Um conceito que reflete a ideia de que as patentes são desnecessárias é a chamada tragédia dos bens não comuns “The
tragedy of the anticommons”[1]
um neologismo cunhado por Michael Heller em um artigo escrito em 1998 para descrever
a falta de coordenação nas ações de múltiplos proprietários de patentes que
agindo em função de seus interesses particulares frustram um desenvolvimento
social desejável [2]. O termo faz uma menção a tragédia dos bens
comuns termo popularizado por Garrett Hardin[3] em 1968 para descrição dos campos comuns da
Inglaterra na Idade Média em que cada criador de ovelhas ao aumentar seu
rebanho de ovelhas fazia com que a área de capim disponível a todos reduzisse [4]. O conceito retoma
artigo escrito por Harold Demsetz[5]
segundo o qual quando a propriedade é comum os indivíduos não estariam
dispostos a nela investir uma vez que não poderão evitar que os outros colham o
fruto de seu trabalho. A propriedade privada seria uma solução para esta
questão. A expressão tragédia dos comuns provém originalmente de uma observação
feita pelo matemático amador William Forster Lloyd sobre posse comunal da terra
em aldeias medievais, em seu livro de 1833 sobre população, muito embora a
teoria esteja presente em História de Peloponeso de Tucídides (c. 460 a.C.-
c.395 a.C.), e no livro I de Política de Aristóteles[6].
As teses de Garrett Hardin enfocava recursos não administrados, em vez de
comunitariamente administrados, esta aplicação das ideias dele é equivocada,
desta forma ele ressaltou que os bens administrados comunitariamente poderia
ser controlado de várias formas diferentes para deter ou limitar a
superexploração.
Commons são conjuntos de recursos utilizados em comum por uma determinada
comunidade. Posner destaca que o movimento de enclosure dos campos ingleses contemporâneo à Revolução Industrial[7]
em que milhões de acres foram cercados e transformados em propriedade privada[8],
foi responsável por um grande aumento de produtividade no campo, uma vez que
com o campo sendo propriedade privada reduziu enormemente os custos de transação
para transformar, por exemplo, uma área de pasto em área para outros usos, pois
esta medida já não dependia da aprovação de todos os seus usuários. [9]
O movimento foi intensificado pela industrialização que exigiu grande demanda
de lã para produção de tecidos, e assim os senhores feudais passaram a cercar
suas terras, eliminado uso dos campos abertos commons, gerando uma massa de camponeses desempregados uma vez que
a criação de ovelhas demandava menos trabalhadores no campo. Na análise Leo
Huberman: “o movimento de enclosure das
terras provocou muito sofrimento, mas ampliou as possibilidade de melhorar a
agricultura”[10]
Karl Marx mostra que sua forma parlamentar a Bills for enclosures of commons
(leis para cercamento comunal) foram “decretos
mediante os quais os proprietários fundiários presenteiam a si mesmos , como
propriedade privada, com terras do povo”.[11]
Jeffrey Atteberry critica comparações do movimento de enclosure de terras no
século XVIII com a atual apropriação de ideias pelo reforço da propriedade
intelectual. Giles Deleuze já destacara que a sociedade está em processo de
transição de uma organização social disciplinar tal como desenvolvido no
trabalho de Foucault sobre hospitais, prisões e escolas, para uma sociedade de
controle sobre espaços abertos em que o poder é exercido de forma mais dinâmica
e flexível. Desta forma para Jeffrey Atteberry a propriedade intelectual opera dentro de uma lógica de
uma sociedade disciplinar enquanto que o acesso aberto à informação (commons)
tipifica uma sociedade de controle. Um regime orientado para os chamados
commons em contraste com o atual regime de propriedade intelectual estariam
mais adequados a esta mudança da organização social do capitalismo
informacional: “o fato de que os commons
informacionais não estariam sujeitos ao enclosure não necessariamente significa
que ele não possa funcionar como um componente chave do aparelho informacional
do capitalismo em um novo regime de imperialismo da informação”.[12]
Garrett Hardin [13]
[1] HELLER, M.A. The tragedy of the anticommons. In. Harvard Law Review, jan. 1998
[2] http:
//en.wikipedia.org/wiki/Tragedy_of_the_anticommons. Cf. BURK, Dan L.; LEMLEY,
Mark, A. The patent crisis and how the Courts can solve it. The University of
Chicago Press, 2009, p.75; GUELLEC, Dominique; POTTERIE, Bruno van
Pottelsberghe de la. The economics of the european patent system. Great
Britain:Oxford University Press, 2007, p.77
[4] HARDIN, Garrett. The tragedy of the commons. Science,
162, n.3859, 13/12/1968. Cf. STIGLITZ, Joseph. Globalização como dar certo. São
Paulo: Cia das Letras, 2007. p. 269; SIMON, Imre; VIEIRA, Miguel Said. A
propriedade intelectual diante da emergência da produção social. In:
VILLARES, Fabio. Propriedade intelectual: tensões entre o capital e a
sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2007. p. 66.
[5] DEMSETZ,Harold. Toward a theory of
property rights. American Economic Review, v.57, n.2, março 1967, p. 347-359
[6] http://pt.wikipedia.org/wiki/Trag%C3%A9dia_dos_comuns
[7]
DEANE, Phyllis, A revolução Industrial, Rio de Janeiro:Zahar,1973, p.66
[8] ROSEN, William. The most powerful
idea in the world: a story of steam, industry and invention. Randon
House, 2010, p. 4159/6539 (kindle edition)
[9] LANDES, William; POSNER, Richard.
The economic structure of intellectual property law. Cambridge:Harvard
University Press, 2003, p.12
[10] HUBERMAN, História da riqueza do
homem. Rio de Janeiro:Zahar, 1978, p. 114-118
[11]
MARX, Karl. O capital, livro I: o processo de produção do capital,São
Paulo:Boitempo, 2013, p.796
[12] ATTEBERRY, Jeffrey.
Information/Knowledge in the global society control: A2K theory and post Colonial commons; In: KRIKORIAN, Gaelle;
KAPCZYNSKI, Amy. Access to knowledge in the age of intellectual property, Zone
Books: Nova Iorque, 2010, p.342, 346
[13] http://en.wikipedia.org/wiki/Garrett_Hardin
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