quarta-feira, 4 de março de 2020

Fundamentação e objetividade do exame técnico do INPI em patentes


A Lei Nº 9.784, de 29 de Janeiro de 1999, que “Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal”:  Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses. Segundo Denis Barbosa: “Não haverá dúvidas de que a constituição de uma patente, restringindo o interesse de terceiros, seja um de tais atos administrativos. O ato administrativo que concede a patente tem de apoiar-se no exame técnico. Ora, a busca é um elemento inescapável dessa motivação. Se a folha de busca indicasse inexistir anterioridades, a motivação seria errônea. O ato mereceria correção. A patente em si mesma seria nula, mas simplesmente pela carência de um requisito fático. Com a vacuidade da folha de busca, falta um elemento essencial da motivação. A nulidade é procedimental, e nem por isso menos lesiva. Aliás, mais, pois a busca improfícua é um fato da vida. A inexistência de busca é uma negligência da Administração. Sempre se escusará o ato falho por acaso, ou deficiência de base de dados.  Assim, temos aqui uma nulidade além de medular, resultado de negligência”.[1]
O Supremo Tribunal Federal[2] analisou deferimento de patente cujo parecer sucinto se limitava a dizer: “O pedido, está, a meu ver, bem definido e delimitado em suas reivindicações. Como não tenha encontrado qualquer anterioridade que possa afetar a sua novidade, opino pelo deferimento do presente pedido”. A Corte entendeu tal parecer como um mero “nada consta” sem afirmar diretamente que o pedido atendia os critérios de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial exigidos em lei: “Assim a patente ao ser expedida apoiou-se apenas numa ficção legal de um ato formal, e não na seriedade de um exame técnico fundado [...] No caso, não houve exame técnico feito pelo próprio DNPI, que se limitou a um sucinto e inconvincente parecer, que não se fundou em quaisquer elementos, por ocasião da patente”. [3] Segundo Hely Lopes Meirelles no direito administrativo: “tratando-se de atos vinculados  ou regrados, impõe-se à Admministração o dever de motivá-los, no sentido de evidenciar a conformação de sua prática com as exigências e requisitos legais que constituem pressupostos necessários de sua existência e validade”.[4] Para Hely Lopes Meirelles: “No Direito Público o que há de menos relevante é a vontade do administrador. Seus desejs, suas ambições, seus programas, seus atos, não têm eficácia administrativa, nem validade jurídica, se não estiverem alicerçados no Direito e na Lei. Não é a chancela da autoridade que valida o ato e o torna respeitável e obrigatório. È a legalidade a pedra de toque de todo ato administrativo”.[5] A administração pública é pautada pelo princípio da impessoalidade: “todo ato que se apartar desse objetivo (o interesse público)  sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade”.[6]
Segundo o TRF2 o órgão público deve emitir decisões coerentes não podendo incorrer em decisões contraditórias: “Aplica-se ao caso o venire contra factum proprium, que se caracteriza, no âmbito do direito público, todas as vezes que a conduta da Administração Pública incorrer em contradição, ou seja, "a ninguém é lícito exercitar um direito em contradição com sua anterior conduta, quando esta, interpretada objetivamente segundo a lei, os bons costumes ou a boa fé, justifica aquela proibição, ou quando o exercício posterior afronte a lei; os bons costumes ou a boa fé". 5. O venire contra factum proprium implica na vedação de comportamento contraditório ou incoerente com o fim de proteger urna parte contra aquela que exerce uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido em situações semelhantes”.(TRF2, Apelação Cível nº 201051010027881, 6ª Turma Especializada, Des. Federal Guilherme Calmon Nogueira da Gama, j. 22.nov.2010, DJ 02.dez.2010). Segundo o STJ: “o direito moderno não compactua com o venire contra factum proprium, que se traduz como o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente (MENEZES CORDEIRO, Da Boa-fé no Direito Civil, 11/742). Havendo real contradição entre dois comportamentos, significando o segundo quebra injustificada da confiança gerada pela prática do primeiro, em prejuízo da contraparte, não é admissível dar eficácia à conduta posterior”. (STJ, Resp n. 95539-SP Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior, Publicado em 14.out.1996). A fundamentação e coerência nas decisões do INPI e avaliação dos critérios de patenteabilidade é fundamental para garantia dos direitos conferidos segundo Denis Barbosa, pois isto é o que garante a existência de uma objetividade no exame, ou seja, a capacidade de sindicabilidade de modo que qualquer técnico no assunto que percorrer o mesmo raciocínio lógico no examinador possa chegar nas mesmas conclusões: “Eu não chego a postular, como o prof. Newton Silveira, que deveria haver maior ductibilidade, flexibilidade no sistema de avaliação. Não. Entendo que são importantes nesse sistema a objetividade e a sindicabilidade. O fato de se usar a atividade inventiva como um requisito para fazer corresponder o monopólio àquilo que o inventor deu à sociedade deve funcionar sistematicamente, e não discricionariamente. Este me parece o ponto essencial".[7]





[1] BARBOSA, Denis. Falta de busca de anterioridades como causa de nulidade de patente, 2004. http://denisbarbosa.addr.com/falta.doc
[2] Recurso extraordinário 58535 SP, Relator: Ministro Evandro Lins (1966) cf. BARBOSA, Denis Borges; KUNTZ, Karin Grau; BARBOSA, Ana Beatriz Nunes. A propriedade intelectual na construção dos tribunais constitucionais. Rio de Janeiro: Lumen, 2009, p. 116
[3] BARBOSA, Denis. Nulidade de modelos de utilidade: peculiaridades. In: BARBOSA, Denis. A propriedade intelectual no século XXI: Estudos de Direito, Rio de Janeiro:Lumen, 2009, p.588
[4] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo:Malheiros editores, 1990, p.148
[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo:Malheiros editores, 1990, p.176
[6] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo:Malheiros editores, 1990, p.88
[7] IV SIPID da Abifina: Desconstruindo mitos, 07/01/2010 http://www.protec.org.br/noticias/pagina/18871

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