Para suficiência descritiva de uma patente não é necessário que a invenção detalhe os fundamentos teóricos da invenção no sentido de explicar o porque os efeitos técnicos citados são atingidos.
A máquina de vapor foi
patenteada por James Watt em 1769, porém,
somente teve seu funcionamento, como máquina térmica, satisfatoriamente
explicado a partir dos trabalhos de Carnot, quando em 1824 publicou sua obra:
"Reflexões sobre a potência motriz
do fogo" e isto não tornaria invalida a patente tal como originalmente
concedida.[1] Segundo
Carnot o motor realiza o trabalho
mecânico devida à queda de temperatura e não à perda de calor, de modo que “o
calor nada mais é que uma força motriz, ou antes, uma força que mudou de
forma”.[2] David
Landes conclui: “a engenhosidade do homem
como inovador e executante é quase inacreditável: observe-se a precedência da
engenharia a vapor em relação à teoria termodinâmica”.[3] Ainda
assim, Carnot baseou suas explicações na então em voga teoria do calórico.[4]
Para Carnot a máquina a vapor girava sob o efeito da queda do calórico de uma
temperatura quente (a cadeira) para fria (a atmosfera) tal como uma roda de
moinho gira sob efeito da queda d’água de uma altura para outra.[5]
Joseph Montgolfier tomou
conhecimento da descoberta do hidrogênio por Cavendish em 1766, um gás mais
leve que o ar e acreditou que uma chama poderia liberar um gás similar que
quando capturado em um balão poderia erguer o mesmo tendo em vista que o
volume, sendo mais leve que o ar, tal como uma boia em um tanque de água,
conforme o princípio de Arquimedes. Em novembro de 1783 Montgolfier fez uma
exibição bem sucedida de sua invenção levando pela primeira vez duas pessoas
para um passeio de balão. Apesar do êxito, sua teoria esta errada, o que
sustentava o balão no ar não era nenhum novo tipo de gás, mas o ar quente.[6]
Embora as invenções do
século XVIII com as máquinas atmosféricas e a vapor aproveitassem a teoria de
Boyle e outros no terreno das leis primárias da pressão dos gases, o problema
prático de fundir o minério com o carvão, por outro lado, estava solucionado
antes que a química dos compostos metálicos fosse decididamente compreendida. [7] David
Landes descreve a siderurgia do século XVIII em suas primeiras invenções da
Revolução Industrial inglesa como uma “arte culinária” na qual os inventores
pouco sabiam do porque do funcionamento de suas invenções, sendo seus êxitos
muito mais decorrência da sensibilidade e instinto dos inventores na
manipulação dos materiais. Ainda em 1860 Bessemer ficou perplexo com o fracasso
de seu conversor quanto posto a trabalhar com minérios fosfóricos. O processo
de Bessemer só produz bom ferro maleável se o minério tivesse baixo teor de
fósforo.[8] De
forma inversa, dificuldades práticas muitas vezes impedem a realização prática
de conceito bem definido. A máquina a vapor de Thomas Savery patenteada em 1698
era um conceito perfeitamente viável, porém os metalurgistas da época não
tinham a tecnologia necessária para resolver seus problemas técnicos[9],
muito embora uma apresentação tenha sido realizada perante a Royal Society. [10]
Felix Hoffmann, um
químico da Bayer, em 1897, sintetizou o ácido acetilsalicílico a partir do ácido
salicílico patenteado pela Bayer em
1899. O mecanismo de ação da aspirina no entanto permaneceu desconhecido até
1970 quando J. Vane descobriu sua ação no bloqueio da síntese de
prostaglandinas.[11] Charles Goodyear ao
acidentalmente misturar enxofre com a borracha inventou o processo de
vulcanização da borracha, sem contudo, ter noção dos motivos pelo qual o
enxofre produzia este efeito. A estrutura do isopreno era desconhecida e
tampouco ele sabia que a borracha natura era seu polímero e que com o enxofre
este polímero conseguiria a ligação cruzada fundamental entre as moléculas da
borracha para mantê-las na posição devida.
Somente 17 anos depois da invenção de Goodyear Samuel Pickles sugeriu
que a borracha era um polímero linear do isopreno e assim o processo de
vulcanização foi explicado.[12]
Charles Goodyear
[1] ROSEN,
William. The most powerful idea in the world: a story of steam, industry and
invention. Randon House, 2010, p. 1418/6539 (kindle edition)
[2]
RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência, vol. IV A ciência nos séculos XIX
e XX, Rio de Janeiro: Zahar, 1987, p.46
[3]
LANDES, David. Prometeu desacorrentado, Rio de Janeiro:Elsevier, 2005, p.332
[4] ROSEN,
William. The most powerful idea in the world: a story of steam, industry and
invention. Randon House, 2010, p. 4719/6539 (kindle edition)
[5]
WITKOWSKI, Nicolas. Uma história sentimental das ciências. Rio de Janeiro:Jorge
Zahar , 2004, p.92
[6] MOKYR, Joel. The lever
of riches: technological creativity and economic progress, New York:Oxford
University Press, 1990, p.110
[7]
A evolução do capitalismo, Maurice Dobb, Zahar Ed., 1973, p.329; LANDES, David.
Prometeu desacorrentado, Rio de Janeiro:Elsevier, 2005, p.99
[8]
LANDES, David. Prometeu desacorrentado, Rio de Janeiro:Elsevier, 2005, p.87;
CAMP, Sprague. A história secreta e curiosa das grandes invenções.Rio de
Janeiro:Lidador, 1964, p. 188
[9]
LANDES,op.cit.p.376
[10]
http://en.wikipedia.org/wiki/Thomas_Savery; ROSEN, William. The most powerful
idea in the world: a story of steam, industry and invention. Randon
House, 2010, p. 622/6539 (kindle edition)
[11] LESK, Arthur.
Introdução à bioinformática, São Paulo, Artmed, 2008, p.303
[12] COUTEUR, Penny le;
BURRESON, Jay. Os botões de Napoleão: as 17 moléculas que mudaram a história. Rio
de Janeiro:Zahar, 2006, p.139
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