terça-feira, 29 de setembro de 2015

Enantiômeros


Para Mark Lemley a doutrina de unexpected result que considera inventivas as invenções que produzam resultados não esperados e a doutrina de obvious to try pelo qual tentativas consideradas com uma boa margem de sucesso seriam uma evidência de não inventividade são duas doutrinas que podem entrar em conflito, pois ocorrer o caso de algo que seja óbvio de se tentar produzir resultados inesperados, o que é comum nas indústrias químicas e farmacêuticas, onde o técnico no assunto é motivado a tentar modificações padrão, mas que devido a imprevisibilidade dos resultados podem levar a efeitos surpreendentes. Para Mark Lemley o praticante de procedimentos considerados normais na ciência caso levem a efeitos surpreendentes não podem ser protegidos por patentes. [1] A doutrina de unexpected results foi tratada pela Suprema Corte em United States v. Adams[2]  em que os elementos de uma bateria os quais se acredita que pudessem até mesmo explodir se combinados, foram combinados na patente, quando a técnica orientava o técnico no assunto a não fazê-lo. O resultado foi considerado surpreendente para o técnico no assunto. O caso envolve a doutrina de unexpected results com a de teaching away, o que reforçou a conclusão de atividade inventiva. Por outro lado, a tentativa óbvia de testar algumas soluções com razoável expectativa de sucesso não é considerada inventiva. Em KSR v. Teleflex em 2007 a Suprema Corte rejeitou as soluções óbvias de serem tentadas como inventivas, especialmente quando há um número limitado previsível de soluções a serem testadas.

Em Hoffmann La Roche v. Apotex[3] o Federal Circuit considerou óbvio de se tentar a dosagem de 150 mg de medicamento uma única vez em um mês quando o estado da técnica aplicava a dosagem de 5mg diários e um outro documento mencionava o conceito de “dose total”. Quando a dosagem mensal foi testada observou-se dum aumento surpreendente da biodisponibilidade do medicamento muito acima do que seria previsto por uma projeção linear ao longo dos 30 dias. Mesmo com tal unexpected effect a Corte concluiu que se tratava de uma dosagem óbvia de ser tentada e, portanto, não inventiva, uma vez que havia razoável expectativa de sucesso muito embora não um sucesso tão surpreendente. Nesta análise não importa as motivações do inventor, mas quais teriam sido as motivações do técnico no assunto. Para Mark Lemley esta decisão “se trata de uma declaração clara do Federal Circuit de que o conceito de obvious to try combinado com uma razoável expectativa de sucesso supera a natureza surpreendente dos resultados alcançados”. Em Aventis Pharma v. King Pharms[4] a patente tratava de estereoisômeros. A Corte conclui uma vez que óbvio identificar o isômero ativo em uma mistura, o fato de que este isômero tem propriedade surpreendentes em si não é relevante, porque tais propriedades já fazem parte da mistura conhecida.

Em outros casos em que existem múltiplas escolhas para se tentar o Federal Circuit tem entendido que a existência de efeitos surpreendentes é uma evidência de atividade inventiva, desta forma, nestas situações, o argumento de obvious to try tem sido rejeitado. Em Sanofi v. Apotex[5] a Corte conclui que um isômero dextrorotatório não era óbvio á luz de uma mistura racêmica conhecida. Embora a literatura indique pelo menos dez técnicas de separação que poderiam ser tentadas a abordagem usada pela Sanofi exigiu cinco meses de experimentação na busca de uma combinação de reagentes favorável com resultados surpreendentes. Neste caso independente de ser óbvio de ser tentado, a ampla faixa de possíveis resultados e a relativa pouca probabilidade de que o composto resultante exibisse tais características diferenciadas e ausência de toxidade torna a solução encontrada não óbvia. Para Mark Lemley nos casos em que as tentativas de soluções óbvias de se tentar levem a um efeito adicionado (added effect), conceito similar ao conceito de efeito bônus na EPO, nestes casos tais soluções continuam sendo óbvias, tal efeito inesperado não deve ter o condão de tornar a solução inventiva, sob pena do sistema de patente não estar protegendo de fato uma invenção mas estendendo a proteção a patentes existentes (evergreening) que o leva a negar patentes para enantiômeros (a prática de se patentear inicialmente um racemato e posteriormente um enantiômero, por exemplo) ou invenções na área de biotecnologia que sejam óbvias de se tentar independente do fato de gerarem efeitos surpreendentes.
 





[1] LEMLEY, Mark. Expecting the unexpected. 28/09/2015 http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2666626


[2] 383 US 39 (1966)


[3] 748 F.3d 1326 (Fed. Cir. 2014)


[4] 499 F. 3d 1293 (Fed. Cir 2007)


[5] 550 F.3d 1075 (Fed. Cir. 2008)

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