Philip Grubb
destaca que por muito tempo a Câmara de Recursos permitiu disclaimers para contornar uma objeção de novidade[1] mesmo
que não houvesse fundamento para tal disclaimer
no relatório descritivo original, os chamados undisclosed disclaimers. [2] Na
EPO T4/80 OJ 1982, T433/86 OJ 1987 e T170/87 OJ 1989 admitem o uso de disclaimer para restaurar a novidade de
um pedido.[3] Segundo
T 4/80 OJ 1982 o disclaimer é
permitido quando uma matéria reivindicada de forma mais ampla é restringida e
não há outra forma que não por um disclaimer
para definir de forma concisa as características que se deseja proteger.[4] Um disclaimer não deve eliminar mais do que
o necessário para restaurar a novidade da reivindicação ou eliminar matéria não
patenteável por não ser considerada matéria técnica. Em T597/92 OJ 1995 tal disclaimer para evitar contestação de
novidade somente poderá ser usado quando não comprometer a clareza da
reivindicação. Em T871/96 OJ 1998 a análise de atividade inventiva deve ser
realizada como se o disclaimer não
existisse.[5] Em
T170/87 OJ 1987 um disclaimer não
pode tornar um conceito óbvio em inventivo. Mesmo nos casos onde a novidade é
aceita com a inserção de um disclaimer
isso não necessariamente significava que a reivindicação possui atividade
inventiva.[6]
A EPO com base
nas decisões G1/03 e G2/03 OJ 2004 tende a ser mais liberal em aceitar um disclaimer[7]
nos casos em que não houver outra forma melhor de definir de modo claro e
conciso a invenção. [8] O Enlarged Board of Appeal em G1/03 OJ
2004 destaca que o disclaimer somente
se justifica nas seguintes situações:
1) como uma forma de se contornar um questionamento de falta de novidade
segundo o Artigo 54(3) e (4) da EPC relativos a pedidos de patente em sigilo; nesta
situação o uso de disclaimer pode ser
particularmente relevante para se evitar o duplo patenteamento,
2) para restaurar a novidade contra um documento acidental segundo o
Artigo 54(2) da EPC (uma antecipação é considerada acidental se ela é tão
distante da invenção reivindicada que o técnico no assunto jamais a levaria em
consideração ao implementar a invenção), ou
3) para excluir matéria considerada não patenteável por não ser
considerada matéria técnica, por exemplo, ao inserir uma referência a “não humano” de modo a atender os
requisitos do artigo 53 da EPC que veta a possibilidade de patenteabilidade
para métodos de tratamento humano ou animal por exemplo. Um método para seleção
do sexo de uma criança seria considerado contra moral, porém, não haveria
maiores problemas caso sua aplicação fosse a seleção de vacas, desta forma, um disclaimer excluindo seres humanos seria
aceitável neste caso.
Reinhard
Spangenberg observa que o uso de disclaimers
tem sido aceito na EPO para contornar antecipações consideradas acidentais como
em T608/96 OJ 2000.[9]
No caso de um documento da área técnica relevante que o técnico no assunto
teria como conhecer, do mesmo campo técnico (T500/00 OJ 2007), uma emenda com o
disclaimer para escapar à uma objeção
de falta de novidade, será considerada tardia e não será aceita, pois o
depositante mesmo tendo conhecimento deste documento preferiu não fazer o disclaimer quando do depósito do pedido,
portanto, ele solicitou uma reivindicação indevidamente ampla mesmo sabendo da
existência de documento que atingia a novidade de parte de sua reivindicação,
portanto, neste caso não caberia um disclaimer.
O fato de se tratar de um documento muito distante da área técnica pode
justificar o fato do depositante não ter feito o disclaimer no depósito original, uma vez que ele desconhecia a
existência deste documento, nem era sua intenção incluí-lo no escopo de
proteção de sua patente. Trata-se de uma anterioridade acidental neste caso e o
disclaimer é aceito. O simples fato
do documento do estado da técnica não ser considerado closest prior art não é suficiente para enquadrá-lo como acidental.[10] Nos
casos em que o documento do estado da técnica contraindique aquela solução
(T14/01 OJ 2006) ou que se trate de documento de difícil acesso (T1049/99 OJ
2002) nada disso pode ser invocado como documento acidental. Exceto por estas
hipóteses o disclaimer não deve ser
aceito como mecanismo do requerente para reformular a reivindicação de forma
arbitrária.[11]
Muitas decisões da Câmara de Recursos concentram a permissão do disclaimer na questão de se saber se o
documento apresentado contra novidade pode ser considerado como acidental ou
não, ou seja, se configurado que o técnico no assunto nunca seria levado a
levar este documento em consideração.[12] Segundo
Robert Young embora G1/03 e G2/03 OJ 2004 admitem o disclaimer sem fundamentação no pedido original (undisclosed disclaimer) no caso de
citações acidentais, no final das contas, é muito raro de ser usado na prática e,
assim, o undisclosed disclaimer
torna-se um instrumento de pouco uso.
Em T201/99 OJ
2004, uma decisão após G1/03 e G2/03 OJ 2004, a Câmara de Recursos discutiu uma
emenda que modifica uma faixa de tratamento de 1 a 10 minutos no pedido
original, para 1 a 6 minutos. O requerente alegou que se trataria de um disclaimer da faixa de 6 a 10 minutos,
porém, escrito numa forma positiva. O disclaimer
é aceito apenas para remover estritamente aquela faixa compreendida pelo estado
da técnica, afim de restaurar a novidade da reivindicação, de modo que qualquer
emenda que exclua da reivindicação original mais do que o necessário deverá ser
rejeitada por violar o Art. 123(2) da EPC (G1/03), o que ocorreu no presente
caso. A necessidade de um disclaimer
não pode significar um artifício para o depositante ampliar a matéria
reivindicada arbitrariamente. Philip Grubb atenta para o requerente evitar um disclaimer excessivo, pois isso pode dar
fundamento a oposição de uma patente pelo Artigo 100(c) da EPC com base em
acréscimo de matéria. Durante os procedimentos de oposição o titular já não
poderá restringir o disclaimer para
os limites corretos pois isso será interpretado como ampliação indevida da
matéria reivindicada, o que é proibido pelo Artigo 123(3) durante os procedimentos
de oposição.[13]
O artigo 123(2)[14]
veda a possibilidade de emendas em uma patente concedida que ampliem o conteúdo
da matéria originalmente depositada.[15] Na
EPC1973 este mesmo artigo vetava tais emendas mesmo para pedidos de patente.[16]
Ademais a Câmara
de Recursos destacou em T201/99 OJ 2004 que colocado numa forma positiva, a
reivindicação não deixa claro que uma determinada faixa está sendo
deliberadamente excluída da reivindicação, ou seja, trata-se de um disclaimer disfarçado, o que compromete
a transparência da reivindicação, ou seja a clareza exigida pelo Artigo 84 da
EPC.[17] Em
T2130/11 OJ 2015 a Câmara de Recursos conclui que a única maneira de elaborar um
disclaimer para cinco exemplos relevantes
citados no documento de anterioridade seria usar os termos exatos de cada um
destes exemplos. A generalização destes cinco exemplos foi considerada como não
atendendo ao Artigo 84 da EPC de se ter uma reivindicação clara e precisa. Para
a Câmara de Recursos a dificuldade de se redigir um disclaimer não pode justificar uma exceção à Regra 84 da EPC. [18]
Quanto aos disclaimers que encontram amparo no
relatório descritivo original (disclosed
disclaimers) ainda haviam conclusões divergentes da Câmara de Recursos.
Algumas decisões (T1107/06 OJ 2008 e T1139/00 OJ 2005) aceitavam tal disclaimer que funcionaria como uma
renúncia (waiver) de direitos e não
haveria violação do artigo 123(2). Outras decisões, no entanto, aplicavam as
decisões G1/03 e G/03 OJ 2004 de modo que suas decisões não se limitariam aos undisclosed disclaimers (T1050/99 OJ
2005, T1102/00 OJ 2004, T1559/05 OJ 2007, T795/05 OJ 2007). Um novo
questionamento ao Enlarged Board of
Appeal foi proposto para a seguinte pergunta: Um disclaimer infringe o artigo 123(2) da EPC se sua matéria é
revelada no pedido tal como depositado? G2/10 OJ 2011 responde que será
considerado acréscimo se a matéria restante na reivindicação após a introdução
do disclaimer não puder ser, seja
explicitamente ou implicitamente, diretamente e de forma não ambígua ser
revelada ao técnico no assunto usando o conhecimento geral comum a partir do
pedido depositado. O disclaimer
nestes casos ocorre como forma de se contornar a falta de novidade diante de
documento encontrado nas buscas pela EPO. Para a Câmara de Recursos o critério
a ser usado não é o de saber se a parte excluída está prevista ou não no
depósito original (critério que vinha sendo adotado), mas se a parte restante
da reivindicação modificada após a inserção do disclaimer encontra suporte no pedido original.[19] O
uso de disclaimer para contornar uma
objeção de falta de novidade[20] é,
portanto, aceito desde que a reivindicação restante não possa ser definida de
forma mais clara e concisa através de características positivas ou se tal
definição positiva limitaria indevidamente o escopo da reivindicação.[21] Em
T437/14 OJ 2016 a Câmara de Recursos destaca que se você morde uma maçã o que
resta da maçã já não é a maçã original. Muito embora ainda seja uma maçã não se
pode considerar que o que resta da maçã seja algo revelado de forma direta e
não ambígua da maçã original[22].
T437/14 OJ 2016 faz novo questionamento ao Enlarged Boards of Appeal se em
relação a G2/10 ao permitir disclaimers
revelados (disclosed disclaimers)
como não violando o artigo 123(2) da EPC se esta conclusão também se aplica aos
disclaimers não revelados.[23]
Em G1/16 o
Enlarged Board of Appeal decidiu que a introdução de um disclaimer não
divulgado undisclosed disclaimers não
deve fornecer uma contribuição técnica ao objeto divulgado quando do depósito
do pedido. Em particular ele não deve ser relevante seja para apreciação da
atividade inventiva do pedido ou para análise de suficiência descritiva do
mesmo pedido. Em T660/14 OJ 2018 a atente examinada diz respeito a um
dispositivo de comando de uma bicicleta. O pedido apresentou dois disclaimers não
divulgados no pedido depositado. O primeiro diz respeito ao elemento de
acionamento do freio e o elemento de comando de troca de velocidade que estão
dispostos para poder pivotar em relação aos eixos de modo não coincidente ao
longo do percurso de acionamento dos freios. Tanto o elemento de acionamento do
freio como o elemento de comando não podem ser pivotados em conjunto com um
destes eixos de deslocamento. A Câmara observou que, de acordo com a patente a
disposição dos elementos de acionamento e comando de modo que possam ser
pivotados em relação aos eixos paralelos do deslocamento proporciona uma
vantagem ergonômica para o ciclista. A capacidade
de pivotamento é uma característica de natureza técnica. A precisão segundo o
qual tais elementos não possam ser pivotados em conjunto é uma outra diferença
técnica em relação à prevista no pedido depositado. Ao excluir a possibilidade
de pivoteamento em conjunto ao longo desses eixos as considerações ergonômicas
foram modificadas resultando em uma mudançano ensinamento técnico original que é
algo de natureza qualitativa no sentido de que a posição do titular em relação à
atividade inventiva é modificada. Os disclaimers não são, portanto, permitidos
neste caso pois impactam na avaliação de atividade inventiva. [24]
[1]
YOUNG, Robert. EPO boards of appeal and key decisions: a review by internal and
external experts https://e-courses.epo.org/wbts_int/caselaw2012/pdf/prae_05.pdf
[2]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 331
[3]
STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patent Convention: a commentary.
Thomson:Cologne, 2003, p. 381
[4]
STAUDER, op.ct, p. 381
[5]
STAUDER, op.cit. p. 382
[6]
GRUBB, op.cit., p.219
[7]
http://en.wikipedia.org/wiki/Disclaimer_(patent)
[8]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 263
[9]
STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patent Convention: a commentary.
Thomson:Cologne, 2003, p. 117
[10]
Catalogue of remaining differences 2012 update of the CDP 2011, IP5 Offices, p.
77
[11]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 265, 336
[12]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 333
[13]
GRUBB, op.cit, p.220
[14]
The European patent application or European patent may not be amended in such a
way that it contains subject-matter which extends beyond the content of the
application as filed.
https://www.epo.org/law-practice/legal-texts/html/epc/2016/e/ar123.html
[15]
YOUNG, Robert. Disclaimers: legal basis especially in the light of decisions
G1/03, 2/03 e 2/10. Possible consequences for their use as an instrument of
patent prosecution, 2012 https://e-courses.epo.org/wbts/caselaw2012/index.html
[16]
A European patent application or a European patent may not be amended in such a
way that it contains subject-matter which extends beyond the content of the
application as filed.
https://www.epo.org/law-practice/legal-texts/html/epc/1973/e/ar123.html
[17]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 264
[18]
http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2015/03/t213011-un-disclaimer-ni-clair-ni-concis.html
[19] An amendment to a claim by the introduction
of a disclaimer disclaiming from it subject-matter disclosed in the application
as filed infringes Article 123(2) EPC if the subject-matter remaining in the
claim after the introduction of the disclaimer is not, be it explicitly or
implicitly, directly and unambiguously disclosed to the skilled person using
common general knowledge, in the application as filed. (G 00002/10)
[20]
Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition
July 2010, p. 262
[21] As was said in decision T 1107/06, point 45.
of the Reasons, the decisive question to ask under Article 123(2) EPC is not
whether the skilled person could infer from the original disclosure that the
applicant intended to exclude the disclaimed subject matter from the scope of
protection. Rather it has to be ascertained whether there is a clear and
unambiguous disclosure, be it explicit or implicit, of the subjectmatter remaining
in the claim. (G 2/10)
[22]
http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2016/10/disclaimers-la-grande-chambre-nouveau.html
[23]
http://dp-patentlaw.blogspot.com.br/2016/10/t-43714-new-questions-on-disclaimers.html
[24] http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2018/03/t66014-application-de-g116.html
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