Na Lei nº 5772/71 o Artigo 19 § 2º previa que “O pedido será indeferido se for
considerado imprivilegiável, por contrariar as disposições dos artigos 9º
(invenções não privilegiáveis) e 13 (modelos não privilegiáveis)”. O parágrafo 3º
previa que “Por ocasião do exame, serão
formuladas as exigências julgadas necessárias, inclusive no que se refere à
apresentação de novo relatório descritivo, reivindicações, desenhos e resumo,
desde que dentro dos limites do que foi inicialmente requerido”. O
parágrafo 5º por sua vez definia que “A
exigência não cumprida ou não contestada no prazo de noventa dias acarretará o
arquivamento do pedido, encerrando-se a instância administrativa”, ou seja,
somente na total inércia da parte caberia o arquivamento do pedido, não cabendo
recurso desta decisão.[1]
Segundo o parágrafo 6º “o pedido será arquivado se for considerado improcedente
a contestação oferecida à exigência”. Segundo o parágrafo 7º “Salvo o disposto no § 5º deste artigo, do
despacho que conceder, denegar ou arquivar o pedido de privilégio caberá
recurso, no prazo de sessenta dias”. Segundo Douglas Gabriel Domingues: “contestadas as exigências do INPI, será o
processo julgado à vista da contestação oferecida, e, caso seja a mesma julgada
improcedente, será o pedido arquivado. Entretanto, como não houve inércia da
parte, que antes contestou o que lhe foi exigido, o arquivamento não determina
o encerramento da instância administrativa, cabendo recurso ao presidente do
INPI no prazo de sessenta dias (Artigo 19 § 7º combinado com
o Artigo 108)”.
Por estes artigos seria possível o
indeferimento em primeiro exame, o que dava margens a decisões consideradas
discricionárias do INPI. Decisão do TRF2[2]
analisou recurso pela não inobservância do parágrafo 3º do
Artigo 19 da Lei nº 5772/71 referente a disposição em conjunto para canto de
cozinha. O indeferiu o modelo de utilidade, segundo o depositante, sem conceder
ao mesmo a oportunidade de melhor esclarecimento da reivindicação nos termos do
parágrafo 3º do artigo 19 da Lei n° 5772/71. O juiz baseia-se em laudo pericial
que conclui que “a reivindicação foi
elaborada de maneira a dificultar a interpretação, sendo certo que se a fizesse
de forma mais clara estaria caracterizado 1) uma nova forma ou disposição
diferente, 2) uma melhor utilização para o fim a que se destina. Em sua
conclusão o Sr. Perito foi categórico: Em tudo que foi visto e analisado,
entendo que o gerador de problema foi a elaboração dos dizeres da reivindicação
do pedido de modelo de utilidade, que não deixou claro onde de fato estava a
modificação do projeto, mas, se houvesse um pedido de exigências por parte do
INPI para entender melhor o pedido que estava sendo feito, não haveria dúvida
por parte deste em identificar a modificação introduzida para um melhor
aproveitamento em canto de cozinha. Portanto, existe no projeto apresentado uma
modificação e disposição diferente que resulta em uma melhor utilização para o
fim a que se destina”. O juiz Desembargador Paulo do Espírito Santo conclui:
“Como não existe discricionariedade do
juiz quanto a aplicação do art. 284 do CPC mutatis mutantis, também não
existirá para o réu relativamente ao parágrafo 3º do artigo 19 do CPI. Talvez
em tudo tivesse sido evitado com esclarecimentos em sede administrativa, eis
que o modelo apresentado se adéqua a definição do artigo 10 do CPI [...] Julgo
procedente os demais pedidos para anular a decisão indeferitória proferida no
processo administrativo, referente ao MU6602007, condenando o INPI a continuar o
processamento do pedido de privilégio”.
Paulina Ben Ami explica que o parecer
técnico inicial do INPI poderia ser uma decisão (deferimento 9.1 ou
indeferimento 9.2), exigência (6.1) ou ciência de parecer (7). [3]
Embora o Artigo 19 § 2º cite como causa de indeferimento
os Artigos 9 e 13, Paulina Ben Ami inclui entre as razões apontadas pelo INPI
para indeferimento a falta de aplicação industrial Artigo 6º § 3º entre outras:
“a prática mostrou a necessidade de
ampliar as definições de não privilegiabilidade que acarretam indeferimento”.
As exigências são formuladas por não cumprimento do Ato Normativo nº 19 de 11
de maio de 1976 referente a elaboração do pedido de patente: “estas exigências podem também ser feitas em
adição à citação de anterioridades, quando estas são tais que não colidem
completamente com a invenção e não acarretem o indeferimento do pedido
(ausência parcial de novidade e não absoluta”. A ciência de parecer é
aplicável “quando são encontrados
documentos que tornam a invenção, à primeira vista, óbvia a um técnico
especializado no assunto, o examinador estabelece no seu parecer que a invenção
não apresenta atividade inventiva. Como não se trata de uma decisão e nem de
uma exigência que deva ser cumprida pelo depositante, foi estabelecido pelo
INPI que tal tipo de parecer será notificado ao depositante através da
publicação na RPI em item separado sob o título Ciência de Parecer (item 7). A
contestação por parte do depositante dentro do prazo de 90 dias é facultativa.
A não manifestação do depositante não acarretará o arquivamento do pedido, mas
sim uma decisão de deferimento ou indeferimento da parte do examinador”.
Paulina Ben Ami mostra que o conceito de atividade inventiva, ainda que não
previsto expressamente no CPI (Artigo 9º e) já era de uso freqüente nos
pareceres do INPI. Como a ciência de parecer não era entendida como uma
exigência, a não manifestação do requerente gerava indeferimento passível de
recurso. Ou seja, mesmo não tendo previsão legal expressa, a prática do INPI
considerava que nos casos de não patenteabilidade do pedido, a não manifestação
do requerente não seria contemplada pelo arquivamento definitivo do artigo 19
parágrafo 5º do CPI.
Na tentativa de incorporar na
legislação o que já era prática de exame do INPI, o Comitê do INPI encarregado
de preparar o que veio a ser o projeto de lei do executivo para a nova lei de
propriedade industrial (PL nº 824/1991) redigiu proposta em que
previa que “após verificada a
regularidade formal do pedido, proceder-se-à, elaborando-se o relatório de
busca e o parecer relativo a: I - patenteabilidade do pedido, II –
enquadramento do pedido na natureza reivindicada, III – reformulação do pedido
ou desdobramento, IV – irregularidades constatadas”. O artigo portanto não
se refere a exigências técnicas.
O Artigo 39 previa que “se o parecer opinar pela não
patenteabilidade ou não enquadramento do pedido na natureza reivindicada, o depositante
será intimado para manifestar-se no prazo de noventa dias, sob pena de
indeferimento. Parágrafo Único: se improcedentes as razões oferecidas na
manifestação, o pedido será indeferido”. A inércia do requerente nas
situações I e II é passível de indeferimento, o que legitima o procedimento já
em uso do INPI de se indeferir após uma ciência de parecer, condição em que a patenteabilidade
do pedido era questionada. O artigo afasta a possibilidade de indeferimento em
primeiro exame, suprindo uma deficiência do CPI e limitando os atos de
discricionariedade por parte do INPI. Como nenhum Artigo se referia à conclusão
de exame (atual artigo 37 da LPI) paradoxalmente o texto original não previa a
situação de deferimento em primeiro exame.
O Artigo 40 do PL 824/91 definia que “No curso do exame do pedido poderão ser
formuladas exigências, que deverão ser cumpridas no prazo de noventa dias
contados da intimação sob pena de arquivamento”. Desta vez a inércia do
requerente em não se manifestar implica em arquivamento ao qual cabe recurso,
ao contrário do Artigo 19 § 5º do CPI em que este arquivamento era
definitivo. O texto do Artigo 40, contudo, não deixa claro quais das situações
de pareceres previstas no Artigo 38 seriam consideradas como exigências, em
princípio, por não terem sido citadas no Artigo 39, as situações de exigência
seriam as hipóteses III e IV. Certo é que pela redação original as duas
previsões dos incisos I e II do Artigo 38 não poderiam ser tidas como
exigências, pois neste caso teríamos os artigos 39 e 40 incoerentes entre si, o
primeiro solicitando o indeferimento em caso de não manifestação e o segundo
indicando o arquivamento não definitivo, embora ambos com previsão de recurso.
O relator Ney Lopes em seu
substitutivo PL 824-A modificou o texto para Artigo 36 “Instruído o processo, será feito o exame, elaborando-se o relatório de
busca e parecer relativo a: I – patentabilidade do pedido, II – adaptação do
pedido na natureza reivindicada, III – reformulação do pedido ou divisão, IV –
exigências técnicas. Artigo 37 Quando o parecer opinar pela não
patenteabilidade ou não enquadramento do pedido na natureza reivindicada ou
formular qualquer exigência, o depositante será intimado para manifestar-se no
prazo de 60 dias sob pena de indeferimento do pedido da patente. Parágrafo
único: o pedido será ainda indeferido se improcedentes as razões oferecidas na
manifestação”. Desta vez, sob quaisquer hipóteses do Artigo 36 a inércia do
requerente seria tratada com indeferimento. No Senado o texto retomou a
previsão do texto original de arquivamento por não manifestação de exigência
assumindo sua forma atual. Conclui-se portanto que a opção de ter todas as
quatro situações de parecer técnico pelo INPI como passíveis de indeferimento
em caso de inércia do requerente foi explicitamente rejeitada pelo Congresso. O
arquivamento passível de recurso tornou-se arquivamento definitivo no Artigo 36
o que condiz com a postura do Congresso de tentar restringir as possibilidades
de recurso tornando o processo administrativo menos burocratizado. Se o
requerente tendo diante de si uma mera exigência técnica não se manifestou é
porque não tem mais interesse na continuidade de seus pedido de patente e
portanto não justifica a possibilidade de recurso.
Segundo o Artigo 35 da LPI por ocasião
do exame técnico, será elaborado o relatório de busca e parecer relativo a: I -
patenteabilidade do pedido; II - adaptação do pedido à natureza reivindicada; III
- reformulação do pedido ou divisão; ou IV - exigências técnicas. Art. 36 -
Quando o parecer for pela não patenteabilidade ou pelo não enquadramento do
pedido na natureza reivindicada ou formular qualquer exigência, o depositante
será intimado para manifestar-se no prazo de 90 (noventa) dias. Parágrafo 1º -
Não respondida a exigência, o pedido será definitivamente arquivado. Parágrafo
2º - Respondida a exigência, ainda que não cumprida, ou contestada sua formulação,
e havendo ou não manifestação sobre a patenteabilidade ou o enquadramento,
dar-se-á prosseguimento ao exame. Art. 37 - Concluído o exame, será proferida
decisão, deferindo ou indeferindo o pedido de patente.
Nos casos em que o parecer do INPI discute
a patenteabilidade do pedido é a situação em que o pedido por exemplo não tem
atividade inventiva e não há nada o que se possa corrigir no pedido sendo
publicado o 7.1 (ciência de parecer). A única opção do requerente é mostrar que
o examinador estava errado em sua avaliação. Nos casos em que por exemplo um
pedido tem três reivindicações e o examinador questiona a atividade inventiva
de apenas uma das reivindicações, o entendimento é o de que se faça um 6.1 (exigência
técnica) porque o pedido tem condições de ser corrigido. Neste caso se o
depositante não se manifesta é feito o arquivamento definitivo. Se o
depositante se manifesta, mas de forma não convincente o examinador poderá
indeferir por falta de atividade inventiva em seu segundo parecer.
Dannemann entende que o inciso III do
Artigo 35 ao tratar de reformulação do pedido compreende exigências técnicas
formais tais como inadequação do título, enquanto que o inciso IV se
restringiria às exigências de cunho técnico [4]: “O CPI de 1971 previa expressamente no Artigo
19 §
5º o prazo de 90 dias somente para resposta às exigência, sendo omisso quanto
as respostas a pareceres [quando o exame concluir pela não patenteabilidade do
pedido], o que gerou controvérsias a respeito deste último. A nova lei elimina
qualquer dúvida neste sentido. A obrigação de emissão de parecer desfavorável
se aplica também aos pedidos divididos”. O autor, portanto distingue dois tipos de resposta do
INPI: parecer de não patenteabilidade relativo ao inciso I do Artigo 35,
mudança de natureza relativa ao inciso II do Artigo 35 e exigências sejam estas
meramente formais (inciso III do Artigo 35) ou técnicas (inciso IV do Artigo
35), sendo que apenas para estes dois últimos casos se aplicaria o arquivamento
definitivo do parágrafo primeiro do Artigo 36. Muitos requerentes conhecedores
da prática do INPI tem optado pela não manifestação à ciência de parecer
expedida pelo INPI como forma de prosseguir mais rapidamente à fase recursal
contando com a análise da matéria de outro examinador. Podemos, contudo,
entender o inciso III que se refere à reformulação do pedido como algo relativo
à unidade de invenção visto que o inciso se remete à possibilidade de divisão
do pedido. De fato nos casos de falta de unidade de invenção cabe duas
possibilidades ao requerente: reformular o pedido eliminando algumas
reivindicações de modo a restar um único conceito inventivo no pedido, ou
proceder a divisão do pedido mantendo um conceito inventivo por pedido. Neste
sentido poderíamos entender o inciso III como não sendo propriamente uma exigência
técnica a qual se refere o Artigo 36, e portanto passível de indeferimento em
caso de inércia do titular.
Portanto, no PL 824/91 houve a
intenção de se criar uma novo tipo de parecer do INPI, além dos já presentes na
lei anterior de exigência, deferimento e indeferimento, que veio a se denominar
“ciência de parecer” na medida em que
se afastou a possibilidade de indeferimento em primeiro exame. Esta ciência de
parecer trataria dos casos em que o pedido não reuniria condições de
patenteabilidade e que pela lei anterior seriam indeferidos em primeiro exame.
Isto remetia a uma prática de exame já adotada pelo INPI no CPI 5772/71.
Portanto, em sua origem na LPI, a proposta da ciência de parecer (7.1) era a de
discriminar os tipos de restrições no pedido de patente que impediram o deferimento
do mesmo. O texto do projeto de lei chegou mesmo a prever a possibilidade de
indeferimento nos casos de não manifestação do requerente para as quatros
possíveis situações de parecer do INPI (não patentabilidade, inadequação da
natureza, falta de unidade de invenção e exigências técnicas), porém esta
proposta foi formalmente rejeitada no Senado. Outro aspecto que a LPI procurou
contornar na lei antiga era a possibilidade de arquivamento definitivo
(prevista no Artigo 19 § 5º do CPI) sem possibilidade de
recurso para os casos de não patenteabilidade. Por este motivo, já no CPI
situações de não patenteabilidade já não eram consideradas exigências técnicas
passíveis de arquivamento definitivo por inércia do requerente. A LPI
incorporou esta prática do INPI. Podemos portanto concluir que tratar todas as
quatro situações do Artigo 35 da LPI como exigências técnicas passíveis de
arquivamento definitivo seria uma interpretação contrária a como o entendimento
da LPI foi sendo construído no Congresso Nacional.
[1]
DOMINGUES, Douglas Gabriel. Direito Industrial – Patentes, Rio de
Janeiro:Forense, 1980, p.206.
[2]
Acórdão Origem: TRF-2 Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL - 0 Processo: 95.02.03622-0
UF : RJ Orgão Julgador: SEGUNDA TURMA Data Decisão: 21/05/1997 Documento: TRF-200057967
Fonte DJU - Data::11/02/1999 - Página::352
[3]
BEM AMI, Paulina. Manual de Propriedade Industrial, São Paulo:SEDAI, 1983, p.95
[4]
DANNEMANN, Siemsen, Bigler & Ipanema Moreira. Comentários à lei da
Propriedade Industrial e Correlatos, Rio de Janeiro:Renovar, 2001, p. 53
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