quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Criação da Convenção Europeia de Patentes em 1973

Um primeiro acordo efeito na direção da uniformização do sistema de patentes europeu veio com a criação do IIB International Patent Institute (ou no original IIB Institut International des Brevets) em 6 de junho de 1947 no Acordo de Haia pela França e os países do Benelux com o objetivo de realizar as buscas por novidade das patentes (sem exame substantivo) depositadas nestes países. O IIB com sede em Haia na Holanda, que posteriormente viria a compor o EPO. Isto explica o porque da sede da EPO em Haia ter se dedicado inicialmente apenas as atividades de busca. [1] posteriormente outros países aderiram ao IIB:  Turquia (1955) para exame técnico de todos os pedidos, Marrocos (1956), Mônaco, Suíça (realizando o exame técnico de relojoaria e têxteis) e Inglaterra (1965) e Itália (1974).[2] Em 19 de dezembro de 1954 a classificação internacional de patentes adotada pelo Acordo de Estrasburgo foi um passo importante para uma patente comum na Europa, antes mesmo da entrada em vigor do Tratado de Roma em 1958.[3] 

Nesta ocasião foi levantada a ideia de se criar uma Oficina Europeia de Patentes de modo que uma primeira convenção nesse sentido foi assinada de 27 de novembro de 1963 em Estrasburgo que estabeleceu critérios de exame comuns que vieram a ser adotados pela lei francesa de 2 de janeiro de 1968[4]. Entre estes critérios destacavam-se como centrais o conceito de novidade absoluta, a presença de atividade inventiva  como aquilo que não fosse decorrência óbvia do estado da técnica para o técnico no assunto, a aplicação industrial e o fato de que o direito conferido pela patente deveria estar determinado pelas reivindicações.[5] François Panel destaca que a inserção do conceito de atividade inventiva foi muito importante para a França que teve de ajustar sua legislação nacional que previa apenas o conceito de novidade.[6] Para Paul Mathély como o mercado comum tornou-se inevitável a unificação do regime de patentes europeu: “existe uma contradição radical entre o estabelecimento de um mercado comum e, no interior deste mercado, um particionamento a partir dos direitos de propriedade industrial. Estava bem claro que um mercado comum exige uma patente comum[7] A proposta original preparada em 1962 em anteprojeto de autoria de Kurt Haertel presidente do Deutsches Patentamt previa a patente comunitária no entanto não encontrou condições políticas para aprovação e teve de ser abandonado em 1965. 

François Panel observa que no pós guerra  poucos poderiam imaginar que dez anos depois estaria se discutindo um sistema de patente que toma como modelo o sistema alemão. A Alemanha de Hitler em 1942-1943 havia tentado impor tal modelo à uma Europa controlada[8]. François Panel, contudo, nega que a Europa libertada tenha guardado algum ressentimento desta proposta alemã[9]. Para François Panel as razões do fracasso na iniciativa se devem a questões de regras de acessibilidade e a cláusulas econômicas. Uma das propostas do plano Haertel previa a não acessibilidade, o que excluía os Estados Unidos que teria de continuar utilizando o sistema nacional de patentes. François Panel lembra que a legislação norte americana de primeiro a inventar beneficiava os inventores norte americanos residentes em detrimento dos direitos de prioridade unionista dos inventores europeus não residentes. No aspecto econômico muitas empresas não concordavam com a cláusula de exaustão de direitos da patente após a primeira venda do produto patenteado. Outra questão era o receio dos escritórios nacionais europeus de perda de receita com a respectiva diminuição dos depósitos nacionais com a entrada em vigor de uma patente  européia. Com o fracasso das negociações os Estados Unidos voltaram-se para o BIRPI e iniciaram em 1967 a articulação para criação do sistema PCT.[10] A proposta de uma patente européia foi retomada por iniciativa da França em 1969 em conferência intergovernamental presidida por Haertel e Savignon presidente do INPI francês e que levou a assinatura da Convenção de Munique em 5 de outubro de 1973.

Segundo Rodrigo Souto Maior o fracasso na negociação de uma patente europeia levou à busca de uma solução junto à OMPI [11]. As negociações que antecederam a assinatura do PCT se estenderam de 1966 a 1970. Em junho de 1965 a National Association of Manufacturers lançou a ideia de uma conferência internacional. O Conselho executivo da União de Paris em 1966 retomou o tema e os Estados Unidos em particular manifestou a “urgência de estudos que tendam a reduzir o retrabalho no exame das patentes, e as taxas de admissão exigidas tanto pelos depositantes quanto aos escritórios nacionais”.[12] Arpad Bogsch relata que na época da idealização do PCT a duplicidade de esforços de exame entre os diferentes escritórios e a falta de um relatório ainda que preliminar que pudesse orientar as ações dos depositantes obrigados a aguardar anos por uma decisão final de seus pedidos, constituíam dois problemas críticos do sistema de patentes: “os criadores do PCT sabiam que eles não poderiam resolver completamente estes problemas. Mas eles tentaram – e eu acredito com sucesso – ao reduzir a sobrecarga de repetidas buscas e exames e a multiplicidade de pedidos de traduções. O primeiro problema foi resolvido – parcialmente eu repito – através da introdução dos relatórios de busca e exame preliminar”.[13]

Uma minuta do Tratado foi assinada em junho de 1970. A assinatura do PCT impulsionou a retomada das negociações [14]. para conclusão de um acordo de harmonização e unificação dos procedimentos de exame e concessão de patentes na Europa que veio a ser assinada em 1973. Um importante fator para o sucesso das negociações do PCT segundo Arpad Bogsch diretor geral da OMPI (1973-1997) foi o apoio dos Estados Unidos. A proposta tinha como metas a redução do backlog dos escritórios de patentes, bem como a elaboração de um relatório de busca e exame que pudesse servir de orientador para os exames dos diferentes países bem como para o requerente. A primeira reunião convocada pelo BIRPI em 1967 teve a participação de França, Alemanha, Japão, União Soviética, Inglaterra, Estados Unidos e do IIB [15].


Kurt Haertel [16]



[1] GUELLEC, Dominique; POTTERIE, Bruno van Pottelsberghe de la. The economics of the european patent system. Great Britain:Oxford University Press, 2007, p.27; DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambridge University Press:United Kingdom, 2010, p.117; MATHÉLY, Paul. Le droit européen des brevets d'invention, Journal des notaires et des avocats:Paris, 1978 p.7
[2] PANEL, François. La protection des inventions en droit européen des brevets. Collection du CEIPI, Paris:Litec, 1977, p.2
[3] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 80; MATHÉLY, Paul. Le droit européen des brevets d'invention, Journal des notaires et des avocats:Paris, 1978 p.8
[4] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.100
[5] MATHÉLY, Paul. Le droit européen des brevets d'invention, Journal des notaires et des avocats:Paris, 1978 p.9
[6] PANEL, François. La protection des inventions en droit européen des brevets. Collection du CEIPI, Paris:Litec, 1977, p.3
[7] MATHÉLY, Paul. Le droit européen des brevets d'invention, Journal des notaires et des avocats:Paris, 1978 p.7
[8] LEPETRE, J. Le brevet européen et les problèmes de l’unification des législations nationales em matière de proprieté industrielle, Paris, 1971
[9] PANEL, François. La protection des inventions en droit européen des brevets. Collection du CEIPI, Paris:Litec, 1977, p.5
[10] PANEL, François. La protection des inventions en droit européen des brevets. Collection du CEIPI, Paris:Litec, 1977, p.8
[11] BARBOSA, Denis Borges; MAIOR, Rodrigo Souto; RAMOS, Carolina Tinoco, O contributo mínimo em propriedade intelectual: atividade inventiva, originalidade, distinguibilidade e margem mínima. Rio de Janeiro: Lumen, 2010. p. 193.
[12] BELTRAN, Alain; CHAUVEAU, Sophie; BEAR, Gabriel. Des brevets et des marques: une histoire de la propriété industrielle, Fayard, 2001, p. 78
[13] WIPO. The First Twenty-five Years of the Patent Cooperation Treaty (PCT) 1970-1995, Geneva, 1995, p.10
[14] CORNISH, William, LLEWELYN, David. Intellectual property: patents, copyright, trade marks and allied rights. London: Sweet&Maxwell, 2007. p. 127.
[15] http: //en.wikipedia.org/wiki/International_Patent_Institute.
[16] http://en.wikipedia.org/wiki/Kurt_Haertel

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