segunda-feira, 13 de junho de 2022

A adesão do Chile como Escritório de Busca e Exame PCT

 

A constituição chilena de 1833 dispunha em seu artigo 152 que “todo o autor ou inventor  terá a propriedade exclusiva de seu descobrimento, ou produção pelo tempo que conceder a lei e se esta exigir a publicação se dará ao inventor a devida indenização”.  Em 9 de setembro de 1840 foi promulgada a lei sobre “privilégios exclusivos” regulando os direitos de propriedade industriais previsto na carta  constitucional. Em 1840 foram depositados apenas sete patentes. De 1840 a 1911 foram cerca de 3,6 mil depósitos com uma média anual de cerca de 50 depositos. Muitas destes depósitos referiam-se  equipamentos na área da agricultura. Em 1875 o Chile sediou a Exposição Internacional de Santiago, evento organizado pela Sociedade de Agricultura e que contou com a participação de 28 países e aproximadamente 3 mil expositores.


No século XIX a produção de salitre chileno estava sob exploração de industriais ingleses como John Thomas North presidente da Liverpool Nitrate Company. Segundo Alejandro Soto: “os britânicos lançaram as bases da industrialização do salitre quando introduziram o sistema Shanks. Este foi introduzido por James Humberstone e seu nome deve-se a John Shanks um britânico que o utilizou para a refinação do carbonato de sódio em Lancanshire em 1870. O sistema de Shanks permaneceu como a tecnologia básica para o refino do salitre até 1925. Seu impacto foi tal que permitiu os chilenos satisfazer a demanda crescente de salitre no mundo inteiro pelo esço de quase conquenta anos”.[1] Em 1890 uma tentativa de nacionalização das empresas de salitre por parte do presidente José Balmaceda foi seguida de uma guerra civil em que os rebeldes foram financiados por North garantindo os suprimentos de salitre necessários aos ingleses. Em 1908 a liderança técnica alemã na indústria de produtos químicos foi reforçada pela invenção do processo Haber-Bosch de fixação do nitrogênio, desenvolvido pela BASF e utilizado na área de fertilizantes, provocando uma revolução na agricultura.[2] Walther Nernst e mais tarde Frtiz Haber  foram os primeiros a pesquisar a possibilidade de uso de catalisadores para fixação do azoto inerte contudo no ar.[3] Embora o nitrogênio seja abundante na atmosfera  ele é relativamente inerte, havendo necessidade de métodos para fixar o nitrogênio, ou seja, removê-lo da atmosfera comm cobinação química com outros elementos. Em uma tempestade a descarga elétrica dos raios faz com que certa quantidade de nitrogênio se combine com uma porção de nitrogênio formando o óxido nítrico. À medida em que este esfria, forma-se o gás dióxido de nitrogênio  que logo se combina com a água da chuva para formar o ácido nítrico que ao cair no solo faz com que o nitrogênio se fixe no solo necessário ao crescimento natural das plantas. O processo Haber Bosch busca uma alternativa sintética deste processo natural. O nitrogênio ferve a 195C e o oxigênio a 183C, assim, quando o ar é liquefeito o nitrogênio entra primeiro em ebulição permanecendo apenas o oxigênio líquido. O processo Haber aproveita esta característica para separar os dois gases e assim obter-se o nitrogênio. Extrai hidrogênio da água por eletrólise e combina-se com hidrogênio em ambiente de alta pressão a 500C para se formar amônia. Depois combina-se a amônia produzida com oxigênio para se formar óxido nítrico. Em seguida o óxido nítrico se combina com mais oxigênio para formar dióxido de nitrogênio que misturado com água forma o ácido nítrico usado na indústria bélica.[4] Grande parte do trabalho de Fritz Harber, cujo objetivo  era produção de amônia para aindústria de fertizantes, foi encontrar um catalisador para aumentar a taxa desta reação que era relativamente lenta.


A BASF fez um acordo com Haber para desenvolver o processo e o grupo liderado por Carl Bosh promoveu importantes avanços na tecnologia de catalisadores e na construção dos compressores necessários. Em 1913 a primeira fábrica de amônia sintética foi instalada na Alemanha em Oppau usando o processo Haber. Em reação com o oxigênio, a  amônia formava o dióxido de nitrogênio, precurso do ácido nítrico usado em explosivos e amrmamentos. A técnica era de difícil implementação a ponto de Brunner Mond ter gasto sete anos para imitar o processo após uma visita à fábrica da BASF em Opau em 1919.[5] O aperfeiçoamento do processo para produzir nitratos fixando nitrogênio do ar, levou a economia chilena à crise, pois o país obtinha até as vésperas da Primeira Guerra Mundial dois terços de suas receitas de exportação com a venda de salitre, que deixou de ter interesse no comércio mundial.[6] O bloqueio  dos britânicos cortando o fornecimento de salitre do Chile para a Alemanha tornara-se desta forma inócuo para a Alemanha. A indústria chilena tentou compensar essa perda pela criação de um cartel, a Associación de Productores de Salitre de Chile, porém, sem sucesso.[7] Um informe da Liga das Nações de 1933 assinala que o Chile foi um dos países mais afetados pela crise provocada pela grande depressão de 1929.[8] O Reich alemão, desprovido das importações de salitre do Chile, tinha grande necessidade de nitratos, indispensáveis para a fabricação de pólvora. [9] Com o processo foi possível a Alemanha continuar a produção de explosivos mesmo depois do corte de seus suprimentos de nitrato de sódio do Chile, prolongando a Primeira Guerra Mundial.[10] O processo envolvia alta pressão e altas temperaturas, assim como o emprego de um catalisador para produzir amônia, elemento crítico do processo e cuidadosamente omitido pela BASF em todas as suas patentes. Durante a Primeira Guerra Mundial, mesmo com a expropriação governamental das patentes da BASF nos EUA, os peritos norte americanos não foram capazes de replicar o processo Haber-Bosch para a fixação de nitrogênio[11]. As patentes básicas deste processo expiraram em 1927 e ainda depois da primeira guerra pouca informação deste processo estava disponível fora da Alemanha.[12] Por não ser possível sua replicação a partir dos conhecimentos do estado da técnica e do conteúdo revelado no relatório descritivo, tais patentes seriam consideradas nulas pela legislação brasileira atual. Em 1918 Fritz Harber ganhou o Nobel de Química pelo desenvolvimento do processo  da síntese da amônia, sob protestos de cientistas que denunciavam a participação de Fritz Haber no uso de gases tóxicos por parte da Alemanha na Primeira Guerra como um uso de cilindros de gas cloro em abril de 1915 numa linha de frente de cinco quilômetros perto de Ypres na Bélgica e que levou a morte de cinco mil homens. [13]


Além da substituição do salitre por adubos nitrogenados é apenas um dos exemplos de monopólios de substâncias naturais quebrados pro produtos tecológicos desenvolvidos pela indústria. Anton Zischka mostra os exemplos do isopreno que substitui a borracha natura, os corantes artificiis que sibstuíram o índigo, a seda artificial que substituiu o algodão, o baquelite que substitui o marfim.[14]


Em 1968 o desenhista industrial Gui Bonsiepe foi contratado pela Oficina Internacional del Trabajo fomentando os conceitos de propriedade industrial. Para Bonsiepe: “há uma clara diferença entre assimilar e copiar. Se deve fomentar a assimilação de conhecimentos técnicos científicos, pois estes são meios para o desenvolvimento do país. Que significa então desenvolvimento ? Aumento do ingresso bruto de uma economia, distribuição destes ingressos entre os membros da sociedade e por conseguinte um aumento do padrão de vida. O desenvolvimento do país significa então ganhar uma força econômica maior. Força econômica pode servir para superar um status de dependência. Para que pois serve a independência e autonomia relativa, se não se adquire ao mesmo tempo autonomia cultural e identidade cultural ? Seguramente isso não se consegue pelo caminho do plágio. Então a estratégia de copiar teria de ceder lugar a uma estratégia de inovação”. Algumas criações chilenas receberam destaque como a “cadeira Valdés”  desenho industrial concedido ao arquiteto Chrittian Valdés em 1979 e a vacina contra hepatite B desenvolvida pelo bioquímico chileno Pablo Valenzuela. Em 1991 o Chile adere a Convenção de Paris. Em 2008 é criado o Intituto Nacional de Propriedad Industrial (INAPI). Em 2009 aderiu ao PCT. Em 2012 a Colección Chilena de Recursos Genéticos do Instituo de Investigaciones Agropecuarias (INIA) foi reconhecida como autoridade internacional de depósito de material biológico segundo Tratado de Budapeste. Em 2012 o INAPI foi transferido para nova sede. O Chile[15] tornou-se autorizade de busca e exame PCT em outubro de 2014 em cerimônia que contou com a participação da presidente Michelle Bachelet e do diretor da OMPI Francis Gurry.[16]



[1] INAPI, Historia gráfica de la propriedad industrial em Chile, 2015, p.53

[2] Eureka: 100 grandes descobertas científicas do século XX. Rupert Lee. Rio de Janeiro:Editora Nova Fronteira, 2006, p. 186

[3] ZISCHKA, Anton. A ciência quebra monopólios. Porto Alegre: Ed. Globo, 1939, p.39

[4] STOKLEY, James. A ciência reconstrói o mundo, Rio de Janeiro:Ed. Globo,1951, p.12

[5]FREEMAN, Chris; SOETE, Luc. A economia da inovação industrial, São Paulo:Ed. Unicamp, 2008, p.161

[6] As veias abertas da América Latina, Eduardo Galeano, Paz e Terra; Rio de Janeiro, 1990, p. 156

[7] LEWINSOHN, Richard. Trustes e cartéis: suas origens e influências na economia mundial. Rio de Janeiro:Liv. Globo, 1945. p.229

[8] INAPI, Historia gráfica de la propriedad industrial em Chile, 2015, p.88

[9] LEWINSOHN, Richard. Trustes e cartéis: suas origens e influências na economia mundial. Rio de Janeiro:Liv. Globo, 1945. p.64

[10] CHALLONER, Jack. 1001 invenções que mudaram o mundo. Rio de Janeiro:Ed. Sextante, 2010, p. 520

[11] Trajetórias da inovação: a mudança tecnológica nos Estados Unidos da América no século XX, David Mowery, Nathan Rosenberg, 2005, São Paulo:Ed.Unicamp, p.92

[12] Carteles Internacionales, Ervin Hexner, México:Fondo de Cultura, 1950, p. 380

[13] COUTEUR, Penny le; BURRESON, Jay. Os botões de Napoleão: as 17 moléculas que mudaram a história. Rio de Janeiro:Zahar, 2006, p.96

[14] ZISCHKA, Anton. A ciência quebra monopólios, Porto Alegre, Globo, 1939, p. 197, 174

[15] INAPI, Historia gráfica de la propriedad industrial em Chile, 2015,

[16] http://www.inapi.cl/portal/prensa/607/w3-article-5312.html



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