No Canadá o escritório de patentes rejeitou como sem
utilidade e meramente descrevendo um resultado desejado, a patente CA2268812
que trata de método para produção de modelos de animal transgênico para a
doença de Alzheimer. O Patent Appeal Board (PAB) rejeitou este argumento e
considerou válida a patente uma vez que definições funcionais de elementos
individuais da reivindicação não necessariamente tornam a reivindicação não
patenteável por serem direcionadas a um resultado desejado. A reivindicação
descreve um método de preparação de animal transgênico que contém um
polipeptídeo mutante X e um polipeptídeo precursor amilóide mutante em que a
expressão do polipeptídeo mutante X possui o mesmo efeito fenotípico que o
M146L e a expressão do polipeptídeo precursor amilóide mutante possui o mesmo
efeito fenotípico que APP695. A Corte entendeu que o efeito desejado da
reivindicação não era a identificação dos transgenes mutantes per se, mas a
produção de modelos de animais transgênicos da doença de Alzheimer que possuíam
o fenótipo de patologia acelerada da doença. Para alcançar este resultado o
depositante havia identificado e expresso a combinação de transgenes mutantes
associados com a doença de Alzheimer em um animal transgênico. O técnico no
assunto seria capaz de identitificar os transgenes mutantes outros do que
aqueles citados especificamente.[1]
Em Sanofi Aventis v. Apotex o Federal Court o Appeal do Canadá[2]
foi analisada a validade da patente do Plavix. A Corte confirmou a validade da
patente e reafirmou doutrina estabelecida de que “nem toda a patente contém uma promessa explícita de um resultado
específico”. Se uma promessa explícita é feita a patente será inváida se o
inventor não demonstrar ou puder prever de forma razoável a dita utilidade na
época da data de depósito. Se nenhuma promessa explícita é feita, então uma
centelha de utilidade será suficiente. Em Bell Helicopter Textron Canada Lt. V.
Eurocopter (2013 FCA219) a patente em questão tratava de um mecanismo de
decolagem de helicópteros e a Corte aplicou a doutrina de “sound prediction” fora do contexto farmacêutico, novamente
sustentando a utilidade da invenção em questão.
No
Canadá desde a decisão da Suprema Corte em Consolboard v. MacMillam Bloedel tem
havido um entendimento de que a evidência em suporte ao critério de utilidade
não necessita ser revelada no pedido de patente. Não haverá utilidade quando a
invenção não funciona, seja no sentido que não funciona de qualquer forma, ou
em sentido mais amplo, quando não realiza aquilo que o relatório descritivo se
compromete que irá realizar. Sempre que os resultados são alcançados ao acaso,
e não através de uma reprodução confiável, haverá fundamento para se questionar
a utilidade da invenção. A Suprema Corte do Canadá em Apotex v. Wellcome
Foundation entendeu que a utilidade deva ser determinada na época do depósito
da patente e não com base em evidências ocorridas após esta data. Para tanto
será necessário demonstrar implementações previstas de modo razoável, em uma
doutrina conhecida como “doctrine of
sound prediction”, evitando-se desta forma especulações no momento do
depósito só confirmadas em data posterior, constituindo assim a patente uma
recompensa sobre o que na verdade constitui uma aposta do depositante. Em
seguida a decisão da Suprema Corte em Apotex o CIPO emendou o manual de exame
para incorporar a doutrina de sound
prediction na prática de exame: “embora
nenhum inventor seja exigido de entender o porque sua invenção funciona, isto
não evita a exigência de previsão razoável (sound prediction). Se um inventor
não pode articular uma linha de raciocínio razoável para conectar seu suporte
factual (através de exemplos) ao restante da matéria reivindicada, ele não tem
o direito para um escopo amplo de suas reivindicações”. Contudo na decisão Lilly/Raloxifene o Federal Court
of Appeal entendeu que em alguns casos esta evidência deve estar presente no
relatório descritivo da patente. Norman Siebrasse questiona este entendimento,
pois a lei canadense não estabelece qualquer discriminação.[3] Jay Erstling argumenta que este critério mais
rigoroso coloca os pedidos estrangeiros em condições desfavoráveis de atenderem
o critério de utilidade no Canadá uma vez que os pedidos de origem não atendem
a este requisito de sound prediction.
Segundo
o guia de exame do CIPO [4]uma
matéria cuja utilidade não sej evidente a partir do revelado no pedido de patente
para um técnico no assunto[5],
que seja inoperante[6],
que apresente resultados que não possam ser reproduzidos ou que não apresente
qualquer resultado que poss ser considerado como benéfico ao público [7]
não atenderá ao critério de utilidade. Salvo
se o invento conseguir provar a utilidade na data de deposito do pedido de
patente, com base em uma demonstração ou previsão factível (sound prediction) a patente será
indeferida por falta de utilidade[8].
Não é necessário para o inventor prover a teoria que explique porque a invenção
funciona, mas a doutrina da previsão factível (doctrine of sound prediction) não pode ser diluída por uma mera especulação. A matéria deve ser operável[9]
por meios descritos pelo inventor de modo que o resultado descrito
inevitavelmente seja alcançado quando colocado em prática[10].
A matéria será considerada sem utilidade se não funcionar[11].
A invenção deve ser controlável[12]
e seus resultados reproduzíveis pelos meios descritos. Um processo que inclua
uma etapa mental envolvendo avaliação é patenteável uma vez presentes os demais
atributos de patenteabilidade uma vez que o efeito da etapa mental seja preciso
e previsível não importa o quanto habilmente é executado. Por outro lado, um
processo que inclua etapa mental cuja natureza dependa da inteligência e raciocínio
humanos não atende as exigências de operabilidade uma vez que a resposta humana
não é previsível nem precisa sempre que o processo for executado pelos usuários,
por exemplo, processos para fazer exercícios físicos, ensino, processos cosméticos
como limpeza de pele, pentear cabelo, pedicure, fazer arranjos florais,
processo para pintar quadros ou tocar instrumentos musicais, métodos para teste
de QI.[13]
No Canadá a decisão da Suprema
Corte em 2002 em Apotex v. Wellcome Foundation expandida pela decisão da Corte
de Apelações em Eli Lilly Canadá v. Apotex significou um critério mais rígido
de utilidade a ser exigido para concessão de patentes. [14] Em Apotex v.
Wellcome a Suprema Corte destacou que o objetivo era evitar a especulação como
justificativa de utilidade: deve haver uma base factual para a utilidade
prevista para a invenção, deve haver na data de depósito do pedido uma linha
firme para sustentar os resultados alcançados pela invenção e em terceiro lugar
deve haver uma revelação adequada no pedido para a lógica ou raciocínio usado
para chegar nesta previsão de utilização[15].
A Suprema Corte, contudo, destaca que sound predictio não quer dizer certeza. Em
2011 a Corte de Apelações em decisão de 2011 em Pfizer Canada v. Canadá
entendeu que a patente atendia o critério de utilidade com bases nos testes
apresentados no pedido de patente. A patente do omeprazole no tratamento de doença
gastroesofágica (CA2139653) teve sua eficácia terapêutica comprovada pela
titular em dados apresentados que comprovavam o conhecimento de tal efeito na
data de prioridade, porém a Corte canadense rejeitou o argumento porque tal
comprovação não foi apresentada até a data de depósito do pedido no Canadá e
não foi mencionada no relatório descritivo, consequentemente as reivindicações
foram rejeitadas por falta de utilidade. O pedido equivalente nos Estados
Unidos US5714504 não teve questionado o critério de utilidade. Na Europa o
pedido equivalente EP652872 teve algumas de suas reivindicações revogadas,
porém novamente o questionamento não foi devido a falta de utilidade mas a
falta de atividade inventiva. O alegado uso e eficácia terapêutica foi aceito
tanto nos Estados Unidos como EPO.
[1] LOWTHERS, Erica. Functional claiming – a
desired result for applicants?.
http://www.lexology.com/r.ashx?i=2892512&l=7GGVM9X
[2] 2013 FCA 186 cf. BAECHTOLD, Robert. The
intellectual property review. Law Business Research:Londres, 2014, p.35
[3] SIEBRASSE, Norman. Must the Factual Basis for
Sound Prediction Be Disclosed in the Patent? 2012, Canadian Intellectual
Property Review, v.18, n.1, p.39-80
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2018899
[4] Patent Office Manual of Patent Office
Practice, CIPOP, 2005.
[5] Marzone Chemicals Ltd. v. Eli Lilly & Co.
[1978] 37 C.P.R.
[6] Hoechst Pharmaceuticals of Canada Ltd. v.
Gilbert & Co. [1966] S.C.R. 189 at p. 194; Lubrizol Corp. v. Imperial Oil
Ltd. [1990] 33 C.P.R. (3d)
[7] Re Application Number 3,389 to Organon [1973]
15 C.P.R. (2d) 253 (PAB)
[8] Apotex
v. Wellcome Foundation Ltd. (2002) 21 C.P.R. (4th) 499 (S.C.C.)
[9] Re: Application 312,909, [1980] C.D. No. 703
[10] Northern Electric Co. v. Brown’s Theaters
Ltd. [1940] ExCR 36 at 56, aff’d [1941] SCR 224
[11] Noranda Mines Ltd. v. Minerals Separation
North American Corp. [1947] 12 C.P.R.
[12] Harvard College v. Canada (Commissioner of
Patents) [2000] 7 C.P.R.
[13] Re Application for Patent containing claims
that read on mental steps performed by a human operator in deciding to transmit
a signal [1972] 23 C.P.R.
[14] ERSTLING, Jay; SALMELA, Amy; WOO, Justin.
Usefulness varies by country: the utility requirement of patent law in the
United states, Europe and Canada. Cybaris, an Intellectual Property Law Review,
2012
http://web.wmitchell.edu/cybaris/wp-content/uploads/2012/04/Erstling-Salmela-Woo.pdf
[15]
THAMBISETTY, Sivaramjani. Legal Transplants in Patent Law: Why Utility is the
New Industrial Applicability, LSE Law, Society and Economy Working Papers
6/2008, p.19 http://ssrn.com/abstract=1111966
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