terça-feira, 16 de maio de 2017

Origem da invenção

O vocábulo invenção deriva de inventio, com o sentido de descobrimento, descoberta e talvez justamente por este motivo, desde longa data encontramos as duas palavras empregadas como sinônimas [1]. Mario Biagioli destaca que o verbo em latim invenire [2]tanto significa “achar” como “criar”, de modo que em sua versão medieval patentes eram tanto concedidas para aquele que realizasse a invenção na prática em determinado local[3]. Para Isidoro de Sevilha que escreve no século VII o termo inventor significa alguém talentoso (ingeniosus), alguém que tem um poder interior (intus) de produzir (genitus) qualquer tipo de arte, descobridor (inventor) porque ele cria (invenirein venire – ir ao encontro de algo) o que está procurando. Assim a coisa procurada é chamada de invenção (inventio).[4] A João Escoto Eriúgena no século IX se deve a expressão “artes mecânicas” documentada em seu comentário à obra de Marciano Capela.[5] Ruben Requião cita o jurista Mario Viari que remete ao significado etimológico do latim invenire e se refere a invenção como “atividade humana por meio da qual são investigadas ou realizadas coisas que antes não existiam”.[6] Christine MacLeod observa que na tradição judaico cristã, onde há a presença de um único Criador, havia uma hostilidade a se referir a criatividade humana, de modo que o termo “inventar” era usado como significando “descobrir”. No século VI o termo em latin inventio significa descoberta, como a “invenção da cruz” ao se referir a descobertas de lascas de madeira que supostamente compunham a cruz de Cristo. Na língua francesa o termo “inventeur” surge em 1431 no feminino ao se referir à Joanna D’ Arc “mentirosa perniciosa, inventora de revelações e de aparições”, ou seja, está vinculado ao conceito de alguém que inventa histórias falas ou fabulosas.[7] Nicolas Binctin observa que a descoberta se refere a ação de fazer conhecer um objeto, um fenômeno escondido ou ignorado porém pré exxstente, de forma que não constitui um bem intelectual uma vez que a ausência de atividade criativa intelectual impede esta qualificação.[8] A distinção explícita da diferenciação dos dois sentidos ocorre no trabalho de Joseph Bramah escrito em 1797 ao criticar a patente de James Watt.[9] Esta distinção entre descoberta e invenção aparece no livro “Elements of the philosophy” do filósofo escocês Dugald Stewart que em 1829 escreve: “o objeto da invenção, como tem sido muito frequentemente observado, é produzir algo até então não existente, enquanto a descoberta é trazer á luz algo que existia, mas que estava oculto á observação comum. Assim Otto Guerricke inventou a bomba de ar, sanctorius inventou o termômetro, Newton e Gregory inventaram o telescópio por reflexão, Galileu descobriu as manchas solares e Harvey descobriu a circulação do sangue. Ao que parece, portanto, aperfeiçoamentos na técnica são propriamente chamados invenções, e fatos trazidos á luz por meio da observação, são propriamente chamados descobertas”.[10]

 
Dugald Stewart






[1] DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito Industrial – patentes, Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 29.


[2] Cf. POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.110


[3] BIAGIOLI, Mario. From print to patents: living on instruments in early modern Europe. Hist. Sci., xliv, 2006, p. 151 http://innovation.ucdavis.edu/people/publications/Biagioli%202006%20From%20Print%20to%20Patents.pdf


[4] Isidore de Seville p.220.X The Etymologies, Book X, Vocabulary (De vocabulis)


[5] PASQUALE, Giovannni Di. A reflexão sobre as artes mecânicas. In: ECO, Umberto. Idade média: bárbaros, cristãos e muçulmanos, v.I, Portugal:Dom Quixote, 2010, p.460


[6] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. São Paulo, Saraiva, 19ª ed, 1º vol., 1989, p. 223


[7] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 136


[8] BINCTIN, Nicolas. Droit de la propriété intellectuelle, LGDJ:Paris, 2012, p.32, 44


[9] MacLEOD, Christine. Heroes of invention. technology, liberalism and british identity 1750-1914, Cambridge University Press, 2007, p.46


[10] BEHAR, Gabriel Galvez. The propertisation o science: suggestions for an historical investigation. In: LOHR, Isabella; SIEGRIST, Hannes. Global Governance of Intellectual Property Rights, v.21, n.2, 2011, p.80-97 tp://hal.archives-ouvertes.fr/docs/00/63/37/86/PDF/GGB_FINAL.pdf

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