O processo da
Diretiva de Programa de Computador iniciou em 1997 quando a Comissão européia preparou
um Green paper sobre a patente comunitária em que também debateu a questão da
patenteabilidade de software. O processo sofreu atrasos pela oposição do
movimento de Software livre e pela prioridade na agenda pela patente
comunitária. Um consulta pública foi aberta em 2000. O primeiro esboço de
diretiva surgiria apenas em 2020 com uma abordagem conservadora que
essencialmente preservava as práticas de exame já consolidadas no EPO. Submetida
ao plenário em setembro de 2003 o texto sofreu severas restrições que segundo
Stefan Shoche[1] incluíram
ameaças ao relator da proposta. Passeatas de cerca de 500 manifestantes contra
a patenteabilidade de software foram realizadas na entrada do Parlamento
Europeu em Bruxelas, no que ficou conhecida como “passeata dos nerds”.[2] As
centenas de emendas recebidas pelo Parlamento Europeu, sob intenso lobby do
movimento de software livre sobre delegados da bancada do Partido verde
principalmente, virtualmente vetavam a possibilidade de qualquer patente de
invenção implementada por software onde a diferença com o estado da técnica
residia no software. A Comissão Europeia apresentou uma proposta comum[3] (documento
nº 9713/04 de 24 de maio de 2004) que restaurava a proposta original. Diversas
delegações, incluindo Holanda, Hungria, Letônia, Polônia, Dinamarca e Chipre
embora tivessem aprovada a proposta de maio de 2004 voltaram atrás e
expressaram reservas com o texto. A inviabilidade de se aprovar centenas de
emendas em tempo reduzido fez com que a maioria das delegações rejeitassem a
proposta[4]
que tratava da patenteabilidade de software
por 648 votos contra a Diretiva e apenas 14 a favor, em sessão plenária em
julho de 2005 de modo que as provisões legais na Europa permaneceram sem
qualquer modificação, o que curiosamente foi visto como uma vitória pelo
movimento de software livre. A EPO concedeu milhares de patentes de invenção
implementadas por software concedidas[5]e o
Boards of Appeal tem confirmado tais
patentes, das quais se destacam duas decisões[6]
(T333/95 de 1997 e T1173/97 de 1998) que estabelecem como critério para tais
concessões a exigência da solução de um problema de natureza técnica[7]. Com
a não aprovação da Diretiva, a concessão de patentes de invenção implementadas
por software por parte da EPO
(sujeita às regulamentações da Convenção Européia de Patentes EPC e do Boards of Appeal), manteve-se sem
qualquer mudança quanto as diretrizes de exame. Com as decisões Bilski e
Comiskey do CAFC nos Estados Unidos revertendo a tendência liberalizante na
concessão de patentes implementadas por software, as pressões tem aumentado na
Europa no sentido de se confirmar as diretrizes da EPO mesmo após a não
aprovação da Diretiva.
A Diretiva Européia de Software rejeitada pela Comunidade Econômica Européia em 2005
negava a possibilidade de uma reivindicação de programa de computador “admitir reivindicações para produtos
relativos a programas de computador, quer por si sós, quer numa portadora, dado
que isso poderia ser considerado como admitindo patentes para programas de
computador enquanto tais". A mesma Diretiva delimita as proteções de
patentes e Direito autoral: “Por outro lado, para efeitos da Diretiva
91/250/CEE relativa à proteção jurídica dos programas de computador, a proteção
por direitos de autor é concedida à expressão particular, sob qualquer forma,
de um programa de computador, ao passo que os princípios e ideias nos quais assenta
qualquer elemento de um programa de computador, incluindo aqueles em que
assentam as suas interfaces, não são protegidos. Será concedida a um programa
de computador a proteção ao abrigo dos direitos de autor, se a forma de
expressão for original, ou seja, uma criação intelectual própria do autor. Na
prática, isso significa que os direitos de autor subsistiriam na expressão de
qualquer forma de código-fonte ou do código-objeto, mas não subsistiriam nos
princípios e ideias subjacentes do código-fonte ou do código-objeto de um
programa. Os direitos de autor proíbem uma reprodução substancial do
código-fonte ou do código-objeto, mas não impedem as muitas formas alternativas
de exprimir os mesmos princípios e ideias num código-fonte ou num código-objeto
diferente. Também não protegem contra o desenvolvimento de um programa idêntico
ou substancialmente idêntico, sem o conhecimento dos direitos de autor
existentes”.
Tal divergência de
interpretação quanto a patenteabilidade de programas de computador vinha sendo
alimentada em uma série de ocasiões: pelo fracasso[8] da
proposta de se eliminar a restrição a programas de computador do Artigo 52 da
EPC em 2002 diante das oposições de Dinamarca, França e Alemanha (Philip Leith[9]
atribuiu a oposição da França a baixa inovação das indústrias francesas de
software); pela resistência do movimento de software livre contra
patenteabilidade de invenções implementadas por software particularmente no
êxito deste lobby, com apoio dos deputados do Partido Verde em rejeitar a Diretiva
de Software[10] votada
no Parlamento Europeu em 2005 (a versão em votação sofreu emendas no texto
original por parte dos opositores que acabaram conduzindo a um texto
contraditório o que levou a rejeição do texto final mesmo por aqueles que
apoiavam a proposta original[11])
e por fim na resistência as ditas patentes manifestada por países do leste
europeu, tais como Polônia, com reduzida inovação local na indústria de
software, recém egressos na Comunidade Européia, e portanto, sem a tradição da
EPO na concessão de tais patentes.[12]
Para Philip Leith o
efeito do debate sobre a Diretiva de Software foi aumentar o desejo da Comissão
Européia em assumir o controle da EPO.[13] O
Parlamento Europeu rejeitou em 7 de julho de 2005 a posição comum do Conselho
sobre a patenteabilidade do software por 648 votos contra, 14 a favor e 18
abstenções. Foi a primeira vez na história parlamentar que os deputados
rejeitaram um texto em segunda leitura no processo de co-decisão.[14]
Segundo o relator Michel Rocard (PSE/FR) esta legislação "não está madura para ser adotada".
Para Nicolas Binctin os debates no parlamento “foram marcados tanto por uma ignorância sobre a unidade dos bens
intelectuais quanto por uma ausência de análises sobre o regime de patentes.
Toda a argumentação fundamentada na negação da possibilidade de se exercer um
direito de propriedade sobre programas de computador está fundamentalmente
errada, pois os programas de computador já são objeto de um regime de
propriedade. Toda diabolização das patentes, é tão absurda quanto a exposição
sobre a ineficácia ou a fragilidade de apropriação do direito de autor”.
Os debates liderados por grupos ligados ao movimento de software livre
constituem falsos debates na medida que a argumentação de que o direito de
propriedade sobre programas de computador já é exercido pelo direito de autor e
o próprio movimento de software livre baseia neste direito para poder
distribuir suas licenças de software livre.[15]
Passeata em Bruxelas em 2004 contra patentes de software [16]
[1] SCHOHE, Stefan; APPELT, Christian; GODDAR, Heinz. Patenting
software-related inventions in Europe. In: TAKENAKA, Toshiko. Patent law and
theory: a handbook of contemporary research,Cheltenham:Edward Elgar, 2008, p.336
[2] http://www.zdnet.com/developers-and-mimes-protest-software-patents-3039115971/
[3] http://register.consilium.europa.eu/doc/srv?l=EN&f=ST%209713%202004%20INIT
[4]
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/com/2002/com2002_0092pt01.pdf
[5]
http://www.answers.com/topic/ software-patents-under-the-european-patent-convention
[8]
http://www.ladas.com/BULLETINS/2002/0202Bulletin/EuropeanPatentConvRevision.html
[9] Software
and Patents in Europe, Philip Leith, Cambridge:Cambridge University Press,
2007, p.22
[10]
http://en.wikipedia.org/wiki/Proposed_directive_on_the_patentability_of_computer-implemented_inventions
[11]
http://ipkitten.blogspot.nl/2007/01/software-patents-yes-or-no.html
[12] no "written statement" apresentado pela
Polônia para G 3/08, o Sumário consta: “A
claimed subject matter, which consists only of instructions performed by
conventional hardware for data processing, also called a computer program or a
computer implemented solution, is not an invention in the sense of the patent
law, irrespective of the form in which it has been claimed. The technical
character is not a formal requirement, in order to fulfill it, it is not enough
to use a technical form or describe an abstract subject of an application by
means of technical terms. (…) There is no technical contribution in case when
an element that matters in a claimed solution does not require a new hardware
or a new combination of previous hardware, does not remove any noticeable
drawbacks and is connected merely with correction of a non-technical part. The
technical character has to be present in the solution, it is not enough if it
is in the problem or the results.”
http://www.epo.org/patents/appeals/eba-decisions/pending/briefs.html
[13] Software
and Patents in Europe, Philip Leith, Cambridge:Cambridge University Press,
2007, p.72
[14]
http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+PRESS+DN-20050706-1+0+DOC+XML+V0//PT&language=PT#SECTION1
[15] WEIDI, H. Les perspectives d’ avenir sur la brevetabilite des
logiciells, Rev. Du Marché intérieur et de l’Union européenne, n.491, sep 2005,
p.510. cf. BINCTIN, Nicolas. Droit de la propriété intellectuelle, LGDJ:Paris,
2012, p.300
[16] http://spectrum.ieee.org/at-work/innovation/europe-struggles-over-software-patents
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