sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Patentes e desemprego

Nuno Carvalho destaca que o requisito de utilidade presente nas legislações patentárias de Veneza no século XV, Inglaterra no século XVII e França no século XVIII estabeleciam que as patentes uma vez concedidas não poderiam prejudicar a indústria já estabelecida e sobretudo no caso da Inglaterra não poderiam gerar desemprego. Em 1589 William Lee solicitou uma patente para uma máquina de tecer meias que foi negada pela rainha Elizabeth I: “Eu amo demais os meus pobres súditos que conseguem o seu pão com a fabricação de malha para dar o meu dinheiro com o objetivo de promover uma invenção que arruinará ao conduzi-los ao desemprego, convertendo-os assim em pedintes”.[1] Com a recusa, William Lee e seu irmão se transferiram para a França instalando unidades produtoras de meias na cidade de Rouen, aproveitando-se do estímulo do rei francês Henrique IV para atração de novas indústrias. Com a morte de Henrique IV em 1610 e as restrições impostas por Luís XIII aos empreendimentos estrangeiros, os irmãos Lee retornaram à Inglaterra, abrindo uma fábrica em Londres.[2] Se a estratégia de proteger os antigos métodos de produção da indústria de lã fossem mantidos a mesma Inglaterra não teria revolucionado a produtividade da indústria têxtil com a introdução de inúmeras máquinas no século seguinte. Christine MacLeod, contudo, aponta este relato da história de William Lee é apócrifo e teria aparecido pela primera vez apenas no século XIX em texto de Gravenor Henson.[3]

Entretanto a tese de que o emprego deveria ser preservado fazia parte da preocupação das autoridades encarregadas na concessão de patentes. Em 1571 o Privy Council rejeitou uma patente de inventor de um cabo para facas atendendo apelo da guilda dos cuteleiro de que a patente levaria os membros da guilda à ruína. [4] Christine MacLeod mostra que esta perspectiva fazia com que poucas patentes citassem como objetivo de sua invenção a economia de mão de obra. Edward Coke em seu comentário ao Estatuto dos Monopólios julgava que uma patente era tida como ‘inconveniente’ se sua implementão resultasse na substuição de mão de obra. [5] O Estatuto dos Monopólios em sua seção 6 especifica que “patentes não devem ser contrárias à lei nem prejudiciais ao Estado seja pela elevação de preços das mercadorias no mercado local, ou por danos ao comércio ou por ser inconveniente de modo geral”. [6] Este quadro se reverte  no início do século XVIII quando patentes como as de John Kay, John Wyatt e Lewis Paul destacam abertamente os ganhos de suas máquinas com economia com mão de obra.


[1] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 219, 292.
[2] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 175
[3] MaCLEOD, Christine. Inventing the industrial revolution: the english patent system, 1660-1800, Cambridge:Cambridge University Press, 1988 p.226
[4] MaCLEOD, C. op.cit.p.13
[5] MaCLEOD, C. op.cit.p.161, 167
[6] http://en.wikipedia.org/wiki/Statute_of_Monopolies

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