quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Reivindicações omnibus

Segundo a Ato Normativo 127/97 item 15.1.3.2. “exceto quando absolutamente necessário, as reivindicações não podem conter, no que diz respeito às características da invenção, referências ao relatório descritivo ou aos desenhos, do tipo "como descrito na parte ... do relatório descritivo” ou "bem como representado pelos desenhos". A referência a “execto quando absolutamente necessário” foi eliminada na normativa seguinte, sendo desta forma mais assertiva. Segundo a Instrução Normativa 30/2013 artigo 4° “as reivindicações não devem conter, no que diz respeito às características da invenção, referências ao relatório descritivo ou aos desenhos, do tipo "como descrito na parte ... do relatório descritivo" ou "bem como representado pelos desenhos".

Tais referências aos desenhos devem ser precisas e não gerar ambigüidade ou indefinição, por isso quando o pedido contiver desenhos, as características técnicas definidas nas reivindicações devem vir acompanhadas entre parênteses, pelos respectivos sinais de referência constantes dos desenhos se for necessário à compreensão do mesmo, entendendo-se que tais sinais de referência não são limitativos das reivindicações. Os desenhos cumprem uma função de esclarecer a invenção. Segundo a EPO formulações nas reivindicações do tipo “motor caracterizado por meios de fixação (parafusos 15), arruelas, ...” não são permitidas por problemas de clareza uma vez que há dúvidas se os ditos parafusos são meramente ilustrativos ou se constitui caracettrística especial da reivindicação. Desta forma as referências numéricas que aparecem em parênteses nas reivindicações devem ser seguidas apenas de algarismo, sem qualquer texto. [1]

Referências nas reivindicações ao relatório descritivo (conhecidas como reivindicações omnibus, do latim – “para todos”) são vetadas pela Regra 43 (6) da EPC2000 exceto quando absolutamente necessário, quando por exemplo as características técnicas da invenção não puderem ser expressas verbalmente como ao se referir a um desenho ou gráfico.[2] Na Inglaterra as reivindicações deste tipo ainda são aceitas e foram adotadas em um pedido sobre dispositivo eletromecânico em 1948 em que se pleiteava na única reivindicação do pedido um “gerador elétrico construído tal como aqui descrito com referências aos desenhos”. [3] Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia e India aceitam esta formulação de reivindicações.[4] Na Inglaterra a reforma do Patents Rules 2007 prevê que a partir de 6 de abril de 2017 não sejam mais aceitas reivindicações do tipo omnibbus. EPO e USPTO normalmente fazem objeção a este tipo de reivindicação.[5]



[1] EPO Guidelines 2010, Part C, Chapter III item 4.19 http://www.epo.org/law-practice/legal-texts/html/guiex/e/c_iii_4_19.htm
[2] STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patent Convention: a commentary.  Thomson:Cologne, 2003, p. 382; Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition July 2010, p. 257 http://www.epo.org/law-practice/case-law-appeals/case-law.html
[3] GRUBB, Philip, W. Patents for Chemicals, Pharmaceuticals, and Biotechnology: Fundamentals of Global Law, Practice, and Strategy; Oxford University Press, 2004, p.343
[4] WIPO patent drafting manual, p.89
[5] https://www.gov.uk/government/publications/the-patents-rules-2007-and-patents-fees-rules-2007

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Patentes como informação tecnológica ?

 
Bessen e Meurer questionam a validade da patente como fonte de informação tecnológica e apresenta os resultados de uma pesquisa realizada nos anos 1990 junto a pequenas empresas britânicas que mostra que apenas um sexto das empresas declararam que lêem patentes como modo de obter informações tecnológicas. [1] O estudo Community Innovation Survey (CIS) realizado entre 1994 e 1996 mostra que somente 3% dos inovadores europeus declararam usar patentes como fonte de informação tecnológica, no entanto, este índice é maior entre aqueles que realizam mais investimentos em P&D.[2] Para Lisa Ouellette não acredita que o papel de disseminação tecnológica pelas patentes seja suficiente para justificar o sistema de patentes. Os críticos argumentam que as patentes não cumprem sua função de disseminação tecnológica por três razões: (i) as patentes contém pouco conteúdo técnico relevante, porque tratam-se de documentos primordialmente jurídicos em que o depositante tenta dissimular a invenção e ao contrario de uma revista científica, o texto não é submetido a um corpo revisor de especialistas (ii) a doutrina de infração deliberada (willful infringement) desestimula o uso de patentes como informação tecnológica, uma vez que o conhecimento de tais patentes implica em indenizações maiores, (iii) as patentes são mais úteis em tecnologias fáceis de copiar, que não podem se basear na complexidade técnica ou no segredo comercial como proteção, de modo que tais tecnologias invariavelmente já seriam disseminadas mesmo sem as patentes. Em relação a primeira crítica Lisa Ouellette[3] realizou entrevistas com pesquisadores em nanotecnologia dos quais apenas 20% responderam aos questionários e que mostram dados surpreendentes quanto a relevância da informação técnica nas patentes. Das respostas obtidas 64% dos entrevistados apontaram que em algum momento já leram documentos de patentes e destes 70% responderam que o fizeram para buscar informações técnicas sendo que deste subgrupo 60% consideraram as informações relevantes. Entretanto apenas 38% dos entrevistaram que indicaram que leram documentos de patentes disseram que as informações dos documentos de patentes eram suficientes para que a invenção fosse implementada. Estudos como os realizados por Cohen Wesley em 1994 mostra que 49.1% dos entrevistados indicaram que embora as patentes sejam cotadas em terceiros lugar como uma fonte de informações técnica das empresas, os dados mostram que tal fonte foi considerada de relevância moderada ou muito importante. Com relação a segunda crítica, Sean Seymore sugere que a simples leitura de um documento de patentes não é suficiente para acionar a doutrina de willful infringement. Segundo Paul Michel a recomendação de que não se leia documentos de patentes com esse objetivo de escapar a indenizações maiores parece “ridícula”.  A pesquisa feita por Lisa Ouellete demonstrou que os entrevistados não apontam tal preocupação (apenas 3%). Com relação a terceira crítica Lisa Ouellete mostra que poucas tecnologias são facilmente copiadas, de modo geral, a engenharia reversa implica em custos de modo que a disseminação pela simples comercialização nem sempre é garantida. Assim as patentes contrinuem para melhorar o acesso a informação embora reconheça que essa função não seja suficiente para se justificar a existência do sistema de patentes, uma vez que apenas uma minoria de inovadores (tendo em vista que apenas 20% dos consultados responderam os questionários) as utillizam como fonte de informação tecnológica.
 


[1] BESSEN, James; MEURER, Michael. Patent Failure: How Judges, Bureaucrats, and Lawyers Put Innovators at Risk. Princeton University Press, 2008, p. 2615/3766 (kindle version)
[2] GUELLEC, Dominique; POTTERIE, Bruno van Pottelsberghe de la. The economics of the european patent system. Great Britain:Oxford University Press, 2007, p.74
[3] OUELLETE, Lisa Larrimore. Do patents disclosure useful information ? Harvard Journal of Law & Technology, v.25, n.2, 2012

domingo, 25 de setembro de 2016

Direitos de usuário anterior (artigo 45 da LPI)


Para preservar os direitos do usuário anterior o artigo 45 da LPI estabelece que “à pessoa de boa fé que, antes da data de depósito ou de prioridade de pedido de patente, explorava seu objeto no País, será assegurado o direito de continuar a exploração, sem ônus, na forma e condição anteriores”. Quando a lei trata de “exploração” neste artigo está se referindo a exploração no mercado interno, pois segundo Denis Barbosa[1]: “note-se que só há direito de inoponibilidade em relação ao invento já explorado (e não simplesmente pesquisado ou conhecido), antes do depósito de patente e no País. A exploração no exterior não faculta a inoponibilidade”. Não há portanto, a possibilidade de extensão de direitos para o mesmo ato realizado no exterior ainda que comprovadamente de boa fé[2].
 
Segundo Luiz Guilherme de Loureiro[3] “a justificativa jurídica [da doutrina francesa], segundo Mathély é que a detenção da invenção por seu criador constitui um direito adquirido e cada um tem a propriedade das criações de seu espírito. O direito adquirido nasce da concepção da invenção e não do que será feito após. Já a segunda doutrina é seguida pela maior parte dos países [incluindo o Brasil]. Segundo essa doutrina o primeiro inventor só pode se beneficiar de um direito de exploração de sua invenção se ele efetivamente já tinha começado tal exploração, ou iniciado preparativos para tanto, antes da data do depósito ou da prioridade do pedido de patente. Os defensores dessa doutrina sustentam que o invento que mantém segredo de sua invenção e não tenha manifestado intenção de explorá-la não merece a proteção legal, porque ele não trouxe nenhuma contribuição ao progresso da sociedade”.
 
Segundo o juiz Agustinho Silva “o direito adquirido é um conceito de direito material, que se traduz numa vantagem integrada, atual ou potencialmente, no patrimônio da pessoa. Escapam á proteção do direito adquirido, em consequência, as normas de natureza formal, que não atingem diretamente o referido patrimônio, por apenas representarem instrumentos que não afetam substancialmente aquelas vantagens. Não estão neste caso as leis que regulam as condições para aquisição de direitos, quando o interessado já tenha exercido a ação necessária, de sua parte, para tal aquisição. Nesse caso a condição preestabelecida se torna inalterável, a arbítrio de outrem, mesmo quando este seja o próprio Estado, pois entender de outro modo seria consagrar o entendimento de que ele poderia procastinar indefinidamente a solução de tais situações, á espera de nova lei que viesse cassar o direito”.[4]
 
Fernando Philipp as mesmas exceções legais de não exploração previstas no artigo 69 da LPI que trata de licenças compulsórias aplicam-se ao artigo 45 da LPI que trata dos direitos de usuário anterior: “assim, a pessoa de boa-fé, para se beneficiar do princípio do usuário anterior deve, na data do pedido de patente ou da prioridade, ter iniciado de maneira efetiva a exploração do objeto da invenção ou ao menos provar a existência de uma das hipóteses previstas pelo artigo 69”[5].
 
Lucas Rocha Furtado refere-se aos direitos de usuário anterior como um anacronismo da Lei, uma vez que se o objeto da patente já havia sido utilizado por terceiros antes da data de depósito da respectiva patente, então esta não apresenta novidade[6]. No entanto, a figura do usuário anterior faz sentido no caso em que esta pessoa protege sua invenção por segredo industrial e, portanto, não pode servir como base para invalidar a patente. Desta perspectiva a LPI ao proteger os interesses de alguém que vinha mantendo sua invenção em segredo, em certo sentido, contraria o princípio básico do sistema de estimular aqueles que optam pela patente em troca da divulgação de sua invenção. Por isso a LPI restringe a condição de usuário anterior aqueles que exploravam a invenção.
 
Luiz Guilherme de Loureiro[7] tem uma interpretação mais ampla: “embora o dispositivo do artigo 45 contenha apenas o termo ‘explorava’, não fazendo qualquer menção aos atos preparatórios, a norma, salvo melhor juízo, deve ser interpretada de forma ampla, a incluir também os atos preparatórios da exploração da invenção [...] Obviamente, os sérios preparativos devem ser referir à exploração da invenção e não à sua concepção. A lei só protege a invenção anterior que já estava acabada, ou seja, idealizada em sua forma e função. A simples ideia da invenção não pode ser alegada pela pessoa interessada”.
 
Os integrantes do escritório Dannemann, Siemsen, Bigler & Ipanema Moreira[8] observam que sendo o uso público anterior do objeto da patente, por terceiro que não o titular, motivo para anular a patente, é presumivelmente mais comum o usuário anterior tentar anular a patente em questão do que procurar fazer valer seus direitos de usuário anterior. Por outro lado, no caso de tal uso anterior não constituir anterioridade para a patente, por estar a tecnologia protegida por segredo industrial, então também neste caso o usuário anterior igualmente preferirá na maioria das vezes não reivindicar seus direitos, pois dificilmente o titular terá acesso as atividades sigilosas de terceiros não autorizados.
 
Os direitos de usuário anterior não se comparam com os direitos conferidos a uma patente . Segundo Fernando Philipp[9] “o direito de usuário anterior é oponível tanto ao titular da patente quanto aos seus beneficiários. Mas ele não é oponível a terceiros outros [...] por exemplo, aos contrafatores da patente de invenção”. Fernando Philipp argumenta que se o usuário anterior vinha explorando sua invenção para fins pessoais nada obsta a ampliação de suas atividades.
 
Assim temos que dificilmente um litígio envolvendo infração resultará no reconhecimento de direitos de usuário anterior. Em uma ação de infração a ré arguiu em sua defesa o uso anterior de um processo de gravação de dados em cilindros de laminação, apresentando como evidências notas fiscais de compra dos eletrodos usados no processo e declarações de seus funcionários. A ação foi encerrada com acordo, porém o perito judicial chegou a emitir laudo que reconhecia o uso anterior[10]. O caso mostra que a comprovação de uso anterior não é prova simples, sendo, portanto, mais recomendável ao inventor solicitar uma patente do que mantê-la em segredo e invocar os direitos de usuário anterior posteriormente.
 
No caso de invenções independentes, terá direito à patente aquele que primeiro fizer o depósito junto ao INPI, independente de quem inventou primeiro. Neste caso de invenções independentes, o primeiro inventor, mesmo sem a patente pode usufruir dos direitos de usuário anterior, previstos no artigo 45 da LPI. Segundo Fernando Philipp “o usuário anterior tem boa-fé a partir do momento em que ele mesmo realizou a invenção ou então ele a recebeu de maneira legítima de seu inventor. Caso contrário, este dispositivo legal [artigo 45 da LPI] não pode ser aplicado, uma vez que o direito de usuário anterior é precário e decorrente de fraude” [11]. No caso de má fé do segundo inventor, o primeiro e verdadeiro inventor poderá solicitar a adjudicação do pedido de patente. Segundo Jacques Labrunie [12]: “seria injusto e despropositado que o legítimo titular usurpado tivesse somente a via da nulidade para questionar a usurpação, pois, com a declaração de nulidade a invenção cairia em domínio público e o inventor continuaria prejudicado, salvo a possibilidade de reparação do dano, por ato ilícito, de responsabilidade do usurpador”. Na legislação francesa (L.613-7) [13]a condição de usuário anterior, introduzida pela lei de 1968, também exige o critério de boa fé. A questão sujeita a maiores controversas diz respeito a exigência do usuário anterior demonstrar que tinha posse da invenção o que pode ser interpretado como simples conhecimento da invenção ou a exploração comercial da mesma.[14]
 
Segundo o STJ ao discutir sobre a patente de invenção que diz respeito ao sistema de abertura e fechamento de latas metálicas (PI 9408643-5) “Ninguém está obrigado a requerer patente para proteger as invenções que utiliza em atividade industrial. Se um empresário obtém proteção para invenção que já era utilizada por seus concorrentes, abrem-se duas possibilidades aos prejudicados: (i) impugnar a patente, mediante a comprovação de ausência de novidade; ou (ii) valer-se do “direito consuetudinário” assegurado pelo art. 45 da Lei 9.279/96. A simples prova testemunhal não é idônea para que se reconheça incidentalmente a nulidade; e o tema tampouco foi objeto do recurso especial. A aplicação do art. 45 da Lei 9.279/96 requer que a invenção tenha sido utilizada pela própria parte prejudicada, mas a prova testemunhal produzida só aponta, com segurança, o uso por terceiros”.[15]
 
O TJMG em Aloísio Pereira v. Ambiente Projetos Ltda [16] conclui: “Não há que se falar em concorrência desleal ou exploração indevida do objeto da patente se um terceiro, de boa-fé, já o explorava antes de efetuado o depósito do pedido de registro junto ao INPI”. Em outra decisão o TJMG conclui: “De fato o Artigo 45 da Lei 9279/96 estabelece o direito à continuidade de exploração empresarial sem qualquer ônus, em se tratando de pessoa de boa fé, que antes do efetivo depósito do pedido de patente, já se encontrava explorando seu objeto no país”[17] Em TJMG Diniz e Carvalho Energia Solar v. Aquecema Energia Solar Ltd[18] conclui que “Inexistindo certeza da identidade entre o bem produzido pela autora, sobre o qual recai pedido de patente, e o fabricado pela ré, e não sendo possível aferir, neste momento processual, se esta faz jus à regra do art. 45 da Lei 9.279/96, mostra-se temerário impedi-la de, liminarmente, continuar fabricando e comercializando o seu produto”.
 
O TJRS em Bandeirante Ind. e Com. de Máquinas v. José Ramão Nascimento Silva[19] preceitua que o direito de usuário é cabível se atendidos dois requisitos básicos: “Assim, necessário, em primeiro lugar, que o usuário detenha, de boa-fé, a tecnologia utilizada pelo depositante do pedido. Por isso, a norma não confere proteção àqueles que dela tomem conhecimento através do próprio inventor, ou por terceiros, com base nas informações obtidas dos inventos ou em face de seus atos, ou através do INPI, por meio da publicação do pedido de patente depositado sem o consentimento do inventor, tudo desde que o pedido tenha sido depositado até um ano após a divulgação (artigo 45, § 2º, e artigo 12, da Lei 9.279/96). [...] Em segundo lugar, para que se configure a ocorrência da previsão legal, é condição a exploração do invento, pelo usuário, no Brasil, assegurando-se, então, o direito à continuidade do empreendimento, sem ônus, na forma e na condição em que já se desenvolvia. E neste ponto, abstraindo-se a eventual identidade ou não de mecanismos utilizados pelas partes, tenho que a norma não confere amparo à pretensão da Autora. Não se põe em dúvida que a Demandante tenha, de fato, produzido um equipamento dotado de esteiras, as quais conduziam o calcário até o momento em que, por ação da gravidade, este era depositado no solo. [...] Ocorre que os elementos probatórios não permitem concluir que houve uma efetiva exploração, verdadeira atividade econômica desenvolvida em torno da invenção. Ainda que o equipamento distribuidor de calcário desenvolvido pela Autora e enviado em consignação para a empresa Comércio de Máquinas Agrícolas Justi Ltda. utilize, efetivamente, o mesmo princípio mecânico patenteado pelo Requerido, não se pode entender a produção de um único protótipo, na história de uma empresa que tem por objeto social, entre outros, justamente a fabricação de máquinas e implementos agrícolas, como uma séria disposição em explorar o invento [...] Não se vislumbra, enfim, um quadro de efetiva exploração do implemento idealizado, mas de concreta desistência da sua fabricação, o que se deveu também à estrutura de que dispunha, não havendo que se falar nem mesmo em preparativos para a exploração.”
 
O TJRS em Cavaletti Estofados para Escritórios Ltda v. Multiflex Estofados para Escritórios Ltda.[20] entendeu que um concorrente que comercializava objeto de patente posterior mas que não como apresentar provas técnicas que possam ser utilizadas para anular a dita patente, pode-se valer da prerrogativa de usuário anterior para não ter de pagar indenização por contrafação da mesma patente: “O Perito apresentou Laudo Complementar. Ratificou o Laudo anterior e esclareceu que “não é possível asseverar, com absoluta certeza, pois isto só aconteceria se fosse possível retornarmos no tempo. Mas pode se dizer que todos os indícios apontam para a existência do mecanismo na época da venda destas cadeiras, devido ao número de patrimônio afixado na base das cadeiras, o qual se encontra na Nota Fiscal referida e no controle patrimonial da Prefeitura Municipal de Getúlio Vargas. Pois não há sinal de remarcação ou substituição recente dos dispositivos. Também deve ser considerado o depoimento de empresários do setor, consultados pelo perito, que afirmam que na época já havia este mecanismo de regulagem tal como o objeto da patente posteriormente depositada”.
 
O juiz conclui: “Entendo, pois, que não é conclusiva o bastante para afirmar a nulidade de patente, o que só poderia ser declarado na ação própria, perante a justiça federal [...]A perícia é suficiente e demonstra que não se pode fazer incidir efeitos decorrentes da patente sobre partes que gozam do abrigo legal oferecido pelo art. 45, da LPI, eis que demonstrada a boa-fé e a anterioridade na exploração do objeto, pois “o direito industrial protege a pessoa que primeiro reivindica a sua proteção, não necessariamente a primeira a conceber o bem intelectual”. [...] Assim, reafirmo que não houve comportamento ilícito por parte das apeladas e que não considero proporcional condená-las ao pagamento de uma indenização e paralisar suas atividades de fabricação e comercialização quando agiram ao abrigo da lei, não agredindo norma constitucional ou ordinária.”
 
Segundo Gabriel Di Blasi: “se o usuário anterior explorou o objeto em sigilo, talvez ele não tenha interesse em exercer tal direito, pelo fato de não se sentir ameaçado pelo titular da patente, pois, este último nunca tomará ciência da existência de um usuário anterior, que explorava o objeto de sua patente antes da data do respectivo depósito. Como exemplo, pode-se citar o caso em que o objeto do uso anterior é um processo de fabricação, cuja prova de uso é difícil de realizar” [21].
 
Na França o Código de propriedade intelectual no artigo L.613-7 preserva os direitos do usuário anterior. Este mecanismo foi introduzido com a lei de 1968. O ônus da prova incide sobre o demandante de direitos de usuário anterior, que deverá provar que tinha posse de tal patente, em território francês, na data de depósito ou prioridade (se houver) da mesma. [22] Um uso anterior no estrangeiro não poderá invocar o direito de usuário anterior na França.[23] Segundo Pollaud Dulian embora o uso se deva concretizar em território francês não importa qual a origem deste conhecimento tenha sido no estrangeiro, pouco importa o local de aquisição desta tecnologia. Para autores como Pouillet, Foyer e Vivant o direito de usuário anterior não constitui propriamente um direito mas de um meio de defesa, mas um direito de exploração em razão de uma possessão pessoal anterior. Segundo Pollaud Dullian: “de qualquer maneira o benefício e exercício de tais direitos estão contidos dentro de limites estreitos, precisamente porque ele constitui uma violação do monopólio”. [24] A possessão pessoal anterior deve ser certa e evidente. O usuário anterior deve estar de boa fé e ter conservado a invenção em segredo, caso contrário este uso anterior pode ser invocado contra a novidade da patente que desta forma entra no domínio público.





[1] Uma Introdução à propriedade intelectual, Denis Barbosa, Rio de Janeiro:Lumen Juris, p. 418


[2] Patentes e Criações Industriais, Pedro Paranaguá, Renata Reis, Rio de Janeiro:FGV Jurídica, 2009, p.87


[3] A Lei de propriedade industrial comentada, Luiz Guilherme de Loureiro, São Paulo:Lejus, p. 116


[4] 5ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Mandado de Segurança, Proc. N.5226. cf. SILVA, Agustinho, F.D. Patentes e Marcas na Justiça Federal. Rio de Janeiro:Livraria Freitas Bastos, 1992, p.34


[5] Patentes de invenção: extensão da proteção e hipóteses de violação, Fernando Eid Philipp, São Paulo:Ed. Juarez de Oliveira, 2006, p.58


[6] Sistema de Propriedade Industrial no Direito brasileiro, Lucas Rocha Furtado, Brasília:Ed. Brasília Jurídica, 1996, p. 55


[7] A Lei de propriedade industrial comentada, Luiz Guilherme de Loureiro, São Paulo:Lejus, p. 118


[8] Comentários à Lei de Propriedade Industrial e correlatos, Dannemann, Siemsen, Bigler & Ipanema Moreira, Rio de Janeiro:Renovar, 2001, p. 130


[9] Patentes de invenção: extensão da proteção e hipóteses de violação, Fernando Eid Philipp, São Paulo:Ed. Juarez de Oliveira, 2006, p.62


[10] Processo n.00109177908, 8a Vara Cível de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Paulo da Costa Sarmento v. Geradu S/A, apud Delimitação do escopo da patente, Ivan Bacellar Ahlert, in. Criações Industriais, Segredos de Negócio e Concorrência Desleal, Manoel Joaquim Pereira dos Santos e Wilson Pinheiro Jabur (coord.), São Paulo: Saraiva, 2007, série GVLaw, p.156

[11] PHILIPP, Fernando Eid. Patentes de invenção: extensão da proteção e hipóteses de violação. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2006. p. 55.
 

[12] LABRUNIE, Jacques. Direito de Patentes: condições legais de obtenção e nulidades, São Paulo: Manole, 2006, p. 139.
 


[13] Toute personne qui, de bonne foi, à la date de dépôt ou de priorité d'un brevet, était, sur le territoire où le présent livre est applicable en possession de l'invention objet du brevet, a le droit, à titre personnel, d'exploiter l'invention malgré l'existence du brevet. http://www.wipo.int/wipolex/en/text.jsp?file_id=322949


[14] SZALEWSKI,J.Schmidt; PIERRE,J.L. Droit de la propriete industrielle,Paris:Litec, 1996, p.76


[15] PROCESSO : REsp 1096598 (2008/0234753-8 - 18/11/2009) UF: MG REGISTRO: 2008/0234753-8 AUTUAÇÃO : 15/10/2008 RECORRENTE : UAI - UNIÃO DE ARTEFATOS INDUSTRIAIS LTDA RECORRIDO : BRASILATA S/A EMBALAGENS METÁLICAS RELATOR(A) : Min. NANCY ANDRIGHI - TERCEIRA TURMA http://www.stj.gov.br


[16] APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.01.551112-4/002 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): ALOÍSIO RODRIGUES PEREIRA E OUTRO(A)(S) - APELADO(A)(S): AMBIENTE PROJETOS EXECUÇÃO LTDA - RELATOR: EXMO. SR. DES. TIAGO PINTO Data do Julgamento: 04/06/2009 Data da Publicação: 01/07/2009


[17] TJMG, 11ª Câmara Cível. Des. Marcelo Rodrigues, AC 1.0079.02.005256-3, DJ 20.01.12 cf. BARBOSA, Pedro Marcos Nunes. Direito Civil da propriedade intelectual: o caso da usucapião de patentes. Rio de Janeiro, Lumen Juris,2012, p.xxii


[18] TJMG, 11ª Câmara, Relator Des. Duarte de Paula, Julgamento 03/03/2010 Agravo de Instrumento 1.0471.08.108935-4/001


[19] Número: 70018549980 Inteiro Teor: doc html Tribunal: Tribunal de Justiça do RS Seção: CIVEL Tipo de Processo: Apelação Cível Órgão Julgador: Vigésima Câmara Cível Decisão: Acórdão Relator: Glênio José Wasserstein Hekman Comarca de Origem: Comarca de Passo Fundo Data de Julgamento: 20/06/2007 Publicação: Diário da Justiça do dia 05/07/2007


[20] Apelação Cível Número do processo: 70008380420 Comarca: Comarca de Getúlio Vargas Décima Quarta Câmara Cível Data de Julgamento: 13-05-2004 Relator: Rogerio Gesta Leal

[21] Di BLASI, Gabriel. A propriedade Industrial: os sistemas de marcas, patentes, desenhos industriais e transferência de tecnologia, Rio de Janeiro: Ed. Forense: 2010, p. 261.
 


[22] BINCTIN, Nicolas. Droit de la propriété intellectuelle, LGDJ:Paris, 2012, p.395; POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.328


[23] Paris, 18 fevereiro 1986, Anales 987, p.113; PIBD 1986, n.3995-III-264


[24] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.330

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Patente de método de animação 3D


Em McRo, Inc. v. Bandai Namco Games America (Fed. Cir. 2016) foi analisada a patenteabilidade de um método de animação em 3D que envolve a sincronização de personagens animados de modo que os lábios dos personagens se movem naturalmente. O estado da técnica realizava esta animação através de um processo morfológico que consumia bastante tempo além de ser impreciso. O método proposto em US6307576 é mais realístico ao descrever um conjunto de regras que vão além do que simplesmente sincronizar fonemas simples com imagens morfológicas, pois leva em consideração o contexto em que aquele fonema ocorre. Segundo a Corte: “quando olhamos a reivindicação como um todo, ela dirigida a um aperfiçoamento patenteável, tecnológico sob as técnicas de animação manuais em 3D [e portanto] não está direcionada a uma ideia abstrata”. [1]



[1] QUINN, Gene. More software patent eligible, Federal Circuit says lip synchronization not abstract, 14/09/2016 http://www.ipwatchdog.com/2016/09/14/software-patent-eligible-federal-circuit-lip-synchronization/id=72832/

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

A crítica de Mark Lemley ao first to file


Para Mark Lemley[1] a aprovação do American Inventor Act em 2011 que estabelece o conceito de first to file, estimula o inventor a depositar seu pedido de patente o quanto antes, o que traz como consequência que os pedidos tornam-se cada vez mais distantes de uma implementação prática, pois se o inventor atrasa seu depósito até o momento em que tiver realizado tal implementação, irá incorrer em risco de perder seu direito. Historicamente a Cortes destacaram tanto o aspecto de implementação pratica da invenção como o aspecto conceitual da invenção. Segundo a Suprema Corte em Seymour v. Osborne, 78 U.S. 516, 522 (1871) “experimentos grosseiros e imperfeitos não são suficientes para que se conceda uma patente, de modo a constituir uma invenção o depositante deve proceder a redução de sua ideia em prática (reduced his idea to practice) e incorporada em alguma forma distinta”. Isto não significava necessariamente a comercialização do invento, porém muitas vezes exigia  construção de um protótipo. Esta perspectiva, coexistiu com uma segunda visão que atribui a parte conceitual como a mais importante, presente por exemplo no tratado de patentes de Robinson de 1890.  A Suprema Corte em Pfaff v. Wells Elecs., 525 U.S. 55, 66 (1998) destaca que “o significado principal da palavra <invenção> na lei de patentes inquestionavelmente se refere à concepção do inventor ao invés da implementação física daquela ideia”. A lei de 1952 é um meio termos entre as duas perspectivas. A seção 102(g) estabelec que no caso de disputa entre dois inventores será declarado o primeiro inventor aquele que diligentemente trabalhou no sentido de implementar a invenção, ou seja, não se assume como critério a data de concepção (conception date) ou a data de redução á prática (reduction to practice) mas um meio termo entre estas duas datas.  O pedido de patente deve ser descrito de modo que o técnico no assunto possa implementar a invenção sem esforço indevido (enabling criteria) o que permite algum grau de abstração na descrição. Outro exemplo citado por Mark Lemley é a exlcusão “on sale bar” (seção 102 b)[2] que concede um período de graça de um ano para posterior depósito caso o inventor comercialize o produto propriamente dito. Caso apenas licencie sua ideia sem a produção propriamente dita do produto em questão, a este ato não se aplica a “on sale bar” esta data de licenciamento não é válida como data de invenção. Portanto o licenciamento da ideia não tem o benefício do período de graça. O Amaerican Inventor Act aumenta ainda mais a pressão para encorajar o depósito mais cedo do pedido quando adota o first to file: “enquanto a lei de 1952 não encorajava de modo suficiente a que o inventor implementasse sua invenção, o AIA não encoraja nada”.  Pela lei de 1952 o inventor tinha um ano após o uso público ou comercialização de sua invenção para depositar o pedido junto ao USPTO. Ainda não está claro na doutrina se este uso público inclui os testes expeeimentais do produto feito com a participação de terceiro. Mar Lemley apnta que tais usos possivelmente não terão o benefício do período de graça o que deixaria o inventor a descoberto uma vez que o direito é garantido ao primeiro que depositar. De qualquer forma enquanto que na lei de 1952 o período de graça era absoluto ou seja, a data de invenlão de fato retragia ao do uso público feito pelo inventor, para todos os efeitos, no AIA o período de graça não é absoluto pois se refer apenas aos usos públicos promovidos pelo inventor ou por terceiros com base em informações obtidas direta ou indiretamente do inventor.[3] Portanto, a divulgação independente feita por terceiros, mesmo tendo ocorrido após a divulgação do inventor, poderá ser usada contra a novidade do pedido depositada pelo inventor dentro de um ano do período de graça. Uma possibilidade para compensar essa desvantagem do sistema first to file seria exigir para a concessão da patente uma implementação prática, protótipo ou prova de comercialização. Adicionalmente as patentes não implementadas tem mais chances de se enquadrarem como trolls de patentes. No entanto, esta medida encontraria grande resistência por parte de universidades. Mark Lemley sugere uma medida intermediária, a de aumentar as exigências de suficiência descritiva, com a apresentação de mais exemplos de implementações práticas, especialmente nas reivindicações funcionais.  Outra medida para garantir direitos aos que implementam suas invenções antes de realizar o depósito seria o de expandir o direito de usuário anterior (prior user right) previsto no AIA de forma mitigada válida não apenas para o uso comercial mas ampliando sua abrangência para aquelas empresas que estão com uso experimental e que de boa fé tem esforços efetivos para redução da invenção à prática.
 
 



[1] LEMLEY, Mark. Ready for patenting, 2015, p. http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2613696
[2] A person shall be entitled to a patent unless the invention was patented or described in a printed publication in this or a foreign country or in public use or on sale in this country, more than one year prior to the date of the application for patent in the United States
[3] A disclosure made 1 year or less before the effective filing date of a claimed invention shall not be prior art to the claimed invention […]  if- the subject matter disclosed had, before such disclosure, been publicly disclosed by the inventor or a joint inventor or another who obtained the subject matter disclosed directly or indirectly from the inventor or a joint inventor

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Em defesa do hindsight


Glynn Lunney critica a abordagem de Gregory Mandel pois ela presume que a perspectiva foresight seja a correta, quando na verdade o parâmetro a ser usado deveria ser o risco social de se conceder uma patente para algo que invariavelmente seria desenvolvido naturalmente pelos concorrentes sem a necessidade uma patente. Para Glynn Lunney a conclusão de obviedade por parte do julgador irá depender fortemente de seu conhecimento: se for acima da média tenderá a concluir pela obviedade, ao passo que se seus conhecimentos forem abaixo da média tenderá a concluir pela não obviedade. Nesse sentido conhecer a solução final é útil para municiar o julgador de menos conhecimentos a tomar uma decisão socialmente justa.[1] Uma invenção que se mostra difícil, que requer tempo e pesquisa para sua realização, irá receber investimentos se puder contar com uma patente ao passo que para uma invenção fácil estes investimentos virão mesmo sem a patente. A patente será justificável socialmente dentro de uma perspectiva econômica no prmeior caso. Para Glynn Lunney esta expectativa do pesquisador deve ser feita após a invenção, pois se feita no início estará sujeito a erro de avaliação. A maximização social da utilidade do sistema de patentes portanto deve levar em conta uma análise com hindsight.[2] Glynn Lunney realizou uma terceira pesquisa, que denomina “partial hindsight”, que modifica uma mudança na pesquisa realizada por Gregory Mandel. Ao invés de apresentar a solução ao entrevistado, ele apresenta um conjunto de quatro possíveis soluções, sendo que três das quais não funcionam e apenas uma é a solução correta, de modo que o entrevistado sabe que há uma solução. Nesta nova pesquisa os resultados mostram pouca diferença para com a situação de foresight em que a solução final não é apresentada ao entrevistado. Para Glynn Lunney esta nova entrevista mostra que mais do que saber exatamente a solução final, o simples fato de saber que há uma solução já provoca uma modificação na resposta do entrevistado quando a obviedade da solução.  Em uma quarta pesquisa, que denomina “partial hindsight with engagement” Glynn Lunney pede ao entrevistado que escreva a possível solução ao problema antes de ser apresentado às quatro soluções. Neste caso observa-se modificações expressivas dos entrevistados quanto a obviedade de cada uma das quatro soluções apresentadas. Defrontados com a dificuldade prática de encontrar uma solução os entrevistados nesta quarta entrevista apresentaram conclusões em favor da inventividade das soluções propostas. Para Glynn Lunney apresentar a solução final ao entrevistado tem o benefício de corrigir deficiências de conhecimento técnico deste entrevistado e portanto contribui, mais do que prejudica, para uma solução socialmente ótima quanto á obviedade da solução.
 
Glynn Lunney Jr.
 



[1] LUNNEY Jr, Glynn; JOHNSON, Christian. Not So Obvious after All: Patent Law's Nonobviousness Requirement, KSR, and the Fear of Hindsight Bias, Texas A&M University School of Law, 2012, p.51
[2] LUNNEY,op.cit.p.93

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Xenofobia nos escritórios de patentes ?


Estudo de Quillen e Webster [1] mostra que no USPTO a média de deferimentos é de 85 % e no EPO de 65 %. Estatísticas do Trilateral Statistical Report de 2007 mostram que 51.4% das patentes que são examinadas na EPO, 48.9% no JPO e 48.7% no USPTO são deferidas [2]. O estudo de Cecil Quillen contudo observa que muitos dos pedidos rejeitados no USPTO reaparecem na forma de continuations de modo que o percentual de concessões fornece um falso quadro das invenções que de fato ao final do processo administrativo são concedidas. [3] Estudo de Dunlop mostra que a taxa de deferimento na EPO decresceu de 70% em 1996 para cerca de 52% em 2007. O autor atribui este decréscimo pela menor qualidade dos depósitos efetuados no período, maior rigor no exame de patentes pela EPO, aumento do backlog de pedidos que aguardam oral proceedings, um indicativo de maior rigor no exame. A presidente da EPO, Alice Brimelow destaca que “o propósito do sistema de patentes é apoiar a geração de benefícios econômicos para a sociedade. Contudo um grande número de patentes não necessariamente é um indicativo de crescimento da atividade de P&D do país. O que nós precisamos é ter certeza que as patentes concedidas são de fato relevantes” [4]. Dados de Posner e Landes mostram que a taxa de deferimentos no período 1965-2001 manteve-se em média em torno de 65% com fortes oscilações a cada ano. Os autores computam a taxa tomando-se em conta o número de concessões em um ano, divididos pelo número de depósitos observados dois anos antes, ao assumir um tempo médio de exame de dois anos fixo [5].

Paul Jensen mostra que das patentes concedidas no USPTO com família no Japão e EPO apenas 37.7% são concedidas na EPO e JPO[6] e apenas 0.6% dos pedidos foram rejeitados na EPO e JPO. Das cerca de 70 mil patentes concedidas no USPTO na amostra considerada, apenas 44.5% foi concedida no Japão, no entanto se considerarmo apenas os pedidos efetivamente examinados, desconsiderando pedidos arquivados e pendentes, temos que 75% dos pedidos decididos e examinados no JPO, tendo uma patente USPTO, acabam concedidos no JPO. Na EPO foram 72.5 % concedidos (considerando arquivados e pendentes) e cerca de 95% considerando apenas os efetivamente examinados e decididos na EPO. Este resultados variam conforme a área tecnológica. Outro aspecto identificado no estudo foi a variabilidade das decisões conforme a origem do pedido. No JPO pedidos examinados e concedidos no USPTO e EPO, sendo o pedido de origem no Japão a taxa de concessão de 70% ao passo que os pedidos de origem alemã 40%, US 45% e demais países 40%. Na EPO os pedidos concedidos no USPTO e JPO com origem na Alemanha tiveram taxa de concessão de 95% enquanto que os pedidos de origem do Japão 80% e Estados Unidos 75%. Paul Jensen conclui diante dos resultados que claramente indicam que JPO e EPO acabam favorecendo seus depositantes nacionais que “é tentador inferir que JPO e EPO estão simplesmente utilizando de patentes como um tipo estratégico de barreira comercial não tarifária. Contudo não podemos saber se isto é devido a fatores estratégicos ou se trata simplesmente de que os depositantes locais estão mais familiarizados com as idiossincrasias do sistema de patentes doméstico, por exemplo”.
 
Paul Jensen
 



[1] QUILLEN, Cecil; WEBSTER, Ogden H. Continuing Patent Applications and Performance of the U.S. Patent Office, Fed. Circ. Bar J., v. 11, n 1, ago. 2001, p. 1-21 apud SUEPO Working Paper. A Quality Strategy for the EPO. dec. 2002. http: //www.suepo.org/public/docs/2002/quality.pdf.
 
[2] ARUNDELA, Anthony; KABLA, Isabelle.What percentage of innovations are patented? empirical estimates for European firms. Research Policy, v.27, n. 2, jun 1998, p. 127-141; JAFFE, Adam; LERNER, Josh. Patent prescription: a radical cure for the ailing US Patent System. IEEE Spectrum, dez. 2004, p. 29. Trilateral Statistical Report 2007 Edition. http: //www.trilateral.net/statistics/tsr/2007/TSR.pdf.
[3] QUILLEN, Cecil; WEBSTER, Ogden H. Continuing Patent Applications and Performance of the U.S. Patent Office, Fed. Circ. Bar J., v. 11, n 1, ago. 2001, p. 1-21; QUILLEN, Cecil; WEBSTER, Ogden; EICHMANN, Richard. Continuing patent applications and performance of the US Patent and Trademark Office – Extended, Federal Circuit Bar Journal, 12, agosto 2002, p.35-55, cf. JAFFE, Adam; LERNER, Josh. Innovation and its discontents: how our broken patent system is endangering innovation and progress, and what to do about it. Princeton University Press, 2007, p. 2572/5128 (kindle version)
[4] RODRIGUEZ, Victor. The backlog issue in patents: a look at european case. World Patent Information, v. 32, 2010, p. 288.
 
[5] POSNER, Richard; LANDES, William. Economic Structure of Intellectual Property Law. Harvard University Press, 2003, p. 343.
 
[6] HENSEN, Jensen; et al. Disharmony in International Patent Office Decisions. The Federal Circuit Bar Journal v.15, n.4 2005, p.681