O vocábulo invenção
deriva de inventio, com o sentido de descobrimento, descoberta e talvez justamente por este motivo, desde
longa data encontramos as duas palavras empregadas como sinônimas [1]. Mario Biagioli destaca que o verbo em latim invenire [2]tanto
significa “achar” como “criar”, de modo que em sua versão
medieval patentes eram tanto concedidas para aquele que realizasse a invenção
na prática em determinado local[3].
Ruben Requião cita o jurista Mario Viari que remete ao significado etimológico
do latim invenire e se refere a
invenção como “atividade humana por meio
da qual são investigadas ou realizadas coisas que antes não existiam”.[4]
Christine MacLeod observa que na tradição judaico cristã, onde há a presença de
um único Criador, havia uma hostilidade a se referir a criatividade humana, de
modo que o o termo “inventar” era usado como o significando “descobrir”. A
distinção explícita da diferenciação dos dois sentidos ocorre no trabalho de
Joseph Bramah escrito em 1797 ao criticar a patente de James Watt.[5]
Esta distinção entre descoberta e invenção aparece no livro “Elements of the philosophy” do filósofo
escocês Dugald Stewart que em 1829 escreve: “o objeto da invenção , como tem sido muito frequentemente observado, é
produzir algo até então não existente, enquanto a descoberta é trazer á luz
algo que existia, mas que estava oculto á observação comum. Assim Otto
Guerricke inventou a bomba de ar, sanctorius inventou o termômetro, Newton e
Gregory inventaram o telescópio por reflexão, Galileu descobriu as manchas
solares e Harvey descobriu a circulação do sangue. Ao que parece , portanto,
aperfeiçoamentos na técnica são propriamente chamados invenções, e fatos
trazidos á luz por meio da observação, são propriamente chamados descobertas”.[6]
O uso indistinto entre inventos
e descobertas é uma repercussão do texto da Constituição norte americana
de 1787 [7]. A Constituição dos Estados Unidos de 1787 confere aos
autores e inventores o direito exclusivo a seus “escritos e descobertas”
(To promote the Progress of Science and
useful Arts, by securing for limited Times to Authors and Inventors the
exclusive Right to their respective Writings and Discoveries).[8]
Mesmo no recente caso KSR v. Teleflex de 2007 a Suprema Corte afirmou: “as
invenções na maioria, se não em todos os casos, dependem de blocos há muito
descobertos, e as descobertas reivindicadas quase que necessariamente serão
combinações do que, em algum sentido, já é conhecido” [9].
A lei de patentes
francesa de 7 de janeiro de 1791 em seu artigo 1º estabelece que “toda descoberta ou invenção nova sobre todos
os gêneros da indústria serão de propriedade de seu autor – Toute découverte ou nouvelle invention, dans
tous les genres d’ industrie, esta la proprieté de son auteur”.[10]
Nouguier observa que a invenção produz “alguma
coisa nova que não existia antes; a descoberta põe luz em algo que já existia,
mas que até então havia escapado á observação”, no entanto, Pouillet
observa de que do ponto de vista jurídico as duas palavras são utilizadas de
forma indiferente uma da outra.[11]
Da mesma forma não se observa nesta época distinção entre “autores” (les auteurs) e “inventores” (les inventeurs).[12]
No Recueil Général de la legislation et des Traités concernant la Proprieté
Industrielle de 1896 se anota: “a lei
(francesa) toma as palavras invenção e descoberta como sinônimas de odo que sob
o ponto de vista prático, não tem interesse a distinção. Mas em linguagem mais
rigorosa, estas duas palavras não tem o mesmo significado. A descoberta é o
fatio de conhecer uma coisa já existente, mas cuja existência ainda não tinha
sido verificada – descoberta das manchas de sol por Galileu, descoberta da América
por Colombo. A invenção consiste no fato de uma pessoa conceber ou realizar uma
coisa que não existe, ou que ela julga não existir – invenção da máquina
penumática por Otto Guericke, invenção da imprensa de Guttemberg. Na verdade a
desciberta, não pode, em regra ser objeto de patente, por não possuir caráter
industrial”.[13] Vander Haeghen ao
escrever em 1928 sobre a lei belga de forte influência francesa já aponta a
diferença entre descoberta e invenção: “a
descoberta é o resultado de um trabalho de observação e não de criação” e
remete a conceito de Jose Kohler: “a descoberta é o reflexo do mundo exterior
ao espírito do homem” e ao mesmo trecho da obra de Dugald Stewart citado anteriormente.[14]
Dugald Stewart [15]
[1] DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito
Industrial – patentes, Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 29.
[2] Cf. POLLAUD-DULIAN, Frédéric ,
Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris,
2011, p.110
[3]
BIAGIOLI, Mario. From print to
patents: living on instruments in early modern Europe. Hist. Sci., xliv, 2006,
p. 151 http://innovation.ucdavis.edu/people/publications/Biagioli%202006%20From%20Print%20to%20Patents.pdf
[4]
REQUIÃO, Rubens. Curso de
Direito Comercial. São Paulo, Saraiva, 19ª ed, 1º vol., 1989, p. 223
[5] MacLEOD, Christine. Heroes of
invention. technology, liberalism and british identity 1750-1914, Cambridge
University Press, 2007, p.46
[6] BEHAR, Gabriel Galvez. The
propertisation o science: suggestions for na historical investigation. In:
LOHR, Isabella; SIEGRIST, Hannes. Global Governance of Intellectual Property
Rights, v.21, n.2, 2011, p.80-97
tp://hal.archives-ouvertes.fr/docs/00/63/37/86/PDF/GGB_FINAL.pdf
[7] “the
congress shall have power to promote the progress of science and useful arts,
by securing for limited times to authors and inventors
the exclusive right to their respective writings and discoveries” U.S. Constitution – Article 1 Section 8 http:
//www.usconstitution.net/xconst_A1Sec8.html.
[9] BARBOSA, Denis Borges; MAIOR, Rodrigo Souto; RAMOS, Carolina
Tinoco. O contributo mínimo em propriedade intelectual: atividade inventiva,
originalidade, distinguibilidade e margem mínima. Rio de Janeiro: Lumen, 2010. p. 101.
[10] RENOUARD, Augustin. Traité
des brevets d’invention, de perfectionnement et d’ importation, Paris, 1825,
p.424
[11]
POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la
Contrefaçon. Marchal et
Bilard:Paris, 1899, p.9
[12]
BERTRAND, André. La propriété intellectuelle, Livre II, Marques et Breves Dessins
et Modèles, Delmas:Paris, 1995, p.79
[13]
Propriedade
Industrial, Assemblea Nacional, Parecer da Câmara Corporativa acerca da
proposta de lei sobre propriedade industrial, Lisboa, 1937, p. 97
[14] HAEGHEN, Vander. Brevets
d'invention marques et modèles, Bruxelas:Ed. Ferdinand Larcier, 1928, p.55
[15] http://pt.wikipedia.org/wiki/Dugald_Stewart
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