domingo, 18 de janeiro de 2015

Patente do Glivec na Índia

A patente do Glivec da Novartis, para o tratamento de câncer, foi depositada dentro do mecanismo de mailbox em 1998 e negada na Índia em janeiro de 2006, com base na Seção 3(d) da lei indiana[1] que estabelece que não se considera invenção a substância obtida pela mera mistura resultante apenas da agregação de propriedades de componentes dos mesmos ou um processo para produção de tal substância [2]. O escritório de patentes indiano acolheu os argumentos do pedido de oposição iniciado pela Cancer Patients Aid Association (CPAA), uma organização indiana que presta atendimento a pacientes com câncer. Enquanto o tratamento com o produto de marca custa US$ 2600 ao mês, o mesmo medicamento produzido por empresas de genéricos é comercializado por US$ 200. [3]As patentes de produtos farmacêuticos passaram a ser concedidas na Índia em janeiro de 2005 com a publicação do Indian Patents Amendment Act encerrando o período de transição permitido por TRIPs. A Novartis contestou no Judiciário indiano a seção 3(d) alegando que a mesma contraria as disposições de TRIPs que segundo a empresa garante aos países o uso de flexibilidades apenas na aplicação de licenças compulsórias, mas não na exclusão de matérias a serem excluídas de patenteabilidade [4]. Em agosto de 2007 a Suprema Corte Indiana rejeitou a alegação de inconstitucionalidade e suspendeu a questão para que a OMC avalie a eventual violação de TRIPs [5]. Diante da repercussão do caso o governo Suíço, sede da empresa, anunciou que não levaria a questão à OMC, o que significaria na prática a manutenção da decisão do escritório de patentes de se negar a patente ao Glivec.[6] No Brasil a patente do Glivec PI9810920 (EP9804427 ) foi indeferida em 2010 e os pedidos divididos PI9816198 e PI9816299 igualmente indeferidos no mesmo ano pelo INPI.

Esta decisão abriu precedente para novas ações contra pedidos de patentes de nova formulações de substâncias já conhecidas. A GSK tem uma tripla terapia em um único comprimido, o Trivizir, que está limitado a conter apenas aqueles medicamentos para os quais detém os direitos de patente, neste caso, o AZT, o 3TC e o abacavir [7]. Em maio de 2010 o escritório indiano de patentes anulou a patente ao medicamento Valganciclovir depositado pela Roche e deferido em 2007. A patente foi anulada por falta de atividade inventiva e por não satisfazer as exigências de uma melhor eficiência terapêutica exigida pelo seção 3(d) da lei indiana [8]. Em janeiro de 2015 o escritório de patentes negou a patente do medicamento Sovaldi da Gilead Sciences, usado no tratamento da hepatite C, que chega a alcançar taxas de cura de 95% segundo ensaios clínicos ao custo de cerca de mil dólares por cápsula que se toma durante 12 a 24 semanas em unção da gravidade da doença. O medicamento teve a patente negado por falta de atividade inventiva com base na seção 3d da lei indiana de patentes. [9] Apesar da não concessão da patente do Glivec e do Sovaldi, Chan Park observa que o escritório de patentes tem aplicado de modo irregular o critério de atividade inventiva tendo concedida patente para a empresa Roche de medicamento para o tratamento de citomegalovirus retinite, uma infecção secundária em pacientes com AIDS causadora de cegueira. A mesma patente foi negada no próprio USPTO por obviedade mas concedida na Índia para as mesmas reivindicações.


Glivec, capa da revista Time em 2011 como medicamento promissor no tratamento do cancer e considerado solução óbvia pelo escritório indiano de patentes [10]



[1] Section 3(d) as amended by the Patents (Amendment) Act, 2005 with effect from 01.01.2005: The mere discovery of a new form of a known substance which does not result in the enhancement of the known efficacy of that substance or the mere discovery of any new property or new use for a known substance or of the mere use of a known process, machine or apparatus unless such known process results in a new product or employs at least one new reactant. Explanation: For the purposes of this clause, salts, esters, ethers, polymorphs, metabolites, pureform, particle size isomers, mixtures of isomers, complexes, combinations and other derivatives of known substance shall be considered to be the same substance, unless they differ significantly in properties with regard to efficacy.” http: //www.deolhonaspatentes.org.br/media/file/Casos/India/decisao_alta_corte_india.pdf.
[2]  http: //www.wipo.int/wipolex/en/text.jsp?file_id=128091.
[3] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.215
[4] PARANAGUÁ, Pedro; REIS, Renata. Patentes e Criações Industriais. Rio de Janeiro: FGV Jurídica, 2009.p. 123.
[5] Casos – Índia http: //www.deolhonaspatentes.org.br/default.asp?site_Acao=MostraPagina&PaginaId=125.
[6] PARK, Chan; MENGHANEY, Leena. TRIPS flexibilities: the scope of patentability and oppositions to patents in India. In: KRIKORIAN, Gaelle; KAPCZYNSKI, Amy. Access to knowledge in the age of intellectual property, Zone Books: Nova Iorque, 2010, p.428
[7] Drug Patents Under the Spotlight, 2003 http: //apps.who.int/medicinedocs/en/d/Js4913e/3.2.html.
[8]  http: //www.ip-watch.org/weblog/2010/05/05/indian-ip-office-overturns-patent-on-aids-patient-drug/.
[9] http://elpais.com/elpais/2015/01/15/ciencia/1421340220_413035.html
[10] http://content.time.com/time/covers/0,16641,20010528,00.html

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