Entretanto, pesquisa na base de patentes do INPI realizada por Rodrigo Oliveira mostra que a maior parte das patentes de segundo uso depositadas no INPI tem como titularidade grandes empresas estrangeiras. Rodrigo mostra que as empresas detentores de patentes de fármacos tem maior propensão a patentear segundos usos por questões de ordem econômica, pois os fármacos já existentes por terem farmacocinética e perfis de segurança já bem conhecidos e por, frequentemente, já terem sido aprovados pelas agências regulatórias para o uso humano, permitem aos detentores destas patentes identificar novos usos rapidamente para avaliação em estudos clínicos de fase II. Dessa forma, os pesquisadores de novos fármacos podem deixar de gastar quase 40% do custo total para trazer um medicamento para o mercado por eliminar grande parte da pesquisa em farmacocinética e toxicologia. [2] Desta forma os detentores das patentes de primeiro uso que detêm, em primeira mão, os dados de pesquisa básica e ensaios pré-clínicos e clínicos do composto químico para o primeiro uso médico, tem maior propensão em avançar neste tipo de pesquisa. A miltefosina, por exemplo, falhou em sua ação anticancer durante os estudos clínicos de fase II, entretanto os estudos in vitro e em animais indicarm sua viabilidade no tratamento de leishmaniose visceral. Podemos, portanto, entender que o custo de desenvolvimento de um novo uso, neste caso, deve ser visto como um continuidade do desenvolvimento do medicamento original, principalmente se considerarmos que apenas um percentual pequeno dos fármacos consegue a aprovação pelas autoridades de saúde.
A pesquisa realizada mostrou um total de 207 pedidos de patentes de segundo uso depositadas entre 1995 e 1997 reivindicados em sua grande maioria como usos ou método terapêuticos. Entre os maiores depositantes, considerando as fusões entre empresas, encontram-se Eli Lilly/US (22), Pfizer/US (15), Sanofi/FR (13), Glaxo Smithkline/GB (12), Novo Nordisk/DK (11), Procter&Gamble/US (9), Hoffman-La Roche/CH (8), Novartis/CH (8), Abbot/US (7), Bayer Schering/DE (7), AstraZeneca/GB (5) e Johnson&Johnson (4). O Brasil aparece representado na amostra com apenas uma patente do Laboratórios Sintofarma S/A (PI9702841-0 de Nova indicação terapêutica da ivermectina). Por definição, o evergreening ocorre quando o novo depósito é realizado antes da patente anterior expirar, ou seja, dentro da sua vigência (geralmente o período de vigência é de 20 anos), porém a pesquisa não avaliou este lapso temporal, limitando a indicar dentre as 207 patentes listadas quais possuiam pedidos de patentes do mesmo depositante referentes aos compostos cujos novos usos são reivindicados nos pedidos de patente do presente estudo. Dos 22 pedidos de patente da Eli Lilly foram, desta forma, identificados “indícios” de evergreening em 20 casos o que representa 91% dos casos. O estudo contudo se limita a considerar pedidos de patentes. Pesquisa simples realizada no site do INPI mostra que destes 20 pedidos de patente 14 foram indeferidos, 8 arquivados e nenhum deferido, uma informação relevante para as conclusões da tese e que é omitida do texto.
Em sua conclusão Rodrigo Oliveira afirma: “No período estudado, a indústria nacional brasileira não se demonstrou inserida de maneira relevante na rede de depositantes de patentes de segundo uso médico no Brasil, o que reflete a sua falta de capacidade e produtividade inovadora significativa no campo das pesquisas de novos usos médicos. Os depositantes de pedidos de patentes de segundo uso médico no Brasil são predominantemente as indústrias farmacêuticas estrangeiras, mais especificamente, as maiores indústrias farmacêuticas em nível mundial em termos de receita, as chamadas “Big Pharma”. O argumento de que uma vez que a indústria nacional não inova então não precisamos de patentes, parte do princípio que o não patenteamento impuslsionaria tais empresas para inovação, o que é questionável, uma vez que décadas sem patentes para produtos químicos farmacêuticos antes do advento da LPI em 1996 não foram capazes de alavancra esta inovação como sugere o texto. Um argumento similar poderia ser usado com relação aos investimentos em mestres e doutores de engenharia. Uma vez que as empresas nacionais pouco inovam e tem poucos centros de P&D então poderíamos concluir que o país deveria parar de investir nesta área ?
Rodrigo Oliveira prossegue em sua análise: “O patenteamento de novas indicações terapêuticas está sendo usado no Brasil por empresas farmacêuticas estrangeiras como um mecanismo artificial de extensão patentária ou como um mecanismo para se obter uma patente relacionada a um composto anteriormente patenteado pela mesma empresa”. Esta conclusão ignora contudo um fato relevante; o de que todas as patentes listadas para a maior empresa, a Eli Lilly, foram arquivadas ou indeferidas não havendo portanto segundo a lei qualquer direito advindo destas patentes que afinal não foram concedidas. O argumento de que a expectativa de exame trouxe insegurança para investimentos de empresas genéricos, não se justifica pois muitas destas patentes, como o estudo indica, são para métodos terapêuticos que já possuem vedação explícita na lei. Não há razões para imaginar que o cenário seria diferente com uma exclusão explícita para novos usos. Diante de uma prática de exame rigorosa em se rejeitar tais patentes, por parte do INPI, tomando-se em conta os pedidos listados nesta pesquisa, pode-se presumir que haja uma maior segurança no mercado que as patentes de métodos terapêuticos serão rejeitadas tão logo examinadas, e quanto as de novo uso concedidas apenas sob um critério de atividade inventiva que veta a possibilidade de patentes frívolas.
[2] OLIVEIRA, Rodrigo Borges. A patenteabilidade do segundo uso e dos posteriores usos médicos no Brasil. Tese Doutorado, Instituto de Economia, UFRJ, Rio de Janeiro, 2012, p.41 http://www2.congreso.gob.pe/sicr/cendocbib/con4_uibd.nsf/05DAB69D6A954B6605257A7C00778D0B/$FILE/Tese_-_Rodrigo_Borges_-_Verso_Final_com_ficha_catalogrfica_-_Ps_-defesa.pdf
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