Mesa Redonda: Vigência das Patentes - art. 40, parágrafo único, LPI (TRF2)
Enfam, 01/12/2020
https://www.youtube.com/watch?v=uJ294FMJiGo
Roberta Magalhães
A hipóte de que empresas atrasam o exame é pura especulação e especulação não pode ser fundamento de inconstitucionalidade. A regra do parágrafo único do artigo 40 da LPI não deve ser aplicada a condutas que visam a postergar demanda do pedido imputado a uma conduta procrastinatória do requerente. Essa procrastinação, se existir, não pode ser presumida. O atraso por atraso do INPI é o que este dispositivo tem em vista e por isso é um dispositivo constitucional. Há um atraso no exame do INPI por várias razões muito embora os esforços do INPI em atender a demanda atual. O remédio para esse atraso é equipar o INPI e assim este parágrafo único nunca ser aplicado. Querer tornar uma norma com base na ineficiência pública do exame não tem fundamento. A certeza de que o titular não será prejudicado pela demora no exame é fundamental para segurança jurídica. Nesse sentido não cabe arguir inconstitucionalidade. As alegações prejuízos aos consumidores são meras sugestões e não correspondem à realidade. Qualquer solução que prorrogue a vigência da patente será lamentada pelos concorrentes, porque essa ADIN tem como real objetivo reduzi a vigência efetiva de uma patente. O parágrafo único é fundamental para o setor de pesquisa no país. A Constituição protege direitos do consumidor mas não diz como isso deve ser feito. Se a norma traz algum benefício o consumidor está atendido pelo incentivo à inovação a longo prazo. Sem este dispositivo não teríamos investimentos em novos medicamentos. Sem o parágrafo único o INPI levar 14 anos para conceder a patente já nasce praticamente morta e todos perdem. Nos EUA se há demora também há uma extensão. Vejo como uma justa compensação do legislador. Só se pode declarar inconstitucional de uma regra se ela não tem propósito nenhum e não é o caso pois esta prorrogação é usada em outros países. Se existe a falsa ideia de que o atraso é benéfica ao titular porque antes da concessão não temos plenos direitos mas apenas uma expectativa de direito. A regra garante um mínimo de exploração daquela tecnologia pelo titular. O direito da patente só é efetivamente adquirido com a patente. Não nego que o pedido desestimula os concorrentes de entrar no mercado mas os efeitos desta patente é bem mais frágil do que teria com uma patente concedida. Se julgarmos esse dispositivo teremos grande insegurança jurídica. O direito de exploração temporária dos privilégio é garantido pela Constituição. Antes da concessão da patente inexiste qualquer proteção jurídica para que depositante investir em pesquisa. Não se estimula investimento por um mera expectativa. SE só pode contar com esse incentivo quando tem a patente concedida. A indenização somente pode ter indenização de cinco anos após o ingresso da ação. O interesse do titular não se resume ao lucro e mesmo assim deverá ingressar num longo processo judicial sem qualquer garantia de ganhar. Estaríamos passando o backlog do INPI para o judiciário. Os trâmites serão mais demorados ainda, sem o parágrafo único do artigo 40. Nada mais do que recompensar o titular por seus esforços no desenvolvimento daquela invenção. O STF insisto não tem competência para analisar o que é justo ou não justo para o titular se esse prazo é justo ou não, isso não cabe a ele avaliar isso numa ação de inconstitucionalidade. O STF não pode substituir a escolha do legislador. Deveria assim uma medida que acelerasse o exame do INPI nesses casos. Não vejo como esse dispositivo quebra princípio da isonomia. Caso não existisse essa compensação aí sim teríamos alguns titulares com prazo muito superior a outros pois este atraso varia por setor, ele não é um atraso isonômico. Seria uma violação à clausula de não discriminação tecnológica previsto em TRIPs. O artigo 40 não converte o atraso do INPI em benefício, pelo contrário o atraso continua sendo ruim para o titular. Há uma falsa ideia de que o atraso beneficie o titular. Este atraso prejudica a todos que fazem pesquisa assim como universidades que são os principais entes depositantes e que tem cada vez mais conseguido royalties por suas invenções. O setor de genérico vai de vento em popa, não vejo ela como prejudicada por este dispositivo. Sem as patentes não haveria inovação nem liberdade de iniciativa, as patentes impulsionam o mercado.
Luciano Benetti Timm
Me chama a atenção querer discutir agora constitucionalidade de um dispositivo de lei de 1996, isso é um surpreendente do ponto de vista de segurança jurídica. Para discutir política pública deve ser discutida não com base em emoções e convicções. Para avançar temos de nos basear em evidências. Primeiro lugar que chama atenção é esta questão temporal. Não há nenhuma evidência de que as empresas são as que provocam deliberadamente este backlog. Não há esta correlação entre backlog e atuação das empresas. Se existe esta correlação mostre um estudo, isso não pode ser afirmado como convicção apenas. 91% da patentes de telecomunicações hoje vigentes foram concedidas com base no parágrafo único do artigo 40 da LPI. Um decreto de inconstitucionalidade sem ponderar os efeitos não faz sentido, esse impacto deveria ser avaliado. Talvez um tratamento legislativo para um dado setor poderá ser feito legislativamente mas sempre baseado em algum estudo concreto. Do ponto de vista jurídico é problemático para segurança jurídica, este debate debate deve ser feito no Parlamento. Entendo que este tema não é estritamente patentário mas de politica pública econômica e para isso temos alternativas possíveis para eventuais abusos. Não é decretando a inconstitucionalidade trinta anos depois da lei. A tendência disso seria aumentar os preços. Advogado gosta de argumentos retóricos, de espantalhos retóricos. Ninguém fez a conta dos impactos econômicos logo isso de direito consumidor é retórica. Pior para o consumidor é ficar sem o produto. Quem defende o fim do parágrafo único defende o argumento de livre iniciativa por retórica porque a livre iniciativa presume a segurança jurídica para investimentos em pesquisas. Casos de abusos devem ser tratados em particular, até discutimos o prazo ideal de uma patente para cada setor. Na saúde temos de definir se o problema é do SUS ou do consumidor. Brasil já assinou TRIPs e aceitou patentes de medicamentos. Se os gastos com esses medicamentos com extensão da patente são elevados então gastemos isso na capacitação do INPI. Se temos dois instrumentos para beneficiar o titular não temos nenhum estudo de que um compense o outro. Prof Geser usa caso do EUA mas ainda assim não me convenceu, pois a patente não é um monopólio, veja o caso de covid que temos várias vacinas concorrendo. Não tem como dizer que a indenização do artigo 44 é suficiente para compensar o atraso do INPI, teria de haver um estudo sobre isso, senão é retórica. Quando temos uma ferramenta de indenização, o tempo de atraso no judiciário deve ser levado em conta nessa análise econômica. Provavelmente esta indenização não consegue compensar o atraso. Outra questão é saber como as Cortes precificam esta indenização mas possivelmente ela é imperfeita. Eu trabalho em arbitragem e esse cálculo é complexo exige muitas horas e os juízes não tem esse prazo para analisar isso. No Brasil o discurso é tão ideológico que se minimiza a ponderação com dados da realidade. Ninguém trouxe a conta do que vai acontecer. Não vejo fundamento de qual o fundamento de inconstitucionalidade. Argumentar que Alagoas será punido temos de rediscutir a nossa Federação, o que é outro debate. Os argumentos me parecem um atalho e não um fundamento razoável objetivo de inconstitucionalidade. O excesso de protagonismo do STF é prejudicial à democracia e temos visto isso. Quem é a favor desta ADIN é claramente ideologicamente antimercado, o próprio prof. Eros, mas não podemos ir por esse lado ideológico. Até agora os dados estão muito escassos. Foi citado Stiglitz mas ele fala do caso americano que não pode ser aplicado diretamente aqui.
Pedro Barbosa
Um pedido de patente é uma legítima expectativa de direito que influem no comportamento dos não titulares. Ao depositar o titular goza de uma exclusividade de fato. O sistema de patentes é um contencioso administrativo. O concorrente que ingresse nesse mercado quando o pedido ainda estava em exame na prática teve sua livre iniciativa cerceada aguardando a decisão quando ao pedido de patente. Quem foi desonesto e entrou no mercado mesmo antes da decisão do INPI será punido pelo artigo 44 da LPI em ter de pagar danos ao titular. O dispositivo é assim é perverso porque pune duplamente o honesto que não entrou no mercado esperando a decisão, e depois ainda te que aguentar a vigência estendida desta patente. Esta discussão agora não é fora de hora pois a demanda foi iniciada há anos atrás. Só se julga agora por atraso do STF. Consumidor é um dos seis polos desta relação jurídica complexa, que envolve o titular, o Estado, a concorrência, o concorrente e o meio ambiente. No Brasil vige a exaustão nacional dos direitos da patente. A concorrência intramarcas não tem nada de ilegal. Não concordo com esta visão de exaustão mas digamos que esteja certa. Ja vi casos de patentes de agroquímico de 37 anos de exclusividade. No resto do mundo aquela tecnologia já está em preços de concorrência há muito tempo. No Brasil por esse conceito de exaustão nacional sequer se pode importar este produto, ou seja, o consumidor é sim penalizado. O Viagra quando ingressou no domínio público logo o preço despencou o preço em quase vinte vezes. Imagine o custo e ineficiência para o consumidor. Perverso porque veda a ideia de concorrência intratecnológica forçando o consumidor pagar mais caro para tecnologias há muito obsoletas. O Brasil concede mais proteção do que nos resto do mundo quando, por exemplo, confere tutela penal para contrafação. Em patentes temos as tutelas penal, compensatória e inibitória quando ele tiver sua patente. A tutela compensatória, contudo, ela retroage e isso mesmo além do prazo prescricional de cinco anos (vide texto de Agnelo Morim). Quem é desonesto se beneficia disso. A forma de cômputo é feito pelo melhor critério ao titular, ao melhor critério para o tutelar, logo me parece excesso de tutela em benefício do titular gerando ineficiências. Se é causa exclusiva o atraso do INPI, porque o estado de Alagoas tem que pagar essa conta quando faz uma licitação ? Esta regra com a mora do INPI, acaba tributando com preços não concorrenciais mais elevados a todos. Há sim um dado ao consumidor. Marajás das patentes não quer perder seus privilégios excessivos. Tradição não pode ser razão de constitucionalidade. Calixto Salomão Filho nos diz que o pacto de inovação é internacional e me parece correto, logo, o agente econômico se baseia na regra internacional para seus investimentos em pesquisa. Se o Brasil concede um ano a mais ou a menos isso não vai inibir inovação nenhuma da multinacional estrangeira. Para se obter um registro sanitário na ANVISA também demora e o terceiro precisa também saber do resultado desse exame e isso pode levar muitos anos. Se eu não sei quanto tempo vou pagar a mais por isso não é respeito a segurança jurídica. Sem eu saber quando acaba o suplício eu não consigo quando eu vou conseguir iniciar minha produção fabril Internacionalmente não existe essa prática de se prorrogar patentes pela demora de seus INPIs, o que existe é compensação ela demora na aprovação dos produtos regulados. Eu preciso saber ex ante quando esta patente acaba. Temos que acabar com a cultura do marajá em patentes.
Patrícia Porto
O atraso de exame se deve a uma questão estrutural do INPI. Os próprios titulares vem aumentando o conteúdo de suas patentes e reivindicações muitas vezes quando sabidamente entendem que será negada mas já contando com essa expectativa de direito. Há uma tendência de procrastinação dos titulares nesses processos e Douglas Domingues já apontava isso. Estudos de Aron e Stiglitz questionam que mais patentes significa inovação, pelo contrário, elas levam a pouca concorrência e inovação. Logo esta extensão exagerada gera desestímulo a inovação. O remédio do artigo 44 da LPI atende não a sociedade nas somente uma parte, ou seja, os seus titulares. Os direitos desta patente não atinge apenas ao titular e ao INPI, mas a sociedade em sentido amplo. O interesse público deve sempre ser a regra, e a exclusiva deve ser vista como exceção. O artigo 5-XXIX da Constituição já determina que os privilégios de patentes devem ser sempre por tempo determinado. A indefinição destes prazos de patentes viola direitos sociais e à livre iniciativa e o direito dos consumidores. Quando se fala em patentes natimortas parece que se ignora os efeitos antes da concessão pelo artigo 44 que garante indenização retroativa, logo já há contrapartida para preservar os direitos do titular antes da concessão da patente. Um mecanismo que só beneficie um dos lados e que traz uma indeterminação no tempo quanto a validade desta patente isso sim causa danos aos não titulares. O artigo 44 da LPI tanto é eficaz como de fato ele consegue inibir a entrada no mercado pelos concorrentes, ou seja, é eficaz na preservação dos direitos do titular e isso não pode ser ignorado. O direito não é natimorto porque tem esse efeito retroativo. Na LPI já existe um mecanismo compensar os efeitos econômicos em benefício ao titular no artigo 44 da LPI com direito de indenização retroativa. É uma garantir jurídica e de interdição de mercado. O direito de patentes não protege o investimento per se. O pacto envolve um meio para estimular inovação em troca de um benefício temporário de forma equilibrada. Querer além desse direito de indenização retroativa ainda ter a vigência para além dos vinte anos me parece uma dupla proteção, dois incentivos ao titular e apenas um retorno final para a sociedade. Com esta extensão indeterminada no tempo o concorrente é prejudicado e não apenas os consumidores. O prazo de 20 anos é o razoável e pactuado em TRIPs, mais do que isso, é desequilibrar esta conta.
André Fontes
Curioso como se usa uma palavra em inglês "backlog" para explicar um conceito que todo mundo entende no português: "atraso". Isso é expressão de engenheiro, nós não usamos isso no Tribunal. André Beers presidente da Anfavea também dizia que não tinha evidências. Quando não se quer, pode haver mil páginas que não adianta nada. Quando se quer, se decide com fundamento em estudo de duas linhas. Falar de livre concorrência e patentes nos Estados Unidos tudo bem, mas no Brasil eu tenho dificuldade em entender. Fico com perplexidade de considerar a tese algo relacionado a um dado concreto. Estamos acostumados com argumentação na linha tradicional usando texto de lei e emitindo opiniões. Em propriedade intelectual temos três níveis: busca e apreensão de produtos contrafeitos claros e sem dúvida (este certamente é o pior nível que há, questão de polícia mesmo), o segundo nível é mais sutil com semelhanças na fronteira, com pareceres divergentes, num plano subjetivo, decisões não unânimes. Um terceiro nível não se resolve com a polícia ou judiciário, mas com agentes econômicos ditando regras e influenciando a redação das leis. Este dispositivo do parágrafo único do artigo 40 da LPI não tem o menor sentido e não tem paralelo no Brasil. O paralelo desse dispositivo encontramos no século XIX quando o Brasil, vassalo da Inglaterra, denunciou o tratamento privilegiado de impostos conferido à Inglaterra, a Inglaterra exigiu um prazo de cinco anos para reverter a tarifação dos produtos britânicos, alegando a mesma coisa, que não havia estudos, etc.. A propriedade intelectual criou formas de intervir na legislação dos países sob esta capa. O juiz argentino Ricardo Lorenzetti de modo muito educado fala em contratualização das leis. Uma lei ela existe em nome de um interesse social e não do interesse privado. Esta lei é um desvio de finalidade normativo porque visa defender o interesse privado de uma parte ou grupo. Se alguém tem dúvida de constitucionalidade faço um raciocínio contrário. No filme "Tempo de matar" narra o julgamento de uma adolescente negra estuprada. O advogado de defesa alegou que não havia crime. O advogado da menina contra argumentou: e se essa menina fosse branca ? Que tal trocarmos os termos neste caso também: diga o laboratório que ficar prorrogando com recursos protelatórios e estendendo a vigência de sua patente, que como punição terá dobrado o prazo perdido em outra patente. É óbvio que iriam alegar que isso é inconstitucional. Este dispositivo é o mesmo caso. Não consigo entender mercado com monopólio, são termos que me parecem incompatíveis. Miguel Reale ao dizer que as leis obedecem a teorias dos modelos, a economia, família, que modela a formação das leis. Se queremos um prazo específico para patentes para que estender a vigência ? A titular já foi beneficiado com o atraso, houve enriquecimento sem causa. Isso é mercado ? Os EUA jamais aceitaria um negócio desses. Vejo com perplexidade essa discussão. Hoje é o parágrafo único do artigo 40, amanhã será o que ? Seremos reféns de companhias que não trazem nenhuma contribuição ao país. O interesse econômico e social do país não é letra morta na Constituição.
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