sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

O impacto da patente da fucsina

Na França importantes invenções marcaram a indústria química tais como o desenvolvimento da fucsina, aperfeiçoamento do corante vermelho anilina por Natanson e pelo químico Verguin de Lyon em abril de 1859. A fucsina é um desenvolvimento do corante artificial anilina patenteado na Inglaterra por Perkin em 1856. O princípio de fabricação da fucsina foi objeto de uma comunicação à Academia de Medicina de Londres em setembro de 1858 por Hoffman, porém na época nenhuma aplicação industrial foi apresentada. As patentes de Verguin depositadas em 8 de abril de 1859 foram licenciadas na França para os irmãos Renard. [1]Lyon, Alsácia e Paris tornaram-se grandes grandes mercados para a nova produção de corantes químicos. No entanto, apesar da posição de monopólio dos irmãos Renard, muitos dos produtores franceses arruinaram-se uns aos outros numa dispendiosa guerra de patentes na década de 1860. A La Fuchsine, maior empresa de corantes do mundo na época pediu falência em 1868 [2]. A disputa resultou no desinteresse dos químicos franceses pela química orgânica da segunda metade do século XIX que migraram para o exterior em busca de um ambiente de maior liberdade de empreendimento sem as ameaças de contrafação de uma patente. Segundo Alain Beltran isto teve impacto em frear o desenvolvimento da química orgânica francesa da época, enquanto os alemães demonstraram sua domínio completo nas estratégias de propriedade industrial.[3]

A crise desencadeia críticas ao sistema de patentes como as de Michel Chevalier, um dos principais conselheiros econômicos de Napoleão III, e que em uma carta publicada em 1863 aponta o sistema de patentes como um ultraje à liberdade e à indústria (un outrage à la liberté et à l´industrie) um entrave ao progresso social que deveria ser abolido, e substituído por um mecanismo de recompensas pecuniárias ao inventor.[4] Michel Chevalier se dirigiu à delegação francesa na Exposição universal de Londres de 1862 numa cruzada contra as patentes, ainda que sem grande e sucesso. Michel Chevalier quando se discutia a patenteabilidade de produtos químicos na legislação de 1844, que ao final dos debates foi aprovada, comentou que “se vocês patentearem os produtos químicos, vossa legislação agirá tal como o Edito de Nantes: ela obrigará a indústria nacional se expatriar” para outros lugares onde não haviam patentes de produtos químicos mas apenas de processos como a Alemanha. O episódio com a patente da fucsina que se seguiu apenas alguns anos depois veio a confirmar as previsões de Michel Chevalier, onde alguns fabricantes franceses de processo alternativo á fucsina vieram a se estabelecer na Suiça.[5]

Com a queda do governo imperial em 1870, e o retorno de políticas protecionistas, o debate em torno da reforma da lei de patentes foi suspenso.[6] A revista The Times que na década de 1860 promovia campanha pelo fim das patentes em editorial de 9 de dezembro de 1874 já defende a reforma do sistema de patentes, já não tratando da abolição do sistema.[7] Em 1878 Michel Chevalier, sob a República Francesa e já sem o mesmo papel político de antes escreve outro artigo contrário as patentes: “as patentes de invenção estão fundamentadas sobre um erro e resultam de uma reação exageradas e um pouco cega em favor dos direitos da inteligência”. [8] Michel Chevalier observa o rápido avanço da tecnologia fotografia de Daguerre e Niépce, não patenteada, como exemplo de como a tecnologia pode progredir mais dinamicamente sem as patente e zomba sarcasticamente do grande aumento de depósitos de patentes entre 1791 e 1870, um aumento de 6 mil depósitos anuais para cerca de 70 mil: “que avalanche de genialidade, Deus meu””. Os argumentos de Michel Chevalier serão retomados em 1889 por F. Malapert ao negar que uma invenção possa ser objeto de propriedade diante sua intangibilidade: “o direito de consumir ou de destruir é o sinal real e palpável que caracteriza o direito de propriedade”.[9]


Michel Chevalier [10]




[1] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 174, 227; POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la Contrefaçon. Marchal et Bilard:Paris, 1899, p.401
[2] LANDES, David. Prometeu desacorrentado. Rio de Janeiro: Elsevier, p. 286 .
[3] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 268
[4] POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la Contrefaçon. Marchal et Bilard:Paris, 1899, p,xi; PICARD, Edmond; OLIN, Xavier, Traité des brevets d'invention et de la contrefaçon industrielle, précédé d'une théorie sur les inventions industrielles, 1869, p. 35
[5] CERQUEIRA, Gama. Tratado de propriedade Industrial, v.1, p.349; HAEGHEN, Vander. Brevets d'invention marques et modèles, Bruxelas:Ed. Ferdinand Larcier, 1928, p.141
[6] JAFFE, Adam; LERNER, Josh. Innovation and its discontents: how our broken patent system is endangering innovation and progress, and what to do about it. Princeton University Press, 2007, p. 1861/5128 (kindle version)
[7] MacLEOD, Christine. Heroes of invention. technology, liberalism and british identity 1750-1914, Cambridge University Press, 2007, p.275
[8] CHAVALIER, Michel. Les brevets d’ invention examines dans leur rapports avec le principe de la liberté du travail et avec de principe de l’ egalité des citoyens, Paris, Guillaumin, 1878. Cf. BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 213
[9] MALAPERT, F. Des lois sur lês brevets d’ invention dans leurs rapports avec lês progress de l’ industrie, Paris, Chamrot, 1889, p.9 cf. BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 214
[10] http://pt.wikipedia.org/wiki/Michel_Chevalier

Nenhum comentário:

Postar um comentário