domingo, 25 de janeiro de 2015

O impacto das patentes nas ações da bolsa de uma empresa

Um indicador do impacto de algumas patentes na atividade econômica pode ser observado no valor das ações de empresas na bolsa de valores. O próprio livro de Michael Meurer[1] que critica o sistema de patentes mostra que nos casos de litígios caem os preços das ações quando a patente em litígio ameaça ser anulada o que representa um ganho para o público, que pode comprar ações mais baratas. Em agosto de 2000 as ações da Eli Lilly caíram em um terço no dia seguinte à decisão do CAFC de que patente do Prozac não teria direito a mais dois anos de extensão de sua vigência uma vez que se tratava de pedido dividido do qual o pedido original havia expirado.[2] Em 14 de outubro de 1980, apenas alguns meses depois do Supremo Tribunal ter se decidido favoravelmente a patente do cientista indiano Ananda Chakrabarty (US4259444), empregado da General Electric, referente a uma bactéria geneticamente modificada da espécie Pseudomonas e concebida para consumir os derramamentos de petróleo nos oceanos, a pequena Genentech ofereceu mais de um milhão de ações a 35 dólares cada uma. Nos primeiros vinte minutos de comercialização, a cotação das ações subiu para 89 dólares cada. Ao final do dia, a inexperiente firma de biotecnologia, que ainda não introduzira um único produto no mercado, angariara 36 milhões de dólares e estava avaliada em 526 milhões [3].
Estudo de Bronwyn H. Hall e Megan MacGarvie mostra uma correlação positiva entre o número de patentes concedidas e o valor de mercado das ações das respectivas empresas na área de software nos Estados Unidos após 1995, quando os tribunais se definiram de forma mais clara pela patenteabilidde de tais invenções[4]. O estudo analisa o período 1975-2002 e conclui que em muitas decisões importantes como Diamond v. Diehr em 1981, a revogação da patente da Compton em 1994 e a liberação de novas diretrizes de exame do USPTO em 1996 não se observa qualquer correlação significativa com o valor das ações das empresas de software. Em outros casos o comportamento é ambíguo: enquanto em Alappat (1994) as ações das empresas de software caem, já considerando o movimento relativo de todas as demais empresas, em re Warmerdam (1994) os valores das ações sobem.
Christine Greenhalgh e Mark Rogers analisando o comportamento de empresas britânicas mostram que quanto mais patentes depositadas por estas empresas na EPO, maior o valor de mercado destas empresas. Por outro lado, a patente no escritório da Inglaterra não evidencia a mesma correlação. Outra conclusão dos pesquisadores é a de que as empresas com maior participação de mercado tem uma atividade de patentes mais intensa[5]. Em 2004 a pendência judicial que o Google mantinha com a Overture, subsidiária da Yahoo, em torno de uma patente (US6269361) sobre sistema de anúncio publicitário, teve influência direta no preço das ações do Google[6]. Em janeiro de 2015 a concessão de uma patente US8934045 sobre a tecnologia de câmeras digitais para a Apple fez o preço das ações da GoPro, líder no mercado, cair em 13% logo após o anúncio da concessão da patente. Esta patente havia sido adquirida pela Apple a partir da aquisição do portfolio da Kodak em 2012.[7]
No caso Apple v. Samsung tão logo anunciado a decisão que condenou em agosto de 2012 a Samsung a pagar 1 bilhão de dólares em indenizações, as ações da Samsung caíram mais de 6% nas semanas seguintes, ao passo que as ações da Apple subiram 6%. Em setembro de 2012, dias antes do lançamento do iPhone5 o preço das ações da Apple atingiam o maior valor de tdos os tempos com a empresa valendo 656 bilhoes de dólares, a maior capitalização de mercado já registrada por uma empresa norte americana.[8] Em junho de 2012 a Interdigital vendeu cerca de 1700 patentes e pedidos de patentes para a Intel por US$ 375 milhões. Na ocasião da venda o preço das ações da Interdigital subiu imediatamente em 28%, o que representou um aumento no valor da empresa em US$260 milhões. Esta reação pode ser explicada porque os investidores antes do acordo não avaliavam que o valor deste portfólio de ações pudesse alcançar tais valores. Observados sobre um contexto mais amplo este aumento do valor das ações não foi capaz de compensar as contínuas quedas do valor das ações da empresa que vinham sendo observadas nos últimos seis meses. O exemplo mostra que embora as patentes tenham valor como ativo econômico, dificilmente podem ser considerados como a receita mais importante de uma empresa. [9] Tomando em consideração a queda nos valores das ações de empresas acusadas de contrafação, os autores estimam uma queda de 2.6% no valor das ações no dia em que o anúncio do litígio de patentes foi realizado. [10]
Com relação às estimativas sombrias de Bessen e Meurer de que excetuando a indústria químico-farmacêutica os ganhos que as empresas auferem com o sistema de patentes são muito inferiores aos gastos em litígios, Glynn Lunney[11] questiona os dados que são baseados nos impactos nos valores das ações das empresas no primeiro dia em que é noticiada a existência de um litígio de patentes. As perdas observadas no primeiro dia no valor da ação da empresa ré, porém, podem ser revertidas se ao final da ação a contrafação não for confirmada, efeito que a metodologia não leva em conta. Para Glynn Lunney não há evidências empíricas de que a reação dos acionistas no curto prazo a um litígio de patente seja um indicador confiável da perda/lucro final do processo, ao contrário, esta reação de curto prazo tende a ser mais pessimista e, portanto, superestimar as perdas no valor da ação com o litígio.
A Apple e a Microsoft passaram anos em disputas judiciais relativas ao direito autoral do conceito de interface gráfica baseada em ícones, presente originalmente no Macintosh e aplicados ao Windows. A animosidade entre as duas empresas foi contornada em 1997 quando Steve Jobs propôs que a Microsoft desenvolvesse os aplicativos Excel e Word para o Macintosh em troca do fim dos litígios da Apple contra a Microsoft, que envolvia em sua maioria a violação de patente de desenhos industriais da Apple avaliados em cerca de 1 bilhão de dólares. Um acordo foi realizado entre as duas empresas. Portanto, o portfólio de patentes da Apple foi considerado fundamental para que a empresa fechasse um acordo favorável junto à Microsoft, contribuindo para a padronização do Excel e Word nas duas plataformas. Com o anúncio da colaboração entre as duas empresas as ações da Apple aumentaram US$ 830 milhões em um único dia[12].



[1] BESSEN, James; MEURER, Michael. Patent Failure: How Judges, Bureaucrats, and Lawyers Put Innovators at Risk. Princeton University Press, 2008, p.138
[2] GRUBB, Philip, W. Patents for Chemicals, Pharmaceuticals, and Biotechnology: Fundamentals of Global Law, Practice, and Strategy; Oxford University Press, 2004, p.120
[3] RIFKIN, Jeremy. O século Biotech, Lisboa: Ed. Publicações Europa América, 2000, p. 63.
[4] The private value of software patents, Bronwyn H. Hall, Megan MacGarvie, NBER Working Paper 12195, abril 2006, http://www.nber.org/papers/w12195
[5] Economic and management perspectives on intellectual property rights, Carine Peeters, Bruno van Pottelsberghe de la Poterie, New York:Palgrave Macmillan, 2006, p.53
[6] Google: a história do negócio de mídia e tecnologia de maior sucesso dos nossos tempos. David Vise e Mark Malseed. Rio de Janeiro:Rocco, 2007, p. 216
[7] WILKOF, Neil. GoPro and the Apple patent: buy on the rumour, sell on the fact?, 16/01/2015 http://ipkitten.blogspot.com.br/2015/01/gopro-and-apple-patent-buy-on-rumour.html
[8] VOGELSTEIN, Fred. Briga de cachorro grande: como a Apple e o Google foram à guerra e começaram uma revolução, Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014, p.156
[9] http://www.patentlyo.com/patent/2012/06/selling-patents.html
[10] BESSEN,MEURER.op.cit.p.1556/3766 (kindle version)
[11] LUNNEY, Glynn. On the Continuing Misuse of Event Studies: The Example of Bessen and Meurer. Symposium James Bessen and Michael Meurer's Patent Failure. the University of Georgia School of Law, v.16, Fall 2008, n.1. Journal of Intellectual Property, v.16, n.1 fall 2008 p.35-56
[12] ISAACSON, Walter. Steve Jobs por Walter Isaacson: a biografia. São Paulo: Cia. das Letras, 2011, p.341, 343

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