quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

A grande barganha

Uma lógica de troca comercial, a que Joseph Stiglitz se refere como “a grande barganha”[1] permeou não somente TRIPs mas a criação da OMC. Segundo Ha Joon Chang os países ricos não satisfeitos com a Rodada do Uruguai do GATT continuaram pressionando por uma maior liberalização das economias em desenvolvimento. Em troca de cortes nas tarifas industriais dos países em desenvolvimento os países ricos se comprometiam a reduzir o subsídio agrícola de forma que os países pobres pudessem aumentar suas exportações, assim como abolir o Multi-Fibre Arragement que restringia as exportações de produtos têxteis dos países em desenvolvimento[2], uma estratégia de negócio em que, segundo os países ricos, todos sairiam ganhando.[3]

O embaixador Miguel Ozorio de Almeida mostra que barganha similar, igualmente não cumprida esteve presente quando da redefinição das regras econômicas do pós Segunda Guerra: "De acordo com a combinação, todos os países se uniriam para organizar o mundo do após-guerra de uma forma justa e equilibrada. Justa e equilibrada queria dizer: com os países desenvolvidos podendo consumir, à vontade, toda a matéria prima dos países subdesenvolvidos. A realidade que nós estamos vivendo [depoimento de 1987 em plena crise da dívida....] hoje, do mundo subdesenvolvido totalmente endividado, é o resultado de Bretton Woods, que aliás está deixando saudades não sei bem a quem. certamente não deveria deixar a nós ! Porque não houve a menor tentativa, nem na Carta do Atlântico[4], nem depois em Bretton Woods[5], de dar uma compensação aos países subdesenvolvidos. Todas as tentativas nesse sentido, que foram feitas na Conferência de Comércio e Emprego de Havana foram abandonadas. É engraçado ! Porque os capítulos correspondentes foram rejeitados pelas duas potências, Inglaterra e Estados Unidos. Foram rejeitados. E a parte correspondente à necessidade de fornecimento de matérias-primas, ao comércio de matérias primas, etc, etc, foi resumido num capítulo especial e esse capítulo foi posto para funcionar, provisoriamente, sob o título de Interim Agreement of Commerce and Employment. Então o Interim Agreement foi posto para funcionar. Os países desenvolvidos nunca ratificaram a parte correspondente a recursos para industrialização dos países subdesenvolvidos. E nós, bestamente, deixamos que o Interim Agreement funcionasse. E ele ficou funcionando, ficou para sempre. Foi aquele provisório que eternizou e que hoje se chama GATT. O GATT é descendente do Interim Agreement, que era o capítulo correspondente, compensatório, dentro de Bretton Woods e da Carta do Atlântico, para a negligência em relação aos países subdesenvolvidos"[6]





[1] STIGLITZ, Joseph. Globalização como dar certo. São Paulo: Cia das Letras, 2007. p. 159, 463.
[2] MAY, Christopher; SELL, Susan. Intellectual Property Rights: a critical history. Lynne Rjenner Publishers: London, 2006, p.155
[3] CHANG, Ha Joon. O mito do livre-comércio e o maus samaritanos: a história secreta do capitalismo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 75.
[4]
http://pt.wikipedia.org/wiki/Carta_do_Atl%C3%A2ntico
[5] http://en.wikipedia.org/wiki/Bretton_Woods_system
[6] Miguel Ozorio de Almeida: um depoimento, Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009, p.20


Nenhum comentário:

Postar um comentário