quarta-feira, 27 de julho de 2022

Tragédia dos bens comuns

 

A tragédia dos bens comuns foi popularizada por Garrett Hardin[1] em 1968 para descrição dos campos comuns da Inglaterra na Idade Média em que cada criador de ovelhas ao aumentar seu rebanho levava a que a área de capim disponível a cada animal reduzisse.[2] Quando a propriedade é comum os indivíduos não estão dispostos a nela investir uma vez que não poderão evitar que os outros colham o fruto de seu trabalho. O conceito retoma artigo escrito por Harold Demsetz[3] segundo o qual a propriedade privada seria uma solução para esta questão.

Commons são conjuntos de recursos utilizados em comum por uma determinada comunidade. Posner destaca que o movimento de enclosure dos campos ingleses contemporâneo à Revolução Industrial[4] em que milhões de acres foram cercados e transformados em propriedade privada[5], encerrando-se assim os pastos comuns, foi responsável por um grande aumento de produtividade no campo[6], uma vez que com o campo sendo propriedade privada reduziu enormemente os custos de transação para transformar, por exemplo, uma área de pasto em área para outros usos, pois esta medida já não dependia da aprovação de todos os seus usuários.[7] O movimento foi intensificado pela industrialização que exigiu grande demanda de lã para produção de tecidos, e assim os senhores feudais passaram a cercar suas terras, eliminando os campos abertos Commons. Com isso aumentou-se a produtividade no campo e produziu-se uma massa de camponeses desempregados uma vez que a criação de ovelhas demandava menos trabalhadores no campo. Na análise Leo Huberman: “o movimento de enclosure das terras provocou muito sofrimento, mas ampliou as possibilidades de melhorar a agricultura”[8]

Nesse sentido as patentes quando colocam sob propriedade privada um conhecimento que de outro modo seria lançado ao bem comum pode ser visto como um anticommon. Mas ao invés de se constituir numa solução na alocação de recursos, as patentes levam ao que Michael Heller em 1998 chama de tragédia dos bens não comuns “The tragedy of the anticommons”[9] um neologismo cunhado para descrever a falta de coordenação nas ações de múltiplos proprietários de patentes que agindo em função de seus interesses particulares frustram um desenvolvimento social desejável.[10]



[1] HARDIN, Garret. The tragedy of the commons. In. Science v.162, 13/12/1968, p.1243-1248

[2] STIGLITZ, Joseph. Globalização como dar certo. São Paulo: Cia das Letras, 2007. p. 269; SIMON, Imre; VIEIRA, Miguel Said. A propriedade intelectual diante da emergência da produção social. In: VILLARES, Fabio. Propriedade intelectual: tensões entre o capital e a sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2007. p. 66.

[3] DEMSETZ,Harold. Toward a theory of property rights. American Economic Review, v.57, n.2, março 1967, p. 347-359

[4] DEANE, Phyllis, A revolução Industrial, Rio de Janeiro:Zahar,1973, p.66

[5] ROSEN, William. The most powerful idea in the world: a story of steam, industry and invention. Randon House, 2010, p. 4159/6539 (kindle edition)

[6] ASHTON, Thomas. A revolução industrial, Sintra:Pub. Europa-América, 1977, p.48; MOUSNIER, Roland. História Geral das Civilizações: os séculos XVI e XVII: os progressos da civilização europeia, tomo IV, v.1, São Paulo:Difusão Europeia, 1967, p.112

[7] LANDES, William; POSNER, Richard. The economic structure of intellectual property law. Cambridge:Harvard University Press, 2003, p.12; HEILBRONER, Robert. A formação da sociedade econômica, Rio de Janeiro:Zahar, 1979, p.81

[8] HUBERMAN, História da riqueza do homem. Rio de Janeiro:Zahar, 1978, p. 114-118

[9] HELLER, M.A. The tragedy of the anticommons. In. Harvard Law Review, jan. 1998

[10] http: //en.wikipedia.org/wiki/Tragedy_of_the_anticommons. Cf. BURK, Dan L.; LEMLEY, Mark, A. The patent crisis and how the Courts can solve it. The University of Chicago Press, 2009, p.75; GUELLEC, Dominique; POTTERIE, Bruno van Pottelsberghe de la. The economics of the european patent system. Great Britain:Oxford University Press, 2007, p.77



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