Com o Alvará de 1809 ficava revogado o Alvará de 1785 que
extinguira e proibira as indústrias e manufaturas brasileiras [1]. O Alvará de 1809 em seu artigo 6o
refere-se a proteção concedida aos “inventores e introdutores de alguma nova
máquina”. Ordenava o Alvará que se fizesse “uma exata revisão dos
[privilégios] que se achavam concedidos, revogando-se os que, por falsa
alegação ou sem bem fundadas razões, obtiveram semelhantes concessões” [2]. Para Visconde de Cairu ao conceder também
privilégio aos introdutores de tecnologias estrangeiras no país “penso que a intenção do legislador é conceder
igual benefício aos ditos introdutores, quando façam importar máquinas e
invenções de países estranhos, durante o tempo das respectivas patentes. Essa lei
é evidentemente política para atrair, quanto antes, ao estado os artistas
eminentes e novos inventos”.[3]
Visconde de Cairu lista entre os fatores que promovem a indústria de um país a
disponibilidade de capitais, mão de obra, livre concorrência, disponibilidade
de matérias primas, existência de um mercado, uma demanda pelos produtos. O
sistema de patentes atua com um elemento deste processo mas incapaz de por si só
alavancar a indústria no país: “os
privilégios, prêmios e favores aos inventores nas artes e ciências é o
requisito que completa os meios de fazer avançar a geral indústria para o auge
de que é suscetível, havendo a discrição conveniente e nas devidas proporções,
em conformidade aos objetos e méritos dos indivíduos. Mas este último expediente
só tem ótimos resultados, onde ocorrem os outros requisitos que explanei. Aliás
por si só, ou injudiciosamente empregados, pouco valem, e até produzem o efeito
contrário ao destino”.[4]
Na interpretação de Visconde de Cairu um mínimo de inventividade é necessário para
a concessão: “é sem questão que não se deve dar privilégio exclusivo ao
inventor de insignificante novidade e
simples alteração de forma nas obras das artes ordinárias, que não manifesta engenhosa combinação ou lavor difícil
[...] Seria absurdo e indecente concedê-los por objetos notoriamente públicos,
e já sem privilégio no país dos inventores” [5]. Ao não discriminar entre inventores e
introdutores de máquinas protegidas em outros países, com a clara intenção de
proteger os industriais ingleses que trouxessem maquinário para o Brasil, o
dispositivo antecipava o tratamento nacional da Convenção da Paris, cerca de
oitenta anos após. Visconde Cairu, contudo, alinhado com as teses liberais de
Adam Smith e Jean Baptiste Say manifestava-se contra o exame prévio por
entender ser uma ação inconveniente do Estado despreparado em avaliar tais
solicitações de patentes e ao risco de avaliação injusta de uma burocracia
estatal[6].
Visconde de Cairu faz referência ao preconceito dos sábios para auxílio no
julgamento das patentes na medida em que estes, sábios em teoria, tendem a ter
preconceito contra os inventores dotados de um conhecimento muito mais prático
e cita o exemplo de Adam Smith que um dos maiores melhoramentos em bombas a
vapor foi obtido por um rapaz servente. Segundo Visconde de Cairu: “se a
invenção é quimérica, ou sem efeito útil, o inventor nada lucra, e não se
agrava a pessoa alguma com o exclusivo: se é alheia, seu dono a reclamará, ou o
público: se está já manifesta por generosidade do inventor, ou por ter expirado
o prazo de seu privilégio, qualquer um tem a faculdade de requerer a revogação
contra quem se disse o inventor ou o introdutor de invenção nova”. [7]
Visconde de Cairu [8]
[1] DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito Industrial – patentes,
Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 17.
[2] GNOCCHI, Alexandre. Propriedade Industrial: licenças &
roialtes no Brasil, São Paulo: Rev. dos Tribunais, 1960, p. 130.
[3]
LISBOA, José da Silva. Observações sobre a fraqueza da indústria e
estabelecimento de fábricas no Brasil, Brasília:Senado Federal, 1999, p.74
[4]
LISBOA, José da Silva. Observações sobre a fraqueza da indústria e
estabelecimento de fábricas no Brasil, Brasília:Senado Federal, 1999, p.67
[5] CARVALHO, Nuno. As origens do sistema brasileiro de patentes
– o Alvará de 28 de abril de 1809 na confluência de políticas públicas
divergentes. Revista da ABPI, n.91, nov.dez. 2007, p. 12; LISBOA, José da
Silva. Observações sobre a fraqueza da indústria e estabelecimento de fábricas no
Brasil, Brasília:Senado Federal, 1999, p.113
[6] MALAVOTA,Leandro
Miranda. A construção do sistema de
patentes no Brasil: um olhar histórico, Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2011,
p. 60; LISBOA, José da Silva. Observações sobre a fraqueza da indústria e
estabecimento de fábricas no Brasil, Brasília:Senado Federal, 1999, p.114
[7]
LISBOA, José da Silva. Observações sobre a fraqueza da indústria e
estabelecimento de fábricas no Brasil, Brasília:Senado Federal, 1999, p.114
[8] http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_da_Silva_Lisboa
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