terça-feira, 21 de julho de 2020

Impactos concorrenciais do parágrafo único do Artigo 40 da LPI, Seminário IBPI

Impactos concorrenciais do parágrafo único do Artigo 40 da LPI, Seminário IBPI,  21/07/2020


Mediadora: Caroline Tauk
O artigo 40 em seu parágrafo único tem sua constitucionalidade questionada pelo ADIN 5529, com base em forte lesão a direitos concorrenciais e a defesa do consumidor pois os demais interessados não poderiam prever quando iniciar suas atividades, além de quebrar a regra constitucional de temporariedade das patentes. Por lado argumenta-se que esta foi uma opção legislativa que deve ser respeitada ao resguardar os direitos do titulares contra atrasos excessivos no exame das patentes.

Paula Andrea Forgioni USP
O agente econômico busca o lucro por definição, se assim não fosse não seria empresa. Isso é básico para se entender a lógica de mercado e é bom que seja assim. O segundo pressuposto persegue o seu auto interesse com avidez, é natural esse egoísmo do agente econômico. O cerne continua o mesmo, não se pode de uma empresa ser o que ela não é, não se deve esperar qualquer altruísmo por parte das empresas, isso é reconhecido por inúmeros economistas. Um terceiro aspecto é que a empresa age racionalmente. O agente econômico responde a incentivo e desincentivo, e políticas públicas buscam estimular tais ações.  Políticas públicas não podem esperar o altruísmo dos empresários. O direito é feito de incentivos e desincentivo. Se pensarmos em termos de lei de propriedade intelectual temos de pensar em incentivos e desincentivo. O que queremos com a lei de propriedade intelectual ? Fomentar a inovação, no mínimo. Kateherina Pristor mostra como o direito trabalha com ficções e o direito de propriedade é uma ficção. O autor pode vender sua música, ou seja, criamos uma ficção jurídica. Com isso o autor ganha uma vantagem concorrencial. a desvantagem é que esse produto, único, fica mais caro. O agente econômico no fundo não gosta de concorrência.  Quando o remédio se torna genérico o preço cai mais de 50% porque aquele sobrepreço estava sendo encaminhado aos consumidores. todos gostam de falar de inovação mas esquecem de dizer que a sociedade paga com isso. O artigo 44 da LPI trata desse mecanismo de incentivo e desincentivo quando prevê a possibilidade de exploração entre a data de publicação do pedido e da concessão da patente, ou seja, ele já tem benefícios antes mesmo da concessão.  Quem explorou entre a publicação e a concessão está sujeito a pagar indenização. Nenhum genérico vai iniciar a produção sabendo desse risco. O parágrafo único do artigo 40 dá uma extensão quando na verdade o titular já usufruiu mesmo antes da concessão. Resumo: o prazo da patente com o artigo 40 acaba sendo muito maior do que vinte anos que é no final das contas o que o titular busca. Isso é anticompetitivo e inconstitucional. Esse prazo por não ser determinado não pode ser percebido como temporário.  Viola a defesa do consumidor porque o força a pagar mais caro por mais tempo. Mauro Maia já dizia que cada ano a mais de uma patente significa milhões de reais para o titular. 

Karin Grau Kuntz IBPI
Minha fala trata de uma perspectiva sistêmica do ponto de vista concorrencial e sobre estes aspectos irei me concentrar. O desenvolvimento tecnológico possui três pilares: o primeiro é a liberdade da informação, o segundo as patentes e o terceiro  liberdade de concorrência. A informação é um bem público sem valor de troca e não apropriável. O inventor usa um sistema de informações anterior. O invento portanto pressupõe a internacionalização de conhecimentos anteriores, pois não se cria do nada, logo a liberdade de informação é fundamental para produzir conhecimento novo. O direito de patente busca motivar o inventor. Considerando que a informação não é apropriada isso levaria eles a protegerem pro segredo e nisso o sistema de patentes tem papel fundamental para evitar que tais criações ficassem sob sigilo. As patentes devem estar vinculados ao incremento do bem estar social.  O direito de patente não é garantido para o inventor rico, isso é colateral, o objetivo principal é o ganho para sociedade como incremento de bem estar social. A liberdade de concorrência não é ilimitada sob risco de acabar com o próprio mercado. Temos de ter um horizonte de previsibilidade para os agentes do mercado. Eros Grau, meu pai, diz que o mercado é uma ordem que pressupõe obediência de seus atores e uniformidade de condutas dentro de uma previsibilidade. Na idade média guerrear era legítimo mas mesmo a guerra tinha suas regras, um código de guerra. Em 1278 Rodolfo da Germania lançou de uma tática desonrosa, depois de uma batalha exaustiva ele mandou um grupo que estava fora da luta atacar de surpresa. Como ninguém esperava isso, tal tática foi considerada desleal. Era preciso regularidade e previsibilidade de cada exército, ele jamais esperaria ser atacada com seu exercito exausto por um grupo que estava esperando somente o momento certo. Rodolfo I é o primeiro rei do Sacro Império Germânico e ter usado dessa estratégia desonrosa. Esse exemplo deixa claro que a liberdade de concorrência tem que respeitar regras de igualdade. Se considerarmos estes três pilares e que possuem uma hierarquia de igualdade, nenhum deles é mais importante do que o outro. O almejado incremento do bem estar social depende da harmonia destes três pilares. O legislador busca compatibilizar tais pilares para que trabalhem em harmonia. Só essa perspectiva sistemática podemos imaginar esses três pilares como peças de um quebra cabeça formando uma figura final. Quando uma das peças se sobrepõe as demais e ela não encaixa nas demais e compromete a figura final.  A duração do direito de patente deve ser limitada temporalmente para que esse equilíbrio se mantenha. O legislador conta o início do privilégio é contado da data do depósito e não da concessão. Estes limites são inerentes do sistema. O artigo 5 XXIX da Constituição delimita um prazo temporário para as patentes. O prazo de vinte anos da LPI foi considerado justo e adequado, há um consenso internacional sobre isso ao incentivar o inventor e promover a inovação. Sabendo quanto tempo irá durar a patente o concorrente pode informar suas decisões e consequência natural do direito de concorrência. O parágrafo único do artigo 40 desequilibra esse sistema ao vincula a vigência da patente à velocidade do INPI . Se o INPI leva mais de de anos para conceder uma patente (intervalo entre a  concessão e depósito) isso irá implicar uma vigência superior a vinte anos e indeterminado. Ninguém sabe quanto irá demorar o exclusivo. Um primeiro argumento é que o atraso não é culpa do titular assim como não é culpa do concorrente, logo porque o concorrente é que tem que ser o prejudicado ? Não há nenhum estudo econômico que mostre que a sociedade ganha com essa extensão. Em certo sentido no âmbito internacional uma série de estudos na Alemanha e Estados Unidos  mostram que os titulares se esforçam em atrasar o exame, com reivindicações amplas e novos requerimentos durante o processamento para dilatar ao máximo o exame.  Benoit Battisteli ex presidente da EPO, preocupado com essa estratégia reconhece isso quando fala do rich man poker que joga com isso. Não entendo então porque a vigência da patente precisa estar vinculado a eficiência da autarquia. O titular não é o único que sofre com ineficiência de um órgão público, o que seria se isso fosse usado em outros órgãos ? Por que somente com o órgão concessor de patentes ? Eu acho que isso entrou na lei nos anos 1990 quando as relações econômicas no âmbito mundial mudaram abruptamente, quando a patente passa a assumir um papel que antes não tinha. Se fosse hoje não teríamos esse parágrafo único do artigo 40 da LPI, porque o momento é outro. Um segundo argumento temos de observar que a duração é contada do depósito e é adequado que seja limitada aos vinte anos. O artigo 40 parágrafo único traz um incentivo perverso para o titular protelar ao máximo seu exame junto ao INPI. O problema é independente do fato do depositante ser estrangeiro ou nacional, ele impacta a todos. 

Rodrigo Ouro Preto Santos ABPI
O dispositivo do artigo 40 é atual pois tem sido muito usado somente agora.  A ABPI ajudou a moldar o sistema de patentes no país. A razão histórica do parágrafo único do artigo 40  da LPI foi introduzida pela ABPI e teve uma motivação pois no passado já houve a contagem de patentes a partir da concessão e obviamente não deu certo. Durante cinquenta anos não se protegia produtos farmacêuticos (1945-1996) e ainda há grande resistência de alguns grupos contra essas patentes. Houve antes da LPI pedidos de patentes que por atrasos do INPI quando a validade da patente era de quinze anos, e muitas vezes a patente era concedida quando já extinta, sem qualquer efeito prático, uma patente natimorta. A indenização sempre fica muito aquém do investimento feito. Para cada produto que chega a prateleira houve centenas de tentativas com outros princípios ativos o que encarece muito a pesquisa e a indenização não cobre isso, ela nunca abrange essa linha inteira de pesquisas pois se fosse assim quebraria a empresa. Durante a história houve uma politica implícita de não se examinar patentes e o titular arcava com esses atrasos. Um desses entraves foi a anuência prévia da ANVISa que contribui para alongar ainda mais o prazo de exame e contribuiu para disparar essa regra do parágrafo único do artigo 40 nos fármacos. Internacionalmente o prazo de exame é de três anos ou menos e no Brasil esse prazo tem sido de dez anos, ou menos quinze  anos como em telecomunicações.  Ha uma falta de compreensão quanto aos benefícios do sistema de patentes.  Esse dispositivo foi feito para nunca ser utilizado. Mas ele foi colocado lá por se sabia desse risco pois já se imaginava que o retorno de fármacos poderia levar a atrasos nessa concessão, foi uma especie de salvaguarda. Fármacos representam menos de 8% das patentes concedidas pelo INPI e esse dispositivo afeta todas as patentes. Dez anos de exame significa não haver proteção porque a indenização não repõe os investimentos. O objetivo da patente é poder parar a contrafação pelo concorrente. Esse dispositivo gerou uma reação do INPI que levou a medidas efetivas de combate ao backlog que deve ser eliminado em 90% até o final do ano que vem. Se não tivéssemos o parágrafo único não haveria essa pressão em capacitar o INPI para solução desse problema. Isso sem falar na bandeira da ABPI de autonomia financeira do INPI que hoje tem orçamento de 120 milhões para uma arrecadação de 500 milhões. Precisamos regulamentar essa autonomia podemos quadruplicar o quadro de examinadores, que tem hoje um quadro modesto embora eficientíssimo. Somente assim resolveremos o problema de backlog e assim jamais voltaremos a falar de parágrafo único do artigo 40 da LPI que jamais foi idealizado para ser usado. O parágrafo único acabou servindo para sociedade quando forçou o agente público a buscar soluções para o atraso. O titular não busca depositar esperando obter 25 anos, as situações de abuso são esporádicas de protelar o exame, isso não é a regra. Não será pela ação de maus usuários que devemos pautar políticas públicas. Precisamos de um exame em tempo razoável que todo o depositante tem como direito constitucional. Se eliminássemos  não haveria mais o incentivo do INPI em resolver seu atraso, pelo contrário quanto mais demorar melhor pois teremos patentes natimortas, inócuas.  O que tínhamos de estar debatendo é o que poderíamos fazer para dar autonomia ao INPI que o capacitasse a uma solução definitiva do backlog. A Constituição não fala em prazo fixado, logo se a vigência da patente leva mais de vinte anos isso não é inconstitucional, pois a extensão de dez anos é um prazo definido e temporário. Nosso objetivo é um sistema de patentes eficiente e vigoroso que atenda aos interesse da sociedade.  Não conheço esse dispositivo em outros ordenamentos, mas o Brasil fez a opção diante dos atrasos históricos do seu escritório de patentes. Outros países não levam tampo tempo para examinar por isso nem pensaram em tal mecanismo. O parágrafo único acabou surtindo efeitos positivos pois o tempo de exame está sendo corrigido pelo INPI e poderá ser melhor resolvido quando dermos autonomia ao INPI. No caso da patente que não sofre infração qual a justificativa para tal extensão ? O risco de infração existe, não pode ser minimizado, temos de observar no sistema como um todo. O desejo do titular é que não haja infrações e o exame seja célere. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário