terça-feira, 1 de abril de 2014

Licenças compulsórias nos EUA

Embora a legislação de patentes dos Estados Unidos não tenha uma previsão direta de licenças compulsórias, este recurso é encontrado em outras partes do direito norte-americano como no Clean Air Act e Atomic Energy Act, por exemplo, assim como no contexto das práticas antitruste [1]. Os Estados Unidos [2], embora bastante críticos quanto a utilização de licenças compulsórias por parte do governo brasileiro, já aplicou mais de 100 licenças compulsórias, inclusive com licenciamento gratuito como no caso em uma patente da Xerox de 1977. Em 1920 químicos da Pfizer desenvolveram um processo de fermentação para obter ácido cítrico em grandes quantidades, que serviu de base para produção de penicilina durante a guerra. De modo a atender às demandas do exército Aliado, a patente teve licenciamento compulsório decretada pelo governo norte-americano.[3] Em 2001 e 2002 esporos de antraz de alta virulência foram introduzidos sob a forma de pó em envelopes enviados a várias pessoas públicas nos EUA. O governo norte-americano viu-se obrigado, por prevenção, a encomendar grandes doses de ciprofloxacina, comercializado pela marca Cipro. A patente US5286754 de propriedade da Bayer, [4] teve ameaça de licença compulsória por parte do governo americano, [5] o que fez o preço do medicamento despencar de 80% de seu preço antes da crise. [6] A droga copiada produzida pela Índia custava menos de 20 centavos de dólar [7] O 28 USC 1498 prevê como uma das prerrogativas do governo a possibilidade de utilizar uma patente sem a autorização do titular, ainda que o mesmo deva ser remunerado de modo razoável (recovery of his reasonable and entire compensation for such use). [8]
Scherer[9] em estudo de 1977 analisa a aplicação de 44 licenças compulsórias nos Estados Unidos e conclui que não houve nenhuma evidência significativa de que estas empresas deixassem de investir em P&D ou mesmo reduzissem tais investimentos. Ou seja, o fair use, usado como regra de exceção, regulando o mercado não parece causar danos significativos aos titulares. Mesmo com o licenciamento compulsório de patentes, as empresas em alguns casos mantém seu interesse em pesquisa. Na ameaça de epidemia de gripe suína, originada no México em abril de 2009, alguns países anunciaram medidas de licenciamento compulsório da patente do Tamiflu, medicamento utilizado no tratamento da doença (US5952375, PI9607098) face a impossibilidade da empresa Roche de atender ao volume de encomendas do medicamento. Ainda assim as empresas se interessaram no desenvolvimento de uma vacina para a doença [10]. Peter Drahos destaca o contraste que o sistema de patente causou em que os países com maior risco para gripe aviária detinham o menor estoque de medicamentos.[11]



[1] BASSO, Maristela. Propriedade Intelectual na era pós-OMC. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2005, p. 41; PARK,Jae Hun. Patents and Industry Standards,Edward Elgar, 2010, p. 108; COLE, Fauver. Compulsory Patent Licensing in the United States: An Idea Whose Time Has Come. Northwestern Journal of International Law & Business, v.8, 1988, p.670-71; http://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1244&context=njilb REICHMAN, Jerome. Compulsory Licensing of Patented Inventions: Comparing United States Law and Practice with Options under the TRIPS Agreement, 2006 http://www.aals.org/documents/2006intprop/JeromeReichmanOutline.pdf
[2] GOLDSTEIN, Sol A study of compulsory licensing, Journal of the Licensing Executives Society, 1977, v.12, n.2, p 122-125; CORREA, Carlos. Integrating public health concerns into patent legislation in developing countries 2002.
http://www.southcentre.org/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=13&Itemid=&lang=en.
[3] MAY, Christopher; SELL, Susan. Intellectual Property Rights: a critical history. Lynne Rjenner Publishers: London, 2006, p.137
[4] http: //en.wikipedia.org/wiki/Ciprofloxacin#cite_note-4.
[5] STIGLITZ, Joseph. Globalização como dar certo. São Paulo: Cia das Letras, 2007. p. 216.
[6] MAY, Christopher; SELL, Susan. Intellectual Property Rights: a critical history. Lynne Rjenner Publishers: London, 2006, p.159
[7] CHANG, Ha Joon. O mito do livre-comércio e o maus samaritanos: a história secreta do capitalismo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 120.
[8] http://www.justice.gov/civil/docs_forms/C-IP_28usc1498.pdf cf. DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.145
[9] SCHERER, The economic effects of compulsory patent licensing, The Monograph Series in Finance and Economics, New York; New York Universty,1977
[10] JEINEI, Stephen. So Who owns the rights to tamiflu patent? oct. 2005 http: //www.patentbaristas.com/archives/2005/10/21/so-who-owns-the-rights-to-tamiflu-patent/.  Taiwan to violate Tamiflu patent due to vaccine shortage oct. 2005. http: //en.wikinews.org/wiki/Taiwan_to_violate_Tamiflu_patent_due_to_vaccine_shortage.
[11] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.287

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