituais, do que inovadoras. Ou seja, a criatividade, no caso, fica por
conta do desenvolvimento de estratégias conhecidas como “life cycle” management
ou “evergreening”, que consistem no prolongamento de tempo do privilégio
mediante a obtenção de múltiplas patentes, com base em diferentes atributos de
um mesmo produto, visando a impedir, p. ex. a entrada de genéricos no mercado
(...)“segundo uso de princípios ativos já conhecidos, novas formulações de
medicamentos em uso etc, são subterfúgios usados para obter novas patentes
sobre velhas moléculas e assim, mediante táticas de modificação de registros,
conseguir a manutenção da exclusividade de mercado e dos preços de monopólio de
medicamentos (...) Não [se pode] esquecer que a descoberta de um novo uso para
um medicamento não estimula a inovação, e adia, em contra-partida, a
concorrência no mercado com prejuízos para a produção e difusão do conhecimento
[...] ”[1].
O relator Messod Azulay
Neto conclui: “Do cotejo dos dispositivos
extrai-se: primeiro, que a patente de segundo uso não atende ao requisito
básico de novidade, à vista do segundo uso da mesma substância já pertencer ao
estado da técnica. Segundo, o fato de uma mesma substância ser utilizada para
outra finalidade não resulta em matéria patenteável por não envolver um passo
inventivo (de acordo com o TRIPs) ou atividade inventiva (de acordo com a lei
brasileira). No máximo estaremos diante de uma simples descoberta de um novo
uso terapêutico, que não é considerado invenção nos termos do art. 10° da lei
n° 9.279/96. III - Ademais, a concessão de um novo monopólio - para um segundo
uso de substâncias já conhecidas - prolongaria indefinidamente os direitos
privados do titular da patente sobre uma matéria que não apresenta os
requisitos, internacionalmente aceitos, de patenteabilidade e, em
contrapartida, reduziria o direito público de acesso aos novos conhecimentos
pela sociedade brasileira, e impediria que pesquisadores nacionais
desenvolvessem novas formulações e novos medicamentos”.
Decisão de Tribunal Federal
do Rio de Janeiro conclui que “a patente
de segundo uso, admitida por países desenvolvidos como os Estados Unidos, a meu
ver não se coaduna com o sistema brasileiro, diante da expressa vedação legal
de se patentear uma descoberta, caso em que se enquadra a patente de segundo
uso, eis que não se trata de um novo produto ou novo processo, pois tanto o
princípio ativo como a composição de fármaco já são conhecido. Ademais, a
ampliação do escopo patentário e, por conseguinte, o privilégio de algo que
sequer é um invento ou um novo processo, não me parecem condizentes com as
políticas de saúde pública, tão caras ao Brasil enquanto país em
desenvolvimento”.[2]
No entanto em decisões mais
recentes o TRF2 reveteu esta linha de raciocício. O TRF2 em Anvisa v. Max Plank
Gesellschaft conclui[3]:
“De outro lado, não se nega nos autos que
a patente da empresa apelada (PP1100133) é de segundo uso, assim denominada por
objetivar a aquisição de novos títulos privilegiáveis com base em princípio
ativo já conhecido, ao argumento de que as buscas por novas moléculas se
tornaram economicamente proibitivas, levando os laboratórios a investirem em
novos efeitos terapêuticos da mesma substância química. Forçoso reconhecer que
o fato de uma patente ser de segundo uso não importa necessariamente em
carência de novidade, sendo possível que novos efeitos terapêuticos se originem
de pesquisas e estudos em tal sentido, de caráter absolutamente inovador, sem
que se configurem em meras descobertas oriundas de uso do medicamento”.
O
TRF2 em Eli Lilly v. INPI em embargos infringentes do mesmo caso da PI9606903 citado
anteriormente reverteu seu entendimento: “O
Brasil contempla a propriedade intelectual privada desde a Constituição, mas de
acordo com os incisos XXIX, XXII e XXIII do art. 5º, sendo certo que na
legislação vigente, no que concerne às patentes, em regra vige o sistema
genérico de classificação onde tudo que não está relacionado de forma expressa
na Lei como não patenteável, em princípio seria passível de proteção, o que em
tese autorizaria o registro das denominadas patentes de segundo uso.
Necessidade de aferição, caso a caso, dos requisitos de patenteabilidade”.[4] Nesta decisão[5]
de junho de 2013 foi discutida
a patenteabilidade de PI9606903 que trata
de uma invenção de segundo médico, o uso da tomoxetina para o tratamento
da TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade), medicamento já
conhecido no tratamento de desordem do trato urinário.
O Relator Paulo Espírito Santo
menciona a definição da Desembargadora Liliane Roriz que bem define o objeto da
patente: “Assim, está-se diante de uma
substância já conhecida e contida no estado da técnica – a tomoxetina,
inventada originalmente para tratar problemas urinários, mas que nunca chegou a
ser efetivamente a ser usada como medicamento, para esse ou para outro fim, e
cujo porcesso de produção também já é conhecido e contido no estado da técnica –
para a qual se inventou um novo uso médico, agora para tratar distúrbios de
atenção. O que se pretende patentear, entretando, não são as etapas do porcesso
de preparação do novo medicamento que contém tomoxetina, mas sim a invenção de um novo uso
para a tomoxetina, após acrescentá-la a outros materiais”. O INPI defendeu
a patenteabilidade alegando que o pedido de patente abrange um processo de
obtenção de um medicamento para tratar TDAH usando a tomoxetina como
ingrediente ativo, sendo portanto, um processo. O relator entende que o pedido
de patente em questão não pretende
proteger um método terapêutico, mas sim um medicamento que serve para tratar
uma determinada doença. Segundo o relator: “em
que pese o denominado segundo uso não ser expressamente veddao por nosso
ordenamento, há que haver em relação a ele, um inequívoco preenchimento dos
requisitos de novidade e inventividade, os quais devam ser aferidos de forma
bem mais rigorosa, uma vez que se trata de alguma coisa já conhecida (no caso o
conjunto substância e processo), ambos do estado da técnica, para que se lhe
estenda um outro monopólio [...] Nossa legislação não proíbe novos usos, ainda
que não os preveja expressamente como patenteáveis, mas não contempla o que não
seja novo, inventivo, mediante utilização de substância que nada tem de
novidade””. A Corte conclui pela falta de novidade deste novo uso: “Novidade se vê esvaziada na medida em que
embora não tenha sido anteriormente descrito o uso da substância para o TDAH e
não tenha havido notícias de pesquisas sobre ele para uso em tal doença a
substância já era conhecida como inibidora de substância que interferia em
outra doença neurológica, não parecendo de todo impossível a um técnico derivar
sua utilização também para outras doenças do mesmo gênero [...] Ante o exposto
nego provimento aos embargos infringentess opostos pela empresa Eli Lilly”.
Em nenhum momento a considerou este segundo uso como descoberta ou como não sendo
invenção pelo Artigo 10 da LPI.
[1] Origem: TRF-2 Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL - 420502 Processo: 2005.51.01.507811-1 UF : RJ Orgão Julgador: SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA Data Decisão: 22/09/2009 Documento: TRF-200221049 Fonte DJU - Data::30/09/2009 - Página::55 Relator Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO http://www.trf2.jus.br
[2] Seção Judiciária Federal do Rio de Janeiro, 39ª Vara Federal, Sentença na Ação Ordinária de nº 2004.51.01.530033-2, DJ 04.07.2007.
[3] Origem: TRF-2 Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL - 418440 Processo: 2005.51.01.500427-9 UF : RJ Orgão Julgador: SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA Data Decisão: 25/05/2010 Documento: TRF-200233470 Fonte E-DJF2R - Data::07/06/2010 - Página::107/108 Relator: Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO
[4] TRF2, 200551015078111 - EMBARGOS INFRINGENTES, Relator: Abel Gomes, data Julgamento: 06/06/2013.
[5] Embargos Infringentes, TRF2 nº CNJ 0507811-09.2005.4.02.5101, Reator: Des. Abel Gomes, Embargante: Eli Lilly Co, Embargado: INPI. Origem: 35ª Vara Federal do Rio de Janeiro (200551015078111), Data de publicação 6/06/2013.
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