Uma
forma encontrada por cientistas de protegerem suas descobertas era com uso de
anagramas, permitindo sua transmissão apenas para aqueles que conhecessem a
forma de decodificar tais informações, mantendo a primazia da descoberta. Roger
Bacon no século XIII filósofo e autor de diversos trabalhos em óptica com
telescópios afirmava que nenhum cientista deveria registrar suas descobertas em
texto ostensiva mas ao invés disso deveria recorrer à escrita oculta. Bacon
escreveu sobre a pólvora por volta de 1260, provavelmente com base em informações
de povos nômades sarracenos, alguns antes do retorno de Marco Polo à Veneza com
histórias sobre a descoberta dos chineses. Para composição da pólvora Bacon usou
de um anagrama que uma vez decifrado revelaria as proporções de sete partes de
salitre, cinco de carvão e cinco de enxofre. Seu enigma permaneceu sem solução
por 650 anos até ser resolvido por um coronel do exército britânico.[1]
Robert
Hooke manteve o sigilo de seus trabalhos sobre as leis de elasticidade por meio
de um anagrama; CEIIINOSSSTUU o qual decifrado significava UT TENSIO SIC VIS
(conforme a tensão, tal força)[2].
Galileu usou uma cifra para comunicar a Kepler sua descoberta dos anéis de
Saturno, que decifrada significava: “observei que o planeta mais distante tem
forma tripla” mas que foi incorretamente decifrada como “salve companheiros
gêmeos, filhos de marte” levando a concepção errônea de que Saturno possuía
duas luas.[3]
Huygens também se utilizou no século XVII de anagramas para garantir a
prioridade sobre sua descoberta de luas em Saturno.[4] Na
Itália do século XVI
Niccolò Trataglia conseguiu resolver o problema de
encontrar as raízes das equações de terceiro grau, porém preferiu manter seu
algoritmo em segredo. Com a insistência de Cardano, Tartaglia escreveu a
solução na forma cifrada de um poema de 25 linhas, o qual o matemático Cardano
foi capaz de decifrar, com o compromisso de manter o segredo de seu autor.
Cardano, contudo, transmitiu o algoritmo a seu secretário um jovem chamado
Ludovico Ferrari que aperfeiçoou o método para obter a solução das equações de
quarto grau. Cardano ficou em situação difícil, se publicasse a descoberta de
Ferrari tornaria público o algoritmo de Tartaglia se comprometera em não
revelar. Tendo decorrido seis anos e sentindo-se liberado da promessa de
segredo, ao saber que outro matemático, Scipione del Ferro, resolvera o
problema das equações cúbicas, Cardano pode publicar sua solução na sua obra a Ars Magna, em 1545 em Nurembergue[5],
atribuindo a solução das equações cúbicas a Scipione Del ferro, o que deixou
Tartaglia enfurecido. [6]
Tartaglia em sua Quesiti et inventioni
diverse de 1546 acusou Cardano de perjúrio escrevendo em termos ofensivos
que contribuíram para má reputação de Cardano na posteridade[7].
Thomas
Merton observa que com a disseminação do artigo científico em revistas
especializadas diminuiu consideravelmente o número de casos de disputas de autoria
de descobertas científicas. Merton cita os números de 72% no século XVIII, 59%
na segunda metade do século XIX e 33% na primeira metade do século XX.[8] Uma
grande controvérsia em torno da descoberta do cálculo infinitesimal e integral
foi estabelecida no século XVII entre Newton e Leibnitz. Newton descobriu o
cálculo em 1665 porém suas primeiras publicações sobre o assunto viriam a ocorrer
em 1704 como um apêndice do livro Óptica. Em sua grande obra Principia
publicada em 1687 utilizou de argumentos geométricos, uma forma de manter a
obra acessível à matemática da época, garantir a continuidade da tradição
geométrica clássica e dar uma referência objetiva aos procedimentos e conceitos
usados. [9] A
controvérsia levou os britânicos a negligenciar por muito tempo os avanços na
matemática no Continente em prejuízo próprio. [10] Para
membros da Royal Society com Boyle e Hooke, somente o registro de invenções,
observações e descobertas no Gresham College poderia se constituir uma forma
segura para solução de controvérsias. Adrian Johns mostra que este mecanismo de
proteção foi utilizado muito embora tenha contribuído para internalizar as
discussões entre os cientistas, mas não extinguir as controvérsias de
prioridade. [11]
Nicolo Tartaglia [12]
[1] COUTEUR, Penny le;
BURRESON, Jay. Os botões de Napoleão: as 17 moléculas que mudaram a história. Rio
de Janeiro:Zahar, 2006, p.85
[2]
http://en.wikipedia.org/wiki/Robert_Hooke
[3]
KING, Ross. O domo de Brunelleschi: como um gênio da Renascença reinventou a
arquitetura, Rio de Janeiro:Record, 2013, p.42
[4]
http://carlkop.home.xs4all.nl/huyglens.html
[5]
EVES, Howard. Introdução à história da matemática, São Paulo:Unicamp,2004,
p.303
[6]
BELLOS, Alex. Alex no país dos números: uma viagem ao mundo maravilhoso da
matemática. São Paulo:Cia das Letras, 2011, p.218
[7]
GILLISPIE, Charles. Dicionário de biografias científica, volume 1, Rio de
Janeiro:contraponto, 2007, p.403
[8]
HELLMAN, Hal. Grandes debates da ciência: dez das maiores contendas de todos os
tempos. São Paulo:Unesp, 1999, p.65
[9]
Scientific American Brasil, Gênios da Ciência, v.7. Newton: o pai da física
moderna, 2013, p. 45
[10]
EVES, Howard. Introdução à história da matemática, Campina:Ed. Unicamp, 2004,
p.444
[11]
JOHNS, Adrian. Piracy: the intellectual property wars from Gutenberg to Gates.
The University Chicago Press, 2009, p.70
[12] https://pt.wikipedia.org/wiki/Tartaglia
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