No século XVI Sérgio Buarque de Holanda aponta que as grandes araras de cores vistosas impressionaram os europeus e foram objeto de tráfico a ponto do Brasil ser mencionado em certos mapas como a terra dos papagaios. A nau Bretaa armada por Loronha e alguns sócios , que saiu de Lisboa em 1511, levou de regresso a Portugal uma carga contendo além de pau brasil e escravos também gatos, saguis e papagaios. [1] A presença de traficantes e piratas na costa brasileira é frequente já no século XVI. Lilia Schwartz mostra que o final do século XIX, conhecida como a “era dos museus” viu florescer diversos museus etnográficos vinculados a modelos evolucionistas de análise, com suas coleções bastante ampliadas com o material coletado por exploradores como o capitão Cook.[2] O naturalista francês Joseph Dombey enviou para o Museu de Paris em 1784 exemplares zoológicos por intermédio da recém criada Casa dos Pássaros, célula mater do futuro Museu Nacional. Os exemplares enviados contudo sem etiquetas de identificação iriam mais tarde desorientar os pesquisadores.[3] Portugueses presos em Goa ao escaparem trouxeram mudas dos famosos jardins de Pamplemousse da Ile de France (atual república de Maurício) entre as quais as sementes da palmeira imperial que seria plantada no Jardim Botânico do Rio de Janeiro inaugurado quando da chegada da família real em 1808.[4] Em 1800 chegou ao Brasil o naturalista Friedr Sieber, para atender demanda do colecionador alemão Conde Hoffmannsegg para explorar a floresta amazônica, coleção esta que foi doada posteriormente a Universidade de Berlin, na qual se utilizaria diversos especialistas.
No século XIX Étienne Saint Hilaire foi enviado pelo Musée d’Histoire Naturelle de Paris para examinar as coleções mantidas no Museu de História Natural em Lisboa onde encontrou várias espécies encaixotadas da coleção de Alexandre Rodrigues Ferreira o “Humbolt brasileiro”. Aproveitando-se da invasão do general Junot em Portugal, do que estava Saint Hilaire levou os melhores espécimes para Paris entre jacarés, papagaios e herbário amazônico.[5] Segundo ele próprio informaria mais tarde, ao deixar Lisboa, em 15 de agosto de 1808, foram levados 68 mamíferos, 443 aves, 62 répteis, 162 peixes, 490 moluscos, 12 crustáceos e 722 insetos os quais apresentaria à comunidade científica como fruto de suas descobertas. Seus manuscritos e desenhos, com raras exceções, permaneceram inéditos até a década de 1960, embora o Brasil tenha tomado posse deles desde 1842.[6]
Comandada pelo naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, a Viagem Filosófica foi a mais importante expedição científica portuguesa do século XVIII. Ela percorreu o interior da América portuguesa durante nove anos e produziu um rico acervo, composto de diários, mapas populacionais e agrícolas, cerca de 900 pranchas e memórias (zoológicas, botânicas e antropológicas). Os diários, a correspondência e umas poucas memórias somente foram publicados a partir da segunda metade do século XIX, sobretudo na Revista do Instituto Histórico. Na década de 1870, os três primeiros volumes dos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro divulgaram uma enorme lista de manuscritos oriundos da viagem. No entanto, somente na década de 1970, o Conselho Federal de Cultura editou uma parte representativa das pranchas e memórias. Deve-se destacar, porém, que ainda há documentação da maior importância que continua inédita em arquivos portugueses e brasileiros. Na Fundação Biblioteca Nacional e no Arquivo Histórico do Museu Bocage estão depositados os principais registros textuais e visuais da expedição.[7]
Alexandre Ferreira, nascido em Salvador e doutorando na Universidade de Coimbra foi enviado em 1783 pelo catedrático de História Natural, Domingos Vandelli, para estudo das riquezas naturais do norte do Brasil. Alexandre Ferreira chegou ao Brasil em Belém realizando extensa pesquisa pelos rios amazônicos por quatro anos escrevendo extensas memórias de caráter científicos para prestar contas ás autoridades de Lisboa. Durante este período enviou para Lisboa vários espécimes etnográficos, zoológicos, botânicos e mineralógicos. No entanto o próprio Alexandre Ferreira ao retornar para Portuga como encarregado de administrar o Real Gabinete de História Natural pode observar o descaso com que seu material havia sido recebido: “os exemplares que coligira à custa de tantas fadigas e remetera com o maior desvelo para o gabinete da Ajuda, deteriorados na maior parte, e confundidos todos, perdidos ou trocados os números e etiquetas que trazia”.
Segundo
Ronald Raminelli[8]: “Os naturalistas atuavam como homens de
ciência, recorrendo à neutralidade para produzir conhecimento. Como bem
percebeu Mary Pratt (1993), eles desempenhavam simultaneamente funções de
cientistas e agentes imperiais, auxiliando a expansão da Europa. Por intermédio
da história natural, aprendiam-se o valor e a importância das comunidades e
regiões percorridas. Desse modo, as memórias, as pranchas e as espécies
coletadas demonstravam as potencialidades da exploração comercial. A ciência
atuava como "descrição exata de tudo" e funcionava como um espelho
rico e multifacetado, no qual toda Europa pôde projetar a si mesma como
construtora de processo planetário em expansão. Em nome da ciência, os
naturalistas atenuavam a competição e violência provocadas pela expansão
comercial, política e pelo domínio colonial. As pranchas da viagem filosófica
possuem essa racionalidade. Constituem uma produção artística e científica
munida de uma lógica colonial, destinada a classificar e transformar a natureza
e as comunidades indígenas em bens para manutenção e exploração”.
Prancha da obra de Alexandre Ferreira [9]
[1]
Holanda, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira, São Paulo:
Difusão Editorial, 1960, p. 91
[2]
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e
questão racial no Brasil 1870-1930, São Paulo: Cia das Letras, 1993, p.87
[3]
HOLANDA, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira: A época
colonial, administração, economia, sociedade, tomo I, volume 2, São Paulo:Difusão
Editorial, 1960, p.170
[4]
WILCKEN, Patrick. Império à deriva: a Corte portuguesa no Rio de Janeiro
1808-1821, Rio de Janeiro:Objetiva, 2010, p.152
[5]
WILCKEN, Patrick. Império à deriva: a Corte portuguesa no Rio de Janeiro
1808-1821, Rio de Janeiro:Objetiva, 2010, p.306
[6]
HOLANDA, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira: A época
colonial, administração, economia, sociedade, tomo I, volume 2, São Paulo:Difusão
Editorial, 1960, p.172
[7] http://bndigital.bn.br/dossies/alexandre-rodrigues-ferreira/?sub=historico%2F
[8] [1] RAMINELLI, Ronald. Do conhecimento físico e moral dos povos: iconografia e taxionomia na Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira. Hist. cienc. saude, Rio de Janeiro , v. 8, supl. p. 969-992, 2001 . http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702001000500010&lng=en&nrm=iso
[9] http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-59702001000500010&script=sci_arttext
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