segunda-feira, 20 de junho de 2022

O destino dos pioneiros inovadores

 

A expectativa do mercado em maiores aperfeiçoamentos, diante de uma tecnologia inovadora, pode agir contra a empresa inovadora que de imediato investe seus recursos na nova tecnologia. O mercado tende a aguardar novos aperfeiçoamentos do que apostar de imediato em uma nova tecnologia, assumindo um comportamento mais conservador.

Rosenberg ilustra este ponto com o exemplo da introdução dos primeiros aviões a jato. A Grã Bretanha introduziu o Comet I dois anos antes dos norte-americanos iniciarem desenvolvimento de um novo avião a jato comercial. Este atraso permitiu as norte-americanas Boeing e Douglas oferecer aviões que podiam transportar até 180 passageiros, enquanto o Comet I transportava apenas 100 e menor velocidade de cruzeiro. Foram detectadas falhas estruturais no Comet, corrigidas pelos seus concorrentes.[1] A empresa Havilland viu sua participação no mercado erodir rapidamente, apesar de apostar sua vantagem competitiva no lead time. Caso a empresa tivesse se protegido por patentes, a empresa teria sua participação nos aperfeiçoamentos de suas inovações feitos pelos concorrentes[2]

Rosenberg é radical em sua conclusão: “os pioneiros inovadores schumpeterianos frequentemente acabam no Tribunal de falências”. O mesmo caso pode-se observar no início da televisão de alta definição HDTV. Nos anos 1970 a japonesa NHK iniciou transmissões experimentais com o sistema analógico de HDTV chamado MUSE. Segundo Carl Shapiro é fundamental a empresa ter um senso de oportunidade, pois agir muito cedo pode representar um risco ao criar um vínculo com um padrão que com o desenvolvimento da tecnologia pode ser mostrar rapidamente obsoleto.[3] Uma das questões polêmicas na definição do padrão foi o parâmetro de relação de aspecto a ser adotado, a relação entre o comprimento horizontal e vertical da tela. A indústria do cinema e da computação alegou que a adoção de um padrão que incluísse relação de aspecto compatível com as telas de cinema dificultaria a convergência entre os setores de televisão e computação, que ficariam em desvantagem. O padrão HDTV adotou a relação de aspecto de 16/9 como solução de compromisso[4]. Carl Shapiro mostra que as emissoras nos Estados Unidos aderiram ao padrão HDTV em parte como forma de conseguir junto ao Congresso maior espaço de canal na fatia de UHF que de outra forma poderia ser reservada para outros fins que não para televisão. Uma aliança entre Zenith, AT&T, General Instrument, MIT, Philips, Sarnoff Reserach Labs, NBC e Thomson, que envolveu o licenciamento mútuo de patentes, formando a chamada “Grande Aliança”[5] em 1993 pôs fim a guerra de padrões em HDTV e viabilizou a adoção de um padrão comum pela FCC.[6] A primeira transmissão em HDTV nos Estados Unidos ocorreu em 1996. Os europeus em 1986 formaram o projeto Eureka 95, que desenvolveu o projeto analógico HD-MAC. Os norte americanos, que entraram mais tarde neste desenvolvimento, apresentaram as primeiras propostas de um sistema digital, superando as propostas japonesas e europeias MUSE e HD-MAC.[7]

O uso de padrões na indústria e as dificuldades de harmonização em grande parte podem revelar não necessariamente a dificuldade no licenciamento de patentes mas podem encobrir interesses de mercado das empresas, como forma de barreira não tarifária. Na década de 1980 os japoneses embora conquistando importante fatia do mercado norte americano, cerca de 43 por cento, não apresentava o mesmo desempenho no mercado europeu em que conquistava apenas 15 por cento do mercado. Em parte isto pode ser explicado pela presença de padrões incompatíveis nos Estados Unidos (NTSC) e Europa (PAL e SECAM).[8] Segundo estudo de 1999 realizado com cerca de 700 empresas na Alemanha, cerca de um por cento do produto interno bruto do país e um terço do crescimento econômico pode ser atribuído a adoção de padrões na indústria. Os padrões atuam como catalisadores para inovações no mercado na medida em otimizam o uso dos recursos em pesquisa. O estudo também encontrou uma correlação positiva entre pedidos de patentes e a adoção de novos regulamentos técnicos, especialmente nos campos mais inovadores da tecnologia.[9]

[1] PETROSKI, Henry. Invention by design: how engineers get from thought to thing, Cambridge: Harvard University Press, 1996, p. 120.

[2] ROSENBERG, Nathan. Por dentro da caixa preta: tecnologia e economia, São Paulo: Ed. Unicamp, 2006, p. 170 e 421.

[3] SHAPIRO,Carl; VARIAN, Hal R. A economia da informação. Rio de Janeiro:Campus, 1999, p.29

[4]  http://en.wikipedia.org/wiki/High-definition_television

[5] http://en.wikipedia.org/wiki/Grand_Alliance_(HDTV)

[6] SHAPIRO,Carl; VARIAN, Hal R. A economia da informação. Rio de Janeiro:Campus, 1999, p.257

[7] VARIAN, Carl; SHAPIRO, Hal. A Economia da Informação. Rio de Janeiro: Campus, 1999, p. 258.

[8] WTO, WORLD TRADE REPORT: Standards, ‘offshoring’ and air transport focus of 2005 WTR, p.39 http://www.wto.org/english/news_e/pres05_e/pr411_e.htm

[9] Blind, K., Grupp, H. and Jungmittag, A. (1999) ‘The Influence of Innovation and Standardization on Macroeconomic Development: the case of Germany’ in Jakobs, K. and Williams, R. (eds.) Proceedings of the First IEEE Conference on Standardization and Innovation in Information Technology, Piscataway, US: IEEE Service Center.cf. WTO, WORLD TRADE REPORT: Standards, ‘offshoring’ and air transport focus of 2005 WTR, p.41 http://www.wto.org/english/news_e/pres05_e/pr411_e.htm

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