domingo, 18 de maio de 2014

Machado de Assis examinador de patentes

Machado de Assis, que foi funcionário da Secretaria de Estado da Indústria, Viação e Obras Públicas, instituição que concedia patentes, escreveu no romance Esaú e Jacó, em 1904, uma crítica ao período de grande especulação financeira que marcou o final do século XIX, numa política conhecida como encilhamento, uma tentativa de expandir o crédito para criação de novas empresas marcada por uma avalanche de negócios fictícios: “Quem não viu aquilo não viu nada. Cascatas de ideias, de invenções, de concessões, rolavam todos os dias, sonoras e vistosas para se fazerem contos de réis, centenas de contos, milhares, milhares de milhares, milhares de milhares de milhares de contos de réis”.

No livro “Visão em vários tempos” o escritor Thiers Martins Moreira relata a crítica de Machado de Assis a uma patente de método financeiro concedida em meio a época do encilhamento. A patente nº 1440 de 30 de maio de 1892 depositada por George Boynton Boynton referia-se a processo  para formação do capital necessário a qualquer empresa por meio da distribuição de cartões numerados: “a ideia é aproveitar o bem conhecido espírito de especulação do povo, a fim de dirigir, a um destino novo e útil, o dinheiro empregado em especulações arriscadas, contrárias aos interesses do Estado, mas que não é possível abolir completamente. Calculado o capital preciso para um cometimento industrial, expõem-se á venda cartões de tal preço e em número tal que de seu produto, pagos os prêmios em dinheiro e deduzidas todas as despesas, fique um lucro líquido igual ao do capital desejado. Desses cartões se fará um sorteio, em virtude do qual serão os prêmios pagos aos portadores dos números que forem designados pela sorte. Dos números que saírem brancos se fará um segundo sorteio com certo número de prêmios, consistentes em ações da empresa a constituir. Os portadores desses prêmios do segundo sorteio serão assim acionistas da companhia que se trate fundar, cujas ações ficarão logo integralizadas e portanto independentes de mais responsabilidade para o possuidor; porquanto o capital correspondente, apurado como lucro líquido da venda dos cartões, é depositado imediatamente por conta da companhia,Estes prêmios em ações não absorvem o capital todo da companhia; as ações restantes ficam pertencendo ao indivíduo ou empresa que explorar a distribuição sistemática e nisso consiste seu lucro”.

Em maio de 1892 Machado de Assis denuncia esta patente ao Ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Antão Gonçalves de Fria, por ter sido concedida violando os termos do artigo 1º inciso 2º da Lei nº 3.129 de 1882 como ofensiva à segurança pública.[1] O depositante se defende junto ao Ministro da Fazenda que manteve a patente. Em novo parecer, de setembro de 1892 Machado de Assis mantém sua opinião em favor da nulidade da patente. Nesta época o Ministro não era mais Antão Gonçalves de faria, mas Inocêncio Serzedelo Correia, Ministro da Fazenda, no exercício interino da pasta da Agricultura, Comercio e Obras Públicas, alinhando-se com o parecer de Machado de Assis: “mantenho o despacho anteriormente dado em vista das informações e de se haver transformado a concessão e questão de loteria e numa fonte de jogo”[2]

Machado de Assis [3]




[1] http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=71854&tipoDocumento=LEI&tipoTexto=PUB
[2] JUNIOR, Magalhães. Machado de Assis – funcionário público, Ministério dos Transportes, 1970, p.67-72
[3] http://pt.wikipedia.org/wiki/Machado_de_Assis

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