Continuam oportunas as
recomendações da Portaria n° 11 de 22 de julho de 1949 do antigo DNPI aos
examinadores de patentes: “os pareceres
deverão ser devidamente fundamentados, e quando contrários à concessão da
patente, deverão mencionar especificamente as anterioridades apuradas, com
indicação precisa da sua natureza e origem, de modo que os inventores possam
plenamente conhecê-los e identificá-las”. [1] Alexandre Gnocchi complementa: “o
examinador, devendo pronunciar-se sobre a privilegiabilidade de uma invenção,
não poderá limitar-se a um lacônico parecer, ou a um ‘nada consta’, ou
simplesmente opinar pelo deferimento ou indeferimento do pedido. Ditos
pareceres – que custam ao inventor uma taxa de Cr$4153,00 – deverão ser
devidamente fundamentados e, quando contrários ao privilégio, especificar com
clareza as anterioridades, anexando cópias das patentes apontadas, para
facilitar ao interessado identificá-las e eventualmente discuti-las. O inventor
tem todo o direito de saber a respeito da sua invenção; um direito que a
Constituição Federal lhe assegura”.[2] Segundo o artigo 37 da Constituição Federal a administração pública direta e
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência. A lei n° 9784/99 no artigo 2° estabelece
que a Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da
legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade,
moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público
e eficiência.
O STF[3] em decisão de 1966 sobre a nulidade da patente n° 45718 referente a um processo de preparação de um produto empregado em composições para acabamento de artefato ou outros artigos de metais ferrosos e não ferrosos, suas ligas e as composições assim obtidas, o juiz Evandro Lins e Silva reproduz o lacônico parecer de deferimento do DNPI: “O pedido está, a meu ver, bem definido e delimitado em suas reivindicações. Como não tenha encontrado qualquer anterioridade que possa afetar a sua novidade, opino pelo deferimento do presente pedido”[4]. O juiz concorda com o parecer do Ministro Oscar Saraiva de que o parecer é “um mero nada consta, não tendo afirmado positivamente que havia novidade no processo para o qual era pedida a patente. Na verdade, o perito afirmou, apenas, que nada conhecia em matéria de anterioridade. Assim, a patente, ao ser expedida, apoiou-se apenas numa ficção legal de um ato formal, e não na seriedade de um exame técnico fundado [...] No caso, não houve exame técnico feito pelo próprio DNPI, que se limitou a um sucinto e inconveniente parecer, que não se fundou em quaisquer elementos, por ocasião da patente”.[5]
Nos casos em que há falta de fundamentação
de pareceres do INPI os juízes tem acolhido a argumentação da perícia. Por
exemplo, o TRF2 em Jorge Haidamus v. Rubens Cunha ao analisar a nulidade da
patente PI0212855 comenta sobre o primeiro parecer do INPI como “absolutamente vago, restringindo-se em
descrever as anterioridades apontadas, sem se preocupar em tecer nenhuma
consideração, para concluir dizendo: “Após a análise das argumentações objeto
da ação de nulidade em questão, entendemos que a matéria objeto da patente
PI0212855 carece de atividade inventiva face às informações trazidas pelos
documentos de patente MU8002354; JP3140584 e US5076016” À míngua desses
esclarecimentos, insuficientes para elidir as conclusões do Laudo, quedo-me
convicto da que a prova pericial enfrenta melhor a matéria, demonstrando que a
patente reúne os requisitos legais, devendo ser mantida”.[6]
Para Denis
Barbosa a
busca de anterioridades é um elemento fundamental para o exame de uma patente: “O ato administrativo que concede a patente
tem de apoiar-se no exame técnico. Ora, a busca é um elemento inescapável dessa
motivação. Se a folha de busca indicasse inexistir anterioridades, a motivação
seria errônea. O ato mereceria correção. A patente em si mesma seria nula, mas
simplesmente pela carência de um requisito fático. Com a vacuidade da folha de
busca, falta um elemento essencial da motivação”[7], no
entanto, o fato de não ter encontrado anterioridades relevantes para incluí-las
em seu relatório de busca não significa que o examinador não tenha feito busca.
Para dirimir esta dúvida, é recomendável que o examinador preencha o relatório
de busca com todas os documentos encontrados e analisados em sua busca, ainda
que não tenham se mostrado relevantes como anterioridades. O artigo 35 da LPI
estabelece que todo o exame técnico deve obrigatoriamente elaborar um relatório
de busca, ainda que este seja o exame realizado por
uma autoridade de busca internacional PCT, por exemplo.
Nos Estados Unidos o Federal
Circuit em decisão de 2012 em Mintz v. Dietz & Watson[8] entendeu que afirmações vagas de que uma reivindicação é óbvia em função do
conhecimento geral comum são inaceitáveis ao menos que estejam suportadas em
alguma evidência objetiva[9].
A obviedade deve se fundamentar em algo que foi realizado e não em algo que
poderia ter sido feito. Se algo é considerado como parte do conhecimento comum
geral então deve existir uma abundância de fontes para sustentar esta
afirmação. O hábito de alegar obviedade sem se fundamentar em evidências
objetivas é algo que tem sido criticado pelo Federal Circuit em decisões
anteriores como em In Re Lee[[10] ou In re Kahn[11]. O USPTO
estabeleceu que um elemento ou combinação de elementos é considerado como bem
conhecido, de rotina, ou convencional somente quando o examinador puder
prontamente concluir que tal elemento é largamente prevalente (widely
prevalent) ou de uso comum na indústria relevante. Em 2018 com o chamado Berkheimer
memorandum esta análise de obviedade passou a ser considerada uma análise factual
da mesma natureza que a análise usada em 35 USC 112(a) para saber se um
elemento precisa ser detalhado no relatório descritivo para configurar uma
situação de suficiência descritiva, ou seja, não basta ser conhecido do estado
da técnica para algo ser enquadrado como well
understood, routine and conventional. O USPTO abriu consulta pública em
abril de 2018 para os critérios estabelecidos no Berkheimer memorandum[12]
Jacques Azéma comenta decisão da
Corte francesa que destaca que os juízes “devem
explicitar os motivos técnicos que conduziram à constatação objetiva de falta
de atividade inventiva. Deve-se observar que a apreciação da atividade
inventiva deve ser objetiva. Enfim, os juízes não devem se limitar, sobre a
atividade inventiva, a uma afirmação geral, sem comparar os elementos
característicos da invenção diante do estado da técnica”.[13]
[1] Propriedade Industrial:
patentes de invenção, Alexandre Gnocchi, São Paulo:Inventa, 1981, p.132
[2] Propriedade Industrial:
patentes de invenção, Alexandre Gnocchi, São Paulo:Inventa, 1981, p.133
[3] Recurso Extarodinário
n.58535 Primeira Turma São Paulo, Recorrentes: Abrasivos e Polidores Seracchi
S/A e outros, Recorrido: Gioiffe Borelli, Data: 31/12/1966, Publicação: DJ
12-04-1967 Presidente: Cândido Motta Filho, Relator: Evandro Lins e Silva
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/670221/recurso-extraordinario-re-58535-sp-stf
[4] BARBOSA, Denis Borges;
KUNTZ, Karin Grau; BARBOSA, Ana Beatriz Nunes. A propriedade intelectual na
construção dos tribunais constitucionais. Rio de Janeiro: Lumen, 2009, p. 116
[5] BARBOSA, Denis.
Nulidade de modelos de utilidade: peculiaridades. In: BARBOSA, Denis. A
propriedade intelectual no século XXI: Estudos de Direito, Rio de
Janeiro:Lumen, 2009, p.588
[6] TRF2, n.
0800191-62.2008.4.02.5101, Jorge Haidamus v. Rubens Cunha, Relator: Des. Messod
Azulay Neto, data: 30/04/2013
[7] http://denisBarbosa.addr.com/falta.doc Usucapião de patentes e outros estudos
de propriedade industrial, Denis Barbosa. Rio de Janeiro:Ed. Lumen Juris, 2006,
p.363
[8] http://www.patentlyo.com/patent/2012/05/mintz-v-dietz-watson-hindsight-and-common-sense.html
[9] http://www.lexology.com/r.ashx?i=2892512&l=7GPAK8K
[10] In re Lee, 277 F.3d 1338 (Fed. Cir. 2002)
[11] In re Kahn, 441 F.3d 977 (Fed. Cir. 2006)
[12] https://www.gpo.gov/fdsys/pkg/FR-2018-04-20/pdf/2018-08428.pdf
[13] AZÉMA, Jacques; GALLOUX, Jean Christophe. Droit de la propriété industriele,
Paris:Dalloz, 2012, p.223
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