Nuno Carvalho observa que a
invenção não pode ser caracterizada apenas por se constituir a solução de um
problema técnico. É importante se destacar o fato de ser resultado da
intervenção humana na natureza: “pois a
natureza também realiza seus próprios avanços técnicos – são estes que fazem a
evolução das espécies. A natureza, em sentido amplo, também cria, ao gerar
mutações em reação ao meio hostil e ao selecionar aquelas que são mais
eficientes”. Segundo
Nuno Carvalho: “Quando o juiz Burger,
relator do famoso acórdão Diamond v. Chakrabarty, observou que o Congresso quis
que a patente cobrisse "tudo o que debaixo do sol é feito pelo homem"
ele estava na realidade enfatizando o elemento de artificialidade que
caracteriza a invenção humana. A condição de artificialidade significa que só é
invenção a criação que resultou da intervenção humana sobre a natureza. A
invenção que é feita pela natureza é uma descoberta, e, por princípio, não é
patenteável”.[1]
Nuno Carvalho cita como exemplo
os fios de teias de aranhas que muito se aproximam dos têxteis sintéticos
produzidos pelo homem. [2]
Julian Hill, da equipe de pesquisa de Wallace Carothers inventou uma fibra
sintética por polimerização por condensação, fibra que tinha paralelo com as
moléculas filamentosas que as aranhas produzem para tecer suas teias.[3]
Uma disposição de fios em um tecido sintético que fosse encontrada em teias de
aranha teria condições de patenteabilidade, da mesma forma que muitas invenções
do homem utilizam princípios encontrados na natureza. Outro exemplo são
engrenagens encontradas nas pernas de insetos do gênero Issus e utilizadas para
se conseguir grandes saltos. O mecanismo foi descoberto por cientistas da
Universidade de Cambridge, no Reino Unido, que analisaram em microscópio o
pequeno inseto, muito comum em jardins da Europa.[4]
Cameron Currie demonstrou que as formigas cortadeiras de folhas carregam em seu
corpo uma substância branca que inclui tipos de bactérias (actinobactérias) que
fabricam antibióticos garantindo que os fungos alimentados por tais folhas não
sejam infectados por pragas. Desta forma, a pesquisa demonstrou que milhões de
anos antes do homem inventar o antibiótico, a natureza já havia descoberto o
mesmo efeito. [5] Ricahrd
Dawkings observa a grande semelhança de determinados vírus com um módulo lunar.[6] Roger
Angel da Universidade do Arizona inventou um telescópio que utiliza espelhos de
grandes dimensões e baixo peso utilizando-se de uma estrutura similar as
encontradas em colmeias (US4606960)[7]. Reinhold
Dauskardt da Universidade de Stanford desenvolveu painéis solares tomando como inspiração
os olhos de uma mosca que consiste em centenas de pequenos olhos segmentados em
forma de favo de mel com redundância interna: “se você perder um segmento,
centenas de outros operarão. Cada segmento é muito frágil, mas está protegido
por um muro em torno dele ". Usando
o olho composto como modelo, os pesquisadores criaram uma célula solar
composta, constituída por um vasto favo de mel de microcélulas de perovskite,
encapsuladas em um invólucro hexagonal com apenas 0,02 polegadas (500 mícrons)
de largura.[8]
No
século XVIII Alessandro Volta desenvolveu sua pilha elétrica formada por
discos de cobre e zinco empilhados alternadamente[9].
Cada par era separado por um cartão molhado numa solução salina, formando uma
coluna sustentada por três varetas de vidro na vertical.
[10]
Seu modelo baseado numa superposição de diversas células elétricas iguais era
uma reprodução encontrada nos órgãos do peixe torpedo responsáveis pela emissão
de choques elétricos.[11]
Modelos de colônias de
formigas na busca de alimento seguindo as trilhas de menor caminho estão sendo
estudados por Marco Dorigo da University College de Londres para solução do
problema tecnológico do caixeiro viajante e técnicas de redes de comunicação.
Padrões presentes em plantas como coníferas na disposição regular de suas
folhagens ótima que garante a maior absorção dos raios de sol podem ter
aplicações tecnológicas. Esta analogia entre trabalho humano e animal torna-se
cada vez mais tênue na medida em que, por exemplo, modelos computacionais baseados
em programação genética mimetizando o comportamento de processos biológicos são
usados na automatização de circuitos elétricos e controladores, como os
trabalhos realizados por John Koza da Universidade de Stanford.[12]
Mosca inspirando painéis solares [8]
[1] CARVALHO, Nuno. A
estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado, presente e futuro.
Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2009, p.82
[2]
CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado.
presente e futuro. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2009, p.80
[3]
Os Cientistas, São Paulo: Abril Cultural, 1972, v.3, p. 740
[4]
http://g1.globo.com/natureza/noticia/2013/09/inseto-utiliza-engrenagens-nas-pernas-para-realizar-saltos-veja-video.html
[5]
https://commonfund.nih.gov/arra/currie ; Scientific American Brasil. Evolução:
a incrível jornada: a corrida das espécies, Duetto, 2001, DVD #3
[6]
DAWKINS, Richard. O maior espetáculo da terra,São Paulo: Cia das letras, 2009,
p.210
[7] http://invent.org/inductee-detail/?IID=518
[8] https://engineering.stanford.edu/magazine/article/insect-eyes-inspire-design-new-solar-cell?utm_source=SoEnewsletter
[9]
NOVELLI, Luca. Volta e a alma do robô: gênios da ciência, São Paulo:Ciranda
Cultural, 2008, p.60
[10]
HART DAVIS, Adam. O livro da Ciência, São Paulo:Globo Livros, 20144, p. 93
[11]
CHAGAS, Aécio Pereira. Os 200 anos da pilha elétrica, Quím. Nova, São Paulo ,
v. 23, n. 3, p. 427-429, June
2000; BBC, Shock And Awe The Story Of Electricity S01E01 [Full Episode]
https://www.youtube.com/watch?v=R7sgNT556PY
[12]
BENTLEY, Peter. Biologia digital, São Paulo: Ed. Berkeley, 2002, p. 60, 107,
152
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