quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Divisão e pedidos de patente complexos

O conceito de unidade de invenção está presente no artigo 4G da CUP: “Se o exame revelar que um pedido de patente é complexo poderá o requerente dividir num certo número de pedidos divisionários, cada um dos quais conservará a data do pedido inicial e, se for o caso, o benefício do direito de prioridade”. Segundo Bodenhausen “Pode ocorrer, de acordo com a legislação do país em que se efetue o exame, que se considere que um pedido de patente é complexo por razões distintas da falta de unidade de invenção, por exemplo, porque contém uma combinação proibida de reivindicações para fabricação e utilização do mesmo objeto inventado. Em tais casos se aplica igualmente o artigo 4G, embora provavelmente este seja utilizado com mais frequência nos casos em que o pedido tenha mais de uma invenção”. [1]
Segundo o artigo 22 da LPI “o pedido de patente de invenção terá de se referir a uma única invenção ou a um grupo de invenções inter-relacionadas de maneira a compreenderem um único conceito inventivo”, o que sugere que uma vez o exame tendo identificado falta de unidade de invenção o depositante terá oportunidade para dividir seu pedido conforme artigo 35 da LPI. No entanto, esta não é a única possibilidade em que o INPI pode emitir parecer técnico relativo a divisão do pedido, uma vez que a LPI não define as situações em que o INPI pode fundamentar um pedido de divisão. O Ato Normativo nº 127/97 de 5 de março de 1997 no item 6 prevê que esta situação possa ocorrer “quando o exame técnico revelar que o pedido é complexo ou que contém um grupo de invenções que compreendem mais de um conceito inventivo, ou mais de um modelo de utilidade”. Na Instrução Normativa nº 30/2013 de 4 de dezembro de 2013, contudo, este trecho do Ato Normativo nº 127/97 foi reescrito como “quando o exame técnico revelar que o pedido contém um grupo de invenções que compreendem mais de um conceito inventivo, ou mais de um modelo de utilidade”. Já não há mais referência a possibilidade do INPI fundamentar uma solicitação de divisão de pedido com base no pedido ser complexo. Como a CUP deixa para as legislações nacionais a definição das condições em que se pode solicitar ao depositante a divisão do pedido, não há qualquer contradição com a CUP seja no Ato Normativo nº 127/97 ou na Instrução Normativa nº 30/2013 apenas que esta última aceita como única justificativa para o INPI solicitar a divisão do pedido o fato do pedido não ter unidade de invenção.
Nuno Carvalho observa que a tradução da CUP ao português presente no Decreto n.º 75572 de 8 de abril de 1975 refere-se a “que um pedido de patente é complexo” quando o texto do artigo 4g da CUP em inglês refere-se a “a patent contains more than one invention”. No entanto no texto autêntico em francês o mesmo trecho refere-se a “Si l’examen révèle qu’une demande de brevet est complexe”, ou seja, o decreto brasileiro traduziu corretamente a partir do texto autêntico em francês[2]. Bodenhausen já em 1969 observava que esta tradução para o inglês não é muito precisa porque um pedido pode ser complexo por razões outras que não a falta de unidade de invenção, por exemplo a complexidade do quadro reivindicatório. Para Nuno Carvalho o termo “complexo” pode se referir a complexidade técnica da invenção o não está de acordo com o sentido original do texto da CUP.[3] No entanto, no âmbito jurídico encontramos o significado do termo como representando algo que abranja duas tecnologias distintas e talvez tenha sido essa a razão do uso desta palavra. O Código de Processo Civil no artigo 431B[4] estabelece que “tratando-se de perícia complexa, que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito e à parte indicar mais de um assistente técnico[5]. Na França Pollaud Dulian também observa que para pedidos de patentes complexos (demande complexe) podem ensejar a divisão do mesmo.[6] A legislação francesa se refere à unidade de invenção no artigo L.612-4 a qual Schmidt Szalewski associa a pedidos complexos com base na jurisprudência, embora o julgados citados que utilizam tal expressão sejam decisões de 1901[7] e de 1879[8]. A Corte francesa se refere a patente com o “vício da complexidade (le vice de complexité)” embora esta não seja considerada uma causa para nulidade da patente.

Georg Bodenhausen [9]



[1] BODENHAUSEN, Guia para la aplicacion del Convenio de Paris para la proteccion de la propriedad industrial revisado em Estocolmo, 1967, WIPO:Genebra, 1969 http://www.wipo.int/edocs/pubdocs/en/intproperty/611/wipo_pub_611.pdf
[2] http://www.wipo.int/wipolex/en/wipo_treaties/details.jsp?treaty_id=2
[3] CARVALHO, Nuno. A estrutura dos sistemas de patentes e de marcas: passado. presente e futuro. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2009, p.93
[4] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm
[5] O escopo da prova pericial e critérios para a escolha do perito, Alexandre Freitas Câmara, In: Revista da ABPI,n.89, jul/ago 2007, p.17 Lei No 5.869, de 11/01/1973 que Institui o Código de Processo Civil, incluído pela Lei nº 10.358, de 2001, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869compilada.htm
[6] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.261
[7] Cons. d’État, 5 agosto 1901 cf. SZALEWSKI,J.Schmidt; PIERRE,J.L. Droit de la propriete industrielle,Paris:Litec, 1996, p.59
[8] Cons. d’État, 12 agosto 1879 cf. CHAVANNE, Albert; BURST, Jean-Jacques; Droit de la Propriété Industrielle, Précis Dalloz:Paris,1976, p.47
[9] https://www.flickr.com/photos/wipo/6234699702/

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