Em
um sentido sociológico o conceito de técnico no assunto se aproxima do conceito
weberiano de “tipo ideal”. O técnico
no assunto opera segundo uma racionalidade com relação a um objetivo determinado
por expectativas no comportamento tanto de objetos do mundo exterior como de
outros homens utilizando essas expectativas como condições ou meios para alcance
de fins próprios racionalmente avaliados e perseguidos.[1] O
tipo ideal, segundo Weber, escrevendo no início do século XX, trata-se de um
conceito sociológico puramente conceitual que expõe como se desenvolveria uma
forma particular de ação social se o fizesse racionalmente em direção a um fim.[2] Cada
tipo ideal ao acentuar o que é característico no grupo, busca a apreender o que
é essencial nele para a análise sociológica[3]. Segundo
Stephen Kalberg “Os tipos ideais não são
estáticos, mas construídos a partir de uma série de orientações regulares de
ação”.[4] Uma
das principais características do tipo ideal é o fato de que não corresponde à
realidade, mas pode ajudar em sua compreensão[5]: “Um conceito ideal é normalmente uma
simplificação e generalização da realidade. Partindo desse modelo, é possível
analisar diversos fatos reais como desvios do ideal: Tais construções (...)
permitem-nos ver se, em traços particulares ou em seu caráter total, os
fenômenos se aproximam de uma de nossas construções, determinar o grau de
aproximação do fenômeno histórico e o tipo construído teoricamente. Sob esse
aspecto, a construção é simplesmente um recurso técnico que facilita uma
disposição e terminologia mais lúcidas”.[6] Segundo
Max Weber: “obtém-se um tipo ideal pela
acentuação unilateral de um ou vários pontos de vista e pela síntese de muitos
fenômenos individuais concretos, difusos, discretos, mais ou menos presentes e às
vezes ausentes, que são organizados segundo os pontos de vista unilateralmente
acentuados a fim de formar um constructo analítico homogêneo. Em sua pureza
conceitual, esse constructo não pode ser encontrado empiricamente, na
realidade, em lugar nenhum”.[7]
Na
concepção de Max Weber, o tipo ideal é um instrumento da análise sociológica
elaborado para a apreensão de fenômenos sociais. O tipo ideal não está ligado à
"maioria" ou a uma média de valores encontrados na realidade, mas o
de uma síntese idealizada da realidade social. Exemplo de tipo ideal é o "homem cordial", em Sérgio Buarque
de Holanda em sua obra Raízes do Brasil.
Denis Barbosa define o técnico no assunto como um tipo ideal weberiano: “o técnico na arte provido dos conhecimentos
gerais do estado da técnica e da experiência no ramo onde o invento se propõe
solucionar o seu problema técnico”. Ao raciocinar de forma óbvia, ou seja,
dentro daquilo que pode ser entendido como a “dinâmica natural, ou crescimento vegetativo, do estado da técnica”[8], o
técnico no assunto obtém soluções que outros indivíduos dentro do mesmo tipo
ideal invariavelmente atingiriam de forma natural.
Karl
Marx contrapõe-se à visão de Weber na medida em que não entende os
acontecimentos sociais como passíveis de projeções ideais, para poder realizar
uma análise. Marx, entende a sociedade como um conjunto de determinações
históricas, culturais, econômicas e políticas: as sociedades se estruturam
conforme a produção material de bens. No entanto, Marx também idealiza um “trabalhador médio”[9] para
desenvolver sua teoria de valor. No primeiro volume de sua obra “O Capital”,
publicada em 1867, Karl Marx desenvolve sua teoria do valor do trabalho na qual
a grandeza de valor de um produto é dada pelo tempo de trabalho médio
necessário ou tempo de trabalho socialmente necessário para a produção do
produto. O preço de uma mercadoria é apenas a denominação monetária da
quantidade de trabalho social nela objetivado, ou seja, dada pela média
socialmente necessária de tempo de trabalho:[10] “o trabalho objetivado em valor é trabalho de
qualidade social média e, portanto, a exteriorização de uma força de trabalho
média. Mas uma grandeza média só existe como média de diferentes grandezas
individuais da mesma espécie. Em cada ramo da indústria o trabalhador
individual, Pedro ou Paulo, difere mais ou menos do trabalhador médio. Esses
desvios individuais, que matematicamente se chamam ‘erros’, compensam-se
mutuamente e desaparecem assim que se considere um número maior de
trabalhadores”. [11]
Ainda segundo Marx a maquinaria contribuiu para esta uniformização do
trabalhador: “a uniteralidade e mesmo a
imperfeição do trabalhador parcial convertem-se em sua perfeição como membro do
trabalhador coletivo”.[12] Karl
Mannheim critica as perspectivas do intelectualismo burguês de criação de tipos
ideais tais como “um homem econômico”
ou “um homem político” independente
de aspectos subjetivos, reunindo um conjunto purificado de conhecimento
destituído de qualquer percepção sensorial do indivíduo. Para Karl Mannheim,
esta construção é um reflexo do positivismo moderno que sempre manteve sua
afinidade com a visão liberal burguesa e que se baseava no ideal de ciência
objetiva onde os aspectos subjetivos eram considerados pré-científicos e menos
valorizados[13].
O
conceito de homem mediano, remete a conceitos utilizados em estatística e
desenvolvidos por Jacques Quételet em sua publicação de 1835 denominada de "Sur l'homme et le developpement de ses
facultés, essai d'une physique sociale"[14] em
que aplica a análise matemática no comportamento humano sob o ponto de vista da
sociologia.[15]
Quételet apresentou sua concepção do homem médio (l´homme moyen), modelo padrão para o comportamento humano, como o
valor central das medidas de características humanas que são agrupadas de
acordo com a curva normal.[16] Suas
pretensões eram a de utilizar a distribuição normal para esclarecer a natureza
das pessoas e da sociedade o que levaria às leis que descreveriam o
comportamento humano e assim conseguir prever de que modo as forças sociais
transformariam as características da sociedade. Na sua concepção o homem médio
estaria sujeito à variação no tempo e em diferentes culturas. O impacto direto
das teorias de Quételet sobre as ciências sociais, contudo, foi pouco
expressivo. Os trabalhos em estatística de Quételet foram aplicados nas
ciências naturais, como por exemplo, em estudos de dados biométricos por
Francis Galton[17]
ao redescobrir as impressões digitais, criando o primeiro sistema de
identificação pessoal e nos estudos do movimento browniano em física
estatística por Albert Einstein.[18]
[1]
http://pt.wikipedia.org/wiki/Max_Weber
[2]
http://www.culturabrasil.pro.br/weber.htm
[3] KALBERG, Stephen. Max
Weber: uma introdução, Rio de Janeiro:Zahar, 2010, p. 145
[4] KALBERG, Stephen.
op.cit, p. 75
[5]
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tipo_ideal
[6] WEBER, Max. A
“objetividade” do conhecimento das ciências sociais, Ática, 2006
[7] KALBERG, Stephen. Max
Weber: uma introdução, Rio de Janeiro:Zahar, 2010, p. 42
[8] BARBOSA, MAIOR, RAMOS,
op.cit., p.74
[9] MARX, Karl. O capital,
livro I: o processo de produção do capital,São Paulo:Boitempo, 2013, p.376
[10] MARX, Karl. Op.cit,
p.117
[11] MARX, Karl. Op.cit,
p.397
[12] MARX, Karl. Op.cit,
p.423
[13] MANNHEIM, Karl.
Ideologia e utopia. Rio de Janeiro: Zahar, 1968, p. 190
[14] RONAN, Colin. História
Ilustrada da Ciência, vol. IV A ciência nos séculos XIX e XX, Rio de Janeiro:
Zahar, 1987, p.74
[15] SEDGWICK, W.; TYLER, H;
BIGELOW, R. História da ciência: desde a remota antiguidade até o alvorescer do
século XX, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1952, p.333
[16] BELLOS, Alex. Alex no
país dos números. São Paulo:Cia das Letras, 2011, p.387
[17] SALGADO-NETO, Geraldo;
SALGADO, Aquiléa. Sir Francis Galton e os extremos superiores da curva normal.
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, v. 45, n. 1, p. 223-239, jan. 2011.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/revistacfh/article/view/2178-4582.2011v45n1p223
[18] MLODINOW, Leonard. O
andar do bêbado, Rio de Janeiro:Zahar, 2011, p. 200
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