ADI 5529 Constitucionalidade do parágrafo único do artigo 40 da LPI
https://www.youtube.com/watch?v=uMwRtZv92hE
Relator Ministro Dias Toffolli
Presidência Ministro Luiz Fux
Otto Licks
Gostaria de formalizar meu pedido de desculpas em especial
ao Ministro relator por conta do termo que utilizei em minha manifestação.
Nunca tive intenção de questionar esta Corte. Presto todas as reverências a
esta Corte e a sua observância à Constituição. Reitero meu pedido de desculpas
e reafirmo meu respeito a ética e renovo meus protestos à mais alta estima que
tenho a esta Corte.
Relator Ministro Dias Toffoli
Louvável a manifestação do advogado, mas observo que no dia
1 de abril no Valor Econômico houve um especial publicitário e já depois da
liminar por mim concedida no Estado de São Paulo rebatendo a minha liminar onde
é colocado que a matéria é de responsabilidade do advogado. Pergunto se o
eminente advogado pagou estas matérias.
Otto Licks
Estas matérias são feitas por diferentes titulares de
patentes. Os jornais diferenciam este tipo de veiculação como diferentes de
anúncios, e são aprovados pelo jornal.
Dias Tofolli
Vou inquiri judicialmente quem é o autor desta matéria. A responsabilidade
do que está contido é de seu escritório. Nunca vi matéria paga para comentar
processo. Isso é deslealdade processual e punida pelo processo civil, é uma
infração disciplinar. Fica o registro. Vou verificar a responsabilização. Se isso
vira moda teremos matérias pagas na impressa disfarçada para comentar
julgamentos. O advogado deve se pronunciar nos autos. Por isso deve haver uma
nota de desculpas nestas mídias.
Luiz Fux
Ministro tem toda a razão, temos que nos precaver de
críticas fabricadas que acabam atingindo a imagem da Corte. Sua preocupação procede.
Ministro Dias Toffoli - vota pela inconstitucionalidade do
dispositivo
Críticas são normais e bem vindas, mas não se pode tolerar é
matéria paga em meios de comunicação por advogados que atuam na causa. Isso é
má fé processual e deslealdade processual. Eu li a matéria e achei que a
matéria era do jornal, mas fui alertado que não era. Não posso tolerar isso.
Por conta disso vou fazer o voto na íntegra.
Não obstante o pedido de inconstitucionalidade do parágrafo
único do artigo 40 o que prevê a ampliação do prazo de vigência das patentes no
caso de atrasos. Ampliação automática e discricionária dependendo da gaveta que
esteja no órgão de registro. A propriedade industrial é parte integrante com
instrumentos nacionais e internacionais para proteger ativos intangíveis da
indústria. No Brasil tal proteção remonta ao Alvará de 1809 do príncipe regente
D. João VI. Na Constituição de 1988 a proteção é tratada no artigo 5º inciso
XXIV onde prevê privilégio temporário a tal direito e com fundamento no
interesse social e no desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Karin
Grau anota que ainda que na parte de direitos individuais o objetivo é incrementar
o bem estar social seja pela garantia do privilégio para incentivo aos
incentores de novos tecnologia e pelo incremento da concorrência de imitação ao
fim do privilégio produzindo mais qualidade e menor preço. No direito internacional
na OMC extraímos o Acordo TRIPs conforme Decreto 1355/1994. Em nada caso a
solução seja no sentido por mim proposto de inconstitucionalidade em nada
ofende TRIPs ou violação as regras da OMC. TRIPS estabelece um patamar mínimo
no intuito de reduzir distorções e obstáculos ao comércio interacional através
de uma proteção eficaz a propriedade intelectual. A LPI se adapta as regras de
TRIPS. TRIPS previa a adequação por quatro anos como regra de transição e prazo
adicional de cinco anos para fármacos, porém, o país renunciou a tais prazos de
transição. Patentes favorecem o
investimento em pesquisa ao compensar os que assumiram riscos na inovação. O
Ministro Eros Grau em resposta a consulta da ABIFINA se refere a patentes por
oferecer certa vantagem concorrencial do titular e viabiliza a recuperação de
investimentos, estimulando a inovação por free Riding. O artigo 6 da LPI diz
que o autor de inventor tem direito a patente. O trâmite processual do pedido
de patente no INPI envolve várias etapas. O artigo 44 da LPI garante a
retroação à data de publicação do pedido quanto aos aspectos penais e
indenizatórios. Embora a patente conceda exclusividade ao titular após
concessão o processo acaba levando a divulgação da patente antes da concessão. Em
geral os pedidos de exame são realizados somente no final do prazo de 36 meses
ficando paralisado pelo próprio depositante e não pelo INPI. Quanto aos fármacos
o artigo 229-C exige a prévia anuência da ANVISA para concessão da patente. A
Portaria conjunta INPI/ANVISA nº 1/2017 o processo fica até 36 meses aguardando
pedido de exame sendo submetido à ANVISA apenas após este prazo de 36 meses. É muito
importante atentar para esta particularidade dos fármacos. A fim do exame o
INPI profere sua decisão pelo artigo 37 da LPI. O privilégio vige pelo caput do
artigo 40 da LPI e, também, pelo parágrafo único. Destaco que expedida a carta
patente surge o direito de obter indenização pela exploração indevida inclusive
após a publicação do pedido pelo artigo 44 da LPI. Assim sendo a proteção
conferida retroage o que funciona como uma contenção aos concorrentes
explorarem a tecnologia. Esse ponto é muito bem elaborado no parecer citado do
Ministro Eros Grau. Mesmo antes da concessão da patente esta produz, portanto,
efeitos. A proteção não inicia, portanto, com a concessão da patente. Findo o
prazo de vigência e assim a proteção extingue-se entrando para o domínio
público. Em regra a vigência é de vinte anos contados do depósito o que atende
ao TRIPs. O parágrafo único prevê a vigência nunca inferior a dez anos contados
da concessão. Na hipótese do INPI demorar 15 anos para conceder a patente, esta
irá vigir por 25 anos contados do depósito. O prazo é portanto variável pois
depende da tramitação de cada processo administrativo e pode ultrapassar os 20
anos. Examinando os documentos do PL que deu origem a LPI não localizei a
motivação deste parágrafo único, ou seja, tal dispositivo foi inserido sem
maiores debates no Congresso. As suas razões não são esclarecidas nos
documentos do Congresso PL824/91 tampouco o incluiu, ele foi inserido no PL824B
em 1993 por substitutivo sem qualquer debate sobre seus possíveis impactos. Isso
tem mais cara de jabuti, de emenda submarino. Diz-se que o dispositivo era para
compensar backlog, mas por mais que se resolva isso, backlog sempre pode
voltar. O fenômeno de backlog existe desde 1996 que tornou patenteável os fármacos,
que até então não tinham proteção. Internalizado TRIPS e sem utilizar o prazo
de transição o INPI não estava equipado para receber esse adicional de pedidos
o que gerou um grande passivo de pedidos e assim formou-se uma enorme demanda.
A solução pensada foi este parágrafo único. Penso que está na hora de ajustar isso. TRIPS
estabelece a vigência de vinte anos contados do depósito (artigo 33). O acordo
está assim garantido pelo artigo 40 da LPI. Esse parágrafo único nada tem a ver
com qualquer obrigação de TRIPs. A racionalidade econômica de TRIPS leva em
conta um prazo médio para concessão da patente. O artigo 44 da LPI já cumpre
esse efeito de compensação por atrasos. Este parágrafo único é conhecido como
TRIPS Plus, além do acordo. O Brasil não é signatário que exija esta prorrogação,
logo nenhuma consequência haverá para o país pelo descumprimento de qualquer
compromisso internacional. A combinação dos artigos 40 e 44 atende
perfeitamente ao acordo TRIPs. O estudo de Direito e Pobreza da USP listou 30
legislações de diferentes países e conclui que o parágrafo único não encontra
paralelo em nenhuma destas legislações. É bem verdade que existem SPCs mas não
se trata de mecanismo automático e discricionário, sem qualquer justificativa,
além de seguirem lógica diversa pois tem aplicação reduzida e limitada a casos
específicos e não automáticos pela simples passagem do tempo. Elas não se
confundem com o parágrafo único do artigo 40 da LPI. Nestas legislações prevêm um prazo máximo
legal o que não ocorre na LPI, além de terem extensão pelo período exato da
demora. Não há qualquer evidência que tais países foram prejudicados por não terem
dispositivo semelhante ao parágrafo único do artigo 40 da LPI que cria um
desequilíbrio entre titulares e consumidores. Nenhum destes dispositivos é tão
amplo e geral como este da LPI. Mecanismos PTA nos Estados Unidos (incorporado nas
legislações do Chile e outros países. Na Colômbia e Peru tal mecanismo não se
aplica aos fármacos para garantir acesso a medicamentos) preveêm extensão da vigência
para cada dia de atraso no USPTO, excluídos os dias de atraso por culta do
requerente (cada caso concreto portanto tem um prazo definido), assim como PTE mas
de uma forma separada e restrita e dependente de requerimento com máximo de
cinco anos. Os SPCs europeus preveêm a extensão, mas para apenas alguns setores
específicos como fármacos e agroquímicos, que pode levar a extensão de até 5
anos adicionados por seis meses, por conta de atrasos na aprovação pelas
autoridades de saúde e não atrasos da EPO. A análise, contudo, depende de
requerimento e sua duração é variável. Todos
os países que adotam algo parecido com o PTS o ajuste só é concedido caso o
atraso seja causado pelo escritório de patente, mas na LPI isso é automático, o
que acaba levando ao interesse claro do depositante que a concessão atrase o
máximo possível. Não é toa que fazem matéria paga em jornal pois o interesse é
atrasar e manter esse dispositivo. Torna-se assim forçosa a conclusão que os
instrumentos adotados no exterior em suas variadas formas contém mecanismos que
o prazo seja estendido mais tempo que o necessário enquanto que no Brasil é
automático e sem necessidade de justificativa.
Quanto a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo
40, no parecer de Eros Grau destaca-se que a demora prolonga a vigência da
patente indiscriminadamente em prejuízo a concorrentes e consumidores que tenham
conhecimento da data em que podem explorara tecnologia o que compromete a
previsibilidade dos agentes no mercado. Ademais a norma incide comportamentos
adversos à livre concorrência ao retardar o processo de exame, pois quanto mais
lento maior a vigência. O prazo de vigência das patentes torna-se indeterminado,
e pode demorar mais de uma década. Inacreditável tal atraso em pleno século XXI.
O prazo determinado precisa ser dado pela delimitação temporal e previsível,
ela depende de um aspecto aleatório: a gaveta do INPI. Temos patentes de 30
anos no Brasil enquanto o produto já é de uso comum na Europa e Estados Unidos
enquanto aqui não tem concorrente, o que transcende dos limites da
razoabilidade e destoa da regra internacional. Com esta norma o prazo será indeterminado visto
que o backlog do INPI é variável depende da tecnologia e eventuais decorrentes
de ações promovidas pelo próprio requerente. Mesmo que o INPI supere o backlog
remanescerá a inconstitucionalidade da norma. Não questiono o prazo de dez anos
de extensão, isso não vem ao caso. Trata-se de uma regra arbitrária, automática
e possibilita monopólios por tempo excessiva em franca violação da segurança
jurídica e eficiência da administração pública, e o direito á saúde no caso dos
fármacos.
Sobre o backlog do INPI há violação do princípio da
eficiência da administração pública. Ao aderir os prazos de transição de TRIPS
poderíamos ter preparado melhor para o exame de fármacos. O dito parágrafo único
do artigo 40 da LPI em nada contribui para reduzir o backlog, que segundo
estudo da London Economics de 2009 observa que não se trata de problema exclusivo
do INPI e causa prejuízos bilionários às economias. TCU no relatório de
auditoria sobre o INPI conclui que o prazo de concessão acima de 10 anos
observado é bem acima da média mundial. O
INPI ocupa o topo da lista com maior atraso em patentes no mundo. O tempo até
primeiro exame é cinco maior que na China e Estados Unidos 2010-2018 variando
entre 70,8 e 84 meses, enquanto que na China e Estados Unidos variou de 4,4 e
27.7 meses. O atraso na ANVISA é de 13,92 meses. A ANVISA consegue ser mais rápida
que o INPI com toda a complexidade de seu exame. Tais meses somando-se aos 36
meses de pedido de exame. Entre 2008 e 2014 a quase totalidade das patentes
incidiu no artigo 40 da LPI com extensão para além dos 20 anos. Torna-se comum
patentes de medicamentos com 29 anos ou até mais segundo auditoria do TCU, o
que onera poder público por ser grande comprador. O voto do Ministro Vital do Rego
mostra que tais efeitos são preocupantes sendo obstáculo à inovação do país,
embora o número de depósito no Brasil seja muito inferior a China e Estados
Unidos seu tempo de processamento é muito maior do que nestes escritórios. O Brasil,
portanto, é duplamente de deficiente na área tendo poucos pedidos e por demorar
nestes poucos pedidos que examina. Requisitei ao INPI informações atualizadas
mostra que tem 143 mil processos pendentes de decisão. Dentre estes 16 mil
estão em etapa de exame formal, 25 mil
estão com pedidos publicados mas pendentes de requerimento técnico não podendo
entrar para fila de exame, 1,9 mil aguardam retorno da ANVISA, 94 mil (65% do
estoque) estão na etapa de exame técnico, e 5,9 mil estão na segunda instância.
Entre os pedidos os que aguardam a mais de dez anos são 8,8 mil pedidos. Vejam
85% dos processos judiciais do Brasil já são digitalizados, mas o INPI
justifica tem problemas com guarda e digitalização. INPI alega que tais problemas
estão sendo solucionados. Observo que o presidente está imbuído para resolver o
problema. Isso só contextualiza a situação. Chama a atenção a demora em
resolver esse problema independente da causa aqui em julgamento. Há clara violação do princípio da eficiência.
O INPI alega redução considerável do backlog com o plano de combate atual. As
divisões que tem maior demora em tempo médio são telecomunicações 10 anos e 1
mês, biofármacos 9 anos e 9 meses. Há situações em que o tempo ultrapassa em
muito o tempo médio chegando a uma proteção de quase três décadas. Hoje temos 36 mil patentes com mais de 20 anos
em vigor por força do parágrafo único do artigo 40, muitas com mais de trinta
anos de proteção efetiva e agora em vigor. A grande maioria destas patentes está em
telecomunicações e fármacos. Todas as patentes hoje concedidas nessas áreas
incidirão no parágrafo único do artigo 40 da LPI. O setor de fármacos 2 (86%) e
fármacos e biotecnologia (41%) também tem altos índices de incidência. Segundo
o TCU isso se deve ao incremento da complexidade das tecnologias, e até mesmo atrasos
causados pelos próprios depositantes ou por terceiros segundo relatório do TCU
(já imagino quem possam ser estes terceiros... diz o Ministro). TCU apontou como fraquezas do INPI: existência
de bases de dados sem interação adequada, muitos documentos com problema de
imagem, falta de solução tecnológica que permita controlar o fluxo, necessidade
de automação, quadro pessoal insuficiência, necessidade de sistemas de
qualidade. O INPI tem sim séria defasagem de examinadores com 312 examinadores
e 459 processos pendentes para cada examinador. Dos 810 cargos de pesquisador
em PI na carga do INPI temos 388 vagas vazias (52%). O INPI opera em situação
precária e carência de recursos humanos e denota necessidade urgente a
reformulação das práticas do órgão. Matérias pagas pelos agentes representantes
do titulares pode ser considerado até um atentado processual. TCU menciona o
depósito sucessivo de pedidos de patentes, evergreening, para prolongar a
exploração exclusiva tendo em vista que o mero depósito inibe a concorrência. Tal
prática é agravada pelo parágrafo único do artigo 40 da LPI como o caso do
etanecepit segundo maior no total de compras do governo com 15 pedidos de
patente, sendo o primeiro em 1999. Mesmo não examinados garantiram a proteção
ao titular, com o tempo de proteção podendo alcançar 36 anos (depositado em 2015).
Não é possível afirmar que essa gestão bloqueou a concorrência, no entanto, é
típico de muitos outros casos. Não vi em nenhuma das manifestações orais alguém
ter contestado os dados deste relatório do TCU. As estratégias dos agentes para
maximizar a vigência de suas patentes estão fartamente citadas na literatura
sobre evergreening. É costume titulares de medicamentos depositarem mais de 100
pedidos por medicamento. Estudo da Fiocruz apontou uso de tais mecanismos de
evergreening para HIV AIDS com média de 22 pedidos por cada medicamento. A auditoria
do TCU estimou os custos nas compras do governo por conta do parágrafo único do
artigo 40 da LPI podendo chegar a perto de um bilhão de reais. O TCU recomendou
a revogação do parágrafo único do artigo 40 da LPI. A Casa Civil já tem consenso
governamental em favor da revogação do parágrafo único do artigo 40 da LPI e
revogação da anuência prévia da ANVISA. No que tange as deficiências do INPI se
reconhece os avanços pelo INPI, porém isso já aconteceu no passado e o backlog
voltou. O plano de combate atual visa diminuir o estoque em 80% dos pedidos
depositados até 31/12/2016 e com exame solicitado. O estoque de 149 mil caiu em
abril de 2021 para 63 mil pedidos. A norma questionada retroalimenta o backlog.
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