sábado, 23 de agosto de 2014

Importação paralela no Brasil

O artigo 68 parágrafo 1o inciso I da LPI estabelece que ensejam licença compulsória: “a não exploração do objeto da patente no território brasileiro por falta de fabricação ou fabricação incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica, quando será admitida a importação”, ou seja, se a tecnologia possui viabilidade econômica para produção local e titular não a explora, está sujeito à licença compulsória, por outro lado se alega inviabilidade econômica para produção local, então neste caso terceiros poderão importar o produto patenteado.

O produto importado deverá ter sido colocado no mercado externo diretamente pelo titular ou com seu consentimento, caso contrário, tal importação constituirá crime (Artigo 184 inciso II da LPI). Denis Barbosa [1] alerta: “com muito mais razão se aplicará aqui a regra de que não há crime se a importação se faz licitamente – quando o consentimento do titular era inexigível por ter expirado ou inexistir vedação de fabricação no país de onde se importa”. Portanto, a LPI dispõe de mecanismos para coibir estas práticas consideradas lesivas à sociedade.

Está em tramitação no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 139/99 proposto pelo então Deputado Alberto Goldman (PSDB/SP) que visa a permitir a importação paralela e possibilitar o licenciamento compulsório sempre que o objeto da patente não for explorado no território brasileiro (por falta de fabricação ou manufatura incompleta do produto, ou ainda pela falta de uso integral do processo patenteado), independentemente de viabilidade econômica [2]. Segundo o deputado o Artigo 68 da LPI permite que “se uma empresa entende ser mais interessante instalar uma planta industrial na Argentina e exportar seu produto para o Brasil, ela tem a garantia de reserva do mercado brasileiro, mesmo decorrido o prazo de três anos da concessão de patente previsto no parágrafo 5º do Artigo 68 para que seja requerida a licença compulsória. É uma verdadeira aberração”.

O PL 824/91 que deu origem a LPI o Artigo 58 definia como exploração local efetiva a fabricação completa do produto objeto da patente ou o uso integral do processo patenteado pelo titular ou seu licenciado e sua comercialização de modo a satisfazer as necessidades do mercado dentro das normas e especificações técnicas. A importação poderia ser considerada exploração efetiva quando entre outras condições a sua fabricação no País fosse comprovadamente antieconômica considerando-se o nível da demanda interna e o seu preço em comparação com o produto importado. A Mensagem Presidencial nº 192 que encaminha o PL 824/91 ao Congresso destaca as vantagens da exaustão internacional: “Dentro desse entendimento, caso haja disponibilidade no mercado internacional, o produto, ainda que patenteado no Brasil, poderá ser livremente importado, desde que tenha sido produzido pelo titular ou pessoa por ele autorizada”. O texto justifica a adoção da exaustão internacional pelo fato de na época estar sendo admitida pela maioria dos países que integravam o grupo negociador de TRIPs. No entanto, cumpre destacar que esta perspectiva não se confirmou, uma vez que o texto final de TRIPS se isenta quanto a questões relacionadas á exaustão de direitos do titular da patente. (Artigo 6º). 

Na Europa  Corte de Justiça em decisão de 1996 entendeu que se um produto é colocado em circulação em um território de algum país membro da Comunidade Europeia como consentimento do titular do direito , tal direito se exaure  conforme a doutrina da exaustão de direitos (règle de l’ épuisement du droit) do objeto em questão, que deve então circular livremente dentro do conjunto de países que forma a União Europeia conforme o artigo 36 do Traité sur de fonctionnement de l’Union européenne (TFUE) antigo artigo 36 do Tratado de Roma . O titular do direito não poderá restringir tal circulação livre alegando concorrência desleal quando da importação paralela deste produto. [3]

O Relator Ney Lopes em seu substitutivo PL 824-A, manteve o princípio da exaustão internacional ou importação paralela, porém restringiu sua aplicação apenas para a importação direta do titular da patente ou de seu licenciado no exterior: “Não permitimos, porém, que a pura e simples importação caracterize a exploração do objeto da patente, a contrapartida à concessão de patentes para os setores que atualmente não são protegidos está vinculada à criação de empregos, pagamentos de impostos em nosso país. Exigimos, portanto, a produção local, como regra geral”.

Em seu substitutivo PL 824-A o relator Ney Lopes vinculou a licença compulsória ao exercício abusivo dos direitos pelo titular. Desta forma no substitutivo PL  824-A (Artigo 72) o titular que , explorando ou não, exercer os direitos patentários de forma abusiva estaria sujeito a ter sua patente licenciada compulsoriamente. O deputado Pratini Moraes (PDS/RS) apresentou emenda em abril de 1993 que previa a possibilidade de importação pelo titular como forma de exploração efetiva nos casos em que a comercialização da matéria  patenteada fosse objeto de acordo internacional: “a emenda visa definir melhor os casos em que não cabe a licença compulsória. A crescente internacionalização da economia brasileira e os acordos firmados com países como os que temos em âmbito do Mercosul, recomendam que não se obrigue a licença compulsória quando o país tiver interesses comerciais a preservar

O texto final da LPI permite a importação por terceiros apenas quando da não exploração do objeto da patente no território brasileiro pelo titular ou licenciado, por falta de fabricação ou fabricação incompleta do produto, ou, ainda, a falta de uso integral do processo patenteado, ressalvados os casos de inviabilidade econômica (Artigo 68, parágrafo 1º).





[1] BARBOSA, Denis. Uma Introdução à propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 468.
[2] http: //www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=15088.
[3] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellctuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.57

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