quinta-feira, 21 de maio de 2020

Artigo 44 da LPI torna supérfluo o parágrafo único do Artigo 40 da LPI ?

Na discussão sobre a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 40 da LPI na ADIN5529 é invocado o argumento de que o artigo 44 da LPI quando garante o direito à indenização mesmo ainda quando do pedido de patente constitui uma salvaguarda ao titular de modo que o mesmo já tem seus direitos de exclusão exercidos mesmo antes da concessão da patente de modo que não haveria qualquer sentido em estender a vigência da patente além dos vinte anos por conta de atrasos na concessão por parte do INPI: "A indeterminação do prazo de vigência da exploração exclusiva de invento industrial traz consequências negativas aos direitos sociais, entre eles O direito à saúde e à alimentação, pois cria Obstáculos ao desenvolvimento de novas tecnologias baseadas na invenção inscrita no INPI. Por mais que a patente ainda não tenha sido concedida, O art. 44 da LPI inibe a atuação da indústria, pois assegura ao titular da patente “direito de obter indenização pela exploração indevida de seu objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a da concessão da patente”.

O parágrafo único do artigo 40 não constava do projeto de lei do executivo encaminhado ao Congresso Nacional tendo sido proposto sob sugestão da ABPI no substitutivo do Relator, deputado Ney Lopes. O Código de Propriedade Industrial de 1967 em seu artigo 25 também previa contagem diferenciada da vigência ora contado do depósito, ora contado da concessão nos casos de demora no exame, de modo que não se trata de uma inovação da LPI. Nos Códigos de 1945 e 1969  a patente era concedida por 15 anos contados da concessão da patente. O presidente Thedim Lobo se queixava que chegou a assinar patentes com 42 anos de vigência: "No mundo  de hoje, no mundo moderno,  em que a tecnologia  muda rapidamente, em que o mundo se desenvolve de um modo surpreendente não é de interesse de nenhum país que esse privilégio seja alongado por um período tão grande". Nos Anais do Congresso da Comissão Especial que apreciou o Projeto de Lei que deu origem ao CPI de 1971 consta testemunho do advogado Thomaz Leonardos define tais patentes como "verdadeiras gestações de elefantes ou dinossauros" [DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito Industrial - Patentes, Rio de Janeiro:Forense, 1080, p. 273; DOMINGUES, Douglas Gabriel. Comentários à LPI, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 155). 

De fato no cálculo das indenizações por contrafação os valores aplicados não fazem qualquer distinção entre o período antes da concessão da patente e o após a concessão da patente. Entretanto ainda assim o artigo 44 da LPI, embora atenue as perdas do titular diante diante do atraso excessivo na concessão da patente, ainda assim parece não ser suficiente segundo entendimento do STJ no Agravo de Instrumento nº 2205036-49.2016.8.26.0000 entre a Allergan titular da patente e a empresa de genéricos União Química Farmacêutica que vinha praticando atos de contrafação da mesma. 

Alguns trechos da decisão do STJ de CESAR CIAMPOLINI:

A incontroversa, inamissível e desproporcional demora do INPI, coloca em risco, até mesmo, a utilidade econômica da patente, sob a ótica da retribuição devida ao inventor, seu justo lucro como contrapartida do que investiu em pesquisa e na viabilização do produto farmacêutico. Os avanços da ciência, que decorrem principalmente da pesquisa por outros laboratórios, podem fazer com que o medicamento discutido seja superado por outros mais modernos antes mesmo do pedido de patente ser analisado de forma definitiva, tamanho o lapso de tempo decorrido.

Segundo José Gomes Canotilho: “Por outro lado, o inventor também não pode ficar totalmente dependente da maior ou menor morosidade da autoridade administrativa competente. Assim como é verdade de que justiça retardada é justiça negada, também o é que, neste domínio, uma decisão demorada por redundar, na prática, numa patente negada. (...) Ora, um atraso excessivo e irrazoável do INPI no exame do pedido e na concessão da patente acaba por redundar, em termos práticos, num encurtamento efetivo e substancial do prazo legalmente estabelecido, violando a lei e conduzindo à frustração dos objetivos do legislador nacional e ao desequilíbrio dos interesses ponderados da inovação e da concorrência. Igualmente violado, neste caso, é o princípio da proporcionalidade em sentido amplo, que também densifica do princípio do Estado de Direito, na medida em que o encurtamento da patente configura uma restrição excessiva e irrazoável do direito fundamental de propriedade intelectual do inventor. (...) Ocorre que a mora do INPI em conceder a patente poderá levar ao cenário em que uma vez concedida a patente e garantida a exclusividade, a tecnologia em questão já estará obsoleta, por conta da evolução tecnológica presente em cenário concorrencial. Neste cenário, os consumidores, uma vez concedida a patente, poderão inclusive não mais ter interesse naquela tecnologia, razão pela qual estarão frustradas as tentativas do titular de buscar ser ressarcido por investimentos feitos anos atrás

Enfatizo que a agravante, em sua contestação não negou que o medicamento que pretende inserir no mercado brasileiro tenha a mesma formulação química daquele já produzido e comercializado pelas agravadas [..] De se invocar, portanto, a imoralidade da posição parasitária da agravante que, valendo-se da desproporcional demora do INPI em decidir acerca das patentes requeridas pela agravada, busca lucro desmesurado com a venda do produto copiado, para cujo surgimento em nada contribuiu, nem um cêntimo nisso investindo. O comportamento da agravante deve ser analisado sob a ótica da repressão do ilícito lucrativo: a contrafação poderá ter causado danos devastadores sobre a propriedade industrial das agravadas quando o INPI, enfim, decidir, beneficiando sobremaneira, no meio tempo, a comercialização do produto genérico

Assim sendo, diante da cópia da formulação decorrente da pesquisa da agravada, objeto de patentes por esta tituladas no exterior por países signatários do TRIPS., imperiosa a aplicação das regras de repressão à concorrência desleal, mesmo antes do deferimento da patente pelo INPI. Afigura-se adequada, por isso, a liminar deferida pelo douto Juízo a quo, para proteção do legítimo inventor, que não pode ser penalizado, ficar à mercê de concorrente desleal que se aproveita de ilegal omissão do INPI: os ritos e as fórmulas sacramentais do processo civil devem ser interpretados à luz da Constituição Federal, não podendo se admitir sirvam de amparo à má fé e ao parasitismo.

Por fim, reitero a insuficiência do art. 44 da Lei de Propriedade Industrial como ferramenta apta a resguardar os direitos do depositante de patente antes do deferimento do registro pela autarquia competente, ao menos neste caso, uma vez que os prejuízos decorrentes da contrafação dificilmente serão ressarcidos após tão desarrazoada e desproporcional demora do Poder Público. Nesse sentido, leia-se trecho da Resolução nº 16 da Associação Brasileira da Propriedade Industrial, a respeito de pedidos de patente para produtos e processos farmacêuticos: “A indenização posterior contemplada no art. 44 da Lei 9.279/96 raramente consegue reparar totalmente os danos causados pela contrafação, devendo-se privilegiar a rápida cessação do uso indevido (cf. Resolução Q 134 B da AIPPI - Association Internationale pour la Protection de la Propriété Intellectuelle), para o que se faz necessária a obtenção da patente” (Resolução nº 16, disponível em https://abpi.org.br/resolucoes-da-abpi/resolucao-no-16-publicada-em-27-09-2001/).

Reiterando que o Poder Judiciário tem o dever de, uma vez verificado desvio de finalidade, sindicar a atividade da Administração, se o caso deferindo medidas preventivas com fulcro no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”) TUDO ISTO CONSIDERADO, a maioria, então, negou provimento ao recurso da ré, mantendo, também por seus próprios e jurídicos fundamentos, a r. decisão agravada, da lavra da Exma. Sra. Dra. Juíza de Direito ANDREA FERRAZ MUSA HAENEL, concessiva de liminar inibitóri










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