quinta-feira, 31 de março de 2016

Apple & Xerox e propriedade industrial


A Xerox desenvolveu o primeiro computador pessoal, o Alto em 1973, uma referência a seu laboratório Palo Alto Research Center, dois anos antes que Paul Allen lançasse o Altair. O modelo previa inclusive um precursor dos protocolos IP da internet, o PARC Universal Packet que permitia diferentes redes de computação por pacotes se interconectarem. A Xerox contudo não comercializou o Alto como produto para o consumidor, pois segundo um chefe do centro de pesquisas da empresa em Nova Iorque: “o computador jamais será tão importante para a sociedade quanto uma máquina copiadora”. Segundo Bob Taylor, na época os homens achavam que saber datilografar estaria abaixo da dignidade masculina, o que frustrava as perspectivas comerciais do computador pessoal: “Era coisa que secretárias faziam. Por isso não levaram o Alto a sério, achando que só agradaria à mulheres. Para mim foi a revelação de que a Xerox jamais chegaria ao computador pessoal”.[1]

O paradigma gráfico de acionar programas com uso de ícones, desenvolvido pela Xerox, foi aproveitado por Steve Jobs nos computadores Lisa e Macintosh[2]. A Xerox PARC desenvolver a tecnologia de bitmapping que permitia o controle de cada pixel projetado na tela do computador, ao invés do processo usual de geração de padrões de letras e números usados, por exemplo, no Apple II. A Xerox, portanto, desenvolveu a interface e em 1979 demonstrou suas idéias a um grupo de engenheiros de uma pequena empresa, a Apple de Steve Jobs, que vinham trabalhando em um conceito parecido com o computador Lisa.[3] Steve Jobs em sua visita declarou: “Não posso acreditar que a Xerox não esteja tirando proveito disso”. Após a visita Steve Jobs concluiria: “Eles estavam com a cabeça em copiadoras e não tinham a mínima ideia do que um computador poderia fazer [...] Eles simplesmente transformaram em derrota a maior vitória da indústria de computadores”. O Macintosh viria a ser lançado em 1984.[4]

O designer Charles Simonyi da Xerox PARC foi contratado pela Microsoft para participar do desenvolvimento do Windows[5]. Walter Isaacson em sua biografia de Steve Jobs relata diálogo com Bill Gates, em que este ao se defender da acusação de estar copiando softwares da Apple relembra o caso Xerox: “Bem, Steve, penso que existe mais de uma maneira de ver a coisa. Penso que é assim: nós dois tínhamos esse vizinho rico chamado Xerox, invadi a casa dele para roubar o aparelho de tevê e descobri que você já tinha roubado”. O próprio Steve Jobs alimentou a tese de que de fato roubara a Xerox: “É melhor ser pirata do que entrar na Marinha”, ou então “Picasso tinha um ditado que afirmava: ‘Artistas bons copiam, grandes artistas roubam’. E nós nunca sentimos vergonha de roubar grandes ideias”. Em 1985, o então presidente da Apple John Sculley havia estabelecido um acordo com a Microsoft pelo qual licenciou para a Microsoft o direito de usar uma parte do visual gráfico da Apple no Windows 1.0 em troca da empresa continuar escrevendo o Excel para rodarem em Macintosh com exclusividade. Os problemas judiciais começaram quando a Microsoft aplicou tais recursos no Windows 2.0, que segundo a Apple não estava previsto no contrato. A Microsoft, que desenvolvia aplicativos para a Apple assinara um acordo em que se comprometia a desenvolver qualquer aplicativo que utilizasse interfaces de apontar e clicar até 1983. O Macintosh viria a ser lançado apenas em 1984. O Microsoft Windows 1.0 viria ao mercado em 1985. [6]

Três aspectos devem ser considerados neste episódio. Em primeiro lugar a Apple pagou pela tecnologia, embora por um preço pequeno se comparado com enorme sucesso que viria a ter o Macintosh. A Xerox investiu um milhão de dólares da Apple, quando de sua abertura de capital em troca da tecnologia da Xerox PARC. Em segundo lugar projetistas da Xerox como Bob Belleville e Larry Tesler foram contratados pela Apple. Em terceiro lugar o conceito de interface gráfica com tela de bitmap, janelas e conceito de desktop da Xerox não foi simplesmente copiado pela Apple mas significativamente desenvolvido tornando-o um conceito aplicável. O computador Xerox Star lançado pela empresa em 1981 foi considerado um fracasso. Com a Apple as janelas possuíam superposição de modo que pudessem se superpor uma sobre as outras, a rolagem das mesmas tornou-se muito mais suave com aperfeiçoamentos no mouse, o conceito de ícones e tipos de fontes foi enormemente ampliado além de terem introduzido conceitos novos como a capacidade de abrir arquivos e pastas com um clique duplo. [7] Com a Apple o mouse passou a ter um único botão e passou a ter o poder de arrastar documentos e pastas, assim como foram criados os menus suspensos.[8]
 





[1] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 309


[2] Computer wars: how the west can win in a post-IBM world, Charles Fergunson, Charles Morris, New York:Times Books, 1993, p.136


[3] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 377


[4] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 876


[5] Computer wars: how the west can win in a post-IBM world, Charles Fergunson, Charles Morris, New York:Times Books, 1993, p.142


[6] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 381


[7] ISAACSON, Walter. Steve Jobs. Rio de Janeiro:Ed.Companhia das Letras, 2011, p. 113-119, 196, 340


[8] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 379

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