domingo, 23 de agosto de 2015

Celso Furtado e a inovação tecnológica

A escola estruturalista latino americana de Raul Prebisch e Celso Furtado também destaca o papel das inovações tecnológicas para o desenvolvimento econômico. Por este modelo o progresso tecnológico tende a elevar a produtividade na indústria assim como ao aumento de salários sendo este maior que o aumento de produtividade o que tende a reduzir a taxa de lucro e desta forma a fazer com que os empresários iniciem novo ciclo de inovação em busca de novos aumentos de produtividade: “A fim de defender a taxa de remuneração do capital, a partir do momento em que a taxa dos salários alcance uma cota crítica, os empresários se esforçarão por introduzir processos produtivos poupadores do fator trabalho[1]. Nos países periféricos contudo a industrialização sendo induzida de fora para dentro constitui um processo distinto da industrialização no centro do sistema capitalista: “No centro, o processo tecnológico assumiu inicialmente a forma de inovações nos processo produtivos, as quais se traduziam em transformações da oferta, que provocavam a deslocação da atividade artesanal, redução dos preços de oferta, ampliação do mercado e a necessidade de introduzir produtos novos. Na periferia, a ampliação do mercado e  introdução de produtos novos precedem a industrialização. O mercado de produtos manufaturados é inicialmente alimentado pelas importações.Portanto o progresso tecnológico se introduz de início pelo lado da demanda. A sociedade se moderniza antes que a economia se desenvolva”.[2] Há um descompasso entre a introdução de novas tecnológicas nos países periféricos e sua difusão, esta incapaz de dinamizar a economia para garantir um ritmo endógeno de se buscar um novo ciclo de inovação. Segundo Celso Furtado há uma diferenciação entre o processo de industrialização nos países centrais e periféricos: “Nos países centrais, os que comandam o processo de industrialização, o ponto de partida era um progresso tecnológico que assume a forma de transformação nos processos de produção, na oferta. Por aí começa sua evolução global.O progresso tecnológico assume primeiramente a forma de inovações no processo produtivo, no métodos de produção. Assim a oferta se vê transformada e essa transformação assume a forma de baixa nos preços relativos de certos setores, deslocação do setor artesanal, ampliação da demanda, necessidade de se introduzir novos produtos, etc. Tudo interligado, entrelaçado. No sistema de economia subdesenvolvida, o processo se inicia pelo lado da demanda, via ampliação do mercado por causa da elevação da produtividade econômica, que decorrer da inserção na divisão internacional do trabalho [em seu papel de exportador de produtos primários]”.[3] A inovação, portanto, nada mais é que o “exercício de uma forma de poder[4] que somente pode ser compreendida sem que se compreenda a forma como a economia periférica está inserida no comércio internacional. Desta forma para Celso Furtado a economia periférica industrializada por um processo conhecido como “substituição de importações” tem um caráter de complemento externo e que não se formou como um sistema autônomo[5]: “o resultado de tudo isso foi a criação no país de um sistema industrial altamente integrado, exclusivamente voltado para o mercado interno, sem capacidade competitiva internacional [sem inovação], e ainda assim, no essencial, controlado por empresas transnacionais”.[6]
Para Celso Furtado as inovações tecnológicas introduzidas nos países periféricos operam no sentido de se preservar as relações de dominação com os países centrais[7]: “o desenvolvimento periférico passa a ser , portanto, a diversificação (a a ampliação) do consumo de uma minoria cujo estilo de vida é ditado pela evolução cultural dos países de alta produtividade e onde o desenvolvimento se apoiou, desde o início do progresso tecnológico. Mais precisamente: o principal fator causante da elevação de produtividade na economia periférica industrializada parece ser a diversificação dos padrões de consumo das minorias de altas rendas, sem que o processo tenha necessariamente repercussões nas condições de vida da grande maioria da população [...] Como esse desenvolvimento envolve a adoção de novos padrões de consumo ou a sua difusão, e como esses novos padrões trazem consigo um vínculo de tipo internacional (importação de inputs pagamentos de royalties de patentes, dividendos, etc) pode-se afirmar também que o referido desenvolvimento é uma transformação estrutural do sistema global no sentido de estreitar as relações de dependência”.[8] Segundo Celso Furtado: “A elevação da produtividade e a modificação nas formas de consumo, sem assimilação concomitante de progresso tecnológico, nos processos produtivos, constituía, em realidade o ponto de partida da formação das estruturas subdesenvolvidas [...] A história do subdesenvolvimento consiste fundamentalmente no desdobramento desse modelo de economia em que o progresso tecnológico serviu muito mais para modernizar os hábitos de consumo [das classes ricas] do que para transformar os processos produtivos”.[9] Nessa perspectiva as previsões de Celso Furtado não parecem muito promissoras aos países periféricos: “Tudo indica que prosseguirá o avanço das empresas transnacionais, graças à crescente concentração do poder financeiro e aos acordos no âmbito da OMC sobre patentes e controle da atividade intelectual, o que contribui para aumentar o fosso entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos”.[10]




[1] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 241
[2] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 86
[3] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 157
[4] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 40
[5] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 170
[6] FURTADO, Celso. Economia do desenvolvimento. Curso ministrado na PUC SP em 1975, Rio de Janeiro:Contraponto, 2008, p. 112
[7] FURTADO, Celso. Análise do modelo brasileiro, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1973, p.13
[8] FURTADO, Celso. Teoria e política do desenvolvimento econômico, sâo Paulo:Abril Cultural, 1983, Série os Economistas, p.182, 185
[9] FURTADO, Celso. Análise do modelo brasileiro, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1973, p.11
[10] FURTADO, Celso. O capitalismo global. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1999, p. 37

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