quarta-feira, 27 de abril de 2016

Interface com usuário ou método financeiro ?


Em Qualtrics, LLC v. OpinionLab[1], Inc. (PTAB 2016) foi analisada a patente US8041805 referente a um sistema porque um método de solicitação de feedback de usuários da internet com relação a uma página específica. Um ícone permite ao usuário entrar com informações sobre a reação a diversos aspectos da página. Uma escala de graduações é apresentada ao usuário para selecionar as opções do usuário para resposta permanecendo visível dentro da janela do browser do usuário. O PTAB conclui que a reivindicação não descreve um método financeiro ou transação monetária, ao contrário, descreve a capacidade de um software de utilidade geral que pode ser aplicada em diversos sites e não apenas sites financeiros. O método apresenta um ícone que possibilita o feedback do usuário sem a necessidade de se navegar por diferentes páginas, ou seja, aperfeiçoa as capacidades de interação com o site. [2]



[1] http://www.opinionlab.com/tour/
[2] http://www.patentdocs.org/2016/04/qualtrics-llc-v-opinionlab-inc-ptab-2016.html

domingo, 24 de abril de 2016

Divergência EPO e DPMA


Em 2013 a Corte Federal alemã não considerou como solução de um problema técnico um método de processamento de imagem de tal modo a conferir uma impressão natural da imagem quando comparada com a imagem original. O objetivo de automaticamente produzir uma representação tão atrativa quanto possível para um observador humano não constitui um problema técnico. [1] Da mesma forma um método de acesso de controle de dados ou programas para operar uma impressora que compreendem medidas a serem implementadas por sofwtare que se resumem as etepas de aquisição, processamento e armazenamento dos dados, sem que o método de controle da dita impresssora propriamente dito seja parte da matéria reivindicada.[2] Um método para destravar celulares pelo deslocamento de um elemento gráfico ao longo de um caminho pré definido foi considerada matéria não técnica tendo em vista já serem conhecidos do estado da técnica técnicas de destravamento por um movimento de deslocamento ainda que sem um caminho pré definido; “a sinalização do curso de procedimento de deslocamento pelo deslocamento de um elemento de imagem é direcionado unicamente ao usuário sem que se constitua um porblema técnico de qualquer forma”, tratando-se apenas de uma informação visual.[3] Comandos e dados de entrada em veículos motorizados usando menus em um monitor por meio de comandos de voz também foram entendidos como sem efeito técnico, pois a ênfase se encontra em como o usuário percebe este tipo particular de representação, isto é, trata-se de uma questão de projeto de adaptação às necessidades e habilidades do operador[4] Em agosto de 2015 a  Bundesgerichtshof (Federal Court of Justice) confirmou[5] o entendimento da Federal Patent Court de abril de 2013 de que a patente alemã relativa a EP1964022 (DE112006003515) depositada pela Apple é inválida. A patente descreve o método gestual com os dedos para desbloquear o iPhone conhecido como “slide to unlock”. A Corte entendeu que não havia atividade inventiva diante de anterioridade patenteada pela empresa sueca Neonode. O mesmo entendimento teve a Corte Distrital de Haia (Joined Cases 396957 / KG ZA 11-730 and 396959 / KG ZA 11-731) a Corte de Apelações na Inglaterra (HTC Europe Co Ltd v Apple Inc. [2013] EWCA Civ 451) muito embora a patente nos Estados Unidos continue válida (US7657849, US8046721, US8209637, US8286103, US8527903, US8627237, US8640057, US8694923, US8745544). Embora este depósito PCT (WO2007076210) tenha depósitos em diversos países como Austria, Austrália, China, Alemanha, Espanha, Japão, Coreia e Hong Kong, não há registro de depósito no Brasil.

Na Alemanha o BGH em X ZR 11/13 declarou a patente de slide to unlock da Apple como inválida por falta de atividade inventiva.[6] O BGH considerou, contudo, que a apresentação de uma notificação de acordo com o movimento do dedod era uma contribuição técnica a solução de um problema técnico. O movimento com o dedo não somente ativa o dispositivo como notifica a sinalização do comando e sua continuação, o que representa uma contribuição técnica de modo que o processo de ativação se torna visualmente reconhecível ao usuário. A característica de proporcionar um retrono ao usuário através da imagem de destravamaneto que se forma ao mover o dedo segundo um percurso pré determinado produz um efeito apenas na mente humana e não é técnico. Marc Schweizer aponta esta decisão do BGH como divergindo do critério adotado pela EPO para o qual características reivindicadas que representem conteúdo que afete o cognição humana não são considerados técnicos ao levar em conta características psicológicas da percepção humana, enquanto que para o DPMA em alguns casos tais características psicológicas da percepção humana podem vir a ser consideradas patenteáveis.
 
 





[1] Federal Patent Court, ruling dated 9 July 2013 – 17 W (pat) 82/09


[2] Federal Patent Court, ruling dated 31 July 2013 – 9 W (pat) 29/09.


[3] Federal Patent Court, decision dated 4 April 2013 – 2 Ni 59/11 (EP) together with 2 Ni 64/11 (EP).


[4] Federal Patent Court, ruling dated 18 April 2013 – 17 W (pat) 124/08.


[5] Apple’s European slide-to-unlock patent declared invalid in Germany, 06/09/2015 http://ipkitten.blogspot.co.uk/2015/09/apples-european-slide-to-unlock-patent.html


[6] http://ipkitten.blogspot.com.br/2016/04/patentability-of-user-interface-designs_21.html

Apresentação de Informações na EPO


Segundo o guia de exame da EPO o mero envolvimento de etapas mentais não significa que a matéria seja considerada não técnica (T643/00). Na EPO em T643/00 a Corte afirmou que uma disposição de items de um menu na tela pode envolver considerações técnicas, ao permitir o usuário gerenciar tarefas técnicas, tais como a busca e recuperação de imagens armazenadas em um aparelho de processamento de imagens de um modo mais eficiente ou mais rápido ainda que uma avaliação mental por parte do usuário possa estar envolvida. A apresentação simultânea de oito imagens em resolução reduzida garante ao usuário a possibilidade de compreender todas as imagens com uma única observada e selecionar a imagem desejada de modo rápido e eficiente. O fato do processo de seleção ser executado de forma automático ou com ajuda de uma interação humana não foi considerado decisivo para a conclusão. Embora tal avaliação per se não se enquadre no conceito de invenção pelo Artigo 52 EPC 1973, o mero fato de atividades mentais estarem envolvidas não necessariamente qualificam a matéria como não técnica, uma vez que qualquer solução técnica no fim tem como objetivo proporcionar ferramentas que possam assistir ou mesmo substituir atividades humanas de difentes tipos, incluindo etapas mentais.[1]
Uma indicação visual de um evento detectado automaticamente como um indicativo para interação humana com o sistema, por exemplo, para se evitar mal funcionamento do sistema, é usualmente considerado como uma contribuição técnica. Por outro lado, uma apresentação visual que tenha como objetivo exclusivamente uma etapa mental para o usuário, em especial a preparação do dado relevante para m processo de decisão não técnico por parte do usuário geralmente não é considerado como representando uma contribuição técnica (T756/06). Em T1567/05 um programa para modelagem de edifícios em que a carga de cada elemento da estrutura é apresentada usando cores foi considerado como a mero conteúdos de informação direcionados exclusivamente para a mente humana, ainda que relacionados a um fenômeno técnico, e, portanto, não representa uma solução considerada técnica. Em T756/06 a Câmara de Recursos conclui que um diagrama que represente com mais linhas as horas trabalhadas do que as horas não trabalhadas tem um como objetivo um aspecto menta do usuário ao invés de um propósito técnico. O depositante alegou que a solução leva em conta o tamanho do visor e nesse sentido leva em conta aspectos técnicos, no entanto como não havia explicitamente esta relação entre as escalas apresentadas e o tamanho do visor na reivindicação tal aspecto não modificou a conclusão de que não a reivindicação se tratava de matéria técnica. [2]


[1] Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition July 2010, p. 193 http://www.epo.org/law-practice/case-law-appeals/case-law.html
[2] SCHWEIZER, Mark. Patentability of user interface designs - Part 1 of 2: the EPO approach, 20/04/2016 http://ipkitten.blogspot.com.br/2016/04/patentability-of-user-interface-designs.html

sábado, 23 de abril de 2016

Patente da vacina contra a peste da manqueira

Em 1906, Alcides Godoy, cientista do Instituto Oswaldo Cruz, descobriu a primeira vacina veterinária do país para profilaxia de doenças infecto-contagiosas: a vacina contra o carbúnculo sintomático, mais conhecido como Peste da Manqueira. Em 1918 em conjunto com outro pesquisador da Fiocruz, Astrogildo Machado, Godoy descobriu a vacina anticarbunculosa, contra o carbúnculo hemático, também conhecida como carbúnculo verdadeiro (ou antraz). Tem havido confusão entre o Carbúnculo Sintomático (Manqueira, Mal do Ano) e o Carbúnculo Hemático ou verdadeiro (Carbúnculo, Antraz). A primeira vacina foi a "Vacina contra a Manqueira" ou seja contra o Carbunculo Sintomático. A Vacina contra o Antraz,"Vacina Anticarbunculo, Manguinhos", foi desenvolvida cerca de 10 anos depois por Alcides Godoy e Astrogildo Machado que então trabalhava no Laboratório de Godoy no Instituto Oswaldo Cruz. As duas vacinas foram patenteadas a primeira por A.Godoy em 1908 (patente no 5566) e a segunda por A.Godoy e A.Machado em 1918 registro no 9981.
O desenvolvimento desta vacina da peste manqueira partiu de uma solicitação dos pecuaristas de Minas Gerais, onde a peste da manqueira dizimava aproximadamente 40%, às vezes até 80% dos bezerros. A epizootia era muito comum também em outros estados do Brasil e em vários países da América do Sul. Em Minas ela já fora estudada por J. Batista de Lacerda, que chegou a preparar uma vacina contra a doença, com resultados insatisfatórios. Oswaldo Cruz, que qualificou estes estudos como pouco sérios do ponto de vista bacteriológico, entregou a incumbência primeiro a Ezequiel Dias e Rocha Lima, depois a Alcides Godoy. A originalidade do processo de Godoy residia na utilização de um meio de cultura especial para bactérias anaeróbicas, na qual a glicose tinha um papel preponderante. Com esse meio de cultura, obteve uma raça diferenciada de bactérias de virulência atenuada, o que permitiu o uso da vacina com o germe vivo (Clastridium Chauvei). Basta uma injeção de dois centímetros cúbicos para imunizar o animal durante toda a vida. Geralmente aplica-se a vacina em bezerros, nos primeiros anos, pois o animal que atinge à idade adulta, num meio infectado,está naturalmente imunizado. Logo que foram confirmadas as propriedades vacinantes das culturas de Godoy, ele partiu para Juiz de Fora, com Rocha Lima e Carlos Chagas, para executar as experiências finais, e só então a vacina começou a ser fabricada em escala comercial.
Após a descoberta das vacinas em 1906 e os registros das respectivas patentes em nome dos cientistas fundadores de Manguinhos, elas passaram a ser fabricadas no Instituto Oswaldo Cruz - Manguinhos, atual Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e exploradas comercialmente pelos próprios cientistas até que, em 1939, resolveram fundar a empresa Produtos Veterinários Manguinhos Ltda, continuando a trabalhar no IOC até falecerem, respectivamente em 1950 e 1945. A firma Produtos Veterinários Manguinhos foi criada e continuou a produção das vacinas até então produzidas no IOC. A vacina contra a manqueira começou a ser distribuída e vendida já em 1906. Ela imunizava o gado com uma só aplicação. Na exposição de demografia e higiene realizada de Berlim, em junho de 1907, na qual o Instituto obteve a medalha de ouro, a vacina da manqueira foi um dos destaques selecionados, dentre os produtos fabricados para representar as atividades do IOC. A premiação em Berlim foi determinante para que o Ministério da Justiça e Negócios Interiores aprovasse um novo regulamento, proposto por Oswaldo Cruz, visando expandir de modo expressivo as atribuições do Instituto, que passaria a gozar de considerável autonomia administrativa e financeira, sendo esta última garantida, principalmente, pela renda advinda da venda da vacina na manqueira. Tais recursos, que permitiam ao Instituto não depender apenas do orçamento governamental, foram fundamentais para contratar novos pesquisadores e, assim, ampliar o quadro de pessoal da instituição. O próprio Oswaldo Cruz, em função da repercussão e da originalidade do processo desenvolvido por Godoy, aconselhou-o a patentear em seu nome a invenção.
Depois de registrar a patente da vacina, em 24 de novembro de 1908, (Carta patente n 5.566, publicada no Diário Oficial de 6 de dezembro de 1908), Godoy lavrou em cartório uma escritura de cessão, lavrada no Tabelião Evaristo Vale de barros, em 11.12.1908, transferindo sua invenção para o Instituto Oswaldo Cruz, na condição de reverter em favor de suas atividades científicas a exploração industrial do produto, sob pena de ficar sem efeito a concessão. Por entendimento verbal entre Oswaldo Cruz e Godoy, ficou estabelecido que o descobridor teria direito a 5% da renda bruta da vacina até 1917, e daí em diante, 8%. Esse artifício hábil consolidou a autonomia de Manguinhos, permitindo-lhe gerir esses recursos, que seriam consideráveis, sem ter de se submeter à burocracia do Ministério da Justiça ou às rígidas determinações que presidiam a aplicação das verbas votadas pelo Congresso. Por outro lado, o estratagema criava, digamos assim, jurisprudência para um tipo de relação privativista entre a instituição e seus pesquisadores, estimulados a inventar e patentear outros produtos biológicos. Segundo depoimento de Arthur Neiva: “dos milhares e milhares de contos de réis que as vacinas preparadas em Manguinhos renderam os descobridores preservaram para si módica percentagem, abrindo mão da quase totalidade em favor de Manguinhos”.[1] Carlos Chagas retrucava aos críticos que consideravam imoral facultar a seus técnicos o direto de solicitar patentes e auferir parte da renda gerada: “A descoberta de produtos novos representa a resultante do esforço ou d capacidade profissional e merece ser recompensada. Alegam os contraditores dessa prática que os tais descobrimentos são realizados com material do estado, e que os descobridores são pagos para realizar descobertas. À primeira objeção cabe a resposta de que não é o microscópio e nem o tubo de cultura que fazem as descobertas E quanto á outra alegação, eu devo afirmar que entre as atribuições dos funcionários deste Instituto não figura a obrigação de fazer descobertas. Seja como for, o certo é que devemos a tais normas uma grande parte do desenvolvimento científico do Instituto”.[2] Entre estes críticos se encontrava o próprio Arthur Neiva que alegava que o modelo de partição de lucros da patente da manquiera fomentou uma ambição nos demais pesquisadores em detrimento da pesquisa básica: “Esta foi a origem principal da decadência de Manguinhos. Vários técnicos do Instituo atualmente empregam toda sua atividade no preparo de vacinas, soros, produtos quimioterápiocos, que, revestidos no nome prestigioso do Instituto onde foram preparados, possam dar uma fonte de renda avultada a seus manipuladores. Todos o ideal de pesquisa cisntífica desinteressada já despareceu quase que pela totalidade dos assistentes, e os que não se sentem com pertinácia para preparar soros e vacinas procuram fundar na cidade laboratórios de pesquisas onde possam encontrar uma condição material melhor do que a que lhes é oferecida pelos pequenos honorários que recebem”.[3]
Segundo Simon Schwartzman: "Os recursos para financiar boa parte dessas pesquisas vinham não do custeio do Instituto pelo governo federal, mas do que ficou conhecido como a “verba da manqueira”. Em 1908 Alcides Godói e José Gomes de Faria desenvolveram uma vacina muito eficaz contra a “manqueira”, uma doença que afetava o gado brasileiro. Doaram ao Instituto a patente dessa vacina, e os lucros com a venda da vacina serviam agora para equipar laboratórios, pagar novos pesquisadores e financiar as viagens dos técnicos pelo Brasil ou aos países vizinhos, em busca de novos problemas e novas soluções”. A famosa verba da manqueira, contabilizada à parte, teve importância vital na sustentação do Instituto Oswaldo Cruz, sobretudo nas conjunturas recessivas do país, com ela foram pagos os salários de muitos pesquisadores e funcionários, parte das despesas com as novas construções, a impressão das Memórias e uma infinidade de outros itens. Devido à importância dessa fonte de recursos, o Instituto empenhou-se a fundo em disseminar o uso da vacina nas zonas pastoris do Brasil. Grande parte dos fornecimentos fazia-se por intermédio do Ministério da Agricultura e outros órgãos públicos estaduais ou municipais. Basta salientar, que, entre outras rendas arrecadadas pelo Instituto, predominava a da manqueira, pela qual foi custeada a maioria das despesas do pessoal contratado e de material até 1930, além da despesa total do Instituto nos anos de 1931 e 1932, na importância média de Cr$ 880 mil anuais, em virtude de ter havido corte orçamentário nos ditos anos. Tendo o governo concedido apenas Cr$ 30 mil para material em 1933 e Cr$ 30 mil para 1934, foi a citada renda um fator preponderante para a manutenção dos encargos do Instituto.
A experiência da vacina da peste manqueira foi pontuada por conflitos políticos e gerenciais. Nara Britto, a partir de depoimento oral de Lobato Paraense, esclarece que as discussões em torno desta vacina originaram divergências, gerando três posições sobre a aplicação dos lucros auferidos com a comercialização do produto. Oswaldo Cruz decidiu destinar os royalties da vacina aos inventores. Uma vertente apoiou a medida tomada por Oswaldo Cruz. Outro grupo pensava em aplicar as verbas em compra de materiais laboratoriais. Um terceiro grupo defendeu a distribuição eqüitativa dos lucros entre os pesquisadores, como forma de acréscimo salarial. Questionou-se também a “legitimidade de propriedade de um produto desenvolvido numa instituição pública”. Em relatório do Instituto Oswaldo Cruz, de 14 de fevereiro de 1912, Oswaldo Cruz tece comentários generosos em relação à atitude de desprendimento de Godoy, posto que este havia cedido a titularidade da vacina ao Instituto. Godoy condicionou a cessão à aplicação das verbas em atividades de aquisição de livros e de publicação da revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, conforme Relatório do Instituto Oswaldo Cruz, de 1911 (Britto, 1995). A patente da vacina foi registrada em 24 de novembro de 1908 (cartapatente no 5.566, publicada no Diário Oficial, de 6 de dezembro de 1908), e lavrada pelo tabelião Evaristo Vale de Barros, em 11 de dezembro de 1908. O termo de cessão foi registrado em 24 de março de 1909, no livro 5, fl.132, do registro geral de privilégios, da Diretoria Geral de Indústria (Ministério da Viação e Obras Públicas). O não cumprimento das condições supracitadas invalidaria a cessão. Entendimento verbal entre Oswaldo Cruz e Alcides Godoy possibilitou o remanejamento, em favor do inventor, de 5% da renda bruta da vacina até 1917, e daí em diante, 8% (Benchimol, 1990). No regulamento de 1918 previa que "os produtos biológicos, quimioterápicos, etc, que representem descobertas de funcionários técnicos do Instituto e dos quais tiverem sido obtidas patetes de invenção, poderão ser fabricados e vendidos pelo Instituto, mediante acordo com os respectivos descobridores".
A vacina contra a peste manqueira, que atingia o gado, foi o segundo produto que obteve no Brasil a renovação da Patente, fato só obtido anteriormente pelo Formicida Matarazzo. A patente da vacina manqueira foi prorrogada pelo Decreto nº 16.200 de 31 de outubro de 1923 que prorrogou por 15 anos o prazo do privilégio de que trata a Carta de Patente de invenção, nº 5.566 de 24 de novembro 1908, que em seu artigo primeiro estabelece: “Fica prorrogado por 15 anos o prazo do privilégio a que se refere a Carta Patente n. 5.566, de 24 de novembro de 1908, concedida ao Dr. Alcides Godoy e transferida ao Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos (Instituto Oswaldo Cruz), em 24 de março de 1909, para invenção de uma nova vacina contra o carbúnculo sintomático (peste da manqueira)”
Em 1937, como conseqüência da reforma implementada por Gustavo Capanema no Ministério da Educação e Saúde (criado em 1930, no âmbito da Revolução de 1930), foi vedada ao IOC a fabricação e comercialização desse e outros produtos veterinários. Em 26 de junho de 1938, Godoy e Machado pediram o registro da marca genérica para produtos veterinários Manguinhos. Suas famílias fundaram em 25 de janeiro de 1939, uma firma que se chamou Produtos Veterinários Manguinhos Ltda, para fabricar e comercializar a vacina da manqueira, do carbúnculo hemático, e posteriomente a vacina contra a pneumoenterite dos porcos. O primeiro lugar em que estabeleceram o laboratório foi em prédio nos fundos do Hospital Gaffrée Guinle, na Rua Silva Ramos 20. Tiveram por muitos anos escritório na Rua Uruguaiana 33. Na década de 40 construíram um laboratório na Rua Licinio Cardoso 91 (hoje Rua Francisco Manuel), em Benfica. Godoy casou-se com Dulce Leite de Castro em 5 setembro de 1923 e tiveram dois filhos: Oswaldo Tarcisio, que veio a se formar em Química Industrial e Engenharia Química e Margarida Maria, que estudou musica, tocava piano e estudou na Europa. Faleceu em 30 de janeiro de 1950, aos 70 anos. Na década de 60 a família Godoy saiu da sociedade, que ficou com a família de Machado. A firma, que continua a fabricar a vacina da manqueira, foi vendida recentemente pelos seus descendentes e pertence hoje à empresa Bravet.
 
 
Alcides Godoy
 



[1] BENCHIMOL, Jaime; TEIXEIRA, Luiz Antonio. Cobras, lagartos & outros bichos, UFRJ, 1993, p.209
[2] BENCHIMOL, Jaime; TEIXEIRA, Luiz Antonio. Cobras, lagartos & outros bichos, UFRJ, 1993, p.189
[3] BENCHIMOL, Jaime; TEIXEIRA, Luiz Antonio. Cobras, lagartos & outros bichos, UFRJ, 1993, p.145

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Tomates e brócolis


Em junho de 2013 a EPO concedeu a patente EP1597965 para a empresa Monsanto para o brócolis derivado do melhoramento convencional, derivadas de cruzamentos e seleção natural. A patente abrange a planta, as sementes e a cabeça de brócolis cortada. O grupo “Não às patentes de sementes” que inclui entidades da Europa tais como o Greenpeace estão solicitando uma revisão da lei de patentes européia para exclusão de patenteabilidade do material de reprodução das plantas e animais e os alimentso derivados dos mesmos. [1] O Enlarged Boards of Appeal G2/12 (Brocoli II) e G2/13 (Tomato II) sobre patentes de produto para brócolis e tomate modificados, concluiu que se o produto é novo, não importa se o processo para sua fabricação é excluído como essencialmente biológico.[2] Tomates modificados, por exemplo, foram desenvolvidos na década de 1970 na Universidade da California que garantem um produto mais robusto que permite o uso de colheitadeiras especiais que desta forma conseguem colher os tomates em uma só passada por canteiros dispostos em linha reta cortando as plantas e balançando os galhos para soltar os frutos. [3] Em T915/10 a Câmara de Recursos considerou que um método para produção de soja tolerante ao herbicida glifosato pela introdução de uma sequência de DNA no genoma da planta por engenharia genética não podria ser entendido como um método de melhoramento de plantas e tampouco definem seja explícita ou implicitamente um método de mistura de genes pr cruzamento sexual e subsequente seleção. Desta forma para a Câmara de Recursos está claro que o método é realizado por engenharia genética ao invés de técnicas convencionais de melhorameno de plantas, podendo, portanto, ser patenteável.[4]

Em 2000 o Ministério da Agricultura de Israel patenteou um tipo de tomate com pouco teor de água, apropriado para a produção industrial, o que reduz os custos de produção de ketchup. A patente dos tomates não envolve marcadores moleculares nem qualquer técnica de engenharia genética. O método consiste, basicamente, em promover cruzamentos de uma variedade de tomate que naturalmente produz pouca água com outra selvagem para obter a variedade que já nasce com teor hídrico ainda menor. Como uma das etapas envolve intervenção humana o governo de Israel alega que o pedido não descreve um processo essencialmente biológico.

O julgamento foi acompanhado por manifestantes do Greenpeace da Alemanha, que montou um estande de frutas e verduras já patenteadas em frente ao edifício do EPO, "caso patentes como brócolis e tomate não sejam proibidas, então não haverá mais limites", explicou o especialista da organização Christoph Then.[5] O grupo alemão "No patents on seeds" publicou documento[6] em que apresenta exemplos de patentes concedidas para melhoramentos convencionais na Europa, posicionando-se contrário a tais patentes que uma vez concedidas poderiam patentes aumentar a concentração no mercado agrícola e elevar os preços dos produtos.[7]
 
 



[1] http://operamundi.uol.com.br/conteudo/babel/30049/monsanto+consigue+la+patente+del+brocoli.shtml http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI340723-17770,00-MONSANTO+CONSEGUE+A+PATENTE+DO+BROCOLIS.html
[2] http://www.wipo.int/edocs/mdocs/scp/en/scp_15/scp_15_3-annex3.pdf
[3] MARQUES, Ivan. O Brasil e a abertura dos mercados : o trabalho em questão, Rio de  Janeiro:Contraponto, 2002, p.27
[4] LUCAS, George. Putting ‘Broccoli’ into practice, 18/04/2016 www.lexology.com
[5] http://www.dw-world.de/dw/article/0,,5821016,00.html
[6] http://www.no-patents-on-seeds.org/
[7] JC e-mail 4091, de 08 de Setembro de 2010. "A guerra do brócolis" na Europa, Guilherme Gorgulho, do Inovação Unicamp, 6/9

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Genetic Technologies v. Merial


Em Genetic Technologies v. Merial (Fed. Cir. 2016) foi analisada a patente US5612179 referente a método para detecção de pelo menos um alelo de um locus genético de alelos múltiplos compreendendo a amplificação do DNA genômico com um primeiro par que expande a região da sequência não codificada para produzir uma sequência característica amplificada do DNA do dito alelo e analisar esta sequência de DNA amplificada para se detectar o dito alelo. Os alelos são as formas alternativas de um mesmo gene. Os alelos múltiplos são resultados de mutações sucessivas ocorridas nos genes de um determinado locus. O Federal Circuit destacou que a invenção trata de um fenômeno genético de que determinadas regiões do genoma pode, em alguns indivíduos, ser herdadas em uma frequência mais elevada do que seria esperada de forma aleatória. A reivindicação é direcionada a uma relação entre sequências codificadas e não codificadas em uma relação desequilibrada e a tendência de tais sequências de DNA não codificadas serem representativas das sequências codificadas, ou seja, uma lei da natureza. A reivindicação não se limita a detectar um alelo particular ligado a uma sequência não codificada particular, mas ao contrário, abrange todas as aplicações. Segundo o Federal Circuit o método descreve uma informação sobre a composição genética do paciente que dependem da existência de um desequilíbrio genético, uma lei natural, o que aproxima muito a invenção da descrita em Mayo pela Suprema Corte. O Federal Circuit comparou o método de diagnóstico proposto ao previsto em Ariosa v. Sequenom. Segundo o Federal Circuit a limitação para se detectar o alelo meramente solicita o usuário a comprar a sequência não codificada que ele amplificou e analisa-la com uma biblioteca de sequências não codificadas conhecidas para estar em desequilíbrio com certas regiões codificadas de alelos. Esta simples comparação não é inventiva suficiente para tornar a invenção patenteável, ao contrário, parece uma operação convencional.[1]



[1] http://www.patentdocs.org/2016/04/genetic-technologies-ltd-v-merial-llc-fed-cir-2016.html

quinta-feira, 7 de abril de 2016

A EPC2000 e a fórmula suíça

Em 2014 T1780/12 conclui que uma reivindicação na fórmula Suíça (Uso de X na fabricação de um medicamento para tratar Y) não se refere a mesma matéria que uma reivindicação de “X para uso em um método para tratar Y”, conforme a forma definida na EPC 2000 de 2007. Um depositante poderia, portanto, ter duas patentes protegendo cada qual uma destas reivindicações que não estaria incorrendo em dupla proteção. O caso discutiu a patente EP1 relativa ao uso de anticorpos de aminofosfolipídeos para o tratamento de câncer. A primeira patente reivindica na forma Suíça o uso de X para a fabricação de um medicamento para o tratamento de Y. O pedido dividido após a entrada em vigor da EPC2000, que permite reivindicação na forma de produto para determinado uso, reivindica X para uso no tratamento de Y. O Boards of Appel considerou que o duplo patenteamento envolve dois aspectos: a categoria da reivindicação e suas características. Referindo-se a T1391/07 a Corte entendeu que a dupla porteção ocorre apenas quando ambas as patentes possuem o mesmo escopo de proteção mas não quando seus escopos se superpõe apenas parcialmente. A primeira patente trata de uma reivindicação de processo, limitado a uma aplicação específica enquanto que a patente do pedido dividido trata de reivindicação de produto limitado a uma aplicação específica. É reconhecido que a reivindicação de processo tenha escopo menor que uma reivindicação de produto e portanto não há dupla proteção. [1]
Entre 2007 e 2010 quando G 2/08 OJ 2010 decidiu pelo fim das reivindicações na fórmula Suíça (Uso de X na fabricação de medicamento para tratar Y) as duas formas de reivindicações foram permitidas. A fórmula suíça deixou de ser aceita para pedidos depositados três meses após a data de publicação da decisão G2/08 no Official Journal em 19 de fevereiro de 2010[2]. T250/05 em 2008 concluíra que a tentativa de converter uma reivindicação na fórmula Suíça na forma de 2007 significaria aumento indevido do escopo de proteção e portanto indevido em oposições (após a concessão da patente).G 2/08 da mesma forma entendeu que os direitos conferidos por uma patente de uso médico na forma da EPC20000 de 2007 seriam mais amplas que aqueles conferidos por uma reivindicação na fórmula Suíça. T1780/12 reivindica na fórmula Suíça uso de uma composição X na fabricação de medicamento para tratamento de câncer. A Corte conclui ser uma reivindicação de escopo limitado e portanto distinta de uma reivindicação na forma EPC 2000 de 2007 que trata de produto de uso limitado.
Na fórmula suíça temos por exemplo “uso de um medicamento X na fabricação de um medicamento para o tratamento da doença Y” enquanto que na forma da EPC2000 temos “medicamento X para o tratamento da doença Y’. T1780/12 conclui que estas duas formas não são sinônimas e não é aceitável uma emenda de um pedido de uma forma para outra. Para a juíza Rian Kalden da Corte de apelações de Haia a reivindicação na fórmula suíça é uma ficção legal. O método de fabricação não tem novidade a invenção de fato reside no novo uso. A forma da EPC2000 não alterou nada,  pois define uma  reivindicação de produto de propósito limitado. Em T1780/12 a Câmara de Recursos conclui tratarem-se de reivindicações diferentes ao qual não caberia o argumento de dupla proteção alegado pela divisão de exame: “é geralmente aceito como um princípio da EPC que uma reivindicação de uma atividade física articular (por exemplo método, processo ou uso) confere menos proteção do que uma reivindicação para a entidade física per se, tal como decide G2/88. Disto segue que uma reivindicação de processo limitado a um próposito espec[ifico também confere menos proteção do que uma reivindicação de produto limitado a um propósito específoc coom a reivindicação do tipo EPC2000. Desta forma o escopo de proteção da patente do pedido dividido é distinta da patente original”. Segundo a nota preparatória MR/18/00 da EPC2000 o novo artigo 54(5) permite a proteção de produto para cada novo uso médico de uma substância conhecida de modo que a proteção é equivalente aquelea oferecida or uma reivindicação na fórmula suíça. A proteção não é ampla, ela se limita aquela aplicação específica. [3]
 
juíza Rian Kalden
 



[1] WP THMPSON, New from Abroad: Double Patenting at the EPO -- What Does "Same Subject Matter" Mean? 18/06/2014 http://www.patentdocs.org/2014/06/new-from-abroad-double-patenting-at-the-epo-what-does-same-subject-matter-mean.html
[2] Catalogue of remaining differences 2012 update of the CDP 2011, IP5 Offices, p. 82http://www.jpo.go.jp/torikumi/kokusai/kokusai2/pdf/jitsumu_catalog/en.pdf
[3] WARD, Annsley Merelle. Fordham 2016: Will purposive construction of Swiss-type claims save second-medical use patents? 05/04/2016 http://ipkitten.blogspot.com.br/2016/04/fordham-2016-will-purposive.html

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Motorola Mobility v. Intellectual Ventures (PTAB, 2016)


Em Motorola Mobility v. Intellectual Ventures (PTAB, 2016) foi analisada a patente US6658464 referente a um produto de software que inclui processador que controla o transporte, armazenamento e apresentação de conteúdo de editores a partir de uma fonte remota através de uma rede não proprietária. A titular da patente alegou que não há qualquer referência na reivindicação a qualquer serviço financeiro. O PTAB, contudo, observou que não é necessária uma referência expllícita de um porduto ou serviço financeiro para enquadramento dentor do CBM. O relatório descritivo, por sua vez, faz referência a sistemas de planejamento financeiro. A reivindicação faz referência a tecnologia conhecida do estado da técnica tais como processador, meios de armazenamento e comunicação. Para o PTAB a patente não decreve necessariamente um problema baseado em tecnologia de computadores, uma vez que a reivindicações é dirigida para a ideia da distribuição de conteúdo, que tem uma longa prática comercial de modo que a reivindicação está direcionada para um conceito abstrato. A reivindicação faz uma descrição genérica de como os componentes executam instruções. De certa forma, a reivindicação limita a ideia abstrar a um ambiente tecnológico particular, mas isto apenas não é suficiente paara garanir a presença de um conceito inventivo uma vez que não se observa qualquer aperfeiloamento do computador propriamente dito ou qualquer aperfeiçoamento em outro campo técnico, ou seja, o PTAB aplica o critério de machine or transformation. [1]
 



[1] HERNDON, Joseph. After Multiple CBM Petitions, Motorola Invalidates Software Patent, 31/03/2016 http://www.patentdocs.org/2016/04/motorola-mobility-llc-v-intellectual-ventures-i-llc-ptab-2016.html