quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Tomates e patentes

Sen. Bernie Sanders questiona o fato de o direito de patentes impedir a importação de medicamentos sem autorização do titular. Se podemos importar tomates do Canadá por que não podemos importar medicamentos ? O resultado disso são medicamentos mais caros para população que muitas vezes não consegue comprar os medicamentos prescritos pelo médico por serem muito caros nos Estados Unidos. Será que tomates são mais imprescindíveis para a população do que medicamentos ? Qual o valor da vida para nossa sociedade ?

 


Alguns pontos podem ser colocados. Tomates são produzidos por milhares de produtores de diferentes países que usam técnicas de plantio conhecidas a milênios. Os custos basicamente se resumem ao plantio e transporte. Medicamentos são bem diferentes de tomates nesse sentido. Os custos de desenvolvimento (pesquisa e testes clínicos) são significativamente maiores que os custos de produção e transporte. 

Considere um exemplo hipotético. Um medicamento custa US$ 100 milhões para desenvolvimento e custo de produção de US$ 1. Para repor os investimentos este medicamento é colocado no mercado dos Estados Unidos onde a empresa tem uma patente, a US$ 10 onde ela esperar vender 1 milhão de unidades por ano. A empresa espera com isso em 11 anos (que o tempo de mercado até a vigência da patente uma vez que a patente é solicitada antes de entrar no mercado) recompor os custos de desenvolvimento. Portanto em 11 anos ela fatura 110 milhões, isso cobre praticamente todos 100 de desenvolvimentos mais os 11 de custo de produção. São cálculos aproximados, para simplificar não se considera o lucro da empresa.
 
Vamos supor que no Canada onde a empresa não conseguiu patente (porque por exemplo esqueceu de pagar uma taxa por exemplo) este medicamento é livre. Qualquer empresa pode fabricá-lo. neste caso as empresas não arcam com os 100 milhões de desenvolvimento. Podemos, portanto, colocar este medicamento no mercado por apenas US$ 1 que é o custo de produção.
 
Moral da história: temos o mesmo medicamento sendo vendido a US$ 10 nos Estados Unidos (onde tem patente) e a apenas US$ 1 no Canadá, onde a patente não existe.
 
Agora considere que admitíssemos que qualquer empresa pudesse importar este produto nos Estados Unidos comprando legalmente do mercado canadense (mesmo que seja do próprio titular da patente !). Ela compra por US$ 1 dólar e revende por este preço no mercado dos Estados Unidos.
 
Qual seria o efeito disto ?
 
Ainda que ela tenha comprado do titular no mercado canadense, o fato é que esta empresa rapidamente irá conquistar todo mercado porque estará vendendo a um preço dez vezes menor que o titular. Como o titular poderá repor seus investimentos ? Não terá como. A titular simplesmente ficará assistindo sua fatia do mercado sendo corroída sem que possa recompor os 100 milhões.
 
Conclusão: Vocês acham que esta empresa voltará a investir 100 milhões para desenvolver um novo medicamento ?
 
Quem perde no longo prazo ? O doente porque em pouco tempo não teremos medicamentos novos.
 
A permissão da importação livre da autorização do titular é o que se chama exaustão internacional dos direitos de propriedade industrial. A empresa concorrente quando compra do titular da patente nos Estados Unidos, no mercado canadense, exaure os direitos do titular, o seja, o titular já recebeu o que tinha que receber, e não terá mais nenhum direito sobre o produto comprado, o que significa que o concorrente pode importar este produto vindo do Canadá. TRIPs nada regula sobre exaustão internacional dos direitos, os países são livres para adotá-la se quiserem. No Brasil a LPI implementa uma exaustão internacional mitigada, pois ela admite a importação por terceiros em situações de licença compulsória 
 
 
Art. 68. O titular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial.
 
        § 3º No caso de a licença compulsória ser concedida em razão de abuso de poder econômico, ao licenciado, que propõe fabricação local, será garantido um prazo, limitado ao estabelecido no art. 74, para proceder à importação do objeto da licença, desde que tenha sido colocado no mercado diretamente pelo titular ou com o seu consentimento.
        § 4º No caso de importação para exploração de patente e no caso da importação prevista no parágrafo anterior, será igualmente admitida a importação por terceiros de produto fabricado de acordo com patente de processo ou de produto, desde que tenha sido colocado no mercado diretamente pelo titular ou com o seu consentimento.

 

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